Acessibilidade / Reportar erro

Adesão às precauções padrão em hospitais universitários na pandemia de COVID-19: estudo misto* * Extraído da tese “Adesão às precauções padrão e infecção por SARS-COV-2 em profissionais da saúde de hospitais universitários durante a pandemia de COVID-19”, Universidade Federal de Santa Maria, 2022.

RESUMO

Objetivo:

Analisar a adesão às precauções padrão por profissionais da saúde e os fatores associados durante a pandemia de COVID-19 em hospitais universitários brasileiros.

Método:

Estudo multicêntrico, de abordagem mista, com estratégia incorporada concomitante e amostra de 559 profissionais da saúde e 53 gestores de cinco hospitais universitários do Sul do Brasil. Coleta de dados realizada de setembro de 2020 a outubro de 2021, online, com o Instrumento de Variáveis Relativas às Precauções Padrão, variáveis sociodemográficas e relacionadas à pandemia. Realizada análise estatística descritiva e inferencial (teste de Mann-Whitney e Kruskal-Wallis) e análise de conteúdo.

Resultados:

Alto nível de adesão às precauções padrão, com associação significativa para ter filhos (p = 0,014); área COVID (p < 0,001), treinamento sobre biossegurança (p = 0,018) e distanciamento social (p < 0,001). Depoimentos demonstraram percepção de risco elevada e busca pela utilização de equipamentos de proteção e por conhecimentos relacionados à biossegurança.

Conclusão:

Alta adesão às precauções padrão, associada a ter filhos, trabalhar em unidades de atendimento à COVID-19, receber orientações/capacitação sobre biossegurança na instituição e realizar distanciamento social.

DESCRITORES
Saúde do Trabalhador; Pessoal de Saúde; Equipamento de Proteção Individual; Princípio da Precaução; COVID-19

ABSTRACT

Objective:

To analyze adherence to standard precautions by healthcare professionals and associated factors during the COVID-19 pandemic in Brazilian university hospitals.

Method:

Multicenter study, with a mixed approach, with a concomitant incorporated strategy and a sample of 559 health professionals and 53 managers from five university hospitals in Southern Brazil. Data collected online from September 2020 to October 2021 with the Instrument of Variables Related to Standard Precautions and sociodemographic and pandemic-related variables. Descriptive and inferential statistical analysis (Mann-Whitney and Kruskal-Wallis test) and content analysis were performed.

Results:

High level of adherence to standard precautions, with a significant association with having children (p = 0.014); COVID area (p < 0.001), biosafety training (p = 0.018), and social distancing (p < 0.001). The testimonies demonstrated a high risk perception and search for the use of protective equipment and biosafety knowledge.

Conclusion:

High adherence to standard precautions, associated with having children, working in COVID-19 care units, receiving biosafety guidance/training at the institution and practicing social distancing.

DESCRIPTORS
Occupational Health; Health Personnel; Personal Protective Equipment; Precautionary Principle; COVID-19

RESUMEN

Objetivo:

Analizar la adherencia a las precauciones estándar por parte de los profesionales de la salud y los factores asociados durante la pandemia de COVID-19 en hospitales universitarios brasileños.

Método:

Estudio multicéntrico, con enfoque mixto, estrategia incorporada concomitante y muestra de 559 profesionales de la salud y 53 gestores de cinco hospitales universitarios del sur de Brasil. Datos recopilados en línea de septiembre de 2020 a octubre de 2021 con el Instrumento de Variables Relacionadas con Precauciones Estándar y variables sociodemográficas y relacionadas con la pandemia. Se realizaron análisis estadísticos descriptivos e inferenciales (prueba de Mann-Whitney y Kruskal-Wallis) y análisis de contenido.

Resultados:

Alto nivel de adherencia a las precauciones estándar, con asociación significativa con tener hijos (p = 0,014); área COVID (p < 0,001), capacitación en bioseguridad (p = 0,018) y distanciamiento social (p < 0,001). Los testimonios indican una alta percepción de riesgo y búsqueda del uso de equipos de protección y conocimientos de bioseguridad.

Conclusión:

Alto cumplimiento de las precauciones estándar, asociadas con tener hijos, trabajar en unidades de atención de COVID-19, recibir orientación/capacitación en bioseguridad en la institución y practicar el distanciamiento social.

DESCRIPTORES
Salud Laboral; Personal de Salud; Equipo de Protección Personal; Principio de la Precaución; COVID-19

INTRODUÇÃO

A pandemia de COVID-19 expôs os profissionais da saúde a um risco aumentado de infecção pelo vírus SARS-CoV-2. Ações de prevenção e controle de infecção foram recomendadas com o objetivo de evitar e reduzir ao máximo a transmissão do vírus durante a assistência à saúde(11. World Health Organization. Coronavirus disease (Covid-19) outbreak: rights, roles and responsibilities of health workers, including key considerations for occupational safety and health [Internet]. Geneva: WHO; 2020 [cited 2022 Apr 20] Available from: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/who-rights-roles-respon-hw-covid-19.pdf.
https://www.who.int/docs/default-source/...
). Entre essas ações, ressalta-se a utilização das precauções padrão (PP), que são medidas de higiene, controle de infecção e de prevenção de exposições ocupacionais. As PP devem ser implementadas em todos os atendimentos, independentemente do diagnóstico do paciente, mediante o risco de exposição a sangue ou outros fluidos e secreções corporais(22. Brasil. Nota técnica n°04/2020. Orientações para serviços de saúde: medidas de prevenção e controle que devem ser adotadas durante a assistência aos casos suspeitos ou confirmados de infecção pelo novo coronavírus (sars-cov-2) – atualizada em 25/02/2021 [Internet]. Brasília: ANVISA; 2020 [cited 2022 Jun 03]. Available from: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/notas-tecnicas/2020/nota-tecnica-gvims_ggtes_anvisa-04_2020-25-02-para-o-site.pdf.
https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centrais...
).

