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Ocupar, resistir e produzir: famílias assentadas e feiras agroecológicas na Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil

Occupy, resist and produce: settled families and agroecological markets in the metropolitan region of Porto Alegre

Resumos

Resumo

Apesar de favorecidas pela proximidade em relação ao principal mercado consumidor do estado, as famílias assentadas da Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) vivem os mesmos dilemas e desafios dos diversos assentamentos de reforma agrária do Brasil. A produção agroecológica de legumes e verduras tem sido o caminho adotado pelos assentados para atender às necessidades de consumidores identificados com a qualidade do produto, mas também com os princípios éticos que regem essa forma de produzir. Este artigo é resultado de uma pesquisa que envolveu a realização de 57 entrevistas em profundidade. O objetivo central foi examinar as estratégias de reprodução social das famílias com ênfase nas relações estabelecidas no âmbito das feiras agroecológicas da RMPA. Pudemos comprovar que essa forma de comercialização direta assume um papel transcendental na vida dos assentados. A relação de confiança construída com os consumidores é um dos fatores de êxito. As famílias que operam nessas feiras são agentes ativos nessa dinâmica, enxergando-se como sujeitos dos processos de produção e comercialização. Os achados da pesquisa convergem para a chamada abordagem “food as a common”, que visa recuperar o valor dos produtos agroalimentares como um elemento essencial da vida e não como uma simples mercadoria.

Palavras-chave:
assentamentos da reforma agrária; redes agroalimentares alternativas; agricultura familiar; canais curtos de comercialização


Abstract

Despite being favored by their proximity to the state's main consumer market, families settled in the Metropolitan Region of Porto Alegre (RMPA) experience the same dilemmas and challenges as the various agrarian reform settlements in Brazil. The agroecological production of vegetables has been the path adopted by the settlers to meet the needs of consumers identified with the quality of the product, but also with the ethical principles that govern this way of producing. This article is the result of research that involved conducting 56 in-depth interviews. The central objective was to examine families' social reproduction strategies with an emphasis on relationships established within the scope of RMPA's agroecological fairs. We were able to prove that this form of direct marketing plays a transcendental role in the lives of the settlers. The relationship of trust built with consumers is one of the success factors. The families that operate in these fairs are active agents in this process, seeing themselves as subjects of the production and commercialization processes. The research findings converge on the so-called “food as a common” approach, which aims to recover the value of agri-food products as an essential element of life and not as a simple commodity.

Keywords:
agrarian reform settlements; alternative agri-food networks; family farming; short marketing channels


1 Introdução

A última edição do Atlas da Obesidade publicado pela World Obesity Federation (2023)World Obesity Federation – WOF. (2023). World Obesity Atlas. London. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://data.worldobesity.org/publications/?cat=19
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mostra um quadro deveras preocupante. Essa doença atinge, atualmente, 22,4% da população brasileira. Em 2035, segundo a mesma fonte, 41% dos brasileiros e brasileiras farão parte dessa infeliz estatística. A taxa estimada de crescimento anual de adultos obesos é considerada alta (2,8%), mas entre as crianças ela alcança um nível (4,4%) ainda mais elevado. Destarte, os gastos com essa enfermidade alcançariam R$ 100 bilhões em 2035, o que equivale a aproximadamente 3% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil para fazer frente a outras doenças a ela associadas.

São bastante conhecidas as causas que produzem a obesidade, que está particularmente ligada ao consumo crescente de produtos ultraprocessados, hipercalóricos e de baixo valor nutricional, sobretudo entre as camadas da população de baixa renda. Para Méndez & García (2014, pMéndez, C. D., & García, I. E. (2014). La mirada sociológica hacia la alimentación: análisis crítico del desarrollo de la investigación en el campo alimentario. Política y Sociedad, 51(1), 15-49.. 15), “a obesidade é a manifestação moderna da pobreza”. Nesses termos, os pobres acabam por consumir o que está ao alcance de seus parcos ingressos econômicos, artigos cuja ingestão invariavelmente depõe contra a própria saúde. Soma-se a isso os recorrentes escândalos, sobretudo os que resultam da contaminação dos produtos agroalimentares durante o processo de elaboração e manipulação e que desatam enorme incerteza na população. Nesse contexto, os últimos quarenta anos

[...] han sido pródigos en escándalos agroalimentarios que estallaron en distintos lugares del mundo. En el rosario incontable de episodios constan la crisis de las dioxinas en Bélgica, la de la carne radiactiva en Japón, la de la hamburguesa con carne de caballo en el Reino Unido, la contaminación por Escherichia coli en Alemania, la síndrome de las vacas locas (encefalopatía espongiforme bovina-BSE), las gripes aviaria y porcina o mismo el caso del aceite de colza que se tradujo en la muerte de más de un millar de personas en España. También en Brasil sobran ejemplos ilustrativos, como el caso de las adulteraciones de leche UHT, del achocolatado infantil Toddynho y una sucesión de eventos relacionados con la «Operación Carne Flaca», dentro de una acción llevada a cabo por la Policía Federal en 2019. Además de esto, según datos de la Vigilancia Sanitaria, el 19,7% de los productos hortofrutícolas comercializados en Brasil contiene agrotóxicos en situación irregular (Sacco dos Anjos et al., 2020, pSacco dos Anjos, F., Menezes, G. R., Pollnow, G. E., & Caldas, N. V. (2020). ¿Son los productos orgánicos más caros? Estudio comparativo de los precios hortofrutícolas en distintos canales de comercialización de Pelotas, Brasil. Agroalimentaria, 26(51), 53-70. http://doi.org/10.53766/Agroalim/2021.26.51.04
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. 55, destacado no original).

Em larga medida, eis aí algumas das chaves que nos permitem entender o aumento da ansiedade vivida pelos comedores, como bem definiu Poulain (2013)Poulain, J. (2013). Sociologias da alimentação: os comedores e o espaço social alimentar. Florianópolis: Editora da UFSC. http://doi.org/10.3917/puf.poul.2013.01.
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. Surge, assim mais uma faceta, através da qual é possível perceber a “sociedade de risco” descrita por Ulrich Beck (2010)Beck, U. (2010). Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34.. Mais do que nunca cresce o entendimento de que o ato de comer vai muito além da mera satisfação de necessidades biológicas. Há muitas coisas em jogo. Nesse contexto, cumpre destacar que:

Propondo produtos cada vez mais perto do estado de consumo, a indústria ataca a função socializadora da cozinha, sem, no entanto, chegar a assumi-la. Assim, o alimento é visto pelo consumidor como “sem identidade”, “sem qualidade simbólica”, como “anônimo”, “sem alma”, “saído de um local industrializado não identificado”, numa palavra, dessocializado (Poulain, 2013, pPoulain, J. (2013). Sociologias da alimentação: os comedores e o espaço social alimentar. Florianópolis: Editora da UFSC. http://doi.org/10.3917/puf.poul.2013.01.
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. 47, aspas no original, grifos nossos).

As preocupações em torno ao ato alimentar se expressam no momento de adquirir os produtos, de conhecer sua procedência, mas também o modo como foram obtidos. Por conta disso, cresce o consumo de produtos orgânicos, bem como as atenções das grandes superfícies de varejo em disponibilizar tais artigos aos seus consumidores. Essa é uma das conclusões que aponta o “Panorama do consumo de orgânicos no Brasil”, segundo o qual uma parcela (46%) relevante da população do país consome alimentos orgânicos. Além disso, no curto intervalo de tempo compreendido entre 2021 e 2023 houve um incremento de 16% no consumo de orgânicos no país (Associação de Promoção dos Orgânicos, 2023Associação de Promoção dos Orgânicos – Organis. (2023). Panorama do consumo de orgânicos no Brasil. Curitiba. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://organis.org.br/pesquisa-consumidor-organico-2023/
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). Possivelmente seja este um reflexo dos anseios da população no sentido de comer produtos saudáveis e que não contenham traços de agrotóxicos.

Para alguns autores, a exemplo de Fonte (2010), aFonte, M. (2010). Food relocalisation and knowledge: dynamics for sustainability in rural areas. In M. Fonte & A. G. Papadopoulos (Eds.), Naming food after places: food relocalisation and knowledge dynamics in rural development (pp. 1-35). Aldershot: Ashgate Publishing. linha que separa o produto convencional e o produto alternativo (obtido sem o uso de agroquímicos e de sementes transgênicas) acaba ficando tênue, dado que ambos trafegam dentro de um mesmo espaço econômico, regido, de modo hegemônico, pelos grandes “impérios agroalimentares” (Ploeg, 2008Ploeg, J. D. (2008). Camponeses e impérios alimentares: lutas por autonomia e sustentabilidade na era da globalização. Porto Alegre: Editora da UFRGS.). Com efeito, os caminhos por onde transitam os artigos da agricultura orgânica assumem características idênticas aos circuitos mercantis convencionais. É isso que Goldberger (2011)Goldberger, J. R. (2011). Conventionalization, civic engagement, and the sustainability of organic agriculture. Journal of Rural Studies, 27(3), 288-296. http://doi.org/10.1016/j.jrurstud.2011.03.002
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denomina “convencionalização” da produção orgânica. Nesse caso, a produção orgânica seria tão somente uma resposta mercadológica às necessidades de consumidores mais exigentes, de maior poder aquisitivo e cada vez mais ansiosos, como aludido anteriormente.

Na atual conjuntura há uma pressão ostensiva (via publicidade) em favor do consumo de alimentos de preparo rápido, setor esse amplamente dominado por grandes corporações que coordenam a disponibilização de produtos alimentícios para a população. Constata-se, assim, uma homogeneização progressiva da cultura alimentar em âmbito global (Niederle & Wesz Junior, 2018). Como resultado desse fenômeno, impõe-se uma tendência à marginalização dos produtos regionais e desvalorização da produção local, sobretudo quando nos atemos ao caso das populações de baixa renda, que acabam preferindo alimentos mais acessíveis e de baixa qualidade.

As atividades relacionadas à agricultura familiar passam também por profundas transformações, uma vez que uma parcela crescente das famílias opta por se integrar à produção de commodities agrícolas pelas facilidades advindas da proteção e dos incentivos do Estado (crédito, subvenções etc.). Isso se deve, em grande medida, à existência de uma sólida infraestrutura de fornecimento de insumos e distribuição de produtos que viabilizam o transporte eficiente tanto no caso de insumos quanto das safras para destinos globais.

