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A controvérsia da desconcentração geográfica da indústria na década de 70

The controversy over the geographical deconcentration of industry in the 1970s

RESUMO

Este artigo examina os efeitos da segmentação dos mercados de trabalho e bens sobre a dispersão de preços e salários relativos na economia brasileira. O argumento teórico baseia-se no comportamento das empresas nos setores oligopolista e competitivo da economia, por um lado, e no comportamento do trabalho organizado e não organizado, por outro. Sugerimos que as negociações entre firmas oligopolistas e trabalho organizado possam ser vistas como um jogo de soma positiva; enquanto um jogo de soma zero caracteriza a distribuição de renda na economia como um todo. Portanto, concluímos que houve uma redistribuição de renda em favor dos lucros e salários dos agentes que atuam nos setores oligopolistas, em detrimento dos outros agentes da economia.

PALAVRAS-CHAVE:
Economia regional; distribuição da força de trabalho; clusters

ABSTRACT

This paper examines the effects of the segmentation of the labour and goods markets over the dispersion of relative prices and wages in the Brazilian economy. The theoretical argument is based on the behaviour of firms in the oligopolist and competitive sectors of the economy, on the one hand, and the behaviour of organized and non-organized labour, on the other. We suggest that the negotiations between oligopolist firms and organized labour can be seen as a positive-sum game; whereas a zero-sum game characterizes the distribution of income in the economy as a whole. Hence, we conclude that there has been a redistribution of income in favour of profits and wages of those agents operating in the oligopolist sectors, in detriment of the other agents in the economy.

KEYWORDS:
Regional economics; distribution of labor force; clusters

Este comentário trata, em duas seções, não apenas da controvérsia sobre a existência, ou não, de uma incipiente desconcentração das atividades industriais na década de 70, inaugurando um processo de reversão da polarização no Brasil consistente e permanente. Trata, também, de dilemas teóricos e empíricos envolvidos com a interpretação do fenômeno da concentração das atividades econômicas e de sua importância relativa, relacionado tanto com o padrão de sistemas de cidades no Brasil como com o desenvolvimento inter-regional.

Utilizando o Método Diferencial-Estrutural discute as evidências da desconcentração industrial entre 1970 e 1980, bem como a pouca relevância que tais constatações podem ter.

DILEMAS DA ANÁLISE REGIONAL

A questão da distribuição equitativa da produção entre as regiões ou subespaços nacionais é tema dominante na Economia Regional. Assume um aspecto ético, político e social destacado. Constitui, porém, um dilema semelhante às vantagens das economias de escala e de geração e difusão tecnológicas da concentração industrial contrapostas às desvantagens na redução da concorrência e na deficiente alocação dos recursos. A concentração espacial das atividades econômicas, em termos relativos e em graus diversos, é consistente com o crescimento econômico, pois as vantagens das economias de aglomeração - resultantes das economias internas ao nível das firmas, das economias de localização intrasetorial e das economias de urbanização nos centros urbanos - tendem a superar os custos associados às atividades localizadas nas maiores cidades de uma região.

A pesquisa empírica sobre o tamanho ótimo das cidades não é conclusiva quando contrabalança os custos e os benefícios inerentes às cidades de diversos tamanhos e, particularmente, quando inclui como unidade de observação o “campo aglomerativo” ou o “entorno” das grandes cidades.

Quando se associam vantagens significativas às cidades de porte intermediário para a localização de novas atividades industriais, como na pesquisa de Boisier et alii (1973BOISIER, Sérgio; SMOLKA, Martin e BARROS, Aluízio A., (1973) Desenvolvimento Regional e Urbano: Diferenciais de Produtividade e Salários Industriais. Rio de Janeiro, Instituto de Planejamento Econômico e Social, INPES, Relatório de Pesquisa n. 15., p. 112) conclui-se pela estratégia de “desconcentração concentrada” no âmbito das políticas regionais de desenvolvimento econômico. Tolosa (1973TULOSA, Hamilton G., (1973) Macroeconomia da Urbanização Brasileira. Pesquisa e Planejamento, Rio de Janeiro, IPEA, v. 3, n. 3, pp. 585-643., p. 611), analisando o que denomina de macroeconomia da urbanização brasileira, mostra que “adotando-se uma visão parcial do modelo de tamanhos urbanos, no sentido de se considerar apenas o aspecto da geração do produto e esquecendo considerações de custo, conclui-se que as cidades se tornam economicamente mais eficientes à medida que o seu tamanho aumenta”.