Na última década, pesquisadores buscaram avaliar estratégias para promover a adesão às PP entre os profissionais da saúde(33. Cunha QB, Camponogara S, Freitas EO, Petry KE, Silva AGI. Strategies to promote adherence to Standard Precautions among health professionals: an integrative review. Research. Soc Dev. 2020;9(4):e141942992. doi: http://doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2992.
https://doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2992...
). Com as mudanças impostas aos serviços a partir do surgimento da COVID-19, novas pesquisas vêm sendo desenvolvidas no sentido de compreender como foi a adesão às PP nesse novo cenário. No Brasil, autores identificaram mudanças positivas de comportamento em relação ao uso das PP durante a pandemia(44. Araújo ER, Gomes GF, Simões MRL, Ferreira PHC, Gonçalves RPF, Lara MO. Mudanças de comportamento relacionado às precauções padrão por profissionais de saúde durante a pandemia do Covid-19. In: Klauss J, editor. Os profissionais de saúde durante a pandemia de COVID-19: atitudes e barreiras. Guarujá: Editora Científica Digital; 2022. doi: http://doi.org/10.37885/221010682.
https://doi.org/10.37885/221010682...
). Na China, os pesquisadores identificaram que o nível de adesão às PP foi positivamente associado à satisfação com a política de controle e prevenção de infecções implementada nesse período(55. Wong ELY, Ho KF, Dong D, Cheung AWL, Yau PSY, Chan EYY, et al. Compliance with standard precautions and its relationship with views on infection control and prevention policy among healthcare workers during COVID-19 pandemic. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(7):3420. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph18073420. PubMed PMID: 33806138.
https://doi.org/10.3390/ijerph18073420...
). Contudo, as pesquisas sobre essa problemática no contexto da pandemia ainda são incipientes.

Esta investigação tem como diferencial a integração de resultados quantitativos e qualitativos para explorar a adesão às PP e os fatores que interferiram nessa prática durante a pandemia. A incorporação de dados mistos na análise contribui para uma interpretação mais aprofundada, permitindo analisar com mais abrangência esse fenômeno. Sendo assim, o objetivo do estudo foi analisar a adesão às precauções padrão por profissionais da saúde e os fatores associados durante a pandemia de COVID-19 em hospitais universitários brasileiros.

MÉTODO

Tipo de Estudo

Estudo multicêntrico, com abordagem metodológica mista e estratégia incorporada concomitante QUANT (qual). O estudo quantitativo caracterizou-se por ser do tipo transversal e o estudo qualitativo teve caráter exploratório-descritivo. A fim de assegurar o rigor metodológico, foi utilizado o instrumento Mixed Methods Appraisal Tool (MMAT)(66. Oliveira JLC, Magalhães AMM, Matsuda LM, Santos JLG, Souto RQ, Riboldi CO, et al. Mixed Methods Appraisal Tool: fortalecimento do rigor metodológico de pesquisas de métodos mistos na enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2021;30:e20200603. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0603.
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
).

Local

O cenário do estudo constituiu-se de cinco hospitais universitários de grande porte (de 151 a 500 leitos); todos eram referência para tratamento da COVID-19 e estão localizados em cinco municípios na região Sul do Brasil (Curitiba – PR, Florianópolis – SC, Porto Alegre – RS, Santa Maria – RS e Rio Grande – RS), sendo quatro deles vinculados à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).

População e Critérios de Seleção

No estudo quantitativo, a população foi composta por profissionais da enfermagem (enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem) e médicos que atuavam na assistência direta aos pacientes pelo menos desde fevereiro de 2020 (período de início da epidemia no Brasil). Foram excluídos os profissionais de outras categorias da área da saúde devido ao instrumento de coleta de dados quantitativo escolhido ser voltado para as atividades assistenciais de médicos e profissionais da enfermagem e ter sido validado apenas nessa população, evitando-se, dessa forma, um viés na coleta de dados. No período de coleta de dados, o número total de profissionais da enfermagem e médicos era de 10.491.

No estudo qualitativo, além dos profissionais da assistência, foram incluídos gestores dos serviços de saúde, como chefes/coordenadores das unidades, profissionais que atuavam nos serviços de controle de infecção, saúde do trabalhador e serviço de educação permanente havia pelo menos 3 meses. A inclusão dos gestores e demais profissionais foi realizada com a finalidade de aprofundar a compreensão do fenômeno investigado e, dessa forma, garantir uma amostra suficiente e fidedigna na análise qualitativa, tendo em vista que a dimensão do objeto investigado se articula com as ações e percepções de todos esses grupos profissionais.

Definição da Amostra

A amostra foi selecionada por conveniência e os participantes foram recrutados pelo e-mail cadastrado junto às instituições. Essa estratégia foi adotada devido às restrições de contato e de acesso aos hospitais impostas pela situação de pandemia. Para coleta quantitativa, foi realizado um cálculo para estimativa amostral, com a finalidade de garantir um número significativo de participantes, com nível de confiança de 95% e margem de erro de 5%, resultando em uma amostra mínima de 371 profissionais de saúde.

A amostra de respondentes obtida para os dados quantitativos foi de 559 profissionais. A amostra de dados qualitativos foi composta pelos profissionais assistenciais que responderam às questões abertas ao final do instrumento de coleta de dados, os quais somaram 546 profissionais de saúde (enfermagem e médicos), além de 53 gestores e profissionais do serviço de controle de infecção, saúde ocupacional e educação permanente.

Coleta de Dados

A coleta de dados foi realizada online, via formulário eletrônico pela plataforma Google Forms, no período de setembro de 2020 a outubro de 2021.

Foram coletados dados de caracterização sociodemográfica (idade, sexo, situação conjugal, filhos) e profissional (instituição, setor, categoria profissional, vínculo de trabalho, formação concluída, turno de trabalho predominante e tempo de experiência profissional em anos) de todos os participantes.

O instrumento de coleta de dados aplicado para obtenção de dados quantitativos era composto por duas partes. A primeira parte continha as escalas do Instrumento de Variáveis Relativas às PP, adaptado e validado para uso no Brasil(77. Brevidelli MM, Cianciarullo TI. Fatores psicossociais e organizacionais na adesão às precauções-padrão. Rev Saude Publica. 2009;43(6):907–16. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000065.
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200900...
). Esse instrumento é originalmente composto por 10 escalas, sendo que neste estudo foram utilizadas sete: Adesão às PP (13 itens), Eficácia da Prevenção (3 itens), Percepção de Risco (3 itens), Obstáculos para Seguir às PP (6 itens), Carga de Trabalho (3 itens), Clima de Segurança (12 itens) e Disponibilidade de EPI (2 itens). As escalas desse instrumento são do tipo likert, cuja pontuação varia de 1 (sempre/concordo totalmente) a 5 (nunca/discordo totalmente). A partir da soma dos itens, foi feita uma média cuja pontuação varia entre 1 e 5 para cada escala. Valores menores ou iguais a 3,49 significam níveis baixos; entre 3,5 e 4,49, níveis intermediários; e valores acima de 4,5 implicam níveis altos(77. Brevidelli MM, Cianciarullo TI. Fatores psicossociais e organizacionais na adesão às precauções-padrão. Rev Saude Publica. 2009;43(6):907–16. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000065.
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200900...
).