Nesse contexto, estudos como o de Altieri (2009) e oAltieri, M. A. (2009). Agroecology, small farms, and food sovereignty. Monthly Review, 61(3), 102-113. http://doi.org/10.14452/MR-061-03-2009-07_8
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de Weis (2007)Weis, T. (2007). The global food economy: the battle for the future of farming. London: Zed Books. demonstram como a produção de commodities agrícolas pode levar ao abandono da produção de alimentos básicos pelos agricultores familiares, fato que impacta negativamente sobre a segurança alimentar e a soberania alimentar das nações. Contrariando a tendência geral, o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) preconiza uma abordagem diversa para a questão agroalimentar, a qual inclui desde a adoção de métodos de produção compatíveis com os imperativos da sustentabilidade até a venda direta dos produtos aos consumidores. Para concretizar essa premissa, o MST está empenhado em um esforço coletivo junto às famílias assentadas, incentivando a incorporação da agroecologia nos assentamentos e direcionando a comercialização de suas produções para os mercados locais, preferencialmente por meio de feiras-livres (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, 2021Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST. (2021). Sete pontos sobre a agricultura familiar e o MST. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://mst.org.br/2021/07/02/7-pontos-sobre-a-agricultura-familiar-e-o-mst/
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).

É uma forma coerente de materializar o conhecido slogan que serve de epígrafe a este artigo. Não basta ocupar terra improdutiva, é preciso resistir contra as ameaças à soberania alimentar do país, bem como ganhar a disputa política contra os detratores da reforma agrária, produzindo comida e não commodities, aqui entendidas como artigos indiferenciados e com baixo valor agregado, a exemplo da soja. Além disso, trata-se de cultivar a terra sem degradar os ecossistemas ou ameaçar a biodiversidade. Entrementes, ao optar pelas feiras livres e pela venda direta, cria-se a possibilidade de ampliar o acesso a produtos de qualidade para o conjunto da população, em lugar de favorecer o consumo elitizado e/ou de promover uma economia de nicho. Comumente, a ideia de nicho remete às necessidades mais específicas de um grupo de pessoas de maior poder aquisitivo. Com efeito, coincidimos com Niederle & Wesz Junior (2018) quando afirmam que:

Tudo o que escapa à representação do regime é tratado imprecisamente como “nicho”. E, neste caso, restam somente três opções para as formas alternativas de produção e consumo: (a) desafiar o regime e alterá-lo (conversão); (b) ser apropriada pelo regime (convencionalização); ou (c) manter-se eternamente como nicho (marginalização) (Niederle & Wesz Junior, 2018, p. 40, aspas no original).

O caso sobre o qual nos dedicaremos neste artigo se enquadra na primeira opção aludida anteriormente. Entrementes, a experiência em tela propõe uma clara ruptura com o mito de que comida de qualidade é um privilégio das classes de rendas mais altas. É no final dos anos 1990 que surgem diversos assentamentos na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) (Lindner et al., 2021Lindner, M., Brustulin, F. S., & Medeiros, R. M. V. (2021). A produção ecológica nos assentamentos rurais no Rio Grande do Sul. Confins: Revue Franco-Brésilienne de Géographie, 50. http://doi.org/10.4000/confins.37593
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). Como sói acontecer em outras latitudes, as dificuldades enfrentadas pelas famílias assentadas se iniciam na fase de instalação e se ampliam ao longo dos anos, mormente quando se trata de encontrar meios de viabilização dos assentamentos num contexto de grandes dificuldades de ordem técnica, econômica, política, cultural e organizacional. Esse tema vem sendo profusamente abordado na literatura sociológica (Sauer & Mészáros, 2017Sauer, S., & Mészáros, G. (2017). The political economy of land struggle in Brazil under Workers’ Party governments. Journal of Agrarian Change, 17(2), 397-414. http://doi.org/10.1111/joac.12206
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; Fernandes et al., 2012Fernandes, B. M., Welch, C. A., & Gonçalves, E. C. (2012). Land governance in Brazil: a geo-historical review of land governance in Brazil (Framing the Debate Series, No. 2). Rome: International Land Coalition.; Wolford, 2010Wolford, W. (2010). Participatory democracy by default: Land reform, social movements and the state in Brazil. The Journal of Peasant Studies, 37(1), 91-109. http://doi.org/10.1080/03066150903498770
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; Sparovek et al., 2019Sparovek, G., Reydon, B. P., Pinto, L. F. G., Faria, V., Freitas, F. L. M., Azevedo-Ramos, C., Gardner, T., Hamamura, C., Rajão, R., Cerignoni, F., Siqueira, G. P., Carvalho, T., Alencar, A., & Ribeiro, V. (2019). Who owns Brazilian lands? Land tenure inequality and concentration in Brazil. Land Use Policy, 87, 104062. http://doi.org/10.1016/j.landusepol.2019.104062
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).

Apesar de favorecidos pela proximidade em relação ao principal mercado consumidor do Rio Grande do Sul, as famílias assentadas da RMPA vivem os mesmos dilemas e desafios dos diversos assentamentos de reforma agrária do Brasil (Martins & Sato, 2021Martins, P. F., & Sato, M. K. (2021). Social struggles, land reform, and environmental management in Brazil: A review. Geoforum, 121, 178-188.; Fernandes & Gonçalves, 2020Fernandes, B. M., & Gonçalves, E. C. (2020). Agrarian reform in Brazil: An analysis of settlement types and the economic and environmental challenges. Land Use Policy, 99, 104950. http://doi.org/10.1016/j.landusepol.2020.104950
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). A produção agroecológica representa uma das principais bandeiras do Movimento dos Agricultores Sem-Terra. Não é simplesmente uma forma de agregação de valor aos produtos, mas um imperativo na luta pela justiça social no campo e na cidade e por construir sistemas agroalimentares sustentáveis. Como destacam Niederle & Wesz Junior (2018), foi no ano 2000, no seu quarto congresso nacional, que o MST assumiu a agroecologia como linha de atuação política.

A importância desse fato surgiu no decorrer da pesquisa, que se desenvolveu de modo intermitente entre 2021 e 2023. Nas incursões realizadas a campo nosso olhar esteve pautado na busca de respostas a algumas questões centrais, a saber: como se apresentam as redes construídas entre as famílias assentadas da reforma agrária e os consumidores que afluem às diversas feiras existentes na RMPA? Como as famílias assentadas se reconhecem dentro de um processo que vem sendo construído, em muitos dos casos, há mais de duas décadas? Como as famílias avaliam as próprias condições de existência social nas atuais circunstâncias? O objetivo central da investigação foi examinar as estratégias de reprodução social das famílias com ênfase nas relações estabelecidas no âmbito das feiras agroecológicas da RMPA.

O artigo está estruturado, além desta breve introdução (primeira), em cinco partes. A segunda delas corresponde ao marco teórico do estudo. Apresentamos alguns aspectos relacionados à questão alimentar na contemporaneidade, bem como à dinâmica das redes agroalimentares alternativas. A terceira parte descreve a metodologia empregada no levantamento e análise dos dados empíricos da pesquisa. A quarta parte diz respeito aos resultados e discussão da pesquisa, expõe e analisa tópicos relativos à trajetória que ensejou o surgimento dos assentamentos da RMPA. Ainda, abordamos a situação das feiras livres da região metropolitana, e exploramos a percepção das famílias assentadas e a relação que desenvolvem no âmbito das feiras. A quinta e última seção reúne algumas conclusões e as considerações finais deste estudo.

2 Fundamentação teórica: as Redes Agroalimentares Alternativas

O termo “redes agroalimentares alternativas” aglutina em torno de si uma infinidade de iniciativas e significados que contrariam a dinâmica que domina o “mainstream” da produção, comércio, distribuição e consumo de produtos agroalimentares, o qual tem como uma de suas faces visíveis as grandes superfícies de varejo (hipermercados) que operam à escala global. Elas representam o que assertivamente Ploeg (2008)Ploeg, J. D. (2008). Camponeses e impérios alimentares: lutas por autonomia e sustentabilidade na era da globalização. Porto Alegre: Editora da UFRGS. define como “impérios agroalimentares”. Tais impérios oprimem produtores familiares com seus espoliadores contratos de comercialização, regidos pela pressão em busca do lucro máximo desses grandes conglomerados. Estudos precursores (Goodman & DuPuis, 2002Goodman, D., & DuPuis, E. M. (2002). Knowing food and growing food: beyond the production-consumption debate in the sociology of agriculture. Sociologia Ruralis, 42(1), 5-22. http://doi.org/10.1111/1467-9523.00199
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; Whatmore et al., 2003Whatmore, S., Stassart, P., & Renting, H. (2003). What’s alternative about alternative food networks? Environment and Planning A: Economy and Space, 35(3), 389-391.) abordaram a dinâmica das redes agroalimentares alternativas.

As grandes cadeias globais são responsáveis, como indica estudo da Organización de las Naciones Unidas para la Alimentación y la Agricultura (2021)Organización de las Naciones Unidas para la Alimentación y la Agricultura – FAO. (2021). Emissions from agriculture and forest land. global, regional and country trends 1990–2019. Roma. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de http://www.fao.org/faostat/en/#data/GF
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, por cerca de 1/3 das emissões de gases efeito estufa. Grandes impérios, com sua lógica intensiva, fomentam o desmatamento, a degradação dos ecossistemas, a expulsão de povos originários, o esgotamento de aquíferos e a contaminação dos recursos hídricos pelo uso expandido de agroquímicos. Um dos exemplos mais contundentes dessa perversa associação tem sido o desmatamento das florestas da Indonésia pela pressão exercida para ampliar as áreas de produção do óleo de palma (dendê) utilizado, sobretudo, como ingrediente de conhecido creme de chocolate. Nesse país asiático, como indicam Cisneros et al. (2021), oCisneros, E., Kis-Katos, K., & Nuryartono, N. (2021). Palm oil and the politics of deforestation in Indonesia. Journal of Environmental Economics and Management, 108, 1-19. http://doi.org/10.1016/j.jeem.2021.102453
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governo concede incentivos para a deflorestação que dá passo ao plantio do dendê em larga escala.