Vale a pena ressaltar alguns pormenores desses estudos. No primeiro caso, os autores relacionam uma medida de produtividade expressa pela relação entre o VTI e a Ocupação e o Tamanho da População da cidade. As regressões com ajustamentos a vários tipos de curvas diferentes não mostraram ser significativas, a não ser para cidades nos estratos de 200 a 500 mil habitantes e acima de 500 mil habitantes. A partir de 200 mil habitantes a produtividade cresce a taxas crescentes e após 500 mil habitantes a taxas decrescentes. Em outro segmento do estudo, mostra-se que a variação de produtividade entre setores é maior do que entre os estados e, entre os estados, é mais pronunciada do que entre os tamanhos dos estabelecimentos. Essa verificação induz os autores a concluírem que a regionalização dos programas setoriais de cunho industrial é mais importante para uma política de desenvolvimento regional do que os programas integrados, subestimando as interdependências técnicas e as interações propiciadas por novos paradigmas tecnológicos nos micro complexos industriais, dentro das regiões, como fator de propulsão de suas economias.

O segundo estudo pressupõe que a produtividade média da mão-de-obra é função da intensidade de capital associada à tecnologia e às economias de aglomeração, o que implica em admitir-se a influência da localização na produtividade industrial. A análise é feita utilizando o conceito de “excedente” por trabalhador, que é igual ao VTI menos a Folha de Salários, do Pessoal Ocupado na Produção, por trabalhador, bem como alguns indicadores do grau de industrialização e especialização por classe de tamanho urbano.

Esses estudos relativos aos últimos anos da década de sessenta constituem um marco para as discussões mais recentes, como a elaborada por Azzoni (1986AZZONI, Carlos Roberto, (1986) Indústria e Reversão da Polarização no Brasil. São Paulo, Instituto de Pesquisas Econômicas, Universidade de São Paulo., p. 75), introduzindo o conceito de “campo aglomerativo”, complementando a ideia de Weber (1929WEBER, Alfred, (1929) Theory of the Location of Industries. Chicago: The University of Chicago Press., pp. 246-249) de “função de aglomeração” com um enfoque moderno, no qual o “transporte de ideias”, informações e inovações faz com que as vantagens locacionais dos centros urbanos de maior porte ultrapassem as suas fronteiras geográfico-administrativas e transbordem para um espaço regional mais amplo. Dentro de uma região surge, assim, a possibilidade da desconcentração industrial em um espaço mais restrito no entorno das grandes cidades, em um “campo aglomerativo” no qual as indústrias se beneficiam dos conhecimentos e inovações gerados e difundidos nessas cidades. Adicionando análises agregativas ao seu argumento e analisando as variações de produtividade, dos salários e do “excedente” nas regiões brasileiras o autor contesta a pertinência da tese da “reversão da polarização” no Brasil, na década dos 70.

Nas análises agregativas a nível regional as teorias do desenvolvimento regional podem ser dicotomizadas em teorias que advogam a tendência marcante à concentração espacial das atividades econômicas e sociais e as teorias que admitem uma desconcentração gradativa devido aos custos e desvantagens crescentes associados às grandes cidades, aos custos políticos e sociais da concentração regional e à exaustão dos recursos naturais não-renováveis, bem como aos impactos ecológicos negativos da concentração industrial.

O que importa considerar, aqui, é que essas teorias se apegam muito à análise de um “processo evolucionário” de cunho weberiano, através de um processo de periodização do desenvolvimento regional em estágios sucessivos ou de uma descrição de padrões. A passagem de um estágio para outro não contém uma elaboração complexa capaz de explicar teoricamente a interação entre os fenômenos que induzem dinamicamente as transformações necessárias para a superação de um estágio, nem explicita o tempo histórico em que tal processo ocorre. São os resultados da observação de processos temporais representados por análises empíricas inspiradas no ajustamento das observações de Kuznets (1963KUZNETS, Simon, (1963) Quantitative Aspects of the Economic Growth of Nations: II - Industrial Distribution of National Product and Labor Force. Economic Development and Cultural Change, Suplemento ao v. 5, n. 4, pp. 3-11.), nos quais a relação entre desenvolvimento econômico e desigualdade na distribuição de renda toma a forma de um U invertido.

