Propensão à inovação em empresas de confecção têxtil da cidade de Gaspar/SC, capital nacional da moda infantil

Resumo

Objetivo:

Analisar a propensão à inovação das empresas de confecção têxtil do município de Gaspar/SC.

Metodologia:

Caracterizada como descritiva, a pesquisa utiliza a abordagem quantitativa. Foi aplicado um questionário eletrônico, respondido por 35 empresas têxteis baseadas num Arranjo Produtivo Local (APL).

Principais resultados:

Os resultados evidenciam que, entre as tipologias de inovação implementadas, há um domínio da inovação de processo. Dentre os principais fatores que motivam a inovação está a adoção de métodos de produção mais eficientes. Os problemas/desafios predominantes são a falta de mão de obra qualificada e os elevados custos da inovação.

Contribuições teóricas/metodológicas:

oferecer uma visão sistemática sobre o tema de inovação, aplicado a um arranjo produtivo de destaque nacional.

Relevância/originalidade:

O levantamento dos dados e a discussão sobre a inovação em empresas de confecção têxtil de vestuário infantil, de um arranjo produtivo específico brasileiro, não haviam sido feitos anteriormente.

Contribuições sociais/gerenciais:

o estudo fornece aos gerentes de empresas de confecção têxtil a informação de que seus esforços no processo de inovação vêm gerando apenas inovações incrementais, provenientes de conhecimento externo provido pelos fornecedores, o que gera uma dependência para inovar.

Palavras-chave:
Tecnologia; Competitividade; Inovação; Setor têxtil

Abstract

Objective:

To analyze the propensity for innovation in textile manufacturing companies in the municipality of Gaspar/SC.

Methodology:

characterized as descriptive, the research uses a quantitative approach. An electronic questionnaire was administered; answered by 35 textile companies based on a Local Productive Arrangement (LPA).

Results:

the results highlight, amid the implemented innovation typologies, there is a domain of process innovation. Among the main factors that motivate innovation is the adoption of more efficient production methods. The predominant problems/challenges are the lack of qualified labor and the high costs of innovation as well.

Theoretical/methodological

contributions: to offer a systematic vision about the theme of innovation applied to a productive arrangement of national relevance.

Relevance/Originality:

Assembled data as well as discussion on innovation in textile manufacturing companies for children's clothing in a specific Brazilian productive arrangement were not previously done.

Social/management contributions:

The research provides managers of textile companies with connectivity information allowing them to conclude that their efforts in the innovation process generate incremental innovations only, derived from external knowledge provided by suppliers, which generates dependence to innovate.

Keywords:
Technology; Competitiveness; Innovation; Textile sector

INTRODUÇÃO

O setor têxtil atual é um ambiente extremamente competitivo, em que as empresas de confecção enfrentam desafios que exigem estratégias de desenvolvimento, aproveitamento de oportunidades, escolhas assertivas e satisfação dos consumidores (Schiavi et al., 2020; Martelli, 2021). Nesse sentido, investir em inovação é uma estratégia eficaz para modernizar processos de produção e aprimorar empresas que conservam padrões tecnológicos, gerenciais e produtivos, ultrapassados (Silva & Xavier, 2020). A inovação atende, ainda, a um reposicionamento sobre a percepção do produto ou do processo conhecido, em um contexto ou uso específico (Gomes & Teixeira, 2018; Silva & Burger, 2018).

O segmento industrial têxtil desponta como um dos mais dinâmicos e promove um alto consumo de seus produtos (média de 16,7 itens novos adquiridos por pessoa em 2021) (Global Fashion Industry Statistics [GFIS], 2022). As coleções lançadas sustentam a afirmativa. A China é líder em produção, enquanto o Brasil, em 5º lugar, produz manufaturados em um quantitativo que mal supre o mercado interno, embora tenha potencial e disponibilidade de matéria-prima (Instituto de Estudos e Marketing Industrial [IEMI], 2019). As deficiências econômicas e o inferior desempenho industrial alertam para falhas competitivas e de inovação no setor (Filleti & Boldrin, 2020). O nível de utilização dos conceitos da indústria 4.0 no segmento têxtil ficam restritos à automação e à gestão da logística interna, à troca digital de dados de produtos/processos, ao sistema de controle de produção quase em tempo real e aos softwares de planejamento e programação da produção (Lalic et al., 2019).

Imersas em contexto de baixa produtividade, indústrias de confecção se esforçam para abastecer um mercado crescente e exigente, ao mesmo tempo em que competem com as grandes cadeias varejistas, que importam produtos para revenda. Isso estimula a terceirização dos processos com grupos que compartilham a produção em oficinas menores, que exploram mão de obra e podem prejudicar a qualidade do produto e a credibilidade do setor (Filleti & Boldrin, 2020).

O setor têxtil e de confecção do Brasil é robusto. Está posicionado entre as cinco maiores indústrias têxteis do mundo e a quarta no setor de vestuário (FIEG, 2018), além de agregar empresas modernas e com grande aparato tecnológico (Moura et al., 2019; Fujita & Barbosa, 2020). O panorama da indústria têxtil catarinense (Campos, 2020) divide-se entre empresas modernas, detentoras de tecnologia e de estratégias comerciais e gerenciais alinhadas às melhores do mundo; aquelas (as modernas) adotam equipamentos atualizados, inseridos em processos estratégicos e com rígido controle de qualidade e habilitação em design; e as demais, acomodam-se em baixos níveis de maturidade de gestão e de tecnologia (Campos, 2020).

O estado de Santa Catarina é o segundo maior polo têxtil do país (ABIT, 2021) e potente gerador de renda e empregos para cidades como Gaspar/SC, detentora do título de Capital Nacional da Moda Infantil. No entanto, percebe-se que a sociedade tornou o setor intelectualmente irrelevante ao longo da história; um descaso alertado, no Brasil, e observado também por pesquisadores europeus e norte-americanos. Com o comodismo gerencial enraizado nas corporações, é lastimavelmente compreensível que ocorra uma impotência tecnológica, o retardo no desenvolvimento e a aversão à inovação do setor têxtil (Martinez et al., 2018; Coelho Junior et al., 2019).

