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Tendência de queda nos preços reais de insumos agrícolas

Downward trend in real agricultural input prices

RESUMO

Este artigo trata da redução de preços na agricultura tentando entender sua relação com os preços dos insumos. Entendemos que mesmo com a redução dos preços finais, a igualmente importante redução nos preços dos insumos atuou para amenizar as perdas e pode ajudar a agricultura a retomar a produtividade.

PALAVRAS-CHAVE:
Preços agrícolas; produtividade

ABSTRACT

This paper deals with the reduction of prices in agriculture trying to make sense of their relation to inputs’ prices. We understand that even with the reduction in final prices, the equally important reduction in inputs prices acted to soften the losses and may help agriculture to regain productivity.

KEYWORDS:
Agricultural prices; productivity

É plenamente sabido que a segunda metade da década passada foi caracterizada como bastante desfavorável aos preços agrícolas em termos reais. Além das adversidades do mercado internacional, dois fatores internos contribuíram para isso: a) o processo de forte aceleração inflacionária e b) a expressiva valorização do cruzeiro.1 1 Homem de Melo, F. “O Crescimento Agrícola Brasileiro dos Anos 80 e as Perspectivas para os Anos 90”. Revista de Economia Política 10 (3): 22-30, 1990.

Ao se concentrar a análise nos preços reais recebidos pelos produtores, entretanto, deixou-se de lado o exame de outra importante variável: a relação de trocas. Esta é a relação entre os preços recebidos pelos agricultores na venda dos produtos e os preços por eles pagos pelos insumos. É a variável mais relevante às decisões dos produtores.

Este artigo analisará um importante evento dos anos 80 e iniciais na década de 90, ou seja, a ocorrência de significativa queda nos preços reais de insumos agrícolas. Esse evento, ao afetar favoravelmente a relação de trocas, atenuou um pouco a crise da década passada e abriu excelentes perspectivas para a agricultura nos próximos anos.

I. A TENDÊNCIA DE REDUÇÃO DOS PREÇOS DE INSUMOS DURANTE 1977/90

Para o exame do comportamento dos preços de insumos pagos pelos agricultores, elaboramos, com os dados básicos do Departamento de Economia Rural - DERAL - da Secretaria da Agricultura do Paraná, um índice nacional de preços pagos (pelos agricultores) por insumos agrícolas, isto é, utilizando fatores de ponderação para o Brasil. Essa série cobriu o período de janeiro de 1978 até o presente. Do mesmo modo, estimamos um índice nacional de preços recebidos pelos produtores de quinze produtos (vegetais e animais).

Utilizando o IGP-DI como deflator, chegamos aos índices de preços reais dos produtos (PRR) e dos insumos agrícolas (PIR). A relação de trocas (RT) é uma variável que resulta dessas duas primeiras, do seguinte modo:

R T = P R R P I R

Em consequência, quando essas variáveis são expressas na forma de taxas de crescimento (ao ano), temos a seguinte expressão:

R T = P R R - P I R

onde os pontos indicam as variáveis expressas como taxas de crescimento (positivas ou negativas).

A Tabela 1 mostra os resultados de nossa análise estatística para essas três variáveis na forma de suas taxas de crescimento durante o período 1977/89, trabalhando-se com os dados em médias anuais. Ela mostra os resultados para quinze produtos e o seu total ponderado. Iniciemos por este último:

  • PRR=-3,37% ao ano

  • PIR=-2,01 ao ano

  • RT=-1,37% ao ano

Tabela 1
Taxas Anuais Médias de Variação dos Preços Reais Recebidos, das Relações de Troca e dos Preços Reais de Insumos, 1977/B9 (% ao Ano)

Houve, portanto, uma redução anual média de 2,01% no preço real dos insumos agrícolas (o agregado de fertilizantes, defensivos, calcáreo, combustíveis etc.). Isso significou uma diminuição de 23,2% no período como um todo. Essa tendência de queda está mostrada no Gráfico 1. Isso, em grande parte, aliviou a redução dos preços reais recebidos - -3,37% ao ano, de modo que a queda da relação de trocas ficou sendo bem menor: - 1,37% ao ano.

Gráfico 1
Evolução do Índice de Preços Reais de Insumos Agrícolas no Brasil, 1977/90 (1977=100)

Sem dúvida, a situação da agricultura foi difícil naquele período, especialmente na segunda metade dos anos 80. Todavia, a redução no índice de preços reais dos insumos agrícolas tornou a crise agrícola mais administrável.2 2 Alguns autores já destacaram esses pontos. Entre eles, Rezende, G. C., “A Agricultura e Ajuste Externo no Brasil: Novas Considerações”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 19(3): 553-78, 1989; e Gasquez, J. G. e C. M. Villa Verde, “Crescimento da Agricultura Brasileira e Política Agrícola nos Anos 80”, Texto para Discussão n 204, IPEA, Brasília, novembro de 1990. Em alguns casos - feijão, milho e bovinos - a redução nos preços dos insumos mais que compensou a diminuição nos preços dos produtos, de modo a provocar melhorias das respectivas relações de trocas, o que, radicalmente altera a questão de seus incentivos.

Excetuando-se algodão e batata, os demais treze produtos, vegetais e animais, tiveram diminuições nos preços dos insumos utilizados em suas respectivas produções. Isso, certamente, dá um respaldo maior aos resultados obtidos. As reduções mais pronunciadas nos preços de insumos ocorreram para feijão, milho, amendoim, café, bovinos, soja e arroz.

