Open-access Da autonomia do Fórum Mulher na arena pública moçambicana

From Autonomy of the Forum Mulher in Mozambique Public Arena

Resumo

Vozes da opinião pública e alguma literatura científica afirmam que as organizações da sociedade civil moçambicana não têm autonomia, dado que dependem da ajuda externa para a sua sobrevivência. Com base na investigação que realizamos entre os anos 2010-2018, primeiro no âmbito dos meus estudos doutorais e, posteriormente, no plano da linha de pesquisa que estabeleci no Departamento de Sociologia da Universidade Eduardo Mondlane, não concordamos com esta afirmação categórica e, neste artigo, argumentamos que, não obstante o fator dependência da ajuda externa, entre outros constrangimentos inerentes ao contexto de pobreza que o país atravessa, algumas organizações da sociedade civil, como é o caso do Fórum Mulher, revelam um sentido de autonomia. Esta lhes permite se afirmarem como sujeitos e fazerem intervenções bem-sucedidas na arena pública nacional, contribuindo assim para a aprovação de leis e políticas públicas que buscam acautelar a igualdade de género e os direitos da mulher.

Palavras-chave: autonomia; Fórum Mulher; sujeito; arena pública; direitos da mulher

Abstract

Public opinion and some academic literature claim that Civil Society Organizations in Mozambique have no autonomy given the fact that for their survival depend on foreign aid (donor funding). Taking into consideration the research we carried out from 2010 to 2018, we disagree with this categoric affirmation. In this paper, we argue that despite the fact that dependence on foreign aid is a factor to be considered among many other constraints related to the context of poverty that the country is going through, some Civil Society Organizations, such as Forum Mulher appear to reveal some degree of autonomy that allows it to stand as a relevant actor in the national public arena, thus contributing to the approvals of laws and public policies that seek to mitigate gaps related to gender equity and women’s rights.

Keywords: Autonomy; Forum Mulher; Actor; Public arena; Women’s rights

Introdução

A conjuntura internacional que condicionou o estabelecimento da democracia multipartidária em Moçambique, nos anos 1990, criou oportunidade e meios necessários para a aparição e intervenção pública de várias organizações da sociedade civil, como é o caso do Fórum Mulher (FM) que, constituído em 1993, com cerca de 35 organizações nacionais da sociedade civil como membros efetivos, tem vindo a intervir na arena pública em prol dos direitos da mulher e do desenvolvimento em geral.

Neste artigo, a sociedade civil é definida como o conjunto de diversas instituições não governamentais que contrabalançam o Estado e que, nas suas relações de interação, podem impedi-lo de dominar e atomizar o resto da sociedade (Ernest GELLNER, 1995, p. 15-16). Geralmente, as organizações da sociedade civil abarcam uma diversidade de espaços, atores e formas institucionais que variam em seu grau de formalidade, autonomia e poder na arena pública. Esta é, por sua vez, entendida como

o espaço público institucional onde as pessoas se juntam e relacionam, numa base voluntária, sem fins lucrativos; onde valores e interesses da sociedade são transmitidos, se comunicam, cooperam ou competem entre si; onde pessoas com diferentes e múltiplas identidades se juntam para debater, discutir, negociar ou mesmo conquistar supremacia sobre outras pessoas, visando influenciar políticas e programas sociais, para o bem comum, mas também, para benefício de grupos de interesses individuais e privados (António FRANCISCO, 2010, p. 55).

Atualmente com 84 organizações locais, nacionais e internacionais, o Fórum Mulher assume-se como movimento feminista e, na arena pública moçambicana, luta contra princípios e práticas socioculturais que inferiorizam as mulheres (FÓRUM MULHER, 2017, p. 2).

Este novo contexto decorre da Constituição de 1990 (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, 1990), que aboliu o regime monopartidário que vigorava desde a independência, em 1975, e que limitava a criação de organizações da sociedade civil não alinhadas com as diretrizes do Partido-Estado (Yussuf ADAM; Humberto COIMBRA, 1997). Noutros termos, foi com o fim do regime autoritário de partido único, resultante em boa parte da pressão da comunidade internacional, que se lograram as atuais liberdades democráticas.

Este fenómeno não é exclusivamente moçambicano. Como observou, por exemplo, Eduardo Costa Dias (2011), por toda a África Subsaariana constata-se a presença crescente, nos terrenos políticos não estatais, de novos agentes ativos, frequentemente organizados e, geralmente, portadores de interesses diversos e historicidades total ou parcialmente autónomas. A este respeito destaca o papel que as organizações da sociedade civil desempenham no processo da democracia (DIAS, 2011) e desenvolvimento.

Entretanto, verificámos que em Moçambique a atuação da sociedade civil tem sido alvo de imensos debates onde, regra geral, é criticada alegando-se que suas organizações não têm autonomia por, entre outros fatores, dependerem fundamentalmente do financiamento do sistema da ajuda externa e cumprirem, por isso, as diretrizes das agências doadoras da comunidade internacional (AFRIMAP; OPEN SOCIETY INITIATIVE FOR SOUTHERN AFRICA, 2009; MASC, 2008; António FRANCISCO; Konrad MATTER, 2007apud Orlando NIPASSA, 2016).