Embora a inovação seja um fator de competitividade na indústria têxtil (Caldeira et al., 2018; Santana et al., 2020), alguns fatores limitantes se destacam nesse processo, como (i) a exposição aos riscos econômicos, (ii) a escassa disponibilidade de financiadores e (iii) o retorno de aceitação lenta e insuficiente dos consumidores aos novos produtos (Silva Filho et al., 2017). Estudos apontam (Zhang et al., 2020) que o apoio do governo por meio de financiamentos tem uma correlação positiva com a pesquisa e o desenvolvimento industrial, o que pode ser um ponto significativo para a inovação das empresas têxteis.

Apresentado o contexto, esta pesquisa questiona: Qual é a propensão à inovação das empresas de confecção têxtil de Gaspar/SC? Justifica-se tal levantamento dada a importância da indústria têxtil no cenário econômico do Vale do Itajaí (Milnitz & Luna, 2017; Menegon et al., 2021), ao qual a cidade de Gaspar/SC faz parte. Ademais, o estudo elucida práticas de inovação que contribuem para enfrentar pressões competitivas, ao mesmo tempo em que colabora com uma reflexão sobre alternativas voltadas para o desenvolvimento industrial do setor em questão.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Indústria têxtil brasileira

Considerada a maior e mais completa cadeia têxtil do ocidente, a indústria têxtil brasileira tem quase 200 anos, envolvendo desde o plantio do algodão até os processos de produção das fibras, fiação, tecelagem, beneficiamento, confecção e comercialização por atacado e varejo (ABIT, 2021). A proporção alcançada pela indústria têxtil nacional a posiciona entre os quatro maiores produtores de malhas do mundo, tornando o Brasil referência mundial no segmento (ABIT, 2021).

O potencial econômico do setor têxtil brasileiro, com alocação de 19,8% do total de trabalhadores na produção industrial e participação de 5% no valor total da produção da indústria brasileira de transformação, em 2020 (ABIT, 2021), exige orientação e adoção de metodologias inovadoras, para que as empresas produzam e se mantenham a longo prazo. As empresas de pequeno e médio porte amparam a economia, haja visto que representam um elevado percentual dos estabelecimentos têxteis do país. O estado de Santa Catarina, por exemplo, desponta como um dos principais parques fabris. Porém, atravessa problemas relacionados à produção, em virtude da falta de planejamento eficiente e das influências mercadológicas, como a concorrência com países asiáticos. Diante disso, é necessário adotar medidas e estratégias que impulsionem mudanças na gestão dessas organizações e consequentemente para a economia do país (Milnitz & Luna, 2017; Menegon et al., 2021).

No Vale do Itajaí, um dos polos da indústria têxtil do estado de Santa Catarina (Milnitz & Luna, 2017; Tambosi et al., 2020), está a cidade de Gaspar, objeto desta pesquisa, agraciada em 2022 com o título de Capital Nacional da Moda Infantil. O ramo têxtil em Gaspar teve início com a chegada dos imigrantes europeus na região, especialmente dos imigrantes alemães, em 1835, e dos italianos, em 1875 (Oliveira & Pereira, 2017). Atualmente, a cidade é responsável por mais de 50% da produção de moda infantil dos grandes magazines do Brasil e emprega cerca de 8.000 colaboradores de forma direta, com concentração de quase 40% do PIB gerado no município (Gaspar, 2022).

A importância do setor têxtil e de confecções é admirável, em vista da capacidade potencial de gerar emprego e renda para o município, o que incentiva, continuamente, a implementação de metodologias inovadoras por parte das empresas, para driblar a concorrência no mercado competitivo.

A inovação e suas tipologias

A inovação, agente promotor do crescimento econômico a longo prazo, assegura a competitividade, a criação de uma ruptura benéfica no sistema econômico, alterações de padrões produtivos e a diferenciação da empresa (Osterwalder & Pigneur, 2020). Entretanto, os empreendimentos são falhos, ao concentrarem-se em atividades com baixo aparato tecnológico e pequenas barreiras de entrada, como atender apenas o mercado interno ou prestar serviços deficitários ao consumidor (Gavira et al., 2020; Carmona & Gomes, 2021). Uma gestão que impulsione a participação, o compartilhamento de visões de todos os setores da empresa (Martelli, 2021), o investimento em recursos, pessoas, equipamentos e pesquisas capazes de criarem novos produtos ou processos produtivos mais eficientes são estratégias que resultam em vantagem competitiva empresarial, como por exemplo o desenvolvimento e o aumento das atividades de exportações (Negri, 2018; Bodlaj et al., 2020). Além disso, a colaboração com outras empresas exerce um papel positivo para o desempenho inovador industrial (Giannini et al., 2019).

O mercado está em constante atividade e imerso em um ambiente competitivo, que exige das empresas uma exposição ao desafio de inovar, para que se moldem às expectativas dos clientes e atendam positivamente à demanda, em função do comportamento dos consumidores, que anseiam por propostas inovadoras (Melo et al., 2020). A concepção teórica de inovação e sua importância para a economia começou a ser difundida no início do século XX por Joseph Alois Schumpeter. Em seu conceito seminal, o processo de inovação resulta de novas combinações descontínuas dos meios produtivos, considerada como uma destruição criativa que rompe a evolução normal da economia (Schumpeter, 1982). No entanto, estudos mais recentes (Bodlaj et al., 2020) apontam que o requisito mínimo para que se considere um processo como um tipo de inovação é que a mudança seja nova para a empresa, mas não necessariamente para o mercado. Isto é, os impactos da inovação nem sempre resultam em grandes mudanças econômicas.