Em paralelo aos resultados que foram sendo alcançados com o processo de modernização da agricultura brasileira, uma série de questões e debates foram emergindo em relação às transformações provocadas por esse fenômeno, tendo em vista o caráter desigual, excludente e contraditório que lhe marcou, com o favorecimento de uma parcela dos produtores, de certos produtos e de regiões em detrimento de outras (Matos & Pêssoa, 2011Matos, P. F., & Pêssoa, V. L. S. (2011). A modernização da agricultura no Brasil e os novos usos do território. Geo UERJ, 2(22), 290-322. http://doi.org/10.12957/geouerj.2011.2456
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; Silva & Botelho, 2015Silva, G. B., & Botelho, M. I. V. (2015). O processo histórico da modernização da agricultura no Brasil (1960-1979). Revista de Extensão e Estudos Rurais, 3(1), 362-387. http://doi.org/10.14393/RCT91723084
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).

No período de 1960 a 1980 houve a migração de milhões de pessoas para as cidades e o êxodo rural se tornou um dos deletérios efeitos da modernização agrícola. Nesse processo, a maioria dos recursos foi disponibilizada para os grandes produtores, os quais puderam se beneficiar dos investimentos, reduzindo o espaço de arrendatários, parceiros e de pequenos produtores que iam sendo expulsos do campo. Muitos dos que permaneceram se vincularam às grandes propriedades como força de trabalho e outros acabaram se organizando para reivindicar melhores condições de permanência no campo (Matos & Pêssoa, 2011Matos, P. F., & Pêssoa, V. L. S. (2011). A modernização da agricultura no Brasil e os novos usos do território. Geo UERJ, 2(22), 290-322. http://doi.org/10.12957/geouerj.2011.2456
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; Silva & Botelho, 2015Silva, G. B., & Botelho, M. I. V. (2015). O processo histórico da modernização da agricultura no Brasil (1960-1979). Revista de Extensão e Estudos Rurais, 3(1), 362-387. http://doi.org/10.14393/RCT91723084
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). Ainda assim, as quatro últimas décadas coincidem com o reconhecimento dos efeitos adversos da modernização conservadora da agricultura brasileira abordada em diversos estudos clássicos (Guimarães, 1982Guimarães, A. P. (1982). Quatro séculos de latifúndio. Rio de Janeiro: Paz e Terra.; Martine & Garcia, 1987Martine, G., & Garcia, R. C. (1987). Os impactos sociais da modernização agrícola. São Paulo: Caetés.) que descrevem as nuances de um fenômeno que alterou profundamente o quadro social rural e urbano no Brasil, o modo como produzimos e consumimos os alimentos e a relação estabelecida com os recursos naturais.

Diante desse cenário há uma plêiade de iniciativas que se movem dentro de uma outra lógica, a exemplo do consumo crítico (Leonini & Sassatelli, 2008Leonini, L., & Sassatelli, R. (2008). Consumatori e cittadini. In L. Leonini & R. Sassatelli, Il consumo critico: significati, pratiche e reti (pp. 3-20). Roma: Laterza.), as quais buscam edificar formas inovadoras de abastecimento alimentar, incluindo mercados de venda direta, a exemplo das “feiras quilômetro zero”. Goodman et al. (2012)Goodman, D., Dupuis, E., & Goodman, M. (2012). Alternative food networks. Abingdon: Routlege. http://doi.org/10.4324/9780203804520.
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reivindicam a necessidade de examinar criticamente os mercados agroalimentares alternativos para desconstruir o que se veio a chamar “localismo reflexivo”.

A comida carrega em si uma história, uma geografia, uma cultura e as relações sociais que integram todo o ciclo produtivo. Nesse contexto, a comida local contrasta frontalmente com o produto alimentício sem lugar e desprovido de valor, aspectos esses que vão mais além do sabor e das características organolépticas. A proximidade geográfica é também uma forma de favorecer o enraizamento das práticas produtivas, promover inclusão social, gerar emprego e renda em nível local. Por outra parte, como bem destacam Fonte & Cucco (2023), oFonte, M., & Cucco, I. (2023). La centralidad de la alimentación para la emancipación social: Redes alimentarias cívicas como proyectos de utopías reales. In F. Sacco dos Anjos & C. N. Caldas (Eds.), Comida, ética e reciprocidade em tempos de pandemia: diálogos entre Brasil, Espanha e Itália (pp. 20-45). Pelotas: UFPel. fator local, por si só, não redunda em benefícios para produtores, consumidores e à sociedade como um todo.

Segundo suas próprias palavras, “la localidad es un concepto descriptivo y su valor heurístico limitado es evidente cuando queremos distinguir un localismo progresivo frente a un localismo defensivo” (Fonte & Cucco, 2023, pFonte, M., & Cucco, I. (2023). La centralidad de la alimentación para la emancipación social: Redes alimentarias cívicas como proyectos de utopías reales. In F. Sacco dos Anjos & C. N. Caldas (Eds.), Comida, ética e reciprocidade em tempos de pandemia: diálogos entre Brasil, Espanha e Itália (pp. 20-45). Pelotas: UFPel.. 30). Não por acaso, Born & Purcell (2006)Born, B., & Purcell, M. (2006). Avoiding the Local Trap: Scale and Food Systems in Planning Research. Journal of Planning Education and Research, 26(2), 195-207. http://doi.org/10.1177/0739456X06291389
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falam de “local trap” ao se referirem aos riscos que acarreta pensar que a proximidade sempre redundaria em benefícios no que tange às questões socioambientais e à luta pela justiça social. Sem um sentido de planeta (Hesse, 2008Hesse, E. (2008). The adult attachment interview: protocol, method of analysis, and empirical studies. In J. Cassidy & P. R. Shaver (Eds.). Handbook of attachment: theory, research, and clinical applications (2nd ed., pp. 552-598). New York: Guilford Press.), tais experiências correm o sério risco de ocultar esquemas protecionistas, cujas formas de produzir alimentos podem estar associadas a práticas contrárias aos princípios do desenvolvimento sustentável.

É por esse motivo que autores como Fonte & Cucco (2023)Fonte, M., & Cucco, I. (2023). La centralidad de la alimentación para la emancipación social: Redes alimentarias cívicas como proyectos de utopías reales. In F. Sacco dos Anjos & C. N. Caldas (Eds.), Comida, ética e reciprocidade em tempos de pandemia: diálogos entre Brasil, Espanha e Itália (pp. 20-45). Pelotas: UFPel. e Renting et al. (2012)Renting, H., Schermer, M., & Rossi, A. (2012). Building food democracy: Exploring civic food networks and newly emerging forms of food citizenship. International Journal of Sociology of Agriculture and Food, 19(3), 289-307. http://doi.org/10.48416/ijsaf.v19i3.206
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defendem a ideia de “redes agroalimentares cívicas”, tidas como iniciativas que colocam ênfase nos mecanismos de governança, exaltando o papel chave da sociedade civil, das administrações locais e regionais em favor da construção de uma cidadania alimentar. A alimentação como bem comum, também chamada de abordagem “food as a commons”, como propõe Vivero-Pol (2017)Vivero-Pol, J. L. (2017). Food as commons or commodity? Exploring the links between normative valuations and agency in food transition. Sustainability, 9(3), 442. http://doi.org/10.3390/su9030442
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, implica reconhecer os processos subjacentes de cooperação, as regras recíprocas de intercâmbio, as normas justas de gestão dos processos e o exercício de democracia direta.

O comércio ambulante de alimentos está presente em todos os continentes e em variados contextos sociais, como praias, calçadas, terminais de transporte público, praças, pontos de táxi, celebrações, feiras, nas proximidades de escolas e hospitais, tanto em áreas urbanas quanto rurais (Amson, 2005Amson, G. V. (2005). Comércio ambulante de alimentos em Curitiba: perfil de vendedores e propostas para programa de boas práticas higiênicas na manipulação de alimentos (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.). O caso das feiras agroecológicas da Região Metropolitana de Porto Alegre guarda uma história própria e expressa algumas das facetas através das quais podemos compreender o conceito de redes agroalimentares cívicas aqui referido. É uma modalidade de mercado de proximidade, da qual participam não somente as famílias de assentados da reforma agrária, mas também os apoiadores e os consumidores que afluem a esses espaços movidos por relações de confiança construídas ao longo de vários anos, onde as trocas vão muito além do simples intercâmbio mercantil. Diversos estudos analisaram a trajetória das feiras agroecológicas da Região Metropolitana de Porto Alegre (Froehlich & Müller, 2019Froehlich, J. M., & Müller, S. G. (2019). A comercialização de produtos da agricultura familiar e agroecológica em feiras de Porto Alegre/RS. Revista de Economia e Sociologia Rural, 57, 345-360. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9479.2019.190035; Martins & Schneider, 2017Martins, A. P. B., & Schneider, S. (2017). Feiras agroecológicas na Região Metropolitana de Porto Alegre: um estudo sobre o circuito curto de comercialização de produtos agroecológicos. Desenvolvimento em Questão, 15, 161-182. http://dx.doi.org/10.21527/2237-6453.2017.35.161-182; Ruas & Schwambach, 2016Ruas, L. C., & Schwambach, K. H. (2016). O papel das feiras agroecológicas na promoção da segurança alimentar e nutricional em Porto Alegre, RS. Ciência Rural, 46, 1703-1708. http://dx.doi.org/10.1590/0103-8478cr20151659; Silva & Silva, 2015Silva, M. D. R., & Silva, R. C. P. (2015). Feiras agroecológicas na região metropolitana de Porto Alegre: o papel das mulheres na comercialização e organização. Revista Nera, 18, 201-217. http://dx.doi.org/10.47946/rnera.v0i26.3459).