Esse instrumento passou por uma adaptação na redação de alguns itens, de forma que o termo “HIV” foi substituído por “COVID-19”, com autorização da autora do instrumento, enfatizando o contexto da pandemia. As escalas foram submetidas à avaliação de nove juízes com experiência em pesquisas na área de saúde do trabalhador para validação do conteúdo. Os juízes opinaram sobre a adequação de cada item que compunha a escala, com base nos critérios de clareza, precisão e relevância. O Índice de Validade de Conteúdo (IVC) obtido em cada item foi ≥ 0,80, atestando a validade do instrumento(88. Rubio DM, Berg-Weger M, Tebb S, Lee ES, Rauch S. Objectifying contente validity: conducting a contente validity study in social work research. Soc Work Res. 2003;27(2):94–111. doi: http://doi.org/10.1093/swr/27.2.94.
https://doi.org/10.1093/swr/27.2.94...
).

A segunda parte do instrumento de dados quantitativos era um questionário contendo 11 questões fechadas, o qual abordava questões relacionadas à pandemia, como: receber orientações da instituição sobre biossegurança com foco na transmissão do novo coronavírus; cumprimento da recomendação de distanciamento social nas atividades da vida particular; ter tido sintomas de COVID-19; utilização de EPI durante a assistência direta a pacientes suspeitos ou confirmados de COVID-19; ter sido testado; fazer parte do grupo de risco, entre outras.

Na coleta de dados qualitativos, foi utilizado um questionário com questões abertas sobre as medidas protetivas durante a pandemia. O instrumento foi composto por cinco perguntas abertas que tinham como foco questões relacionadas a: percepção da utilização das medidas de proteção individual pelos trabalhadores da instituição; dificuldades enfrentadas e estratégias utilizadas para melhorar a proteção no ambiente de trabalho; percepção da atuação da instituição com relação à problemática. O questionário foi incorporado ao protocolo de pesquisa quantitativa; porém, o seu preenchimento não era obrigatório.

Análise e Tratamento dos Dados

Os dados quantitativos foram organizados em uma planilha eletrônica sob a forma de banco de dados no programa Excel/Windows e foram analisados no IBM-SPSS versão 25. A análise de dados foi realizada por meio da estatística descritiva (frequência absoluta e relativa) e inferencial (teste de Mann-Whitney ou Kruskal-Wallis). O teste de normalidade de Shapiro-Wilk mostrou que as variáveis não apresentaram distribuição normal. As escalas do Instrumento de Variáveis Relativas às PP foram representadas pela mediana e intervalo interquartílico tendo em vista a distribuição dos dados. O nível de significância de 5% (p < 0,05) foi adotado para todas as análises.

Os dados qualitativos foram submetidos à análise de conteúdo(99. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016.) com auxílio do software MAXQDA. Após a organização do conjunto de dados a ser analisado (1ª etapa), realizou-se a exploração e análise aprofundada do material, com codificação e agrupamento (2ª etapa). Nessa etapa, os dados foram agrupados em uma categoria com 13 subcategorias. Por último, foi realizado o tratamento dos resultados e interpretação (3ª etapa).

Após, foi realizada a incorporação dos dados qualitativos aos quantitativos a partir da comparação dos achados, de forma que os itens da categoria qualitativa foram incorporados a resultados quantitativos. Essa integração foi realizada na etapa de interpretação dos resultados, buscando-se a complementaridade das informações e o aprofundamento na compreensão do objeto de estudo.

Aspectos Éticos

Esta pesquisa foi submetida para consideração ao Comitê de Ética em Pesquisa das cinco instituições participantes e foi aprovada sob os seguintes pareceres: nº 4.335.006, nº 4.466.661, nº 4.685.755, nº 4.348.898 e nº 4.501.805. Todos os princípios éticos previstos em pesquisas envolvendo seres humanos foram respeitados de acordo com a Resolução 466/12. A participação na pesquisa foi precedida pela concordância online do participante, que teve acesso ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Além disso, a fim de preservar seu anonimato, as respostas qualitativas foram identificadas por códigos compostos pela letra “E” para enfermeiros, “M” para médicos, “TE” para técnicos de enfermagem, “AE” para auxiliares de enfermagem, e “G” para gestores e profissionais dos serviços de controle de infecção, saúde do trabalhador e educação permanente, seguidas de números associados à ordem em que o participante foi integrado à pesquisa. As instituições também foram identificadas por letras: Hospital A, Hospital B, e assim, sucessivamente.

RESULTADOS

Na análise quantitativa, houve a participação de 559 profissionais, sendo 71% (n = 397) profissionais da enfermagem (195 técnicos de enfermagem, 185 enfermeiros, 17 auxiliares de enfermagem). Nessa amostra, 77,3% (n = 432) eram do sexo feminino, com média de idade de 45 (±9,54) anos (mínimo 22 e máximo 68 anos); 79,4% (n = 444) tinham companheiro e 72,8% (n = 407) possuíam filhos. Com relação às variáveis profissionais, 35,4% (n = 198) possuíam título de Especialista e 72,4% (n = 405) tinham seu contrato laboral regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O tempo médio de experiência profissional foi de 18,3 anos (dp ± 9,1), o turno predominante de trabalho na instituição era o diurno para 67,1% (n = 375). Maior percentual (77,6%, n = 434) informou possuir um vínculo empregatício e 82,3% (n = 460) tinham uma carga de trabalho semanal ≤ 40 horas.

A Tabela 1 mostra os dados da associação entre as características sociodemográficas e ocupacionais e a adesão às PP.

Tabela 1
Comparação da distribuição da adesão às precauções padrão entre as variáveis categóricas sociodemográficas e ocupacionais (n = 559). Curitiba – Paraná; Florianópolis – Santa Catarina; Porto Alegre, Santa Maria e Rio Grande – Rio Grande do Sul, Brasil, 2020-2021.