Ao se considerar o grau de difusão e os impactos da inovação na economia, duas tipologias podem ser identificadas, a saber: radical e incremental (Escrig et al., 2020). A inovação radical é a tipologia que expressa um produto/serviço totalmente novo. Embora não ocorra com frequência, o seu potencial de otimizar os resultados das empresas e, com isso, contribuir para que desafiem a posição dominante dos seus concorrentes líderes no mercado, diversos autores (Escrig et al., 2020) têm enfatizado a sua importância para a sobrevivência e o sucesso das organizações a longo prazo (Escrig et al., 2020). Já a inovação incremental é definida como a alteração de características do produto/serviço, sem alterar sua estrutura geral (Ferreira et al., 2015). Além dessas, destacam-se outros quatro tipos de inovações que se baseiam, majoritariamente, em um conjunto de mudanças nas atividades gerenciais (Fierro et al., 2017; Bodlaj et al., 2020), e classificados quanto à natureza em inovações organizacionais, de marketing, de produtos e de processos.

As inovações organizacionais inserem, adequam ou modificam práticas de negócios na organização do local de trabalho ou nas relações externas, em novas estratégias e sistemas de gestão. A inovação de marketing caracteriza-se ao promover mudanças no design e na embalagem; o preço baseia-se em demanda e oferta; modifica-se a distribuição dos produtos, com novos canais de vendas e implementam-se franquias; investe-se em divulgação e promoção quando há uma mudança nas características do produto ou do serviço (Fierro et al., 2017).

Entretanto, se um produto adquire recursos ou há uma melhoria significativa no serviço oferecido ao cliente, compreende-se como inovação de produto (Fierro et al., 2017), as melhorias das especificações técnicas, componentes e materiais, ou adequação a um modo fácil e funcional de uso (Beck & Beuren, 2017); e quando as características básicas dos produtos oferecidos diferem de todos os anteriores. Nesse caso, introduz-se um bem novo ou melhorado às características ou usos previstos, num novo entendimento do mercado e da tecnologia da empresa, incorporado, necessariamente, para agregar valor aos produtos (Lopes et al., 2018; Grützmann et al., 2019).

Já a inovação em processos implica na implementação ou adequação de um método de produção ou de entrega, novo ou significativamente melhorado, a incluir alterações significativas, a fim de diminuir os custos unitários de produção ou de entrega, para aumentar a qualidade e a eficiência produtiva (Beck & Beuren, 2017; Palheta et al., 2021). Dessa forma, melhoram-se sistemas, ao se reduzirem desperdícios, e aumenta-se a eficácia ou altera-se a forma operacional.

Inovação na área têxtil

A inovação pode ser determinada quando a instituição se posiciona, a partir da percepção de um produto ou processo já conhecido, em um contexto ou uso específico, e promove uma modificação radical ou por incremento, em prol da satisfação do consumidor ao utilizar um bem ou um serviço (Beck & Beuren, 2017). Esses são aspectos-chaves e primordiais para as organizações do segmento têxtil que, no âmbito das suas rotinas, buscam uma gestão eficiente e de destaque no mercado (Menegon et al., 2018).

Mesmo que a produção industrial nesse setor enfatize as inovações de produto, com o lançamento sazonal de novas coleções que, por sua vez, indicam a busca constante por novas tendências estéticas e por novos tipos de materiais, poucos são os estudos sobre inovação de produto, a indicar que foi o tipo menos valorizado nos estudos acadêmicos, e sugerir investimentos em pesquisas (Menegon et al., 2018). Os autores ressaltam, ainda, que a percepção dos gestores sobre minimizar desperdícios nos processos é um assunto ainda não compreendido pelo meio acadêmico, mas de extrema urgência para a indústria têxtil. Contrapondo à pesquisa de Menegon et al. (2018), as inovações investigadas por Ganzer et al. (2017), foram percebidas de modo quase equilibrado, na seguinte ordem decrescente: inovações de marketing, inovações organizacionais, de produto e de processo.

Adaptar novas tecnologias e processos e abandonar a comodidade impulsionam a indústria têxtil a percorrer um caminho mais assertivo, para alinhar perspectivas e manter a ordem (Silva & Xavier, 2020). Com a crescente concorrência, cabem às empresas se preocuparem em alcançar vantagens competitivas que as diferenciem no mercado, para o alcance da sobrevivência, eficiência e lucratividade. Para tanto, é necessário que desenvolvam novas práticas de inovação, conforme indicam alguns estudos, Figura 1, realizados no setor têxtil.

Figura 1
Práticas de inovação no setor têxtil

Caldeira et al. (2018) identificaram algumas práticas de inovação recentemente adotadas pelo setor têxtil. No setor de vestuário, há novas tecnologias aplicadas a produtos: roupas com elementos eletrônicos incorporados, a controlar a temperatura e que mudam de cor. No segmento de fibras, há aplicações de nanotecnologia; no setor de tecidos, inova-se em produtos para revestir automóveis, a incorporar recursos de fotônica, que conferem ao tecido propriedades de luminescência. O investimento em tecnologia é visto como caminho para competir e crescer por meio do desenvolvimento de novas formas de produzir, a fim de diminuir custos (Caldeira et al., 2018).

A nanotecnologia associada à moda possibilitou a inovação e atendeu certa demanda de consumidores (Britto et al., 2018). Por inovação incremental, desenvolveu-se um tecido composto por citronela, a proteger o usuário de insetos, vetores de doenças. Ressalta-se a importância da relação empresa-fornecedor e empresa-cliente na aplicabilidade da inovação. Como contribuição gerencial, a nanotecnologia amplia a função do produto: além de agasalhar o corpo, protege de doenças, como um diferencial competitivo para empresas deste setor, a aumentar as vendas dos produtos (Britto et al., 2018).

Um estudo de Gomes et al. (2014) indicou que as dimensões eficiência, eficácia, custos e melhorias de processos estão associadas ao desempenho da inovação na indústria têxtil. A dimensão melhoria exige aprimorar a qualidade do produto, condições de trabalho e produtividade, enquanto a dimensão de capacidade de inovação é decisiva em melhorar o desempenho do produto na indústria têxtil (Manthey et al., 2017).