Os assentados não são simples feirantes, mas homens e mulheres que comercializam a própria produção, a qual é obtida através de processos que excluem o uso de agroquímicos. Nesse sentido, ao exercer as duas funções (produtores e vendedores), as famílias desempenham uma forma de pluriatividade como estratégia de reprodução social, segundo analisaram estudos clássicos realizados no Brasil (Sacco dos Anjos, 2003Sacco dos Anjos, F. (2003). Agricultura familiar, pluriatividade e desenvolvimento rural no sul do Brasil. Pelotas: Editora da UFPel.; Schneider, 2003Schneider, S. (2003). A Pluriatividade na Agricultura familiar. Porto Alegre: UFRGS.). Além disso, como veremos neste artigo, há uma reputação que precisa ser preservada pelos assentados. É que consumidores conscientes adquirem legumes e verduras, plenamente convencidos de que o consumo desses produtos não oferece riscos à própria saúde, que sua obtenção não contamina os recursos naturais e, além disso, que adquirir tais artigos gera inclusão social e reafirma o compromisso com a reforma agrária. Foram esses os conceitos que ensejaram a realização desta investigação e a análise do contexto sobre o qual nos debruçamos.

3 Metodologia

A pesquisa imergiu sobre a dinâmica das feiras de produtos agroecológicos existentes na RMPA a partir da perspectiva das famílias de assentados da reforma agrária, com ênfase nos desafios, perspectivas, oportunidades e experiências acumuladas ao longo do período em que esse sistema de comercialização vem operando. O olhar se voltou para a história das feiras, bem como para as formas de organização das famílias que operam nesse mercado. A imersão a campo se deu durante os anos de 2021 e 2022, de forma intermitente, sendo que as entrevistas se concentraram entre junho e novembro de 2022. Elas aconteceram na casa das famílias assentadas, mas também em inserções que se desenvolveram nas 41 feiras que ocorrem semanalmente nos municípios da RMPA, incluindo Porto Alegre (26), Viamão (2), Charqueadas (2), Canoas (7), Nova Santa Rita (1), Eldorado do Sul (1), São Jerônimo (1) e São Leopoldo (1).

Tratava-se de conhecer a realidade das famílias assentadas que comercializam seus produtos, investigar como elas se reconhecem como sujeitos dos processos, bem como saber como avaliam as perspectivas desse canal de comercialização. Conhecer o ponto de vista dos entrevistados envolveu a realização de 57 entrevistas em profundidade mediante o uso de roteiro semiestruturado que colheu depoimentos de entrevistados ligados à direção do MST (5), Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre (Cootap) (3), consumidores (5) que frequentam as feiras agroecológicas, membros da equipe técnica e assessoramento (7) e agricultores(as)-feirantes (37). Além das entrevistas, lançamos mão de pesquisa documental (atas de reuniões de grupos de feirantes, materiais de divulgação das prefeituras etc.), levantamento de informações secundárias relacionadas, sobretudo, com o surgimento dos assentamentos da RMPA e o uso de registros fotográficos.

Na montagem da amostra de entrevistados utilizamos a conhecida técnica “snowball” (Morgan, 2008Morgan, D. (2008) Snowball sampling. In L. Given (Ed.), The SAGE encyclopedia of qualitative research methods (pp. 816-817). Thousand Oaks: SAGE Publications Inc.). Trata-se de recurso que visa obter uma amostra não-probabilística, na qual os participantes iniciais indicam outros entrevistados potenciais e assim sucessivamente, até que se alcance o chamado “ponto de saturação”, momento em que os depoimentos começam a repetir argumentos e informações e não agregam novos elementos ao estudo. Os depoimentos foram transcritos integralmente, sendo que o material bruto foi submetido à pré-análise para posteriormente ser examinado mediante o emprego da análise de conteúdo (Bauer & Aarts, 2002Bauer, M. W., & Aarts, B. (2002). A construção do corpus: um princípio para a coleta de dados qualitativos. In M. W. Bauer & G. Gaskell (Eds.), Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático (3ª ed., pp. 17-39). Petrópolis: Vozes.). As falas exprimem opiniões sobre temas diversos e foram sistematizadas segundo eixos temáticos relacionados com o objeto central da pesquisa e com as grandes questões aludidas anteriormente. Empregou-se uma abordagem eminentemente qualitativa na investigação que ensejou este artigo científico.

Nesse sentido, coincidimos com Groulx (2021, pGroulx, L.-H. (2021). Contribuição da pesquisa qualitativa à pesquisa social. In J. Poupart, J-P. Deslauriers, L-H. Groulx, A. Laperrière, R. Mayer & A. Pires (Eds.), A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos (pp. 95-124). Petrópolis: Vozes.. 98), quando ele afirma que “a pesquisa qualitativa introduz um novo sentido dos problemas; ela substitui a pesquisa dos fatores e determinantes pela compreensão dos significados”. Nesse caso, os significados envolvem múltiplas questões, a exemplo de percepções sobre a própria condição dos assentados dentro do ambiente social que representam as feiras, sobre o tipo de atividade que realizam, o modo como se constrói a relação com os consumidores de seus produtos, o presente, mas sobretudo o próprio futuro de suas unidades de produção e a continuidade dessa atividade laboral.

4 Resultados e Discussão

4.1 Os assentamentos na Região Metropolitana de Porto Alegre

No momento em que este artigo é finalizado, o MST celebra 40 anos de luta pela reforma agrária no Brasil. A ocupação realizada na mítica Fazenda Annoni, um latifúndio improdutivo de 9,3 mil hectares, situado em Ronda Alta (RS), envolveu mais de 1.500 famílias vindas de muitas localidades gaúchas, sobretudo do Noroeste sul-rio-grandense. A ocupação foi um marco insofismável na luta pela terra e pela justiça social no Brasil, como assim refere o estudo de Dickel (2019)Dickel, S. L. (2019). Mudanças na legislação e o processo de titulação em assentamentos de reforma agrária: o caso da fazenda Annoni. In I. A. P. Machado, J. C. Tedesco & M. Gerhardt (Eds.), História do mundo rural: o sul do Brasil (pp. 103-122). Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo..

O episódio relativo à Fazenda Annoni expôs uma chaga que se arrasta no país desde tempos que remontam ao período da colonização, como bem descreveram obras clássicas da sociologia e da historiografia brasileiras, a exemplo de Guimarães (1982)Guimarães, A. P. (1982). Quatro séculos de latifúndio. Rio de Janeiro: Paz e Terra., Rangel (1962)Rangel, I. (1962). A questão agrária brasileira. Recife: Comissão de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco. e Prado Junior (1966). Dentro das fileiras do MST estavam famílias desalojadas pela construção de represas e pela demarcação de terras indígenas1 1 Em maio de 1978, nada menos que 1.800 famílias tiveram que abandonar a terra depois da demarcação da Reserva Indígena de Nonoai, destinada à etnia Kaingang. Tal fato lançou um contingente de famílias a uma desesperadora condição. Sobre esse tema, consultar Fernandes (2000). , bem como trabalhadoras e trabalhadores rurais expulsos de grandes fazendas, pequenos arrendatários de terras, meeiros, dentre outras categorias laborais. O incremento no número de assentamentos que surgem ao longo dos anos subsequentes é fruto da mobilização do MST e das forças que apoiam esse movimento social.

A década de 1980 marcou um ponto de virada, momento em que agricultores familiares e trabalhadores rurais unificaram suas lutas e organizaram manifestações multitudinárias, conquistando visibilidade por meio de mobilizações lideradas pelos movimentos sociais e representações sindicais. Isso resultou na promoção da agricultura familiar como uma categoria social a ser fomentada no país (Medeiros, 2010Medeiros, L. S. (2010). Agricultura familiar no Brasil: aspectos da formação de uma categoria política. In M. Manzanal & G. Neiman (Eds.). Las agriculturas familiares del Mercosur: trayectorias, amenazas y desafios (pp. 131-152). Buenos Aires: Ciccus.; Picolotto, 2014Picolotto, E. L. (2014). Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(Supl. 1), 63-84. http://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600004
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; Niederle et al., 2014Niederle, P. A., Fialho, M. A. V., & Conterato, M. A. (2014). A pesquisa sobre agricultura familiar no Brasil - aprendizagens, esquecimentos e novidades. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(1, Supl. 1), 9-24. http://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600001
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) dentro de um projeto mais amplo de transformação social no campo.

Outro aspecto importante desse período foi a criação, ainda durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1999-2001), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), cuja missão precípua eram as questões relacionadas à agricultura familiar e à reforma agrária, enquanto o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) se envolvia com os interesses da agricultura patronal – o chamado agronegócio. A constituição desses dois ministérios demonstrava a tensão e os conflitos existentes entre esses dois tipos de agricultura que, embora não sejam independentes quanto aos processos produtivos, são portadores de propostas antagônicas de desenvolvimento rural (Medeiros, 2010Medeiros, L. S. (2010). Agricultura familiar no Brasil: aspectos da formação de uma categoria política. In M. Manzanal & G. Neiman (Eds.). Las agriculturas familiares del Mercosur: trayectorias, amenazas y desafios (pp. 131-152). Buenos Aires: Ciccus.; Picolotto, 2014Picolotto, E. L. (2014). Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(Supl. 1), 63-84. http://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600004
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; Niederle et al., 2014Niederle, P. A., Fialho, M. A. V., & Conterato, M. A. (2014). A pesquisa sobre agricultura familiar no Brasil - aprendizagens, esquecimentos e novidades. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(1, Supl. 1), 9-24. http://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600001
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).

Através da Figura 1 é possível vislumbrar a situação atual dos assentamentos da reforma agrária no Rio Grande do Sul. Segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), entre os anos 1975 e 2023 houve o assentamento de 12.246 famílias nessa unidade federativa brasileira, cuja área total alcança 295.420,94 hectares, o que, grosso modo, equivale a 24,2 hectares/família. A Figura 1 mostra que existem quatro grandes zonas de adensamento ou concentração de assentamentos. A primeira delas é o Noroeste gaúcho, próxima à fronteira com Santa Catarina. A segunda delas se distribui pela região Centro-ocidental do RS, enquanto a terceira se concentra na fronteira com o Uruguai. A quarta zona corresponde ao universo mais amplo desta pesquisa, qual seja, a Região Metropolitana de Porto Alegre.

Figura 1
Concentração de assentamentos no Estado do Rio Grande do Sul. Fonte: Atlas Socioeconômico (Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuse, 2024).