Inspirado nas contribuições de Kuznets, Williamson (1965WILLIAMSON, J.G., (1965) Regional Inequality and the Process of National Development: A Description of the Patterns. Regional Analysis (edited by Needleman), Londres, Penguin Modem Economics, pp. 99-158.) realiza testes empíricos sobre a redução das desigualdades regionais em vários países, por meio de séries temporais e análises de seções cruzadas. Estabelece, então, um padrão de redução das desigualdades inter-regionais de renda em forma de sino, no qual essas desigualdades diminuem com o crescimento da economia nacional.

Williamson, como Kuznets o fez para as economias nacionais, explica as causas da convergência das rendas per capita inter-regionais, por meio da descrição de padrões históricos agregados e propõe um índice para medir as desigualdades regionais de renda e observar a sua evolução em diversos estágios da economia nacional. Esse índice foi utilizado no Brasil por vários pesquisadores, como veremos.

Quer seja tomando como unidade de observação os centros urbanos, quer seja considerando subespaços nacionais mais abrangentes constituindo regiões, as contribuições teóricas e os testes empíricos têm dificuldade em precisar as relações em termos de estoques e fluxos, em termos estáticos (participações relativas) e dinâmicos (taxas de crescimento) capazes de permitir um entendimento maior das possibilidades da desconcentração geográfica das atividades humanas.

Um entendimento profundo das causas da desconcentração espacial seria necessário para estabelecer graus e patamares consistentes e que diferenciassem a distribuição das atividades econômicas próximas dos locais de concentração de uma dispersão geográfica acentuada e equitativa do ponto de vista político, econômico e social. Além disso, tal entendimento teria que permitir diferenciar-se uma situação duradoura na qual as regiões periféricas tenham uma competitividade efetiva e eficiência produtiva, de uma situação instável e passageira: mais do que uma curva em U invertido, presenciamos curvas em S deitado, que retratam a instabilidade das economias regionais mais pobres e dependentes, de tal forma que não se observa uma reversão duradoura da polarização.

Jeffrey Sachs (1988SACHS, Jeffrey, (1988) Políticas Comercial e Cambial em Programas de Ajustamento Voltados para o Crescimento. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 8, n. 2, pp. 21-48., p. 32) ressalta o conflito entre liberalização e estabilização nas economias endividadas. Mas ocorre, também, um conflito entre liberalização e equalização espacial nas economias de mercado que visam à competição no âmbito internacional, partindo de um estado inicial de profundas desigualdades sociais e regionais, pois as circunstâncias privilegiam a concentração espacial. As atividades exportadoras mais eficientes se encontram, em geral, nas regiões mais desenvolvidas.

As análises agregativas das disparidades regionais de renda, inspiradas nas contribuições de Williamson e aplicadas ao Brasil se desenvolveram a partir dos estudos pioneiros de Haddad e Andrade (1974HADDAD, Paulo Roberto e ANDRADE, Thompson A., (1974) Política Fiscal e Desequilíbrios Regionais. Estudos Econômicos, São Paulo, Instituto de Pesquisas Econômicas, v. 4, n. 1, pp. 7-54.) e de Albuquerque e Cavalcanti (1976ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti e Cavalcanti, Clóvis de Vasconcelos, (1976) Desenvolvimento Regional no Brasil, Brasília, Instituto de Planejamento Econômico e Social - IPEA/IPLAN, pp. 29-50.). Ocorreu no país um período de acentuada convergência da Renda Interna Regional, per capita, na década de 50 e acusada nos índices denominados de Vw, que variam de zero (distribuição espacial equitativa) até a unidade. Tais índices decrescem continuamente no período e depois se estabilizam a partir do início da década de 60. Surge, então, a polêmica em torno da interpretação dos índices e da pertinência do fenômeno da concentração das rendas regionais internas per capita, Parte da convergência de rendas deveu-se às reduções das disparidades intrarregionais e das migrações internas, principalmente nos momentos de grandes secas no Nordeste, como em 1952 e 1958. Uma outra parcela decorre da própria queda da produção no Sudeste. Estes dois tipos de “convergência” demonstram a relatividade dos indicadores de desigualdades regionais de renda. Além do mais, os índices não são invariantes com relação à forma de agregação ou de divisão do espaço nacional, em regiões. Outrossim, a variável “Renda Interna Bruta” não discrimina a renda líquida enviada de uma região para a outra, o que pode distorcer significativamente os resultados encontrados.