Damásio e Monteiro (2020) analisaram as principais mudanças geradas pela inovação tecnológica no processo produtivo de uma indústria têxtil durante o período de 1995 a 2015. O processo de modernização tecnológica, no recorte temporal, trouxe mudanças no processo produtivo da empresa, nas inovações tecnológicas e nas relações de trabalho, a exigir que a empresa se modernizasse para que pudesse ser mais competitiva no mercado têxtil, pois a conjuntura econômica demandou que os processos produtivos ficassem mais eficientes em custo, produtividade e qualidade. As alterações no processo de produção foram mais incrementais, na medida em que não houve mudanças radicais no desenho do processo produtivo. Aumentou-se a velocidade de processamento e a qualidade, por controle eletrônico, de máquinas de fiação e tecelagem, além de aprimorar os produtos químicos no acabamento do tecido (Damásio & Monteiro, 2020).

Cavalcanti e Santos (2022) analisaram a competitividade da cadeia têxtil brasileira, levando em conta atributos da inovação como: construção e promoção de marcas, flexibilidade e produção com padrão de alta qualidade. Os resultados indicaram baixa vantagem competitiva, motivada pelo escasso investimento em inovação, resultando em participação ínfima no mercado mundial. Evidenciou-se a falta de inovações, inclusive pelo baixo número de depósitos de patentes voltados para esse setor. Para Giannini et al. (2019), o modelo de inovação da indústria têxtil ainda é caracterizado pelo baixo investimento em pesquisa e desenvolvimento, o que provoca autonomia restrita em sua capacidade de inovação. Todavia, a criação de políticas setoriais de desenvolvimento oriundas da cooperação dos atores que constituem a cadeia produtiva têxtil, a exemplo de empresários, organizações sem fins lucrativos representantes do setor, em conjunto com organizações públicas, despontam como alternativas para definirem desafios e estabelecerem metas relacionadas à inserção e ao avanço de inovações têxteis (Antero, 2006). Para tanto, essas políticas podem ser construídas a partir de um plano de desenvolvimento setorial, com projeções de ações inovativas direcionadas para a modernidade, eficiência e sustentabilidade da produção têxtil e de confecção (Kazmi & Takala, 2014; Nhung & Thuy, 2018).

Por fim, Carmona e Gomes (2021) apresentaram o efeito mediador do desempenho inovador na relação entre a Capacidade de Aprendizagem Organizacional (CAO), a Capacidade de Inovação Organizacional (CIO) e o desempenho organizacional na indústria têxtil do estado de Santa Catarina. Entre as contribuições, Carmona e Gomes (2021) verificaram que a proposta e validação de um modelo que desenvolve argumentos a favor da CAO e da CIO para alavancar o desempenho inovador e organizacional em mercados emergentes como o brasileiro, no setor têxtil, que embora negligenciado pela literatura de inovação, como indústria madura, de baixa intensidade tecnológica, têm alto potencial de inovação.

METODOLOGIA

A fim de analisar a propensão à inovação das empresas de confecção têxtil do município de Gaspar/SC, esta pesquisa, quanto aos objetivos e abordagem, configura-se como descritiva e quantitativa, já que visa estudar e descrever as características de um grupo de empresas têxteis a respeito do fenômeno da inovação, a partir da aplicação de indicadores baseados na Pesquisa de Inovação (PINTEC) (IBGE, 2020). Conforme dados da Prefeitura Municipal do referido município, o APL em questão é constituído por 870 empresas de confecção, 480 facções e 85 tinturarias, fiações, tecelagem e outros (Gaspar, 2022).

Diante da diversificação de empresas inseridas no setor, foi adotada a técnica de amostragem por conveniência não probabilística. Para sua operacionalização, o questionário foi enviado para gestores proprietários de 100 empresas do segmento de confecção do vestuário infantil, no período que compreendeu o primeiro semestre de 2022. Como resultado dessa etapa, obtiveram-se respostas de 35 respondentes que aceitaram participar da pesquisa. Os dados de contato foram obtidos junto à Associação Empresarial de Gaspar (ACIG), e o público definido como grupo de interesse, justifica-se pelo fato de compor o segmento de maior representatividade da cadeia têxtil gasparense. Vale destacar que o setor infantil engloba cerca de 60% do APL têxtil do município de Gaspar (Gaspar, 2022).

O instrumento de coleta de dados foi elaborado com base na literatura consultada e na Pesquisa de Inovação (PINTEC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020). Quanto à estrutura, o instrumento foi composto por questões fechadas e dividido em seções que correspondem aos indicadores de inovação selecionados, sendo elas: Seção 1: Identificação dos respondentes; Seção 2: Caracterização da empresa; Seção 3: Identificação dos tipos de inovação; Seção 4: Motivações para inovar; Seção 5: Impactos decorrentes da implementação da inovação; Seção 6: Identificação das fontes de inovação; e Seção 7: Obstáculos encontrados no processo de inovação.

Para qualificar o instrumento de coleta dos dados, realizou-se um pré-teste com o questionário elaborado. Para tanto, foi encaminhado para dois gestores de empresas têxteis, com graus de escolaridade distintos, que leram e responderam às questões. Os respondentes indicaram que o questionário estava claro e compreensivo, sem apontarem qualquer necessidade de ajuste no texto.

A coleta foi realizada por meio do Google Formulários, cujo link foi enviado aos e-mails das empresas, presentes na listagem fornecida pela ACIG. A etapa de análise dos dados, fornecidos pelos respondentes, foi executada com o auxílio do MS Excel, utilizado para a organização e a sistematização de informações apresentadas no formato de tabelas e gráficos com percentuais estatísticos descritivos referentes à distribuição de frequências das práticas de atividades inovativas, todas presentes no conjunto de empresas pesquisadas. Além disso, a discussão dos resultados foi interpretada à luz do referencial teórico utilizado como suporte para a investigação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Neste tópico do artigo, são apresentados os resultados e a discussão. A primeira parte da análise realizada descreve o perfil dos gestores participantes da pesquisa, na qual foram calculadas as frequências absolutas e relativas (Tabela 1). Na identificação dos respondentes, foi constatado que 69% deles são do sexo masculino e 31% do sexo feminino. Portanto, verifica-se uma significativa disparidade relacionada à ocupação de cargos de gerência entre gêneros. Em relação à faixa etária, nota-se uma prevalência de gestores jovens, com idades compreendidas entre 18 e 39 anos (68%), enquanto que o percentual correspondente à terceira idade (6%) denota ser o menos expressivo no contexto do gerenciamento.