Conforme Lindner et al. (2021)Lindner, M., Brustulin, F. S., & Medeiros, R. M. V. (2021). A produção ecológica nos assentamentos rurais no Rio Grande do Sul. Confins: Revue Franco-Brésilienne de Géographie, 50. http://doi.org/10.4000/confins.37593
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, é na última década do século XX que se intensifica o processo de assentamento das famílias no Rio Grande do Sul. Isso fica claro quando levamos em conta que 200 dos 343 assentamentos contabilizados no período 1986-2020 (equivalente a 58,3%) surgiram entre os anos 1991 e 2000. Na RMPA existem hoje 27 assentamentos de reforma agrária. Nada menos que 2/3 deles foram criados nesse mesmo período. Numa zona fisiográfica (planície) apta para a produção de arroz irrigado, a opção por cultivar as terras pelo caminho da agroecologia representou um enorme desafio do ponto de vista técnico, ambiental, cultural e social. Menos de uma década depois, o MST se converteu no maior produtor de arroz orgânico da América Latina (Souza et al., 2023Souza, M. D. H., Palma, E. A., Diniz, A. P. B., & Amparo, V. P. (2023). Contributions of land reform to food production and distribution in Brazil: Contribuições da reforma agrária na produção e distribuição de alimentos no Brasil. Concilium, 23(12), 139-150. http://doi.org/10.53660/CLM-1510-23H39
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; Pollnow et al., 2020Pollnow, G. E., Caldas, N. V., & Sperling, D. R. (2020). O arroz ecológico Terra Livre: desenvolvimento e empoderamento social. Cadernos de Agroecologia, 15, 3484.).

Como bem sublinharam Rossi et al. (2022, pRossi, N., Colasanti, N., Fiorani, G., & Di Gerio, C. (2022). Rural commons and the experience of the Movimento Sem Terra in Brazil. Journal of Sustainable Development, 15(5), 90-96. http://doi.org/10.5539/jsd.v15n5p90
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. 92), o MST “[...] become the largest producer of organic rice in Latin America, its latest harvests exceeding 27.000 tons of organic rice, exporting more than 30% of its production to countries such as the United States, Germany, Spain, New Zealand, Norway, Chile and Mexico”. Essa ingente produção, obtida de modo agroecológico, absorve atualmente 352 famílias rurais e sete cooperativas que integram 22 assentamentos distribuídos por nove municípios das regiões Metropolitana, Sul, Centro Sul e Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. Há, no entanto, um grupo de famílias assentadas que optaram por se dedicar à produção agroecológica de frutas, legumes e verduras. É esse o contexto sobre o qual se desenvolveu a pesquisa.

A literatura que aborda os atores envolvidos nos processos de criação e consolidação dos assentamentos no país é ampla e diversificada. A reforma agrária no Brasil é um tema candente e um campo de poder no sentido atribuído por Pierre Bourdieu. Nesse sentido,

Ele também é, inseparavelmente, um campo de lutas pelo poder entre detentores de poderes diferentes, um espaço de jogo em que agentes e instituições – tendo em comum o fato de possuir uma quantidade específica de capital (econômica ou cultural, notadamente) suficiente para ocupar posições dominantes no âmago de seus respectivos campos – se enfrentam com estratégias destinadas a conservar ou transformar essa relação de força (Bourdieu, 1989, pBourdieu, P. (1989). La noblesse d’état, grandes écoles et esprit de corps. Paris: Minuit.. 375).

Além dos demandantes pela terra que se apresentam sob as diferentes categorias sociais (assalariados, parceiros, posseiros, quilombolas etc.), há outros atores intervenientes, incluindo agentes públicos (Incra, poder judiciário etc.), organizações sindicais, representantes de secretarias estaduais de agricultura, serviço de extensão rural, prefeituras municipais, organizações não-governamentais, igreja, o próprio MST, a Via Campesina etc. Cada um desses atores sociais detém um determinado volume de capital político empregado não somente na implantação dos assentamentos (Medeiros & Leite, 2009Medeiros, L. S., & Leite, S. (2009). A formação dos assentamentos rurais no Brasil: processos sociais e políticas públicas. Porto Alegre: Editora da UFRGS.), mas também nos rumos que esse processo poderá assumir. Esse aspecto surgiu em grande parte das entrevistas.

O assentamento rural há que ser entendido como um conjunto de unidades agrícolas independentes entre si, instaladas ou reconhecidas pelo Incra através da Política de Reforma Agrária, onde originalmente existia um imóvel rural que pertencia a uma pessoa física ou jurídica e que não cumpria com sua função social. A Política de Reforma Agrária é um conjunto de medidas conduzidas pelo Poder Público a fim de promover a distribuição de terras entre trabalhadores rurais, atendendo aos princípios de justiça social e aumento da produtividade, conforme disposto na Lei n.º 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto da Terra).

De acordo com o Estatuto da Terra (Brasil, 1964Brasil. (1964). Lei n.º 4504 de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4504.htm
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), mais além de promover cidadania, desconcentração e democratização da estrutura fundiária e geração de renda no campo, a Reforma Agrária deve priorizar a produção de alimentos básicos, o combate à fome e à pobreza, a promoção da cidadania e da justiça social, a interiorização dos serviços públicos, a redução da migração campo-cidade e a diversificação do comércio e dos serviços no meio rural.

Zimmermann (1994)Zimmermann, N. C. (1994). Os desafios da organização interna de um assentamento rural. In L. S. Medeiros, Barbosa, M. V., Franco, M. P., N. Esterci & S. Leite (Eds.), Assentamentos rurais: uma visão interdisciplinar (pp. 205-224). Ed. Unesp. destaca que o assentamento é um espaço de relações sociais que responde a uma nova realidade marcada pela busca por resistir sob um ambiente invariavelmente desfavorável. Assim, o processo de “territorialização” da luta pela terra promove a integração dos indivíduos em torno a uma meta comum: a Reforma Agrária. E isso é um fator que marca a identidade simbólica do movimento social. Portanto, o assentamento é um espaço que expressa um sentido histórico que é resultado de processos políticos e sociais, bem como um lócus onde se materializam relações sociais diferenciadas. Nesse contexto,

A restauração da comunidade tem sido a utopia dos movimentos sociais ligados ao trabalho da terra e à reinvenção da sociedade segundo valores de um mundo agrícola idealizado, o mundo da fartura, da religião, da família, da pessoa, do trabalho coletivo, da recusa do mercado e até do dinheiro (Martins, 2014, pMartins, J. S. (2014). Uma sociologia da vida cotidiana. São Paulo: Contexto.. 136).

Trabalhadoras e trabalhadores rurais que lograram conquistar a terra convertem o território onde atuam num espaço com uma identidade própria, uma identidade simbólica do MST que expressa a luta por justiça social. Nos assentamentos, a área é dividida em parcelas, lotes ou glebas, as quais são entregues pelo Incra a uma família que terá o direito de explorá-la para produzir o próprio sustento. Cada lote em um assentamento se torna uma unidade da agricultura familiar. Nossos entrevistados exaltaram as dificuldades enfrentadas ao longo do caminho percorrido.

Neste artigo, referimo-nos à agroecologia como uma forma de produzir que exclui o uso de agrotóxicos, mas ela precisa ser compreendida, também, como uma ciência e um movimento social. Há diversos autores e trabalhos que consideram a produção agroecológica e a produção orgânica como termos equivalentes e intercambiáveis entre si. Sobre a distinção entre os dois conceitos, consideramos válida a posição adotada por Caldas e Sacco dos Anjos:

No Brasil geralmente, se adota a expressão agroecológico nas alusões a processos ligados à dinâmica da agricultura familiar, ao passo que o orgânico se vincula a uma forma de agricultura na qual essa associação é menos intensa. Em outras palavras, poder-se-ia dizer que, no primeiro caso, se trata de pensar essa forma de produzir como estratégia de reprodução social de camponeses, assentados de reforma agrária e/ou produtores familiares. No segundo caso, tem-se uma lógica em que predomina uma racionalidade empresarial e centrada na busca do lucro, cujos processos produtivos são executados com o uso de mão de obra assalariada e tecnicamente voltados a um modelo de substituição de insumos químicos por insumos biológicos (Caldas & Sacco dos Anjos, 2017, pCaldas, N. V., & Sacco dos Anjos, F. (2017). Agricultura familiar e inovação social: o caso da Rede Ecovida de Agroecologia no sul do Brasil. Revista Brasileira de Agroecologia, 12(3), 167-175. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://periodicos.unb.br/index.php/rbagroecologia/article/view/50041/38037
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. 168).

Por conta disso, como advertem esses autores, todo o produto agroecológico é orgânico, mas nem todo o produto orgânico pode ser considerado como agroecológico.

4.2 As feiras-livres na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA)

A pesquisa imergiu sobre a dinâmica das feiras de produtos agroecológicos existentes na RMPA a partir da perspectiva das famílias de assentados da reforma agrária, com ênfase nos desafios, perspectivas, oportunidades e experiências acumuladas ao longo do período em que opera essa rede agroalimentar alternativa, assim como nas formas de organização das famílias para operar nesse âmbito. As feiras se desenvolvem nos municípios de Porto Alegre, Viamão, Charqueadas, Canoas, São Jerônimo, Nova Santa Rita, Eldorado do Sul e São Leopoldo.

A imersão a campo mostrou que as feiras são frequentadas por um público bastante diversificado. Uma das causas se deve ao fato de elas funcionarem dentro de áreas internas de instituições públicas, como no caso da feira que ocorre no pátio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), bem como da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), da Secretaria de Agricultura do Governo do Estado e do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFF-RS). Nesses lugares predominam consumidores que são funcionários de Estado. Já as feiras ao ar livre se desenvolvem em espaços públicos e de ampla circulação, como calçadas, ruas e praças. Nesse caso, os consumidores apresentam uma condição social mais heterogênea.