Esta é uma discussão encontradiça na literatura sobre desequilíbrios regionais no Brasil. A falta de uma conceituação e teorização maior sobre o significado e a importância da dinâmica da distribuição espacial das atividades econômicas e sociais e das próprias consequências sobre o desenvolvimento regional das políticas macroeconômicas deixam o tema transitar por uma larga faixa de ambiguidades. Afinal, o que conta são as melhoras efetivas nas condições de vida da população das diversas regiões, em termos absolutos. Contudo, os indicadores sociodemográficos nesses períodos de análise, como mortalidade infantil, esperança de vida ao nascer, alfabetização, entre outros, não melhoraram nas regiões periféricas.

O que se quer concluir é que o tema da concentração versus convergência das rendas regionais carece de precisão conceituai. Do ponto de vista empírico, Locatelli (1988LOCATELLI, Ronaldo Lamounier, (1988) Crescimento e Desigualdade: Uma Resenha Crítica (artigo resenha). Revista de Economia Política, v. 8, n. 2, pp. 109-117.) em artigo-resenha sobre crescimento e desigualdade conclui que “as evidências empíricas avaliadas ... embora passíveis de alguma restrição por se basearem em dados incompletos, não favorecem a proposição de que crescimento e igualdade constituem objetivos conflitantes”. Por outro lado, a nível espacial, se não se demonstra a inevitabilidade das desigualdades regionais de renda tem-se como evidência a resistência do “espaço construído” em ceder lugar ao desenvolvimento competitivo a outras regiões e a depreciação de sua infraestrutura e posição hegemônica.

ANÁLISE DE “SHIFT-SHARE” E A DESCONCENTRAÇÃO INDUSTRIAL NO BRASIL NA DÉCADA DE 70

A comparação entre os Censos Industriais do IBGE dos anos de 1970 e 1980 revela uma incipiente desconcentração da Produção Industrial global e por gênero de indústria, no Brasil. Conforme os comentários feitos na seção anterior, contudo, uma mudança na participação relativa da produção industrial entre os diversos estados da federação e com a diminuição da participação do estado de São Paulo não caracteriza por si só uma melhor distribuição das atividades industriais ou mesmo uma melhoria do desempenho econômico e social das diversas regiões do país.

Azzoni (1986AZZONI, Carlos Roberto, (1986) Indústria e Reversão da Polarização no Brasil. São Paulo, Instituto de Pesquisas Econômicas, Universidade de São Paulo.) mostra, por exemplo, que a comparação entre os índices de produtividade, salários e excedente dos estados da federação nos anos de 1970, 1975 e 1980 não autoriza concluir-se sobre a reversão da polarização na década de 70.

Nesta seção vamos utilizar o Método Diferencial-Estrutural (Shift-Share), em uma variante apresentada por Curbelo (1984CURBELO, José L., (1984) Structural Productive Changes in the Spanish Regional System: A Shift and Share Analysys, Berkeley, USA.) e aplicado à Espanha, para analisar a desconcentração industrial entre 1970 e 1980.

De uma forma simples este método estabelece que a variação no emprego de um gênero industrial i em uma região j pode ser explicado por três componentes, a saber: a variação do emprego a nível nacional; a composição industrial da região j (industrial mix); o componente residual. A variação do emprego do gênero industrial i na região j pode, então, ser expressa pela seguinte identidade:

E j j = E N j j + I M i j + C R j j (1)

Vale a pena discriminar um pouco mais tais componentes. O primeiro representa a parcela do crescimento do gênero industrial i na região j que teria ocorrido se ele tivesse crescido na mesma proporção que a indústria, em nível nacional. Analisa se a variação regional é maior ou menor do que a variação média nacional e dá uma visão estática da estrutura da região em relação à nacional. Os dois outros componentes permitem a análise diferencial: distinguem características peculiares de cada região. O segundo componente representa a parcela atribuída à variação do emprego no gênero i na região j devido à sua composição industrial, ou seja, devido ao fato de que em nível nacional alguns gêneros industriais crescem mais do que outros, de tal modo que as regiões que se especializam nos gêneros industriais que mais crescem nacionalmente são beneficiadas, pelo seu industrial mix. O terceiro componente procura captar fatores diversos que induzem variações no emprego regional, particularmente devido à sua localização, acesso aos mercados de matérias-primas e outros insumos e aos mercados de produtos, aos efeitos das políticas governamentais de desenvolvimento regional, enfim da competitividade regional. Se o componente de composição industrial pode ser afetado por mudanças tecnológicas, pela introdução de novos produtos etc., o componente residual não é capaz de determinar a eficiência econômica das atividades regionais. Desse modo, uma região que mostre uma variação positiva de CRU e, portanto, competitividade com outras regiões, pode ter florescido com atividades economicamente ineficientes (nascidas, até mesmo, sob a égide de políticas de desenvolvimento regional excessivamente protecionistas), cujo desempenho a prazos mais longos fica comprometido.