As medianas das escalas do Instrumento de Variáveis Relativas às PP estão descritas na Tabela 2. Verificou-se nível alto para “adesão às PP” e níveis intermediários para as demais variáveis.

Tabela 2
Mediana e intervalo interquartílico das variáveis relativas às precauções padrão (n = 559). Curitiba – Paraná; Florianópolis – Santa Catarina; Porto Alegre, Santa Maria e Rio Grande – Rio Grande do Sul, Brasil, 2020-2021.

As variáveis relacionadas à pandemia que foram associadas a maiores valores de adesão às PP foram descritas na Tabela 3. Os profissionais que receberam orientações e/ou capacitação na instituição sobre biossegurança com foco na prevenção da transmissão do coronavírus tiveram valores significativamente maiores de adesão às PP. Aqueles que afirmaram que sempre realizaram o distanciamento social recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nas demais atividades da vida particular também tiveram valores significativamente maiores.

Tabela 3
Comparação das medianas de adesão às precauções padrão com as variáveis relacionadas à pandemia de COVID-19 (n = 559). Curitiba – Paraná; Florianópolis – Santa Catarina; Porto Alegre, Santa Maria e Rio Grande – Rio Grande do Sul, Brasil, 2020-2021.

As associações significativas entre as Variáveis relativas às PP e as variáveis relacionadas à pandemia são descritas na Tabela 4. A mediana da percepção de risco foi mais elevada no grupo de participantes que teve sintomas sugestivos de COVID-19 durante o período. O grupo que afirmou ter recebido orientações/capacitação sobre biossegurança com foco na prevenção da transmissão do novo coronavírus teve melhor percepção quanto ao clima de segurança e melhor percepção quanto à disponibilidade de EPI. O grupo que afirmou sempre ter utilizado EPI durante a assistência direta a pacientes suspeitos ou confirmados de infecção por COVID-19 teve melhor percepção de clima de segurança e da disponibilidade de EPI.

Tabela 4
Comparação das medianas do Instrumento de Variáveis Relativas às Precauções Padrão com as variáveis relacionadas à pandemia de COVID-19 (n = 559). Curitiba – Paraná; Florianópolis – Santa Catarina; Porto Alegre, Santa Maria e Rio Grande – Rio Grande do Sul, Brasil, 2020-2021.

Com relação à análise qualitativa do estudo, os achados foram agrupados em uma categoria intitulada “Repercussões da pandemia na adesão às PP”, a qual evidenciou o entendimento dos profissionais quanto às medidas de proteção, quanto à percepção dos riscos, às questões relacionadas ao ambiente de trabalho e às instituições durante esse período. A unidade de análise utilizada na construção da categoria foi “Fatores relacionados à adesão às PP”. Essa categoria foi apresentada em 13 subcategorias, as quais foram incorporadas aos resultados quantitativos. Foram extraídas declarações significativas para melhor representá-los, conforme descrito no Joint display exibido no Quadro 1.

Quadro 1
Joint display com integração dos resultados quantitativos e declarações dos participantes. Curitiba – Paraná; Florianópolis – Santa Catarina; Porto Alegre, Santa Maria e Rio Grande – Rio Grande do Sul, Brasil, 2020-2021.

DISCUSSÃO

Os resultados permitiram analisar a adesão às PP, por profissionais da saúde, durante a pandemia. Estudos anteriores apresentaram níveis intermediários de adesão às PP(1010. Ferreira LA, Peixoto CA, Paiva L, Silva QCG, Rezende MP, Barbosa MH. Adherence to standard precautions in a teaching hospital. Rev Bras Enferm. 2017;70(1):90–7. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0138. PubMed PMID: 28226047.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
1313. Faria LBG, Santos CTB, Faustino AM, Oliveira LMAC, Cruz KCT. Knowledge and adherence of the nurse to standard precautions in critical units. Texto Contexto Enferm. 2019;28:e20180144. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2018-0144.
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
), diferentemente do nível elevado encontrado no presente estudo. As respostas qualitativas corroboram esse achado, demonstrando que a pandemia levou a uma maior conscientização quanto à utilização das PP.

O medo de contrair e de transmitir a doença aos familiares foi identificado como um aspecto que influenciou na adesão às PP, sendo que os profissionais que possuem filhos foram mais aderentes. O contexto da pandemia fez com que os profissionais refletissem sobre os riscos a que estão expostos no ambiente de trabalho, gerando mudanças nas atitudes e comportamentos, o que resultou em uma maior adesão às PP. A literatura aponta que o medo de se infectar ou infectar familiares está entre os principais desafios mentais enfrentados por profissionais da saúde que atuam em pandemias, o que, somado ao estigma sofrido por parte da sociedade, gera estresse e isolamento(1414. Stuijfzand S, Deforges C, Sandoz V, Sajin C, Jaques C, Horsch A. Psychological impact of an epidemic/pandemic on the mental health of healthcare professionals: a rapid review. BMC Public Health. 2020;20(1):1230. doi: http://doi.org/10.1186/s12889-020-09322-z. PubMed PMID: 32787815.
https://doi.org/10.1186/s12889-020-09322...
). Assim, aderir às PP, além do benefício relacionado à proteção física, contribui para o bem-estar emocional do trabalhador, que passa a se sentir seguro para realizar sua atividade.

Os profissionais mais aderentes às PP eram os que atuavam nas unidades destinadas ao tratamento exclusivo de pacientes com COVID-19. Segundo os resultados qualitativos, os profissionais dessas unidades tiveram menor dificuldade para seguir as PP e receberam mais apoio institucional, tanto no que diz respeito à disponibilidade de equipamentos quanto à participação ativa dos gestores junto às equipes. Somado a isso, acredita-se que o elevado risco de contaminação nesses locais foi um fator que contribuiu positivamente na motivação para que os profissionais aderissem às práticas de segurança com rigor.