Não concordamos com parte significativa desta posição pois, como veremos ao longo deste artigo, existem organizações da sociedade civil que não dependem do sistema da ajuda externa e outras, como o Fórum Mulher, que, mesmo dependendo daquele financiamento, não deixam de desenvolver suas atividades com autonomia na definição, prossecução e materialização de agendas em prol dos direitos da mulher.

Neste prisma, pretendemos demonstrar em termos teóricos e empíricos que, não obstante o fator dependência da ajuda externa entre outros constrangimentos inerentes ao contexto de pobreza que o país atravessa, o Fórum Mulher revela um sentido de autonomia que lhe permite se afirmar como sujeito e fazer intervenções na arena pública, seja discordando ou concordando com agendas dos doadores e do governo. Daqui decorre a leitura alternativa que fazemos sobre a questão da autonomia e dependência da sociedade civil no processo de conquista de liberdades substantivas.

O debate que desenvolvemos em seguida é, em parte, resultante do processo de investigação que realizamos entre os anos 2010-2018, primeiro no âmbito dos meus estudos doutorais e, posteriormente, no plano da linha de pesquisa que estabeleci no Departamento de Sociologia da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), onde, com alguns membros colaboradores, temos pesquisado os contornos da dinâmica da sociedade civil na arena pública moçambicana. Para a elaboração deste artigo, baseamo-nos na revisão da literatura e na realização de entrevistas semiestruturadas com mulheres e homens que acompanham, analisam e/ou estudam a dinâmica da sociedade civil na arena pública moçambicana, e não só. Todo o aparato utilizado na construção dos dispositivos de recolha de informação e, posteriormente, de análise de conteúdo, interpretação e discussão dos dados pertinentes baseou-se no exercício da interdisciplinaridade e da triangulação teórica e metodológica.

O presente artigo está estruturado em seis secções. Começamos por apresentar uma análise alternativa em torno da questão da autonomia e dependência da sociedade civil. Em seguida, para fundamentarmos o nosso entendimento sobre a matéria, apresentamos a noção de autonomia como conceito relativo, dinâmico e negociável. Depois recorremos ao “Mundo das Mulheres”, em Alain TOURAINE (2008), para debatermos os contornos da afirmação da consciência feminina e o apelo à ideia de sujeito. Na quarta secção, apresentamos a visão, missão e identidade feminista do Fórum Mulher com recurso a uma articulação entre a teoria e a empiria. Na penúltima secção destacamos a sua estrutura, estratégias de luta e campos de atuação para, finalmente, analisarmos o sentido de intervenção e os sucessos que o Fórum Mulher e suas congéneres já conseguiram averbar na arena pública nacional.

Autonomia e dependência da sociedade civil - uma análise alternativa

Durante o trabalho de campo no âmbito da minha tese de doutoramento (NIPASSA, 2016), me confrontei com vozes da opinião pública nacional segundo as quais as organizações da sociedade civil não têm qualquer autonomia. Esta posição encontra eco na literatura científica, onde, entre outros autores, destacamos Patrick Chabal (2009) ao afirmar categoricamente que a sociedade civil não passava de uma ilusão.

Chabal sustenta sua noção de “ilusão da sociedade civil” com o argumento de que, para além de não ter autonomia, dado que suas numerosas organizações foram fundadas com base em exigências externas, ela tem sido tomada como instrumento político tanto pelos seus fundadores como pelos seus dirigentes. Especificamente, o autor afirma não acreditar na autonomia das organizações da sociedade civil (OSC ou CSOs, sigla em inglês) no contexto africano pelas seguintes razões:

A primeira é que muitas OSC são partidos políticos disfarçados, desenhados para facilitar o acesso de seus líderes a postos políticos. A segunda é que não poucas OSC são tomadas e instrumentalizadas pelas elites políticas. A terceira é que numerosas OSC são estabelecidas visando somente ao financiamento externo, dado que nas últimas duas décadas uma crescente proporção da ajuda externa tem sido canalizada directamente para a ‘sociedade civil’. Adicionalmente, um certo número de organizações da sociedade civil surgiu como resultado da determinação da comunidade doadora em colocar assuntos específicos (exemplo, descentralização, género) na agenda (CHABAL, 2009, p. 7 [tradução livre]).

O argumento que se desenvolve no presente artigo discorda, em pontos fundamentais, da posição que acabamos de expor. Assim, para esclarecer tal desacordo, discutir-se-á, de seguida, os quatro pontos apresentados na citação de Chabal (2009), conjugando-os com dados dos relatórios de Francisco e Matter (2007), do MASC (2008) e do AFRIMAP (2009), acima mencionados.