Como o método não considera mudanças na estrutura do emprego das regiões no período de observação, Stilwell (1969STILWELL, F.J.B., (1969) Regional Growth and Structural Adaptation. Urban Studies, v. 6, pp. 162-178.) propôs que se acrescentasse ao método original uma Variação Proporcional Revertida (V) que levasse em conta as mudanças que poderiam ter ocorrido na estrutura industrial. Este componente se assemelha ao segundo componente acima referido - IM ij - mas revertido, ou seja, avalia as variações ocorridas nos gêneros industriais das regiões tomando a variação do emprego do fim do período de análise com relação às taxas de crescimento revertidas. A variação do emprego do setor i na região t. neste caso, assume a seguinte expressão de uma identidade:

E i j E N i j + I M i j + M I M i j + M C R i j (2)

onde MIM ij e MCR ij são as variações dos componentes diferenciais ‘’Composição Industrial” e o Componente Residual, agora modificados. Os valores positivos desses componentes significam que houve melhoria na estrutura industrial da região. Considerando todos os n gêneros industriais da região j, as expressões (1) e (2) devem, então, ser escritas da seguinte forma:1 1 Consideremos o início e fim de um período, como O e T, de variação do emprego regional no gênero industrial i na região j. Seja N o emprego total na indústria nacional e R o emprego regional. Então: E N i j = R i O N T / N O - 1 ; I M i j = R i O N i T / N i O - N T / N O ; C R i j = R i O R i T / R i O - N i T / N i T ; V = R i T N O / N T - N i O / N i T ; M I M i j = V - I M i j ; M C R = C R i j - M I M i j Com essas definições é possível demonstrar que as expressões (1), (2), (3) e (4) são identidades que se resumem na diferença entre o emprego regional em todos os gêneros da indústria no momento final T e o emprego no momento inicial 0.

i = 1 n E i j i = 1 n E N i j + i = 1 n I M i j + i = 1 n C R i j (3)

i = 1 n E i j i = 1 n E N i j + i = 1 n I M i j + i = 1 n M I M i j + i = 1 n M C R i j (4)

Com todas as informações do Pessoal Ocupado por Gênero de Indústria dos Censos Industriais do IBGE e do total da indústria nas grandes regiões para os anos de 1970, 1975 e 1980, e com as adaptações necessárias para compatibilizar os gêneros industriais considerados nestes três Censos, é possível calcular os componentes do método nas expressões (3) e (4). Pode-se, alternativamente, utilizar a Produção Industrial (VTI) como variável, ao invés do emprego. Aqui se visa a trabalhar com um indicador que mostre o desempenho regional em termos econômicos e de absorção de mão-de-obra.

A Tabela 1, a seguir, resume os resultados obtidos.

Tabela 1:
Síntese dos Resultados da Análise Diferencial-Estrutural para os Setores Industriais de Grandes Regiões, nos períodos de 1970 a 1975 e 1975 a 1980

Os resultados indicam que na década de 70 o Sudeste perdeu posição competitiva (valores negativos para o componente residual). Isto é, em parte, o resultado da gradativa desaceleração do crescimento da economia nacional na década e da queda da Produtividade Média do Trabalho (Calabi e Luque, 1985CALABI, Andréa Sandro e LUQUE, Carlos Antônio, (1985) Os Ciclos de Expansão Industrial e seus Impactos, São Paulo: NOBEL’Ministério do Trabalho., pp. 49-55), que afetaram profundamente o centro industrial mais importante do País, localizado no Sudeste. Por outro lado, a política de incentivo ao Nordeste, expressa no artigo FINOR 34/18, implantada em 1962, passa a ser dinamizada nos anos de 1974/1975. Nota-se que as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste mantêm uma composição industrial desfavorável (valores negativos para IMii), em relação às demais regiões do País. Contudo, suas estruturas industriais melhoraram, relativamente. Os efeitos das políticas regionais de desenvolvimento econômico, vantagens locacionais resultantes da dotação relativa de recursos naturais e ganhos de produtividade, possibilitaram maior competitividade dessas regiões. A região Sul, por outro lado, manteve sua posição relativa, mas teve um declínio na estrutura de sua composição industrial.