Um clima de segurança elevado em unidades de atendimento à COVID-19 foi observado em outros países. Na Espanha, os profissionais dessas áreas sentiram-se privilegiados por estarem suficientemente equipados e não foram observadas altas taxas de contágio entre eles(1515. Moreno-Mulet C, Sansó N, Carrero-Planells A, López-Deflory C, Galiana L, García-Pazo P, et al. The impact of the COVID-19 pandemic on ICU healthcare professionals: a mixed methods study. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(17):9243. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph18179243. PubMed PMID: 34501832.
https://doi.org/10.3390/ijerph18179243...
). Outros estudos demonstraram que a contaminação de profissionais da saúde foi maior em enfermarias, fato que os pesquisadores atribuem a uma diferença no uso de EPI e nas práticas de biossegurança entre os locais para atendimento exclusivo a pacientes com COVID-19 e locais de atendimento geral(1616. Sant’Ana G, Imoto AM, Amorim FF, Taminato M, Peccin MS, Santana LA, et al. Infecção e óbitos de profissionais da saúde por COVID-19: revisão sistemática. Acta Paul Enferm. 2020;33:e20200107. doi: http://doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0107.
https://doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO...
,1717. Gómez-Ochoa SA, Franco OH, Rojas LZ, Raguindin PF, Roa-Díaz ZM, Wyssmann BM, et al. COVID-19 in health-care workers: a living systematic review and meta-analysis of prevalence, risk factors, clinical characteristics, and outcomes. Am J Epidemiol. 2021;190(1):161–75. doi: http://doi.org/10.1093/aje/kwaa191. PubMed PMID: 32870978.
https://doi.org/10.1093/aje/kwaa191...
).

No presente estudo, os achados demonstraram que os profissionais mais aderentes ao uso de EPI, durante assistência ao paciente com COVID-19, tiveram uma melhor percepção quanto ao clima de segurança e disponibilidade de EPI, o que se considera uma evidência de que se sentir apoiado é um fator relevante para estimular a adesão às PP.

É importante destacar que o clima de segurança percebido pelos participantes teve uma diferença significativa entre as instituições. Na instituição que teve a melhor avaliação dessa escala, Hospital C, os participantes relataram uma participação ativa das chefias junto às equipes, com orientações claras e eficazes, e buscando as melhores evidências para a segurança de todos. Isso fez com que os profissionais percebessem o engajamento da instituição na segurança dos profissionais, buscando atender às suas necessidades de proteção, o que melhorou a percepção quanto ao clima de segurança.

Nesse sentido, o item avaliado pior pelos participantes do estudo, no que diz respeito ao clima de segurança, foi o envolvimento da alta gerência nas atividades de segurança. Estudo com profissionais de enfermagem brasileiros apontou que a maioria (81,8%) deles não se sentia seguro com as ações implementadas pelas instituições no enfrentamento da COVID-19(1818. Silva MAS, Lima MCL, Dourado CARO, Pinho CM, Andrade MS. Nursing professionals’ biosafety in confronting COVID-19. Rev Bras Enferm. 2021;75(Suppl 1):e20201104. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1104. PubMed PMID: 34669785.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1...
). O sentimento de apoio inadequado, somado a uma alta carga de trabalho e à falta de EPI, repercutiram na carga mental dos profissionais(1919. Cunha GH, Siqueira LR, Fontenele MSM, Moreira LA, Ramalho AKL, Fechine FV. Prevalence of testing and coronavirus-19 among nurses in the pandemic. Rev Bras Enferm. 2022;75(Suppl 1):e20210365. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0365. PMid:35262600.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0...
). Os profissionais precisam se sentir apoiados por suas instituições e por seus líderes e, assim, estimulados a assumir a sua própria responsabilidade para garantir um ambiente de trabalho mais seguro.

Os profissionais da saúde demonstraram elevado interesse em aprender sobre as medidas de biossegurança. Além disso, as instituições de saúde ofertaram diversos tipos de treinamentos, capacitações e orientações sobre o tema, o que favoreceu a disseminação do conhecimento relacionado às PP. A variável “Ter recebido orientações e treinamento sobre biossegurança” foi associada estatisticamente a uma melhor percepção do clima de segurança e disponibilidade de EPI. Também, os profissionais mais aderentes às PP foram os que receberam treinamento na própria instituição.

Com relação à disponibilidade de EPI, identificou-se que um percentual de 48% afirmou que suas unidades de trabalho possuíam todos os equipamentos necessários para sua proteção. Na análise qualitativa, identificou-se que as unidades destinadas ao atendimento de paciente com COVID-19 foram mais bem contempladas quanto à oferta desses equipamentos, o que também foi demonstrado na literatura(1515. Moreno-Mulet C, Sansó N, Carrero-Planells A, López-Deflory C, Galiana L, García-Pazo P, et al. The impact of the COVID-19 pandemic on ICU healthcare professionals: a mixed methods study. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(17):9243. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph18179243. PubMed PMID: 34501832.
https://doi.org/10.3390/ijerph18179243...
). Um estudo realizado na UTI de um hospital universitário do Canadá verificou que a disponibilidade de EPI foi uma preocupação constante durante a pandemia. A angústia dos profissionais estava relacionada à possibilidade de que não haveria equipamentos suficientes, somada à necessidade de utilização de produtos desconhecidos até então(2020. Crowe S, Howard F, Vanderspank-Wright B, Gillis P, McLeod F, Penner C, et al. The effect of COVID-19 pandemic on the mental health of Canadian critical care nurses providing patient care during the early phase pandemic: a mixed method study. Intensive Crit Care Nurs. 2021;63:102999. doi: http://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102999. PubMed PMID: 33342649.
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.1029...
). Sobre isso, é importante enfatizar que ter condições para realização de um trabalho seguro, especialmente em um momento de crise sanitária, é relevante para a saúde física e mental dos profissionais da saúde.

A adesão às PP foi associada ao cumprimento da recomendação de distanciamento social. Os indivíduos que mais seguiram as normativas de segurança no ambiente de trabalho demonstraram que estenderam esses cuidados ao ambiente extra-hospitalar, sinalizando para uma coerência de atitudes na busca por uma proteção maior com relação à infecção pelo vírus. Essas ações realizadas em conjunto são essenciais, tendo em vista que a eficácia do distanciamento social depende em grande parte da adoção das demais medidas, como correta higienização das mãos, uso de máscara e medidas de higiene de superfícies(2121. Oliveira AC, Lucas TC, Iquiapaza RA. O que a pandemia da Covid-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução? Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20200106. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0106.
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
).