De outro lado, a Tabela 2 mostra a evolução, durante 1977/1990, dos índices de preços reais dos principais insumos, agora incluindo máquinas agrícolas. Para fertilizantes e defensivos, a redução de preços reais foi bastante pronunciada. Apenas o grupo “máquinas agrícolas” é que teve aumento de preços reais a partir de 1988. Para combustíveis, a redução ocorreu a partir de 1984. O caso das máquinas agrícolas teve a influência predominante da maior tributação, via ICMS.

Tabela 2
Evolução dos Índices de Preços Reais de Insumos Agrícolas no Brasil, 1977/90 (1977=100)

É possível perceber, tanto no Gráfico 1 como na Tabela 2, que as reduções mais pronunciadas nos preços reais dos insumos ocorreram na segunda metade dos anos 80. Nesse contexto, as seguintes variáveis explicativas podem ser mencionadas:

  1. Menor preço do petróleo;

  2. Valorização do cruzeiro;

  3. Menores tarifas na importação;

  4. Maior eficiência das e competição entre as empresas, com uma fraca demanda da agricultura;

  5. Maior tributação, via ICMS, uma variável com efeito contrário às demais.

II. A MAIS RECENTE TENDÊNCIA DE REDUÇÃO DE PREÇOS DE INSUMOS

Questão ainda mais importante para a agricultura é a existência (ou não) de uma mais recente tendência de queda nos preços dos insumos e sua continuidade nos próximos meses e anos. Utilizando as médias mensais do índice de preços de. insumos do período abril de 1988 - setembro de 1990, obtivemos as seguintes variações acumuladas (estimadas estatisticamente), em ordem decrescente dos produtos constantes do índice:

Leite -42,4% Frango -41,7% Ovos -40,2% Suínos -37,8% Milho -30,8% Soja -27,8% Trigo -27,4% Arroz -25,4% Algodão -25,4% Bovinos -24,7% Feijão -19,5% Mandioca -18,0% Café -14,2% Amendoim -9,6% Batata -7,8% ÍNDICE TOTAL -26,5% ÍNDICE ANIMAIS -34,5%

Os trinta meses anteriores a outubro de 1990 registraram, portanto, expressiva redução nos preços reais dos insumos agrícolas, novamente sendo um fator de alívio à crise experimentada pelo setor agrícola, com destaque para os insumos na produção animal. Duas variáveis podem explicar essa mais recente queda: a) o aprofundamento da defasagem cambial e b) o início do processo de redução das tarifas de importação, ainda no governo Sarney, principalmente no caso de fertilizantes.

O Gráfico 2, por sua vez, mostra a evolução desse mesmo índice nacional de preços reais de insumos agrícolas para o período de janeiro de 1988 a março de 1991. Já está incluído, portanto, o período do governo Collor, que iniciou um processo mais abrangente e profundo de redução das tarifas de importação. A redução dos preços reais de insumos é muito clara nesse Gráfico 2.

Gráfico 2
Evolução do Índice de Preços Reais de Insumos Agrícolas no Brasil, 1/1988 - 3/1991 (1977=100)

Entre os primeiros trimestres de 1988 e de 1991, a redução foi de 20,9%, o que é muito expressivo. Importante, também, a redução ocorrida a partir de março de 1990, mês que correspondeu ao mais alto nível da defasagem cambial. Entre março de 1990 e janeiro de 1991, enquanto o cruzeiro teve uma desvalorização real de 44,7% (deflator, IGP-DI), o índice agregado de preços reais de insumos diminuiu 13,4%.

Isto significa que outros fatores, inclusive o prosseguimento da redução das tarifas de importação, foram capazes de compensar o efeito de alta das desvalorizações reais do cruzeiro e indica que os preços reais mais baixos dos insumos deverão continuar. Duas razões fortalecem essa conclusão: a) a redução das tarifas de importação de insumos, inclusive máquinas, continuará até 1994; b) no final de abril último, o governo de São Paulo diferiu o ICMS sobre insumos agrícolas, no que foi seguido por outros Estados. Entre os demais Estados, destacamos a isenção dada pelo Rio Grande do Sul para máquinas agrícolas.

Como resultado, a agricultura está tendo e deverá continuar a ter melhoria significativa de sua relação de trocas. De um lado, pela elevação dos preços reais recebidos na comercialização de seus produtos. De outro, pela redução de preços reais dos insumos comprados do setor agroindustrial. Em consequência, o aumento da produtividade agrícola será estimulado e a rentabilidade do setor será incrementada. Esta é uma favorável perspectiva neste início de década.

  • 1
    Homem de Melo, F. “O Crescimento Agrícola Brasileiro dos Anos 80 e as Perspectivas para os Anos 90”. Revista de Economia Política 10 (3): 22-30, 1990.
  • 2
    Alguns autores já destacaram esses pontos. Entre eles, Rezende, G. C., “A Agricultura e Ajuste Externo no Brasil: Novas Considerações”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 19(3): 553-78, 1989; e Gasquez, J. G. e C. M. Villa Verde, “Crescimento da Agricultura Brasileira e Política Agrícola nos Anos 80”, Texto para Discussão n 204, IPEA, Brasília, novembro de 1990.
  • JEL Classification: Q11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 1992
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