Em relação aos dois primeiros, não achamos que o facto de algumas OSC poderem ser “partidos políticos disfarçados”, concebidos para facilitar o acesso de seus líderes a postos políticos, seja uma fraqueza ou mereça, tão expeditamente, repúdio. Como vimos anteriormente, a sociedade civil busca a liberdade e o bem-estar, facto que implica engajamento no processo de luta pela sua conquista, expansão e manutenção (NIPASSA, 2016). Nestes termos, casos em que eventuais membros da sociedade civil assumem postos de tomada de decisão política longe de ser uma desvantagem revelam, no nosso entender, um protagonismo necessário no processo de emancipação individual e/ou social.

Afinal, a busca de promoção política e a capacidade de influência em espaços públicos de tomada de decisão não são incompatíveis, muito pelo contrário, com a procura de meios para que a afirmação de liberdades seja no plano individual como no coletivo. Vale mesmo lembrar que estudos de Peter Houtzager et al. (2003); Larry Diamond (1994); Nuno Vidal; Justino Pinto de Andrade (2008) mostram que as ligações entre organizações da sociedade civil, partidos políticos e Estado podem ser funcionais para a dinâmica das primeiras.

Neste prisma, a instrumentalização política da sociedade civil de que Chabal (2009) fala pode ser concebida em termos de processos dinâmicos de negociação nos quais algumas organizações entendem apoiar certas elites políticas em função de interesses em jogo. Vale, neste ponto, salientar que não encontramos no livro de Chabal (2009) evidências que lhe permitam afirmar categoricamente que as OSC não têm autonomia. De todo modo, como demonstramos adiante, a autonomia não é um conceito absoluto e consentir com outrem não significa necessariamente a sua falta ou perca.

Quanto aos terceiro e quarto aspetos, concordamos que muitas organizações formais da sociedade civil surgiram nas décadas de 1990 e de 2000 em função dos fundos disponibilizados pela comunidade internacional no âmbito da ajuda pública ao desenvolvimento, vulgo ajuda externa. Neste plano, diferentes programas do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e das Nações Unidas estabeleceram, de facto, agendas sobre o género, descentralização, HIV-SIDA, questões ambientais, “boa governação”, entre outras, umas por razões de “urgência social”, outras por questões “doutrinais” (NIPASSA, 2016). Todavia, a afirmação de Chabal segundo a qual tais organizações da sociedade civil foram criadas visando, pura e simplesmente, ao acesso aos fundos disponíveis, encerra uma generalização abusiva e, portanto, passível de problematização e discussão. Quanto mais não seja pelo facto de Chabal não ter identificado que organizações da sociedade civil foram fundadas visando exclusivamente àqueles fundos. Ademais, mesmo considerando-se a hipótese de determinadas organizações terem sido criadas com aquele objetivo, no prosseguimento de suas atividades, elas não deixam de influenciar de algum modo as agendas e o processo de tomada de decisões1 em prol de matérias pertinentes ao contexto nacional.

Outrossim, as agências doadoras buscam, com o seu financiamento, o alcance de objetivos e vantagens próprias que muitas vezes ultrapassam o que teórica, imediata e manifestamente dizem pretender com as suas ações (Lopo NASCIMENTO, 2008; Elísio MACAMO, 2006; Ramiro MONTEIRO, 1997; David SOGGE, 1997). Nestes termos, as contrapartidas que elas tiram do processo de cooperação abrem espaço para o exercício do poder de negociação por parte das instituições “beneficiárias”, caso estas assim o entendam (Carlos CASTEL-BRANCO, 2011).

Além do mais, é importante notar que cumprir planos traçados por agências externas que os financiam não significa necessariamente subserviência da sociedade civil (Tony KILLICK; Carlos CASTEL-BRANCO; Richard GESTER, 2005). Pode acontecer que haja coincidência ou convergência de interesses entre as partes. Por exemplo, sendo o Fórum Mulher uma organização da sociedade civil com orientação ideológica feminista, por que seria criticada se recebesse fundos e implementasse planos de instituições internacionais interessadas na luta pela igualdade de género e observância dos direitos humanos da mulher em Moçambique? Entendemos que, neste tipo de situações, a implementação de agendas feministas definidas por congéneres internacionais não constituiria uma imposição destas sobre o Fórum Mulher. Resumindo, em processos negociais que envolvem jogos de interesses e disputas por influência é arriscado afirmar que esta ou aquela instituição não tem autonomia.

Da autonomia como conceito relativo, dinâmico e negociável

Discutir o conceito de autonomia pressupõe tomar em consideração a liberdade negativa e a liberdade positiva (Isaiah BERLIN, 1969).2 Isto implica saber que, em determinados contextos, os indivíduos precisam não só de ter um vasto campo de possibilidades de escolha sem impedimentos formais, como também a capacidade para materializá-las.3 Destarte, o conceito de autonomia articula tais liberdades em graus variáveis, visto ser inevitável a presença de algum tipo de constrangimento ou condicionalismo, sejam eles recursos disponíveis, leis naturais, convenções sociais, entre outros possíveis.