Perceber o risco a que se está exposto é considerado um fator importante para a atitude dos profissionais da saúde com relação à utilização das medidas de proteção. Os achados do presente estudo demonstraram que os profissionais com sintomas para COVID-19 tiveram uma maior percepção de risco para infecção por SARS-CoV-2. Esse aspecto é importante, pois a falta de consciência dos riscos contribui para o comportamento de desproteção. Estudo demonstrou que, apesar dos graves acidentes de trabalho envolvendo material biológico, existe uma subestimação dos riscos tanto por parte dos empregadores como dos empregados(2222. Ribeiro LCM, Souza ACS, Neves HCC, Munari DB, Medeiros M, Tipple AFV. Influência da exposição a material biológico na adesão ao uso de equipamentos de proteção individual. Cienc Cuid Saúde. 2010;9(2):325–32. doi: http://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v9i2.8282.
https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v...
). Durante a pandemia, a exposição a um risco até então desconhecido aumentou essa consciência dos profissionais, influenciando a adoção das medidas protetivas. Entretanto, é preciso considerar que a convivência permanente com a exposição favorece a diminuição da percepção dos riscos, dificultando a decisão pela adoção das PP(2222. Ribeiro LCM, Souza ACS, Neves HCC, Munari DB, Medeiros M, Tipple AFV. Influência da exposição a material biológico na adesão ao uso de equipamentos de proteção individual. Cienc Cuid Saúde. 2010;9(2):325–32. doi: http://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v9i2.8282.
https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v...
). Assim, novos estudos e intervenções terão de ser desenvolvidos nos anos conseguintes para melhor avaliar as mudanças com relação à percepção de risco e a sua associação com a adoção de medidas de segurança pelos profissionais da saúde.

Os resultados também evidenciaram elevada adesão ao uso de EPI, como avental, máscara, luvas e óculos de proteção. Esse resultado é positivo quando comparado a um estudo anterior realizado apenas com profissionais da enfermagem(1212. Cunha QB, Freitas EO, Pinno C, Petry KE, Silva RM, Camponogara S. Standard precaution adherence by nursing workers: a mixed methods study. Texto Contexto Enferm. 2021;30:e20200240. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0240.
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
). Tanto os resultados quantitativos como os qualitativos evidenciaram que os participantes acreditavam ser possível atender pacientes infectados sem se contaminar, fazendo uso da proteção adequada. De fato, estudos demonstram que a observância das indicações de uso dos EPIs é eficiente para prevenir as infecções entre os profissionais da saúde(2323. Ferioli M, Cisternino C, Leo V, Pisani L, Palange P, Nava S. Protecting healthcare workers from SARS-CoV-2 infection: practical indications. Eur Respir Rev. 2020;29(155):200068. doi: http://doi.org/10.1183/16000617.0068-2020. PubMed PMID: 32248146.
https://doi.org/10.1183/16000617.0068-20...
). Na China, pesquisadores buscaram examinar os efeitos de proteção de EPI para profissionais que prestavam atendimento a pacientes com COVID-19 e demonstraram que, apesar do alto risco de exposição, nenhum dos 420 profissionais foi infectado, mesmo realizando procedimentos geradores de aerossol, pois estavam adequadamente protegidos(2424. Liu M, Cheng S, Xu K, Yang Y, Zhu Q, Zhang H, et al. Use of personal protective equipment against coronavirus disease 2019 by healthcare professionals in Wuhan, China: cross sectional study. BMJ. 2020;369:m2195. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.m2195. PubMed PMID: 32522737.
https://doi.org/10.1136/bmj.m2195...
).

Apesar do benefício da proteção, a utilização de EPI tem implicações negativas para a realização do trabalho. Cerca de 20% afirmaram que não conseguem se acostumar com a utilização do EPI e acreditavam que seguir as PP torna o trabalho mais difícil. A dificuldade para realizar as tarefas com os EPIs envolve a diminuição dos sentidos, como visão, audição e tato, interferindo na capacidade de realizar o trabalho de forma eficiente. Além disso, o desconforto físico gerado pela utilização do EPI tornou a adesão por períodos prolongados um desafio a ser superado. Uma pesquisa com enfermeiros apontou como desconfortos mais comuns relacionados ao uso de EPI: sudorese ao usar máscara cirúrgica (50,9%) ou do tipo N95 (64,2%), ressecamento das mãos pela constante lavagem e uso de luvas (73,9%), transpiração pelo uso de macacão/avental (84,1%) e problemas de visão e cefaleia ao utilizar óculos de proteção/protetor facial (47,9%)(2525. Atay S, Cura SÜ. Problems encountered by nurses due to the use of personal protective equipment during the coronavirus pandemic: results of a survey. Wound Manag Prev. 2020;66(10):12–6. doi: http://doi.org/10.25270/wmp.2020.10.1216.
https://doi.org/10.25270/wmp.2020.10.121...
). Esses desconfortos precisam ser considerados quando se pensa em aumentar a adesão, indicando a necessidade de mais pesquisas que examinem a qualidade, a eficácia e o conforto dos EPIs.

Além do uso de EPI, o aumento na higienização das mãos foi uma das mudanças relatadas pelos participantes. Entretanto, os resultados quantitativos apontaram um percentual de 75% dos profissionais que sempre realizam a lavagem das mãos após a retirada de luvas. Estudos realizados antes da pandemia demonstraram uma maior prática de higiene das mãos, chegando a 83,6% entre profissionais da enfermagem de um hospital universitário(1212. Cunha QB, Freitas EO, Pinno C, Petry KE, Silva RM, Camponogara S. Standard precaution adherence by nursing workers: a mixed methods study. Texto Contexto Enferm. 2021;30:e20200240. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0240.
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
) e 82,9% em outro estudo realizado em hospital psiquiátrico(1111. Piai-Morais TH, Orland FS, Figueiredo RM. Fatores que influenciam a adesão às precauções-padrão entre profissionais de enfermagem em hospital psiquiátrico. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(3):478–85. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420150000300016. PubMed PMID: 26107709.
https://doi.org/10.1590/S0080-6234201500...
).