Tabela 1
Caracterização das participantes

Item		Frequência
		Absoluta	Relativa	Acumulada
Sexo	Feminino	11	31%	11
	Masculino	24	69%	35
Idade	18 a 29	12	34%	12
	30 a 39	12	34%	24
	40 a 49	5	14%	29
	50 a 59	4	11%	33
	60 ou mais	2	6%	35
Formação	Ensino médio completo	13	37%	13
	Ensino superior completo	11	31%	24
	Ensino superior incompleto	8	23%	32
	Pós-Graduação completa	3	9%	35
Experiência em gerenciamento	1 a 5 anos	12	34%	12
	6 a 10 anos	9	26%	21
	11 a 15 anos	2	6%	23
	16 a 20 anos	3	9%	26
	21 anos ou mais	9	26%	35

• Nota: Elaborado pelos autores.

Quanto ao grau de escolaridade, o ensino médio completo é a formação predominante entre os respondentes (37%), seguida do ensino superior (31%). Todavia, o percentual de pós-graduados é extremamente baixo. Por conseguinte, indagou-se sobre quantos anos de experiência em gerenciamento o profissional acumulou em toda a sua carreira. A maioria dos gestores (34%) afirmou ter entre 1 e 5 anos de atuação em cargo de gestão, realidade que está proporcionalmente relacionada com a faixa etária dos respectivos respondentes.

Tratando-se da caracterização das empresas, calcularam-se as frequências absolutas e relativas (Tabela 2). Uma característica realçada se refere ao total de organizações tipificadas como de grande porte, sendo identificada, nesta pesquisa, apenas uma (6%) que corresponde a esse perfil. Já o perfil de pequeno porte é o mais predominante entre as empresas analisadas (51%), condição que pode ser uma barreira para o desenvolvimento de inovação de grande impacto para essas respectivas confecções.

Tabela 2
Caracterização das empresas participantes

Item		Frequência
		Absoluta	Relativa	Acumulada
Porte	Micro	0	0%	0
	Pequeno	18	51%	18
	Médio	15	43%	33
	Grande	2	6%	35
Atuação geográfica	Municipal	1	3%	1
	Regional	2	6%	3
	Nacional	30	86%	33
	Internacional	2	6%	35

• Nota: Elaborado pelos autores.

No que diz respeito à abrangência de atuação, verificou-se o mercado nacional como a principal dimensão definida pelas empresas (86%) para a oferta das suas produções. Por outro lado, a expansão do setor têxtil brasileiro, para um contexto internacional, encontra diversas barreiras de competitividade, derivadas da ausência de adequadas políticas de fomento à tecnologia e inovação, além das elevadas taxas tributárias e altos custos da mão de obra (Cavalcanti & Santos, 2022). Assim, o fortalecimento da internacionalização da produção têxtil e de confecção do município de Gaspar se apresenta como um grande desafio.

Destacadas as considerações iniciais sobre o perfil dos gestores e das indústrias participantes desta pesquisa, segue-se ao ponto determinante da apresentação dos dados para se alcançar o objetivo deste estudo. Nesse sentido, destaca-se a análise das questões que abordaram dados em relação à inovação das indústrias têxteis do município de Gaspar. Ao questionar os gestores sobre os tipos de inovações introduzidos nas empresas recentemente (Figura 2), foi constatado que a aquisição de máquinas, para otimização do processo de manufatura, desponta como a principal ação desenvolvida pelos empresários (77%), seguida de aquisição de software (51%) para melhorar o gerenciamento e as mudanças no layout da empresa (48%). O investimento nesses aspectos, ao setor têxtil, é uma alternativa viável para competir e crescer, com o desenvolvimento de novas formas de produzir, a diminuir custos (Cavalcanti & Santos, 2022; Damásio & Monteiro, 2020). Em contrapartida, nota-se que o investimento na execução de atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) com funcionários da empresa (26%), bem como de P&D com uma equipe de consultoria contratada (8%), evidenciam os menores índices de inovação implementada.

Figura 2
Identificação dos tipos de inovações introduzidas recentemente nas empresas

As respostas demonstram, portanto, que entre as tipologias de inovação (Fierro et al., 2017) presentes nas empresas de confecção têxtil do município de Gaspar, há um predomínio da inovação de processo, a partir da inovação de estrutura organizacional. Os aspectos favoráveis à inovação e competitividade das empresas de têxteis e de confecção brasileiras, a saber: gestão e difusão do conhecimento, criatividade e cooperação, são fortalecidos a partir da existência de um setor especializado em pesquisa e desenvolvimento ativo (Caldeira et al., 2018).

Considerando-se o impacto da inovação nos níveis de mercado (Figura 3), a pesquisa evidencia que as inovações adotadas pela maioria das empresas (57%) foram relevantes no âmbito que abrange a própria organização da empresa, mesmo que já exista no mercado nacional/internacional. A inovação beneficia todos os níveis do setor têxtil, embora empregue métodos comuns. Existe a necessidade de que as empresas do setor têxtil enfrentem o desafio de inovar, como condição para se manterem no mercado, ao criarem ou aperfeiçoarem métodos inovadores que atendam à cadeia produtiva (Caldeira et al., 2018; Menegon et al., 2018). A inovação tem sido reconhecida como um dos principais pilares resultantes de incremento na competitividade das empresas e no desenvolvimento econômico do setor têxtil industrial (Moreira et al., 2016).