Ao observar a impossibilidade de uma autonomia absoluta, Hugo Engelhardt (1998) propôs a articulação da definição de princípio de autonomia com o princípio de consentimento, visando à identificação de que o que está em jogo não é um valor possuído pela autonomia em si, mas o reconhecimento de que a autoridade moral secular deriva do consentimento dos agentes envolvidos num empreendimento comum4 (Vicente ZATTI, 2007). Neste quadro, o princípio da autonomia, ao se articular com o princípio de consentimento, remete para um processo dialógico no qual, atendendo às circunstâncias e aos interesses em jogo, os agentes procuram influenciar duma ou doutra forma a tomada de decisões no sentido das suas conveniências. Assim, resumindo e concatenando, a autonomia é sempre relativa, dinâmica e negociável. Este entendimento sustenta a ideia de que o Fórum Mulher tem autonomia suficiente para afirmar a sua orientação feminista, chamar para si a ideia de sujeito e lutar pelos direitos da mulher mesmo quando se encontra numa situação de pobreza e dependência em relação aos seus parceiros e doadores.

Afirmação da consciência feminina e apelo à ideia de sujeito - uma nota teórica

No livro O Mundo das Mulheres, Touraine (2008) mostra que a afirmação da consciência feminina não se refere aos seus papéis sociais, nem mesmo à missão das mulheres de transmitir a vida e ao vínculo excecional que liga as mães aos filhos ou filhas. Para o autor, estes temas devem ser abordados sim, mas importa, antes de mais, compreender o sentido sociológico do apelo à ideia de sujeito.

Na perspetiva sociológica, a ideia de sujeito não flutua acima das realidades sociais, a meio caminho entre temas religiosos ou moralizadores e a realidade observável. O sujeito, esteja ele presente numa mulher ou em qualquer outra categoria, é uma defesa contra a invasão da experiência vivida por todas as formas de poder, entre as quais a manipulação das imagens e de todas as representações desempenha um papel crescente.

De acordo com Touraine (2008), representações como a mulher reprodutora, a mulher repouso do guerreiro, a mulher dócil, a mulher educadora dos filhos e a mulher agente publicitária pela exposição do seu corpo destroem, ativamente, a consciência que a mulher tem de si mesma como criadora de si própria, ao ponto de ser muito difícil perceber nessas grandes figuras da mulher a afirmação de uma vontade de libertação.

A consciência de si como sujeito é, em primeiro lugar, um protesto contra o sistema dominante cujo sentido de dependência da mulher foi bem descrito por Simone De Beauvoir (1990) e, no contexto moçambicano, denunciado por investigadoras como Conceição Osório e Tereza Cruz e Silva (2018), Nair Teles (2012), Maria José Arthur (2007), Ana Loforte (2007), Isabel Casimiro (2004), Terezinha da Silva (2003), entre outras. A mulher a quem se impõem tantos serviços e deveres rebela-se e luta para salvar a sua consciência de si mesma. Ela rebela-se e sabe mobilizar os direitos à educação que adquiriu, em grande parte graças às feministas (TOURAINE, 2008).

Para Touraine, a importância que se atribui aos movimentos de libertação das mulheres leva a tratá-los como a ação de seres livres, conscientes da responsabilidade que as mulheres têm, em primeiro lugar, relativamente a elas próprias. Mas, em tom crítico e com o qual concordamos, ele coloca a seguinte questão: “não é paradoxal que os livros escritos sobre as mulheres nos transmitam quase sempre a imagem de uma mulher dependente e dominada, quando tantas vitórias foram conseguidas?” (TOURAINE, 2008, p. 49-50). E prossegue, afirmando que o facto da desigualdade e da violência continuarem a atingir as mulheres justifica que o trabalho de denúncia seja prosseguido, mas este trabalho teria muito mais força se se apoiasse na consciência feminina que se desenvolve nos territórios libertados, onde abundam as pós-feministas.

E no processo de verificação empírica destes pressupostos teóricos, reconhecemos a importante luta que o Fórum Mulher trava em prol dos direitos das mulheres e com ganhos assinaláveis na arena pública moçambicana, mas nos perguntamos igualmente se a militância feminista deste Fórum toma em consideração a relevância da consciência feminina que se desenvolve entre as mulheres que vivem uma forte ambivalência entre o espaço privado e o espaço público, chegando a situar-se naquilo que a investigadora brasileira Nair Teles (2012) conceptualizou como “o não lugar do feminino”? Assim, averiguemos o alcance analítico da identidade feminista do Fórum Mulher.

Da visão, missão e identidade feminista do Fórum Mulher

No seu Plano Estratégico 2014-2018, o Fórum mulher afirma ter como visão “uma sociedade mais justa e solidária, com igualdade de género, que respeita plenamente os Direitos Humanos das Mulheres”. E na sua missão ela

impulsiona transformações económicas e socioculturais, numa perspetiva feminista, fortalecendo as ações e a influência política dos seus membros e da sociedade civil moçambicana, colaborando com os movimentos sociais nacionais e internacionais” (FÓRUM MULHER, 2013, p. 7).