As feiras que operam nos órgãos públicos citados foram planejadas em dias e horários que permitam o acesso ao maior número de consumidores. Boa parte das feiras “ao ar livre” ocorre aos sábados, justamente para contemplar indivíduos que trabalham durante a semana, bem como para priorizar o público cativo das feiras e ideologicamente afinado com o espírito que move a produção agroecológica. Ainda assim, cada feira tem sua história e peculiaridades que foram sendo lapidadas na relação de confiança estabelecida com os frequentadores. Essa informação apareceu de forma recorrente nos depoimentos dos entrevistados. Há, portanto, o público fiel, que se programa para consumir quase que exclusivamente os artigos da feira, mas há também os que adquirem produtos por estarem de passagem pelo local.

Há dois aspectos que sobressaem nas falas dos entrevistados. O primeiro deles tem a ver com a força do coletivo, ou seja, da organização das famílias e do poder decisório que lhe corresponde no encaminhamento de questões imediatas; o segundo, com o peso da experiência adquirida como fator de êxito nos processos. São os erros e os acertos do caminho. O primeiro aspecto aparece na criação do Grupo Gestor das feiras, do mesmo modo que há o Grupo Gestor do Arroz Agroecológico. As decisões são tomadas de forma democrática pelo conjunto das famílias que operam nas feiras. O caso do arroz agroecológico serviu de base ou modelo para a implantação das feiras da RMPA.

A questão da experiência pode ser vista na trajetória do arroz agroecológico, cuja produção começou timidamente em 1999, em caráter experimental, em pequenas lavouras (sete hectares) situadas em dois assentamentos da RMPA. Hoje é um caso de êxito e um processo consolidado que, paradoxalmente, começou com um pequeno passo. A força do coletivo aparece, também, na questão da certificação. No Brasil há uma legislação bastante avançada que admite tanto a certificação por auditagem ou por terceira parte, realizada por empresas certificadoras, quanto a certificação participativa, que opera dentro de uma lógica distinta. Valemo-nos aqui da distinção proposta por Radomsky (2009)Radomsky, G. F. W. (2009). Práticas de certificação participativa na agricultura ecológica: rede, selos e processos de inovação. Revista IDeAS, 3(1), 133-164. ao comparar a certificação participativa e a certificação convencional ou por auditagem, levada a cabo por empresas especializadas. Assim,

Enquanto a primeira é feita por meio de um trabalho formativo ao longo de tempos, que implica reuniões periódicas e diálogos, a segunda é um mecanismo de verificação técnico que é realizado uma vez ao ano e sem acompanhamento. Ainda, conforme pude observar e ouvir nas múltiplas vozes de agricultores certificados e mediadores, a certificação por terceira parte não se afirma como prática construtiva (Radomsky, 2009Radomsky, G. F. W. (2009). Práticas de certificação participativa na agricultura ecológica: rede, selos e processos de inovação. Revista IDeAS, 3(1), 133-164., pp. 153-154).

Inicialmente, a produção agroecológica do arroz lançou mão da certificação por terceira parte, mas com o amadurecimento do processo de produção e organização, a certificação participativa se impôs naturalmente. Assim como no caso do arroz, houve por bem criar um Grupo Gestor das Feiras, encarregado não apenas de organizar a produção, mas também para encaminhar a questão da certificação (avaliação da conformidade). A legislação brasileira (Lei n.º 10.831/2003, regulamentada pelo Decreto n.º 6.323/2007)2 2 A Instrução Normativa n.º 19 de 2009 define três mecanismos de controle e informação da qualidade orgânica no Brasil, envolvendo um Organismo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC), o qual pode ser: 1) uma Certificadora, que estabelece uma certificação por Auditoria ou por terceira parte; 2) Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC), que estabelece a certificação via Sistema Participativo de Garantia (SPG) da Qualidade Orgânica; e 3) Organização de Controle Social (OCS). A terceira possibilidade permite exclusivamente a venda direta ao consumidor, que pode se dar tanto no caso de feiras como em compras governamentais, mas sem o direito ao Selo Orgânico. Nesse caso, a credibilidade é gerada por uma OCS. Independentemente de qual mecanismo de credibilidade é acionado, em todos os três casos os produtores precisam estar registrados no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos (CNPO) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). admite a venda direta de produtos orgânicos, dispensando a etiquetagem dos artigos. Não obstante, como advertiu Caldas (2013, pCaldas, N. V. (2013). A certificação de produtos orgânicos no Brasil e na Espanha. Pelotas: Editora UFPel.. 117), “os produtores devem estar cadastrados junto ao MAPA. Isso implica na existência de um Organismo de Controle Social (OCS)”, o qual é entendido como sendo um

[...] grupo, associação, cooperativa ou consórcio a que está vinculado o agricultor familiar em venda direta, previamente cadastrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, com o processo organizado de geração de credibilidade a partir da interação de pessoas ou organizações, sustentado na participação, comprometimento, transparência e confiança, reconhecido pela sociedade (Brasil, 2007, pBrasil. (2007). Lei n.º 11.326, de 24 de julho de 2006. Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11326.htm
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. 1).

O sistema participativo de garantia (SPG) e a mecânica que suporta essa modalidade de certificação ou avaliação da conformidade traduz a força de um processo que se constrói a partir das interações estabelecidas entre as famílias de produtores, os consumidores de seus produtos e o arco de alianças tecidas com os mais diversos atores sociais que militam em favor do desenvolvimento sustentável, da proteção da biodiversidade e da geração de alimentos saudáveis.

A Cooperativa Central dos Assentados do Rio Grande do Sul (Coceargs) é o órgão encarregado de gerir o sistema de certificação participativa (SPG) do qual participam os grupos de produtores encarregados de realizar as “visitas de pares” com vistas ao cumprimento dos padrões requeridos na avaliação de conformidade. Para além das “visitas de pares”, a Coceargs, através de sua equipe técnica, realiza visitas direcionadas por amostragem para conferir se as unidades de produção estão seguindo os critérios estabelecidos no momento de elaboração do Plano de Manejo. Em 2012 o Grupo Gestor das Feiras deu início ao processo de certificação orgânica participativa de suas unidades produtivas através do mecanismo de OCS, junto ao Mapa e Coceargs. Em maio de 2013 as famílias foram cadastradas no Mapa e receberam o certificado de produtores orgânicos. Como bem esclareceram Niederle et al. (2021), aNiederle, P. A., Dorville, C., & Lemeilleur, S. (2021). Diferenciação institucional na certificação de produtos orgânicos: uma comparação dos Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade no estado do Rio Grande do Sul. Revista de Economia e Sociologia Rural, 59(2), e224827. http://doi.org/10.1590/1806-9479.2021.224827
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atuação da Coceargs sofreu diversos ajustes em virtude das dificuldades e obstáculos que foram surgindo ao longo do caminho. Nesse sentido,

Em 2012, antes de registrar o OPAC, a Coceargs obteve registro de uma OCS para viabilizar a venda direta dos assentados nas feiras livres. Desde então, constituiu três OCSs totalizando 16 grupos que abarcam 53 famílias. Como a estrutura e funcionamento de uma OCS são mais próximos àqueles da certificação participativa, muitas organizações compreendem-na como um passo inicial até o registro do OPAC (Niederle et al., 2021, pNiederle, P. A., Dorville, C., & Lemeilleur, S. (2021). Diferenciação institucional na certificação de produtos orgânicos: uma comparação dos Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade no estado do Rio Grande do Sul. Revista de Economia e Sociologia Rural, 59(2), e224827. http://doi.org/10.1590/1806-9479.2021.224827
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. 12).

Houve igualmente avanços com a criação da Cootap, a qual surgiu em resposta à demanda dos assentamentos que buscavam ampliar o acesso aos mercados, não somente para vender seus produtos, incluindo o caso dos mercados institucionais (PNAE e PAA), mas também para a aquisição de insumos (adubos orgânicos) e realização de investimentos nos lotes das famílias. A Cootap desempenha um papel importante, agrupando a produção das diversas cooperativas singulares e as demandas das famílias individuais articuladas em forma de rede.

Em grande medida, os assentamentos que apresentam maior organização coletiva são os que oferecem maior diversidade de artigos. Além de fomentar a cooperação entre as famílias assentadas, surgem pontes que conectam os assentamentos entre si, favorecendo a circulação dos produtos nas feiras regionais e nacionais, bem como o intercâmbio entre as famílias pela via da solidariedade e da reciprocidade.

A questão agrária no Brasil sempre assumiu uma conotação social, como resultado da exclusão praticada contra as classes subalternas, como bem ressaltou Martins (2003)Martins, J. S. (2003). A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais. In J. S. Martins (Ed.), A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais (pp. 228-228). Petrópolis: Vozes.. O imaginário social sobre o tema da reforma agrária se alimenta da força dos argumentos construídos pelos atores sociais atuantes dentro e fora do espaço das feiras, em meio a uma interação que acaba se convertendo num elo de ligação que transpassa as asperezas do tecido social. Conspiram a favor das feiras agroecológicas o despertar de uma nova consciência dos consumidores em torno às bondades dos produtos naturais, assim como uma crescente aversão aos produtos processados e carregados de conservantes.

O Grupo Gestor das Feiras se reúne trimestralmente para realizar os planejamentos relacionados à certificação, à produção em si, aos manejos, ao acondicionamento dos produtos e à comercialização. Também são avaliados os pontos de feiras e as infraestruturas que dão suporte ao processo. Para além do Grupo Gestor, as famílias se organizam em grupos de certificação que renovam os pactos em torno aos princípios éticos de todo o processo, desde a produção à comercialização. A produção de frutas, legumes e verduras se dá de forma individualizada, mas a comercialização e a certificação operam sob uma visão coletiva. Como observaram nossos entrevistados, essa é uma diferença importante em relação a agricultores que produzem e comercializam seus produtos, predominantemente, de forma individualizada.

As feiras que ocorrem em espaços públicos prescindem de autorização das prefeituras municipais. Na região metropolitana operam atualmente 41 feiras agroecológicas (Quadro 1). Em Porto Alegre, os assentados realizam 26 feiras distintas, sendo um número bem menor em municípios adjacentes, a exemplo de Canoas (7), Viamão (2), Charqueadas (2), Nova Santa Rita (1), Eldorado do Sul (1), São Jerônimo (1) e São Leopoldo (1). Estão envolvidas nada menos que 80 famílias ligadas a nove assentamentos distintos que comercializam mais de 70 itens (frutas, legumes, verduras, condimentos, sucos etc.).