Figura 3
Impacto da inovação nos níveis de mercado

No que se refere às razões ou causas que incentivaram a empresa a inovar (Figura 4), os resultados apontam que, na busca por aumento da produtividade, os gestores esclarecem que os principais motivos são as perspectivas de alterar ou de melhorar os métodos de produção existentes (74%) para, a partir dessa condição, atender às necessidades dos clientes (68%) que, por sua vez resulte no incentivo de desenvolvimento de novos produtos e serviços (63%). Numa visão geral sobre as inovações realizadas na indústria têxtil e de confecções brasileiras, observa-se proeminência em relação às inovações de processo sobre as inovações de produto (Moreira et al., 2016).

Figura 4
Razões ou causas que incentivaram as empresas a inovarem

O desenvolvimento de novos produtos e serviços, nas empresas investigadas nesta pesquisa, pode ser potencializado mediante o fortalecimento da cultura de cooperação no APL. Para tanto, organizações representativas locais e regionais precisam reestruturar os seus programas de apoio ao fomento das atividades de inovação que, dentre os principais escopos, busquem desenvolver a cooperação como prática organizacional. Pode ser observado que apenas 20% das empresas apresentam um contexto no qual as atividades de inovação são incentivadas pelo Núcleo Têxtil de Gaspar-SC, a destacar que um dos objetivos dessa entidade, criada em 2018 para representar os interesses dos empresários do setor local, é o de impulsionar a troca de experiências, o aperfeiçoamento e o aprimoramento dos negócios e a melhoria contínua da cadeia têxtil local (Associação Comercial e Industrial de Gaspar [ACIG], 2022).

Em termos de benchmarking, nota-se que somente 29% das empresas pesquisadas praticam adaptações de tecnologias criadas por outros para atender às suas necessidades, como o alargamento da gama de produtos e substituição de produtos e serviços obsoletos. Nesse caso, infere-se que os produtos oferecidos suprem o mercado e que a maioria das empresas opta em aderir às metodologias inéditas, pouco usadas por outras organizações, mas que sejam eficazes. Um exemplo de inovação bem-sucedida na indústria têxtil é a utilização da microfibra (a partir dos anos 70) na criação de novos tecidos. Dentre outros resultados, essa inserção reduziu custos e permitiu implantar novas características técnicas ao produto final (Menegon & Zambarda, 2019; Osterwalder & Pigneur, 2020; Palheta et al., 2021).

A constatação do baixo índice de adesão à prática do benchmarking é reforçada ao se identificar que, apenas, um terço das empresas (34%) investigadas nesta pesquisa são gerenciadas por gestores que afirmam realizar o acompanhamento das inovações da concorrência como um incentivo para inovar. Além disso, destaca-se o fato de que apenas 14% das empresas constituem um cenário no qual seus gestores desejam manter a posição atual de mercado. Isso denota que os responsáveis pela administração das empresas não querem estagná-las na posição em que se encontram, mas com um comportamento visionário, pretendem melhorar continuamente e se desenvolverem dentro do setor (Britto et al., 2018; Caldeira et al., 2018; Menegon et al., 2018; Carmona & Gomes, 2021).

Ademais, os dados demonstram que os setores mais beneficiados com inovações implementadas dentro das empresas (Figura 5) são, na devida ordem: i) setor de Produção (88%), fato que se justifica, principalmente, pela motivação dos gestores em introduzirem inovações que possibilitam melhorias nos métodos de manufatura e, também, na aquisição de máquinas e equipamentos; ii) setor de vendas (60%), que resulta na expansão de abrangência de ofertas dos produtos para o mercado nacional; e iii) setor de estoque e armazenamento (46%), visto que a gestão das atividades operacionais de logística tende a ser otimizada significativamente com a introdução de inovações, como a exemplo da aquisição de máquinas e equipamentos, aquisição de softwares e mudanças no layout da empresa, identificadas como as práticas mais presentes nas empresas pesquisadas.

Figura 5
Setores das empresas beneficiados pelas inovações introduzidas

Todavia, os setores de recursos humanos (14%) e de distribuição e transporte (20%) são evidenciados como os que são menos impactados pelas inovações introduzidas nas empresas de confecção, que fazem parte da amostra deste estudo. Embora práticas e rotinas inovadoras apresentem grande potencial de impacto para esses setores, os custos da mão de obra fazem parte da contramão que impede o aumento da competitividade da cadeia têxtil e de confecção brasileira (Cavalcanti & Santos, 2022). Somando-se a esse gargalo de dimensão nacional, o custo Brasil, compreendido como o conjunto de dificuldades estruturais que impactam negativamente na economia do país, impedindo o seu crescimento e competitividade, pode ser interpretado como um amortecedor do impacto das inovações na distribuição de produtos das empresas. Porém, apesar das dificuldades, os impactos das atividades de inovação podem ser percebidos e associados às diversas áreas dentro das organizações, tais como o produto, os processos, aspectos ligados ao meio ambiente e, também, às regulamentações e normas (Moreira et al., 2016; Gavira et al., 2020; Martelli, 2021).

Para além das dificuldades, internas e externas às empresas do setor, os resultados obtidos pelo processo de inovação implementado (Figura 6) apontam que 80% das confecções pesquisadas obtiveram um aumento da capacidade produtiva. Os benefícios relacionados à produção, também, foram identificados nos aspectos relacionados à produtividade da manufatura, isto é, na melhoria da qualidade dos produtos ofertados (57%). Em termos de competitividade, um dos fatores a ser considerado importante na avaliação do desempenho das empresas diz respeito à produção com alto padrão de qualidade e, não apenas, o lucro obtido (Cavalcanti & Santos, 2022).