Numa espécie de manifesto, o documento declara que o Fórum Mulher identifica-se como organização feminista porque reconhece que, desta forma, reclama para si a ideia de sujeito, os seus membros tornam-se sujeitos e integram todos os sujeitos no campo de luta pelos direitos das mulheres. Entendem que a luta pelos direitos das mulheres é essencialmente política e o processo de designação também o é. Nos seus próprios termos afirmam que “ao identificarmo-nos como feministas, politizamos a nossa luta pelos direitos das mulheres, questionamos a legitimidade das estruturas que mantêm a subordinação das mulheres e desenvolvemos ferramentas de análise e ação transformadora” (FÓRUM MULHER, 2013, p. 5).

Neste prisma, com apelo à causa comum, o Fórum Mulher busca mobilizar as mulheres e a sociedade em geral para uma maior participação, quer pela via directa, quer pela representativa, na luta contra a ideologia da dominação masculina que legitima a opressão das mulheres.

De facto, não se pode negar a força e as consequências da ideologia da dominação masculina analisada ao detalhe por Pierre Bordieu (1998) e observada no quotidiano moçambicano. Entretanto, há que ter cautela com o que Touraine designou como o “Mito da Dominação Masculina” quando, entre outros aspetos, alerta que contra a imagem caricatural das mulheres dominadas e oprimidas, e para não as reduzir à ideia de dependência relativamente aos homens, importa insistir sobre a diversidade interna desta vasta categoria e, sobretudo, procurar as mulheres atrizes por detrás das mulheres vítimas (TOURAINE, 2008, p. 113).

Enfim, e com bastante atino, o Fórum Mulher afirma que o seu foco é e deve sempre ser a luta contra o sistema patriarcal, uma “luta pela liberdade, transparência, justiça social, solidariedade e autonomia de escolha, para reafirmar a dignidade da pessoa humana como o principal bem da humanidade” (FÓRUM MULHER, 2013, p. 4-5).

Da estrutura do Fórum Mulher, estratégias de luta e campos de atuação

De acordo com o Relatório Anual 2017, o Fórum Mulher é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, composta atualmente por 84 organizações locais, nacionais e internacionais. O Fórum Mulher define-se como sociedade civil, a partir de uma perspetiva feminista, com o papel de mediadora entre sociedade civil e Estado nas relações com as políticas governamentais e no fortalecimento das organizações que lutam pelos direitos das mulheres. O seu compromisso é lutar por transformações de princípios e práticas socioculturais que inferiorizam as mulheres, enfrentando as relações de poder hierárquicas entre mulheres e homens (FÓRUM MULHER, 2017, p. 2).

A estrutura do Fórum Mulher integra membros de diversas organizações distribuídos nos seguintes órgãos: Mesa da Assembleia Geral (presidente - um membro da Associação Coalizão da Juventude Moçambicana, vice-presidente - um membro da Associação das Mulheres Desfavorecidas (AMUDEIA), secretária - um membro da associação sociocultural Horizonte Azul); Conselho de Direção (presidente - um membro da Organização Nacional dos Professores (ONP), 1º vice-presidente - um membro da Organização Mulher e Lei na África Austral (WLSA), 2º vice-presidente - um membro da associação Levante-se Mulher e Siga ao seu Caminho (LEMUSICA); Conselho Fiscal (presidente - um membro da Associação Moçambicana das Mulheres de Carreira Jurídica (AMMCJ), 1º vogal - um membro da União Nacional de Camponeses (UNAC), 2º vogal - um membro da Associação Rural de Ajuda Mútua (ORAM)). Os principais doadores do Plano Estratégico são o Comitê de Oxford de Combate à Fome (OXFAM NOVIB, Programa Acções para uma Governação Inclusiva e Responsável - AGIR) e Cooperação Suíça. Outros fundos provêm do Fundo das Nações Unidas para Actividades Populacionais (FNUAP), Fundação AGA KHAN, Open Society Initiative for Southern Africa (OSISA), Institute of Development Studies (IDS), Embaixada da França, entre outros (FÓRUM MULHER, 2017, p. 3-4). Esta estrutura nos parece bem constituída e com suficiente robustez para a luta pelos direitos das mulheres.

As estratégias fundamentais que acompanham esta estrutura são: i) desenvolvimento organizacional, com intervenções no plano da formação e ação política e no plano de desenvolvimento de capacidades; ii) estratégia de advocacia, com intervenções em três campos, nomeadamente, políticas públicas e acordos, práticas culturais e sociais, alianças e parcerias; e iii) estratégia de informação e comunicação (FÓRUM MULHER, 2013, p. 10-17).