Estudo realizado em Cingapura verificou a contaminação do ambiente em áreas de isolamento para pacientes positivos para COVID-19 em distâncias maiores de um metro, demonstrando que a contaminação provavelmente foi ocasionada pelas mãos dos profissionais da saúde(2626. Yung CF, Kam K, Wong MSY, Maiwald M, Tan YK, Tan BH, et al. Environment and personal protective equipment tests for SARS-CoV-2 in the isolation room of an infant with infection. Ann Intern Med. 2020;173(3):M20–0942. doi: http://doi.org/10.7326/M20-0942. PubMed PMID: 32236490.
https://doi.org/10.7326/M20-0942...
). Em uma amostra com 72 profissionais da saúde em Wuhan, na China, pesquisadores evidenciaram que a lavagem de mãos não qualificada, a higiene subótima antes do contato com o paciente e o uso inadequado de EPI foram fatores de risco para infecção por SARS-CoV-2 nos trabalhadores(2727. Ran L, Chen X, Wang Y, Wu W, Zhang L, Tan X. Risk factors of healthcare workers with corona virus disease 2019: a retrospective cohort study in a designated hospital of Wuhan in China. Clin Infect Dis. 2020;71(16):2218–21. doi: http://doi.org/10.1093/cid/ciaa287. PubMed PMID: 32179890.
https://doi.org/10.1093/cid/ciaa287...
). Dessa forma, está claro o papel central que a adesão às PP tem tanto na proteção dos profissionais da saúde quanto na segurança dos pacientes internados, amparando a preocupação para que os profissionais deixem de ser vetores de infecção no ambiente hospitalar por meio da aplicação rigorosa das medidas de biossegurança.

Mesmo que os resultados deste estudo tenham encontrado respaldo na literatura, algumas limitações podem ser apontadas. A utilização de instrumento autoaplicável, que está sujeito ao viés de memória do participante, pode interferir nos resultados obtidos. O delineamento transversal utilizado impossibilita o estabelecimento de relações de causa e efeito. Por fim, reconhecemos a característica não probabilística da amostra, a qual obteve mais participantes da categoria da enfermagem, mesmo que o estudo tenha sido divulgado igualmente para os profissionais médicos das instituições participantes.

Os achados deste estudo poderão nortear novas intervenções no processo de educação nas instituições, buscando tanto a proteção dos profissionais quanto a dos pacientes. As estratégias devem estar focadas em mudanças consistentes no comportamento de risco dos profissionais, além de melhoria das condições de trabalho, que envolve dimensionamento adequado de pessoal e provisão de material e EPI suficientes e de qualidade para todos os profissionais que prestam assistência direta ou que estão expostos aos riscos relacionados a ela. O apoio ofertado pelas instituições deve contar com a participação de toda a equipe nas atividades de segurança, do nível assistencial ao gerencial.

Recomenda-se o monitoramento da adesão às práticas de segurança, com manutenção de estratégias educativas, e a criação de programas institucionais de atenção à saúde do trabalhador.

CONCLUSÃO

O estudo identificou alto nível de adesão às PP por profissionais da saúde durante a pandemia de COVID-19. As variáveis relativas às PP obtiveram níveis intermediários. Os fatores que foram associados a maior adesão às PP foram: ter filhos, trabalhar em unidades de atendimento à COVID-19, receber orientações/capacitação na instituição sobre biossegurança e realizar distanciamento social recomendado pela OMS. Também contribuíram de forma positiva para a adesão às PP nesse período a percepção de risco elevada dos profissionais da saúde, uma expressiva busca pela utilização de equipamentos de proteção e a propagação de conhecimentos relacionados à biossegurança.