Quadro 1
Feiras agroecológicas da RMPA de acordo com os municípios e locais de funcionamento

Mesmo sob o peso da globalização econômica, as feiras persistem, como frisaram alguns estudos (Ribeiro, 2007Ribeiro, A. E. M. (2007). Feiras do Jequitinhonha: mercados, cultura e trabalho de famílias rurais no semi-árido de Minas Gerais. Fortaleza: Etene/Banco do Nordeste do Brasil.; Sacco dos Anjos et al., 2005Sacco dos Anjos, F. S., Godoy, W. I., & Caldas, N. V. (2005). As feiras livres de Pelotas sob o império da globalização: perspectivas e tendências. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária.), sendo elas vistas como o lugar da diversidade por antonomásia. As 41 feiras agroecológicas são apresentadas no Quadro 1, as quais estão distribuídas em quatro grandes grupos segundo o local em que acontecem e o público a que se dirigem. O primeiro grupo (A) compreende as feiras que ocorrem dentro de órgãos públicos federais, estaduais e associações de classe; o segundo grupo (B) dentro de espaços privados (shoppings centers, clínicas privadas); o terceiro grupo (C) dentro de instituições e estabelecimentos de ensino público e privado; e o quarto grupo (D) compreende as feiras que ocorrem em espaços abertos (ruas e praças). O grupo D é o mais numeroso (43,9% das feiras), seguido do grupo A (26,8%), do grupo C (19,5%) e do grupo B (9,8%).

Chama a atenção o caso das feiras que ocorrem dentro de grandes superfícies de varejo (Shopping centers). Em maior ou menor medida, as feiras que ali se desenvolvem expressam uma situação antitética ou paradoxal. É que dividindo um amplo espaço, onde diariamente circulam milhares de pessoas, estão ali, justapostos, de um lado, um sistema regido pelo anonimato das trocas, altamente massificado, formal e padronizado em seus processos, e, de outro, uma modalidade de venda de produtos agroalimentares regida pelos princípios éticos, pela reciprocidade, pela informalidade e por relações de confiança.

4.3 As feiras agroecológicas sob a perspectiva das famílias assentadas na RMPA

Ao adentrarmos no universo das famílias assentadas ficaram evidenciados os princípios que guiam as práticas adotadas tanto no que tange ao processo produtivo em si quanto nas relações construídas com os demais atores intervenientes nesse sistema socioeconômico materializado nas feiras, sobretudo com os consumidores. A fidelização está pautada em compromissos éticos já comentados anteriormente. Todavia, foi durante a pandemia da Covid-19 que surgiram obstáculos intransponíveis para as famílias assentadas, as quais, da noite para o dia, viram-se privadas de realizar as feiras e de obter a renda necessária para assegurar a própria sobrevivência. O depoimento a seguir transcrito resume a sensação experimentada pela totalidade de nossos entrevistados:

É aí quando a gente tomou a decisão de parar com as entregas porque dava muito trabalho, e passar a fazer só as feiras. Então, focar nas feiras e aí era uma a mais que a gente fazia no Colégio Farroupilha também, aí veio a pandemia. Nós decidimos em dezembro, e aí em março começou. Aí paramos. Os três primeiros meses com as entregas, e em março veio a pandemia e aí as entregas explodiram. Aí a gente atendia assim... até as nove da noite a gente estava entregando, entregando, entregando. Chegou num limite que a gente disse assim: não temos mais capacidade e paramos de pegar gente nova e tal. Então foi muito, muito muito, muito, muito trabalho. Durante os dois anos de pandemia. E hoje, já diminuiu bastante porque tem o pessoal, conforme foram se sentindo seguros, foram indo retornando para as feiras, que sempre foi o nosso foco né? A feira tem que continuar, tá lá, e o pessoal tem que ir para as feiras (D, 66).

A pandemia fortaleceu a convicção de que era necessário buscar outros canais de comercialização, incluindo armazéns de bairro e lojas, apesar do aumento da jornada de trabalho. O que os entrevistados denominam “bolichos” correspondem a espaços de venda de produtos agroecológicos beneficiados e vendidos a um público cativo. Tais artigos procedem de outros assentamentos, a exemplo de grãos, sucos e cereais. O importante é diversificar a oferta de produtos, fazer girar o dinheiro ao longo do ano, evitando, assim, os períodos de escassez de renda e de artigos comercializáveis, como indica o depoimento a seguir:

[...] a gente tem, junto com a banca de verdes, a gente tá com o bolicho da feira, que o bolicho é uma banca que tu leva produtos, agrega produtos que os produtores da feira não têm. E essa também é uma conquista nova, a gente tá com 3 sábados de bolicho. Antes eram duas bancas. Uma com verdes e outra com feijão e arroz. O arroz é daqui. Da Cootap, e o feijão já é de fora. Mas, acaba sendo essa banca, a nossa banca, que segura os grãos o ano inteiro na feira. E como é isso, o M. fazia, desde sempre, a gente foi levando. Agora regularizou. Então agora é a banca de bolicho. Então a gente vai levar os feijões, mas aí a gente pode levar outras coisas, que a banca não tem, igual aveia, grão de bico, linhaça, O que não tem a banca do bolicho vai levar, daí somos nós (S, 59).

Para os produtores que participam das feiras, o comércio justo oferece um conjunto de vantagens que impactam positivamente nas vidas das famílias rurais e das comunidades, como aludem diversos estudos (Andorfer & Liebe, 2012Andorfer, V. A., & Liebe, U. (2012). Research on fair trade consumption: a review. Journal of Business Ethics, 106(4), 415-435. http://doi.org/10.1007/s10551-011-1008-5
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; Becchetti & Huybrechts, 2008Becchetti, L., & Huybrechts, B. (2008). The dynamics of fair trade as a mixed-form market. Journal of Business Ethics, 81(4), 733-750. http://doi.org/10.1007/s10551-007-9544-8
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; Doran, 2009Doran, C. J. (2009). The role of personal values in fair trade consumption. Journal of Business Ethics, 84(4), 549-563. http://doi.org/10.1007/s10551-008-9724-1
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). Em primeiro lugar, os preços justos permitem que esses agricultores e artesãos recebam uma remuneração adequada pelos seus produtos, garantindo que seu trabalho e investimento sejam devidamente recompensados. Além disso, os padrões de trabalho justos são rigorosamente aplicados, forjando ambientes seguros e dignos para os trabalhadores rurais e artesãos, o que inclui a proibição do trabalho infantil e o respeito aos direitos trabalhistas (Santos, 2011Santos, M. M. G. (2011). O comércio justo e o mercado global: um jogo de equilíbrios. Revista Lusófona de Ciência Política, Segurança e Relações Internacionais, 11, 89-109. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://recil.ensinolusofona.pt/handle/10437/4300
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).

O comércio justo também está intrinsecamente ligado ao desenvolvimento sustentável, promovendo práticas agrícolas que visam a preservação do meio ambiente e a prosperidade a longo prazo das comunidades rurais. Essa abordagem não apenas beneficia o planeta, mas também o bem-estar das futuras gerações. Outra dimensão fundamental do comércio justo é a facilitação do acesso desses produtores aos mercados globais. Há várias entidades de outros países interessadas em apoiar agricultores familiares e camponeses que produzem sem destruir os recursos naturais. Essa é outra faceta, através da qual sobressai a ideia referida na literatura internacional (abordagem “food as a commons”) referida anteriormente.

Outrossim, o comércio justo busca capacitar os produtores, fortalecendo suas organizações e comunidades. Isso se manifesta na promoção da participação democrática nas decisões relacionadas à produção e comercialização. O empoderamento é uma parte essencial do processo, instando os produtores para que tenham voz ativa sobre seus próprios destinos (Silva, 2016Silva, D. R. (2016). Redes de economia solidária e comércio justo: o caso da Cooperativa Agropecuária Familiar, Uauá e Curaça (COOPERCUC) no semiárido baiano (Dissertação de mestrado). Salvador: Universidade Federal da Bahia.). Para os consumidores, o comércio justo reúne um leque de vantagens significativas que vão além da simples compra de produtos. Primeiramente, os produtos de comércio justo são notoriamente reconhecidos pela alta qualidade, uma vez que os produtores são incentivados a investir na excelência de seus produtos. Isso significa que os consumidores podem desfrutar de produtos de primeira classe enquanto contribuem para uma causa maior que é a proteção do planeta num contexto onde cresce o temor pelos efeitos do aquecimento global.

Os sistemas de comércio justo promovem a transparência ao longo de toda a cadeia de suprimentos. Como referiu Santos (2011)Santos, M. M. G. (2011). O comércio justo e o mercado global: um jogo de equilíbrios. Revista Lusófona de Ciência Política, Segurança e Relações Internacionais, 11, 89-109. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://recil.ensinolusofona.pt/handle/10437/4300
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, tal atributo permite aos consumidores rastrear a origem dos produtos e verificar se os padrões éticos estão sendo rigorosamente cumpridos. Essa transparência cria uma sensação de confiança nas compras, onde os consumidores têm a certeza de que suas escolhas estão alinhadas com seus valores éticos. O depoimento de um de nossos entrevistados exprime, de forma patente, esse atributo que é tão valorizado e reconhecido pelos consumidores que afluem às feiras da RMPA. Não somente é preciso produzir um alimento confiável, no sentido de suas qualidades intrínsecas, mas de manter uma oferta regular para que essa relação se conserve através do tempo:

Porque a gente tem os clientes da gente, que a gente tem lá [na feira], é assim ó: eles vêm, eles vêm reto, eles vêm certo aqui, vem daqui, ó... Eles sabem que a gente mantém sempre. É parelha a produção. Se tu começar a falhar, que nem por exemplo: aqui ó, tem esse vizinho aqui, ele é um baita de um produtor, tudo assim ó, só que dá loucura nele, né? Tem época assim que ele planta, planta, planta e sobra produto, tem época onde ele tira e esquece de ir para a horta [e] aí já não tem os clientes certos dele (M, 46).