Os relatórios de actividades do Fórum Mulher, os eventos promovidos pela causa dos direitos da mulher e as reportagens da comunicação social dão conta da implementação dessas estratégias de luta que, genericamente, tem conseguido materializar os objectivos perseguidos a meio das dificuldades inerentes à dinâmica das relações de poder na arena pública.

Das intervenções, autonomia e sucessos do Fórum Mulher na arena pública

A arena da sociedade civil remete para um ambiente agónico e uma realidade estratégica enfrentados pelos agentes intervenientes. A realidade estratégica é reconhecida pela associação de pessoas com vista à realização de interesses manifestos, latentes, explícitos, implícitos, coletivos, particulares, altruístas e/ou egoístas. Assim, verificamos que o Fórum Mulher como organização da sociedade civil desenvolve-se num ambiente agónico, um ambiente frequentemente conflitual e/ou competitivo.

De acordo com Francisco (2010), o ambiente agónico da sociedade civil confere à missão e à ação das organizações da sociedade civil uma natureza estratégica na medida em que busca mecanismos de atuação que garantam o sucesso na disputa pública pela satisfação da missão e interesses que as movem.

Em termos teórico-analíticos e empíricos, nos perguntamos em que circunstâncias o Fórum Mulher averba sucessos nas relações de poder na arena pública moçambicana. Esta questão nos conduz à possibilidade de emprego de estratégias coletivas de conflito que não somente agregam recursos individuais dos membros da associação para articular os interesses comuns desses indivíduos, mas que também superam a individualidade desses recursos e interesses, bem como os obstáculos à organização efetiva, na medida em que se define uma identidade coletiva, na base da qual a possibilidade de mudar as relações de poder existentes se torna potencialmente exequível. Especificamente, tal acontece quando, por exemplo, o Fórum Mulher busca parcerias nacionais e internacionais com que se identifica.

De facto, os pressupostos teóricos mostram que aqueles em posição de poder relativamente inferior precisam de aumentar o seu potencial de mudança por meio de superação dos custos comparativamente mais altos da ação coletiva, através da mudança dos padrões de acordo com os quais esses custos são subjetivamente avaliados dentro da sua própria coletividade.

Noutros termos, somente na medida em que as associações dos relativamente sem poder conseguirem formar uma identidade coletiva, de acordo com os padrões nos quais os custos de organização estão subjetivamente esvaziados, poderão elas esperar mudar a relação de poder original. Por outro lado, são os relativamente sem poder que mais precisam de agir na base de uma noção de identidade coletiva, simultaneamente gerada e pressuposta por suas associações (Clauss OFFE; Helmut WIESENTHAL, 1984 apudNIPASSA, 2016).

Nesta linha de raciocínio, Pierre Bourdieu (1989) mostra que o mais importante do ponto de vista do problema da rutura do círculo da reprodução simbólica das relações de poder está no facto de que, na base das homologias de posição5 no interior do campo político, se podem instaurar alianças mais ou menos duradoiras e sempre com fundamento em possíveis mal-entendidos mais ou menos conscientes. Isto se nota quando o Fórum Mulher reconhece a multiplicidade de identidades que concorrem para a construção da sua identidade feminista, como se pode ler no seguinte trecho:

Reconhecemos que, como feministas, temos múltiplas e variadas identidades - somos do norte, do centro e do sul, de todas as idades, de vários grupos étnicos, religiões e cor de pele, e lutamos por mudar as nossas vidas e as vidas de todas as mulheres. A afirmação da nossa identidade feminista não tem “se”, “mas” ou “porém”. Somos feministas e juntas seguimos construindo essa identidade, através das nossas práticas individuais, coletivas e institucionais (FÓRUM MULHER, 2013, p. 5).

Não obstante as potenciais contradições que podem surgir dessa congregação de múltiplas identidades numa identidade glocal (articulação entre o global e o local e vice-versa), a homologia de dis/posição é sempre possível entre, por exemplo, os intelectuais e as bases do Fórum Mulher. Na perspetiva da sociologia política em Bourdieu (1989), os “intelectuais” ocupam no seio do campo do poder, isto é, em relação aos “poderosos”, posições homólogas das que são ocupadas pelas “massas” no espaço social tomado no seu conjunto.

Este facto pode dar origem a uma aliança ambígua, na qual alguns intelectuais, dominados entre os dominantes, oferecem aos membros da sociedade civil, mediante uma espécie de desvio do capital cultural acumulado, os meios para constituírem objetivamente a representação dos seus interesses numa teoria explícita e em instrumentos institucionalizados, tais como tecnologias sociais de mobilização, lobby, manifestações, protestos, entre outros, que podem ser usados na arena pública.