A conclusão de tais resultados agregativos em nível de grandes regiões é que eles apontam na direção de relativa melhoria na posição das regiões menos desenvolvidas do País.

As perdas econômicas que atingiram a nação, ao longo da década de 70, reduziram o dinamismo do parque industrial concentrado na região Sudeste e foram, em parte, compensadas por componentes do tipo residual (como demonstram os valores negativos de !Mii’ contrabalançados pelos valores positivos de CRu,MIMu e MCR;) para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Do lado da oferta de bens, a década de 70 presencia uma desconcentração na produção industrial.

Azzoni (1986AZZONI, Carlos Roberto, (1986) Indústria e Reversão da Polarização no Brasil. São Paulo, Instituto de Pesquisas Econômicas, Universidade de São Paulo., pp. 47-70) mostra uma queda nos índices de produtividade média da mão-de-obra no estado de São Paulo entre 1970 e 1980; mantém-se, contudo, a sua preeminência. O índice de produtividade continua alto, embora, passe de 1,12 para 1,05, perdendo apenas para os estados da Bahia (1,25) e do Paraná (1,09). A queda do índice de produtividade, porém, é mais acentuada em São Paulo do que na grande maioria dos demais estados. Além do mais, no Paraná, em Santa Catarina, em Pernambuco e na Bahia os índices aumentaram entre 1970 e 1980. Aliás, esta verificação na Bahia e em Pernambuco está associada à concentração intrarregional do desenvolvimento econômico do Nordeste.

À luz dos comentários da seção anterior, todavia, qual o sentido dessas verificações no que concerne à melhoria das condições de vida nas regiões periféricas e qual a sustentação do crescimento dessas regiões em prazos mais longos?

Na verdade, a evidência de diferenciais de crescimento econômico inter-regional e de reversão da polarização é destituída de maior importância, a não ser que se admitam os pressupostos da Teoria da Dominação. E mais: os diferenciais encontrados são destituídos de importância, a menos que se precisem os graus de diferenciação relevantes, suas consequências políticas e sociais e as perspectivas de crescimento estável das regiões periféricas.

Não é nosso propósito neste comentário refletir sobre tais considerações, mas delimitar as conclusões da incipiente desconcentração das atividades industriais na década de 70, em um intervalo restrito.

A menos que se demonstre um efeito decisivo e negativo da polarização econômica, política e social das regiões mais ricas sobre as demais ou, de acordo com a Teoria da Dominação, a supremacia dos fatores ‘’extrativos” sobre os “distributivos’’, a verificação relevante da incipiente desconcentração das atividades industriais entre 1970 e 1980 é a da possibilidade de promover o desenvolvimento relativo das regiões periféricas induzido pela industrialização.

Por outro lado, a competitividade regional e as perspectivas de desenvolvimento de uma região ficam condicionadas à eficiência econômica e à capacidade de desenvolvimento com relativa autonomia, o que não é captado nem demonstrado no Método da Análise Diferencial-Estrutural.

Enfim, o que cumpre ser demonstrado são as possibilidades e potencialidades do desenvolvimento regional condicionadas ao “entorno paramétrico” imposto pelos limites do desenvolvimento econômico nacional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • WILLIAMSON, J.G., (1965) Regional Inequality and the Process of National Development: A Description of the Patterns. Regional Analysis (edited by Needleman), Londres, Penguin Modem Economics, pp. 99-158.
  • 1
    Consideremos o início e fim de um período, como O e T, de variação do emprego regional no gênero industrial i na região j. Seja N o emprego total na indústria nacional e R o emprego regional. Então:
    E N i j = R i O N T / N O - 1 ; I M i j = R i O N i T / N i O - N T / N O ; C R i j = R i O R i T / R i O - N i T / N i T ; V = R i T N O / N T - N i O / N i T ; M I M i j = V - I M i j ; M C R = C R i j - M I M i j
    Com essas definições é possível demonstrar que as expressões (1), (2), (3) e (4) são identidades que se resumem na diferença entre o emprego regional em todos os gêneros da indústria no momento final T e o emprego no momento inicial 0.
  • 2
    JEL Classification: R12; R11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 1991
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