Figura 6
Resultados obtidos pelo processo de inovação implementado na empresa

Em seguida, registra-se uma diminuição do tempo de produção em 46%, bem como nos custos de produção em 43% das confecções. Enquanto isso, apenas 3% das empresas obtiveram patentes (Figura 5) e/ou criaram novas marcas (6%) após implementarem metodologias de inovação. Assim, esses resultados reforçam evidências de que a falta de inovações no setor têxtil se deve ao baixo número de depósitos de patentes, ao desenvolver produtos e marcas de alto valor agregado com uma sistemática de alta produtividade. Ao manter tal comportamento, aumenta-se a possibilidade de perda interna de mercado, a ampliar o déficit na balança comercial (Cavalcanti & Santos, 2022).

Ao problematizar o desenvolvimento e introdução de inovações nas organizações, é importante investigar as suas possíveis e principais fontes de fomento (Figura 7). Nessa perspectiva, verificou-se um significativo índice de contribuição dos clientes (63%) e dos fornecedores (54%) na implementação de inovações nas empresas pesquisadas. A busca de informações sobre clientes e o mercado permite que a empresa entenda melhor as necessidades, a facilitar o desenvolvimento da inovação e a aceitação no mercado, principalmente por poder antecipar a oferta, em função dos desejos da clientela. Ideias e informações que a empresa recebe dos clientes, por pesquisas de satisfação, por exemplo, ajudam-na a identificar necessidades e a fornecer um produto personalizado (Caldeira et al., 2018; Santana et al., 2020).

Figura 7
Fontes de inovação para as empresas

A literatura especializada aponta que significativa parcela das inovações desse setor advém da aquisição de máquinas e equipamentos, bem como de novos tipos de matéria-prima (Moreira et al., 2016) que, originalmente, partem da cadeia de fornecedores. Uma das características da cadeia de têxteis e de confecções é ser consumidora de tecnologias, a considerar que a maioria das inovações acontecem de forma exógena às empresas, principalmente via fornecedores (Britto et al., 2018).

O relacionamento com cliente influencia positivamente a capacidade inovativa da empresa, e é importante no desenvolvimento de ideias e lançamento de produto, inovações de processo e organizacional, e a estratégia empresarial, a identificar oportunidades de maneira mais eficiente e reduzir os riscos da inovação. Boas práticas de liderança e relação com os clientes e a sociedade, e o acesso a informações e conhecimentos têm, indubitavelmente, impacto positivo e significativo sobre a geração de inovação, dada a importância desses recursos para desenvolvimento da capacidade dinâmica (Vasconcelos & Oliveira, 2018).

As parcerias com universidades e institutos de pesquisas (3%) e a participação em feiras, conferências e seminários (8%) representam as fontes de inovação menos utilizadas pelas empresas. O distanciamento relacional dessas empresas de confecção com instituições de ensino e pesquisa revela, para efeitos de inovação e crescimento econômicos do APL, uma oposição ao que evidenciam estudos empíricos (Caldeira et al., 2018) que, ao abordarem o papel dos agentes externos de estímulo à inovação, elucidam que as ações do governo e das universidades “devem ser consideradas como as principais agentes de estímulo à inovação no setor têxtil brasileiro” (Caldeira et al., 2018, p. 19).

Devido à facilidade em apoderar-se de conhecimentos e informações, bem como de utilizá-los no processo produtivo das empresas, fontes como clientes, consultoria, feiras e exposições, também se tornam relevantes para a expansão de inovações no setor (Moreira et al., 2016). A obtenção e o compartilhamento de informações podem ser utilizados para melhoria ou desenvolvimento de novos produtos ou serviços, de novos métodos de marketing, para redução dos riscos do processo de inovação e dos custos de transação (Milnitz & Luna, 2017; Menegon et al., 2021).

Em relação aos problemas e obstáculos que impediram/dificultam o processo inovativo das empresas (Figura 8), foi identificado que os elevados custos (66%) e a falta de mão de obra qualificada (66%) são as principais barreiras que prejudicam o desenvolvimento e adoção de inovações. Para solucionar o problema da falta de mão de obra qualificada, seria ideal trabalhar em conjunto com instituições de ensino, a oportunizar que estudantes e professores, mediante estágios ou projetos de pesquisa/extensão, atuem na empresa, ao oferecerem serviços e obterem retorno em aprendizado. Assim, incentivariam estudos da comunidade acadêmica, investiriam em conhecimento e profissionalização da empresa, evitando gastos excessivos. A referida relação pode proporcionar a qualificação do aluno/estagiário a trabalhar de acordo com as necessidades da empresa.

Figura 8
Dificuldades, problemas ou obstáculos que impediram/dificultaram o processo inovativo das empresas

No que diz respeito aos riscos econômicos excessivos, obstáculos considerados pelos gestores de 60% das empresas pesquisadas, é evidente que existem diferentes tipos de incertezas relacionadas ao retorno do capital financeiro investido em inovação. A princípio, as empresas podem definir suas necessidades e definir quais serão os gastos necessários. Para um melhor direcionamento, a busca por uma fonte externa de apoio à tomada de decisão pode ser uma alternativa eficaz. Assim, a empresa tende a definir com maior segurança qual é a melhor maneira de arrecadar fundos para atingir os objetivos que foram traçados.

Destaca-se, também, nos resultados, a dificuldade para se adequar a padrões, normas e regulamentações. Foi verificado que um terço das empresas pesquisadas (31%) apresentam esse gargalo como uma questão a ser resolvida. Portanto, conhecer aspectos regulatórios, sociais e sustentáveis permite que a organização se destaque ao desenvolver ideias, e obter um desempenho inovador superior (Vasconcelos & Oliveira, 2018).

A inovação está implicada num processo intenso de desenvolvimento de conhecimento e de informação (Beuren et al., 2020). A qualidade da informação pode refletir na inovação de produtos e processos, via conhecimento que, por sua vez, caracteriza-se como informação em determinado contexto em que se atribui significado e interpretação. Esse conhecimento se relaciona com a inovação, o surgimento de uma nova ideia ou invenção e a sua transformação em um negócio (Alves & Ceolin, 2019; Osterwalder & Pigneur, 2020).