Neste prisma, resultados do nosso trabalho de investigação teórica e empírica confirmam a existência de organizações da sociedade civil como o Fórum Mulher que, não obstante os diversos constrangimentos que enfrentam, fazem uso da autonomia de que dispõem para romper com as ligações que fragilizam o sentido da sua intervenção. Destarte, estabelecem novas parcerias com redes e plataformas nacionais e internacionais que, fundamentadas em homologias de dis/posições, respeito mútuo e ética de responsabilidade pública, desencadeiam ações que contribuem para a observância dos direitos da mulher e do desenvolvimento, entendido genericamente como conquista, expansão e manutenção de liberdades substantivas. Os três exemplos seguintes atestam o valor deste tipo de intervenção das organizações da sociedade civil na arena pública:

A Aprovação da Nova Lei da Família (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei 10/2004, de 25 de agosto) resultou de uma ação de âmbito nacional protagonizada por organizações da sociedade civil que questionavam as desigualdades nas relações de poder entre mulheres e homens na esfera familiar e na esfera pública, mais concretamente no acesso aos recursos sociais, económicos e políticos. A iniciativa envolveu o Fórum Mulher, WLSA, Mulher, Lei e Desenvolvimento (MULEIDE), Associação das Mulheres de Carreira Jurídica (AMCJ), que usaram como estratégias de luta a apresentação de um anteprojeto de lei, lobby e advocacia junto de decisores no Parlamento, nos ministérios e na Presidência da República (Para mais detalhes, vide Bente TOPSOE-JENSEN et al., 2015).

A Aprovação da Lei contra a violência doméstica (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei 21/2009, de 21 de julho) resultou de uma ação de âmbito nacional, com o objetivo de lutar contra a violência de género e a falta de legislação específica sobre violência doméstica contra as mulheres. Destacou-se nesta ação um grupo de organizações da sociedade civil liderado pelo Fórum Mulher. Associações que lutam pelos direitos das mulheres de nível local deram um importante contributo, fornecendo documentação de casos de violência e apoiando na divulgação do Projeto de Lei. Foi criado um movimento pela aprovação daquela lei que usou, entre outras estratégias de luta na arena pública, a pressão sobre o Parlamento, debates públicos, lobbies e advocacia bem-sucedidas (Para mais detalhes, vide TOPSOE-JENSEN et al., 2015).

A Campanha contra discriminação na proposta do Novo Código Penal foi uma ação de âmbito nacional desencadeada nos primórdios do ano de 2014. Ela tinha como objetivo a promoção da proteção legislativa dos direitos da criança e de género. A iniciativa foi lançada pela plataforma da sociedade civil para a revisão do Código Penal e contou com a WLSA e o Fórum Mulher na coordenação das atividades. Como estratégias de luta foram promovidos debates na arena pública, fez-se uma enorme mobilização popular e foi proposta uma revisão dos artigos discriminatórios no anteprojeto do Código Penal.6 Como resultado dessa intervenção das organizações da sociedade civil, o artigo 223 da proposta de revisão do Código Penal que previa o casamento entre a vítima e o violador; o artigo relativo à criminalização da mendicidade e do adultério foi todo excluído do Código Penal aprovado (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, 2012) (Para mais detalhes, vide TOPSOE-JENSEN et al., 2015).

Embora a implementação destes dispositivos legais e de políticas públicas como Plano de Acção para Redução da Pobreza Absoluta (PARPA II, 2006-2009) (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, 2006), Plano de Acção para Redução da Pobreza Absoluta (PARP, 2011-2014) (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, 2011) e Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência baseada no Género (2018-2021) (REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, 2018), entre outros, ainda não seja cabal e haja muito por conquistar no plano da igualdade de género e dos direitos humanos das mulheres, o simples facto da sua aprovação ter resultado de longas e aturadas lutas travadas na arena pública já atesta a importância do apelo à noção da autonomia do sujeito, capacidade de intervenção pública e influência política do Fórum Mulher em articulação com suas congéneres.

Considerações finais

A análise que fazemos sobre o sentido de intervenção do Fórum Mulher, como sujeito na arena pública moçambicana, recupera o polémico debate sobre autonomia e dependência da sociedade civil. Ao contrário dos que afirmam que, por serem dependentes da ajuda externa, as organizações da sociedade civil moçambicana não têm autonomia, nós argumentamos que a dependência não implica subserviência e que a atuação pública de certas organizações da sociedade civil, como é o caso do Fórum Mulher, revelam sim um grau de autonomia que deve ser reconhecido quanto mais não seja pelo seu potencial emancipatório.

Efetivamente, o Fórum Mulher busca uma sociedade mais justa e solidária, com igualdade de género, que respeita plenamente os Direitos Humanos das Mulheres. E na sua missão ela procura impulsionar transformações económicas e socioculturais, numa perspetiva feminista, fortalecendo as ações e a influência política dos seus membros e da sociedade civil em geral, colaborando com os movimentos sociais nacionais e internacionais.

Para salvaguarda da sua visão e missão, o Fórum Mulher coopera com agências doadoras que defendem e financiam atuações em prol dos direitos da mulher. Neste plano de convergência de interesses e partilha de objetivos, o Fórum Mulher mobiliza esforços para a sua luta contra o patriarcado e a ideologia da dominação masculina. Para o efeito, adota como estratégias o desenvolvimento organizacional, onde intervém no plano da formação, da ação política e do desenvolvimento de capacidades, realiza ações de advocacia no campo da legislação e políticas públicas e aposta igualmente no plano da informação e comunicação.