REFERENCES

  • 1.
    World Health Organization. Coronavirus disease (Covid-19) outbreak: rights, roles and responsibilities of health workers, including key considerations for occupational safety and health [Internet]. Geneva: WHO; 2020 [cited 2022 Apr 20] Available from: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/who-rights-roles-respon-hw-covid-19.pdf
    » https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/who-rights-roles-respon-hw-covid-19.pdf
  • 2.
    Brasil. Nota técnica n°04/2020. Orientações para serviços de saúde: medidas de prevenção e controle que devem ser adotadas durante a assistência aos casos suspeitos ou confirmados de infecção pelo novo coronavírus (sars-cov-2) – atualizada em 25/02/2021 [Internet]. Brasília: ANVISA; 2020 [cited 2022 Jun 03]. Available from: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/notas-tecnicas/2020/nota-tecnica-gvims_ggtes_anvisa-04_2020-25-02-para-o-site.pdf
    » https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/notas-tecnicas/2020/nota-tecnica-gvims_ggtes_anvisa-04_2020-25-02-para-o-site.pdf
  • 3.
    Cunha QB, Camponogara S, Freitas EO, Petry KE, Silva AGI. Strategies to promote adherence to Standard Precautions among health professionals: an integrative review. Research. Soc Dev. 2020;9(4):e141942992. doi: http://doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2992.
    » https://doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2992
  • 4.
    Araújo ER, Gomes GF, Simões MRL, Ferreira PHC, Gonçalves RPF, Lara MO. Mudanças de comportamento relacionado às precauções padrão por profissionais de saúde durante a pandemia do Covid-19. In: Klauss J, editor. Os profissionais de saúde durante a pandemia de COVID-19: atitudes e barreiras. Guarujá: Editora Científica Digital; 2022. doi: http://doi.org/10.37885/221010682.
    » https://doi.org/10.37885/221010682
  • 5.
    Wong ELY, Ho KF, Dong D, Cheung AWL, Yau PSY, Chan EYY, et al. Compliance with standard precautions and its relationship with views on infection control and prevention policy among healthcare workers during COVID-19 pandemic. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(7):3420. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph18073420. PubMed PMID: 33806138.
    » https://doi.org/10.3390/ijerph18073420
  • 6.
    Oliveira JLC, Magalhães AMM, Matsuda LM, Santos JLG, Souto RQ, Riboldi CO, et al. Mixed Methods Appraisal Tool: fortalecimento do rigor metodológico de pesquisas de métodos mistos na enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2021;30:e20200603. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0603.
    » https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0603
  • 7.
    Brevidelli MM, Cianciarullo TI. Fatores psicossociais e organizacionais na adesão às precauções-padrão. Rev Saude Publica. 2009;43(6):907–16. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000065.
    » https://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000065
  • 8.
    Rubio DM, Berg-Weger M, Tebb S, Lee ES, Rauch S. Objectifying contente validity: conducting a contente validity study in social work research. Soc Work Res. 2003;27(2):94–111. doi: http://doi.org/10.1093/swr/27.2.94.
    » https://doi.org/10.1093/swr/27.2.94
  • 9.
    Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016.
  • 10.
    Ferreira LA, Peixoto CA, Paiva L, Silva QCG, Rezende MP, Barbosa MH. Adherence to standard precautions in a teaching hospital. Rev Bras Enferm. 2017;70(1):90–7. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0138. PubMed PMID: 28226047.
    » https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0138
  • 11.
    Piai-Morais TH, Orland FS, Figueiredo RM. Fatores que influenciam a adesão às precauções-padrão entre profissionais de enfermagem em hospital psiquiátrico. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(3):478–85. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420150000300016. PubMed PMID: 26107709.
    » https://doi.org/10.1590/S0080-623420150000300016
  • 12.
    Cunha QB, Freitas EO, Pinno C, Petry KE, Silva RM, Camponogara S. Standard precaution adherence by nursing workers: a mixed methods study. Texto Contexto Enferm. 2021;30:e20200240. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0240.
    » https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0240
  • 13.
    Faria LBG, Santos CTB, Faustino AM, Oliveira LMAC, Cruz KCT. Knowledge and adherence of the nurse to standard precautions in critical units. Texto Contexto Enferm. 2019;28:e20180144. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2018-0144.
    » https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2018-0144
  • 14.
    Stuijfzand S, Deforges C, Sandoz V, Sajin C, Jaques C, Horsch A. Psychological impact of an epidemic/pandemic on the mental health of healthcare professionals: a rapid review. BMC Public Health. 2020;20(1):1230. doi: http://doi.org/10.1186/s12889-020-09322-z. PubMed PMID: 32787815.
    » https://doi.org/10.1186/s12889-020-09322-z
  • 15.
    Moreno-Mulet C, Sansó N, Carrero-Planells A, López-Deflory C, Galiana L, García-Pazo P, et al. The impact of the COVID-19 pandemic on ICU healthcare professionals: a mixed methods study. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(17):9243. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph18179243. PubMed PMID: 34501832.
    » https://doi.org/10.3390/ijerph18179243
  • 16.
    Sant’Ana G, Imoto AM, Amorim FF, Taminato M, Peccin MS, Santana LA, et al. Infecção e óbitos de profissionais da saúde por COVID-19: revisão sistemática. Acta Paul Enferm. 2020;33:e20200107. doi: http://doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0107.
    » https://doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0107
  • 17.
    Gómez-Ochoa SA, Franco OH, Rojas LZ, Raguindin PF, Roa-Díaz ZM, Wyssmann BM, et al. COVID-19 in health-care workers: a living systematic review and meta-analysis of prevalence, risk factors, clinical characteristics, and outcomes. Am J Epidemiol. 2021;190(1):161–75. doi: http://doi.org/10.1093/aje/kwaa191. PubMed PMID: 32870978.
    » https://doi.org/10.1093/aje/kwaa191
  • 18.
    Silva MAS, Lima MCL, Dourado CARO, Pinho CM, Andrade MS. Nursing professionals’ biosafety in confronting COVID-19. Rev Bras Enferm. 2021;75(Suppl 1):e20201104. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1104. PubMed PMID: 34669785.
    » https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1104
  • 19.
    Cunha GH, Siqueira LR, Fontenele MSM, Moreira LA, Ramalho AKL, Fechine FV. Prevalence of testing and coronavirus-19 among nurses in the pandemic. Rev Bras Enferm. 2022;75(Suppl 1):e20210365. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0365. PMid:35262600.
    » https://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0365
  • 20.
    Crowe S, Howard F, Vanderspank-Wright B, Gillis P, McLeod F, Penner C, et al. The effect of COVID-19 pandemic on the mental health of Canadian critical care nurses providing patient care during the early phase pandemic: a mixed method study. Intensive Crit Care Nurs. 2021;63:102999. doi: http://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102999. PubMed PMID: 33342649.
    » https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102999
  • 21.
    Oliveira AC, Lucas TC, Iquiapaza RA. O que a pandemia da Covid-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução? Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20200106. doi: http://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0106.
    » https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2020-0106
  • 22.
    Ribeiro LCM, Souza ACS, Neves HCC, Munari DB, Medeiros M, Tipple AFV. Influência da exposição a material biológico na adesão ao uso de equipamentos de proteção individual. Cienc Cuid Saúde. 2010;9(2):325–32. doi: http://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v9i2.8282.
    » https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v9i2.8282
  • 23.
    Ferioli M, Cisternino C, Leo V, Pisani L, Palange P, Nava S. Protecting healthcare workers from SARS-CoV-2 infection: practical indications. Eur Respir Rev. 2020;29(155):200068. doi: http://doi.org/10.1183/16000617.0068-2020. PubMed PMID: 32248146.
    » https://doi.org/10.1183/16000617.0068-2020
  • 24.
    Liu M, Cheng S, Xu K, Yang Y, Zhu Q, Zhang H, et al. Use of personal protective equipment against coronavirus disease 2019 by healthcare professionals in Wuhan, China: cross sectional study. BMJ. 2020;369:m2195. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.m2195. PubMed PMID: 32522737.
    » https://doi.org/10.1136/bmj.m2195
  • 25.
    Atay S, Cura SÜ. Problems encountered by nurses due to the use of personal protective equipment during the coronavirus pandemic: results of a survey. Wound Manag Prev. 2020;66(10):12–6. doi: http://doi.org/10.25270/wmp.2020.10.1216.
    » https://doi.org/10.25270/wmp.2020.10.1216
  • 26.
    Yung CF, Kam K, Wong MSY, Maiwald M, Tan YK, Tan BH, et al. Environment and personal protective equipment tests for SARS-CoV-2 in the isolation room of an infant with infection. Ann Intern Med. 2020;173(3):M20–0942. doi: http://doi.org/10.7326/M20-0942. PubMed PMID: 32236490.
    » https://doi.org/10.7326/M20-0942
  • 27.
    Ran L, Chen X, Wang Y, Wu W, Zhang L, Tan X. Risk factors of healthcare workers with corona virus disease 2019: a retrospective cohort study in a designated hospital of Wuhan in China. Clin Infect Dis. 2020;71(16):2218–21. doi: http://doi.org/10.1093/cid/ciaa287. PubMed PMID: 32179890.
    » https://doi.org/10.1093/cid/ciaa287

Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Thereza Maria Magalhães Moreira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    29 Ago 2023
  • Aceito
    06 Maio 2024
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br