Ao investirem em conhecimento inovador, empresas têxteis podem alavancar vendas e desenvolverem os empreendimentos, a se destacarem no mercado, tais quais empresas que mais investem nesse setor, pertencentes a países desenvolvidos e conhecidas mundialmente. Investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D) é uma das chaves que viabiliza o progresso da empresa, sobretudo financeiramente. Com novos produtos e processos, a empresa maximiza a capacidade tecnológica e aumenta a produtividade.

CONCLUSÕES

Com o objetivo de verificar a propensão à inovação das empresas de confecção têxtil de Gaspar/SC, esta pesquisa foi guiada conforme os pressupostos teóricos da inovação e adaptação do instrumento de coleta de dados do survey realizado pela PINTEC nas indústrias brasileiras. A partir da sistematização de indicadores, os resultados apresentam informações empíricas que, em contexto geral, evidenciam uma realidade na qual, as organizações constituintes da amostra deste estudo, possuem em sua trajetória setorial, significativos avanços na implementação de inovações. Todavia, ainda enfrentam diversos desafios como riscos econômicos excessivos, elevados custos para inovarem e falta de mão de obra qualificada.

As inovações introduzidas nas empresas de confecção pesquisadas predominam nos processos operacionais de manufatura, de natureza incremental, mais presentes nas suas ações de esforços para a redução do tempo e custos de produção. Assim, o aumento da capacidade produtiva foi identificado como o principal resultado obtido em decorrência das inovações. Outro fator que se destaca na elevação da eficiência inovativa dessas empresas é a aquisição de software. A gestão de processos, com o uso de inovações mais avançadas e atreladas a modernos recursos computacionais, tornou-se uma condição necessária para que organizações alcancem excelente desempenho na manufatura e produtividade. Esse resultado se compara ao observado por Lalic et al. (2019), onde a gestão de processos é uma incorporação de inovação trazida da indústria 4.0 para o segmento têxtil, mesmo que ainda em baixa escala, a partir do sistema de controle de produção quase em tempo real.

A melhor estratégia de promoção da inovação identificada no estudo ainda está focada na alocação de recursos financeiros dirigidos à atualização de máquinas e equipamentos. Suas principais fontes para inovação relacionadas às atividades de mercado, especificamente, são clientes e fornecedores, resultado corroborado pelo estudo de Giannini et al. (2019), que perceberam que as empresas buscam conhecimento externo provido pelos fornecedores, o que gera uma dependência para inovar.

A dependência de tecnologias oriundas dos fornecedores sugere que políticas públicas, voltadas para elevar a inovação no setor têxtil, devem estimular o processo de cooperação entre universidades/institutos de pesquisa, empresa e governo. Políticas de financiamento do governo poderiam promover significativamente a pesquisa e o desenvolvimento da ciência em empresas (Zhang et al., 2020). Assim, seria possível ampliar a capacidade das organizações em solucionar os problemas e obstáculos que impedem ou dificultam o processo de inovação.

Uma possibilidade de mitigar os pontos fracos e aprimorar as atividades inovativas do APL seria a elaboração coletiva de um plano de desenvolvimento setorial, que incorpore em seus objetivos, dentre outras coisas, ações para fomentar processos de cooperação voltados para P&D e propostas de qualificação dos atores que executam processos operacionais e estratégicos na cadeia produtiva têxtil. O potencial de contribuição dessa recomendação para o APL, além de fundamentar-se na realidade empírica diagnosticada neste estudo, encontra pressupostos em estudos já realizados no setor têxtil de outros países (Kazmi & Takala, 2014; Nhung & Thuy, 2018).

Além disso, a elaboração e, posteriormente, periódicas atualizações de um plano setorial podem ser viabilizadas a partir da ampliação das atividades abarcadas pelo Núcleo Têxtil de Gaspar-SC, uma vez que a referida entidade representa os interesses dos empresários do setor. Para tanto, a inserção de um observatório da inovação e competitividade do setor têxtil local, na estrutura organizacional do referido Núcleo, em parceria com outras entidades públicas e privadas, pode ser uma alternativa viável para a elaboração desse instrumento de planejamento, além de pesquisas técnicas e científicas, consultorias de apoio à tomada de decisão e realização de fóruns para debates de temas contemporâneos associados à inovação.

Por fim, ao considerar que este estudo limita-se à análise empírica das atividades de um grupo de empresários em contexto específico, não se recomenda a generalização dos resultados obtidos para a compreensão da realidade de outros APLs. Para aprofundar a análise, propõe-se a replicação do estudo com uma amostra maior de empresários, bem como em aglomerações produtivas têxteis localizadas em outras regiões, com a finalidade de promover um quadro comparativo. Figura-se, ainda, como recomendação de estudos: o mapeamento da rede de atores públicos e privados inseridos na cadeia produtiva têxtil do município de Gaspar, com o intuito de identificar os seus papéis e níveis de poder para que possam estabelecer ações em conjunto (Tambosi et al., 2020) de fomento à inovação; e, como atenção à tendência de digitalização dos processos industriais, a análise da propensão à introdução de tecnologias da smart manufacturing (Indústria 4.0) na cadeia têxtil em questão e suas contribuições para a promoção de práticas de manufatura alinhadas aos princípios da Economia Circular.

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• Classificação JEL:

  D20, L23, L26, M10, O00

• Item relacionado (hasTranslation):

  https://doi.org/10.14211/regepe.esbj.e2478

Editado por

Editor Chefe¹ ou Adjunto²:

¹ Dr. Edmundo Inácio Júnior https://orcid.org/0000-0003-0137-0778

Univ. Estadual de Campinas, UNICAMP

Editor Associado Responsável:

Dr. Cristiano Morini https://orcid.org/0000-0003-2868-3280

Univ. Estadual de Campinas, UNICAMP

Editora Executiva¹ ou Assistente²:

¹ M. Eng. Patrícia Trindade de Araújo

² Camille Guedes Melo

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Jul 2024
• Data do Fascículo
  Jan-Apr 2024

Histórico

• Recebido
  16 Set 2022
• Aceito
  01 Maio 2023
• Publicado
  20 Fev 2024