Estas estratégias de luta têm sido acompanhadas por um contínuo estabelecimento de novas parcerias com redes e plataformas nacionais e internacionais que, fundamentadas em homologias de dis/posições, respeito mútuo e ética de responsabilidade pública, reforçam ações que, no contexto moçambicano, já resultaram na aprovação de leis e políticas públicas que favorecem a observância dos direitos da mulher e do seu desenvolvimento em geral.

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  • 1
    Esta matéria foi anteriormente discutida por Killick, Castel-Branco e Gester (2005), tendo chegado à conclusão de que nas relações de cooperação que envolvem a ajuda externa, a dependência não significa subserviência. Nestes termos, as organizações da sociedade civil têm a possibilidade de discutir, propor, negociar e reformular agendas de intervenção na arena pública.
  • 2
    Na obra Four Essays on Liberty, Isaiah Berlin (1969) define liberdade negativa como a ausência de impedimentos legais para as ações dos indivíduos e a liberdade positiva como o alcance de meios para materializar tais ações permitidas pela liberdade negativa. E, na obra Pensar de Outro Modo, Alain Touraine (2007) defende que não há liberdade positiva sem liberdade negativa (TOURAINE, Alain. Pensar de Outro Modo. Lisboa: Instituto Piaget, 2007).
  • 3
    A título de exemplo, quando a Constituição da República de Moçambique (2004) declara - no Número 1 do Artigo 55º sobre Liberdade de Residência e de Circulação - que “Todos os cidadãos têm o direito de fixar residência em qualquer parte do território nacional”, garante inequivocamente a liberdade negativa. Porém, diversas privações fazem com que a materialização dessa liberdade não esteja ao alcance de todos os cidadãos, ou seja, tal liberdade negativa não é acompanhada pela liberdade positiva.
  • 4
    O autor esclarece que o princípio do consentimento destaca a circunstância em que quando Deus não é ouvido por todos do mesmo modo ou não é de maneira alguma ouvido por ninguém, e quando nem todos pertencem a uma comunidade perfeitamente definida e integrada, e desde que a razão não descubra uma moralidade canónica concreta, então a autoridade moral secularmente justificável não vem de Deus, nem da visão moral de uma comunidade particular, nem da razão, mas do consentimento dos indivíduos.
  • 5
    Homologia de posição caracteriza a situação em que indivíduos de posição social diferente (um intelectual e um iletrado, por exemplo) podem se identificar e criar alianças entre si dada a sua “identidade comum” de dominados face aos grupos mais poderosos dum Estado, por exemplo. E como entendemos ser igualmente necessária uma “disposição” comum para tal interação, nos convém adaptar esta noção passando a ser designada por nós como homologia de dis/posição.
  • 6
    A revisão do Código Penal moçambicano, no ano de 2014, envolveu várias organizações da sociedade civil - WLSA, Fórum Mulher, ActionAid, AMUDEIA, AMMCJ, Lambda, Rede HOPEM e Muleide - que trabalharam em rede desde a base até ao nível nacional, ao regional e internacional (consultando, por exemplo, parceiros na África do Sul). Estas OSC e seus parceiros criaram task forces de leitura e interpretação crítica do projeto de lei do Código Penal que estava na Assembleia da República para aprovação. Após tal trabalho de leitura do documento e auscultação das comunidades, as OSC consideraram que o projeto de lei tinha cinco lacunas nos aspetos de proteção das vítimas de violência doméstica e dos direitos das mulheres e das crianças. O task force liderado pela Lambda mobilizou a sociedade civil para a inclusão da expressão “orientação sexual” na letra do artigo 234, que tipifica o crime de discriminação. Vários outros task forces deram inputs nas suas respetivas áreas (mulheres, direitos humanos, criança, violência sexual) e o facto de se juntar os esforços baseados em conhecimentos específicos criou uma capacidade de advocacia muito forte. Encontradas as fragilidades no anteprojeto de lei do Código Penal, as OSC iniciaram uma grande campanha junto dos parlamentares para que as cinco lacunas fossem retificadas. O Parlamento aprovou a Lei de base de proteção da criança; formulou e aprovou a Lei contra a violência doméstica e fez a revisão de parte das lacunas que tinham sido identificadas pelas OSC no anteprojeto de lei do Código Penal.
  • Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista:
    NIPASSA, Orlando Júlio André. “Da autonomia do Fórum Mulher na arena pública moçambicana”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 28, n. 1, e68315, 2020.
  • Financiamento:
    O presente dossiê foi realizado com apoio do Programa de Internacionalização PRINT/CAPES. /
  • Consentimento de uso de imagem:
    Não se aplica
  • Aprovação de comitê de ética em pesquisa:
    Não se aplica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    31 Out 2019
  • Aceito
    21 Nov 2019
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