Os consumidores conscientes apreciam o fato de estarem apoiando práticas comerciais que são socialmente responsáveis e ambientalmente sustentáveis. Isso pode ser um fator motivador significativo para aqueles que desejam fazer compras de maneira ética e ecologicamente consciente. Nesse sentido, consumir produtos de comércio justo proporciona aos consumidores uma satisfação moral. Eles têm a gratificação de saber que suas escolhas de compra contribuem para uma causa social e ambiental justa, promovendo equidade e sustentabilidade. É uma maneira tangível de fazer a diferença no mundo enquanto se desfruta de produtos excepcionais (Silva, 2016Silva, D. R. (2016). Redes de economia solidária e comércio justo: o caso da Cooperativa Agropecuária Familiar, Uauá e Curaça (COOPERCUC) no semiárido baiano (Dissertação de mestrado). Salvador: Universidade Federal da Bahia.).

O comércio justo representa um modelo econômico e social centrado na equidade, sustentabilidade e qualidade de vida para todas as partes envolvidas, incluindo produtores- feirantes e consumidores. Portanto, o comércio justo promove uma abordagem ética no sistema comercial.

Alguns assentamentos da Região Metropolitana de Porto Alegre encontraram dificuldades de iniciar a produção, pois a grande maioria das famílias assentadas era estranha àquele ambiente e por isso teve que adaptar sua forma de produzir em relação ao clima, ao solo e à topografia dos assentamentos. Além das diferenças agroclimáticas, o solo se apresentava degradado devido ao uso intensivo de agroquímicos empregados na produção convencional de arroz irrigado. Dessa forma, algumas famílias inicialmente buscaram alternativas de renda fora do lote, trabalhando nas cidades da região metropolitana e principalmente em Porto Alegre.

Hoje, a comercialização dos produtos oriundos dos assentamentos da região metropolitana de Porto Alegre ocorre de diversas formas, e, a cada ano, há uma maior aceitação nos circuitos convencionais, incluindo grandes redes de supermercados. No entanto, as feiras ainda são os espaços prioritários de comercialização em meio ao contato direto com o público. Importante relatar que pelo fato desses assentamentos estarem próximos aos grandes centros urbanos da Região Metropolitana de Porto Alegre, facilita o fluxo dos produtos e a participação nas feiras. Essa proximidade contribui para que uma produção altamente perecível, como verduras, frutas e pães, possa celeremente chegar à mesa dos consumidores.

A proximidade aos centros urbanos ainda reduz o custo do transporte e as perdas da produção. Essa experiência das feiras do MST contraria a lógica verticalizada do grande mercado de alimentos. De acordo com Sacco dos Anjos et al. (2005)Sacco dos Anjos, F. S., Godoy, W. I., & Caldas, N. V. (2005). As feiras livres de Pelotas sob o império da globalização: perspectivas e tendências. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária., há uma perda de espaço da venda direta de produtos agrícolas no âmbito dos países centrais, bem como no contexto da maioria das cidades brasileiras, fenômeno esse decorrente, especialmente, da posição hegemônica que ocupam as grandes superfícies de varejo.

É exigido das famílias produtoras uma boa dose de organização para dar cabo das tarefas que se desenvolvem tanto no âmbito privado dos lotes e na obtenção dos produtos a serem comercializados quanto especialmente na esfera pública, no tocante ao processo de certificação, de planejamento da produção e da comercialização dos diversos artigos. O Grupo Gestor das Feiras é a instância onde grande parte das decisões é tomada. Quando questionados sobre sua participação no grupo gestor e de certificação, os entrevistados confirmaram que estão envolvidos em ambas as instâncias. Todavia, o papel dessa institucionalidade acaba derivando para elucidar outras questões relacionadas ao dia a dia nos assentamentos.

No grupo de certificação, nossos entrevistados explicaram que a coordenação é rotativa, onde cada família assume a responsabilidade durante um período de um ou dois anos. Isso promove uma distribuição equitativa das tarefas e incentiva a participação de todos os membros do assentamento na gestão e certificação dos produtos. Durante esse intervalo de tempo, eles acompanham todas as reuniões dos grupos gestores das hortas e da Cootap, assegurando a disseminação eficaz das informações para o grupo e participando diretamente das decisões da cooperativa.

Ao acompanhar as reuniões dos grupos gestores das hortas e da Cootap, os participantes desempenham um papel fundamental na coleta de informações relevantes, que são posteriormente compartilhadas com todo o grupo. Esse sistema de rodízio não apenas garante uma gestão mais democrática do assentamento, mas também que todos os membros se envolvam ativamente nas decisões e processos que afetam a sua comunidade agrícola. A participação ativa é essencial para o sucesso e a sustentabilidade dos assentamentos.

Ao ser indagada sobre a frequência das reuniões com a Cootap, a entrevistada J (46) explicou que a frequência dessas reuniões é definida pela própria Cootap, a qual acontece aproximadamente a cada três meses. Durante a pandemia, houve pausas nas reuniões devido às circunstâncias, sendo logo a seguir retomadas.

As reuniões do grupo de certificação eram mensais né? Esse ano que a gente tá um pouco mais espaçado mas, sempre o grupo aqui participa das reuniões mensalmente, sempre na primeira segunda-feira do mês. Com a pandemia deu um espaçamento, mas também não deixamos de nos reunir, um pouco mais espaçado... Dois meses no máximo, né? (J, 46).

Eles observaram que o processo de certificação (avaliação da conformidade orgânica) não estabelece um número específico de reuniões além das duas visitas anuais dos pares certificadores. No entanto, recomenda-se que as reuniões ocorram regularmente. Há certa flexibilidade, de modo a que a comunidade se organize de acordo com as suas necessidades. Isso faz com que o grupo de certificação se adapte às circunstâncias e a novos desafios. Num momento de tantas incertezas e de grandes desafios, a necessidade de se reunirem cresceu durante a pandemia. Decisões difíceis precisavam ser tomadas no âmbito individual e coletivo.

É preciso dizer que tais assentamentos enfrentam um ambiente marcadamente hostil. Em seu entorno estão grandes propriedades que praticam uma agricultura intensiva e altamente tributária do uso de agrotóxicos. Recorrentemente as famílias são ameaçadas pelos fazendeiros. Exemplo disso corresponde aos fatos que se sucederam entre os dias 16 e 12 de novembro de 2020 com a criminosa pulverização de agrotóxicos sobre o assentamento Santa Rita II, localizado no município de Nova Santa Rita. Essa prática ilegal já havia sido proibida pela Justiça Federal e voltou a ocorrer no final de 2020 e também em março de 20213 3 Ver a propósito a decisão do TRF4 em 25/04/23 e a matéria publicada no Brasil de Fato (2021). .

O Instituto Preservar, uma associação sem fins lucrativos e que atua na defesa e preservação do meio ambiente, ajuizou uma ação, em setembro de 2021, que tem como réus “empresas fabricantes de agrotóxicos, diversos produtores rurais, a União, o estado do Rio Grande do Sul e a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam)” (Brasil, 2023Brasil. (2023). Mantida proibição de pulverização de agrotóxicos em propriedades rurais de Nova Santa Rita (RS) e Eldorado do Sul (RS). Portal Unificado da Justiça Federal. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://www.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=noticia_visualizar&id_noticia=26949
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). Nesses termos, ficou claramente evidenciada a reiterada e deletéria ação dos grandes produtores, mas também a omissão perversa de um órgão estadual (Fepam) que deveria exercer suas atribuições no sentido de coibir as ações delitivas cometidas pelos infratores e zelar pela vida das famílias.

Além da contaminação direta das pessoas que habitam os assentamentos, houve prejuízos econômicos graves, dado que a produção contaminada por agrotóxicos não pode ser comercializada. Tal fato foi comprovado através de laudos emitidos pelo serviço público de Extensão Rural (Emater, RS). Tais eventos revestem importância na medida em que evidenciam o oceano de dificuldades a que se enfrentam as famílias em seu devir. A produção contaminada foi descartada pelos assentados, gerando grande revolta nas famílias e nos apoiadores da causa. Para não trair a confiança dos consumidores, as famílias amargaram o prejuízo. A inércia das autoridades federais é decorrente do peso político das forças que apoiaram a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder e das forças atuantes no âmbito do governo do estado do Rio Grande do Sul na gestão de Eduardo Leite. Há vários trabalhos recentes (Araújo & Franchini, 2020Araújo, R., & Franchini, M. (2020). The impact of Bolsonaro’s policies on the fight against illegal deforestation in Brazil. Sustainability, 12(21), 8841.; Ferrante & Fearnside, 2019Ferrante, L., & Fearnside, P. M. (2019). Brazil’s new president and “ruralists” threaten Amazonia’s environment, traditional peoples and the global climate. Environmental Conservation, 46(4), 261-263. http://doi.org/10.1017/S0376892919000213
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; Abessa et al., 2019Abessa, D., Famá, A., & Buruaem, L. (2019). The systematic dismantling of Brazilian environmental laws risks losses on all fronts. Nature Ecology & Evolution, 3(4), 510-511. http://doi.org/10.1038/s41559-019-0855-9
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) que referem a destruição ambiental protagonizada no Brasil nos últimos cinco anos.

Na seção a seguir elencamos alguns eixos de convergência que a imersão realizada nos assentamentos da RMPA permitiu desvelar no que tange à questão das feiras como um processo eminentemente social e produtor de significados.

4.4 Eixos de convergência da dinâmica das feiras agroecológicas da RMPA

  1. Histórico do assentamento:

    • A maioria dos feirantes entrevistados está no assentamento há 28 anos, indicando um longo período de comprometimento com a comunidade onde estão inseridos, dentro e fora do assentamento;

    • A condição inicial do assentamento era precária, mas ao longo dos anos as famílias demonstraram perseverança na construção e melhoria das condições de vida;

  2. Envolvimento em organizações:

    • Os feirantes atuam ativamente no âmbito da Cootap e na Coceargs, mostrando um forte engajamento em questões relacionadas à comunidade e à agricultura familiar. Não se trata aqui de uma escolha, mas de um imperativo diante da necessidade de viabilizar a própria sobrevivência;

    • Mesmo sem ocupar cargos de liderança estadual, as famílias desempenham papéis administrativos nessas organizações, indicando uma participação ativa na gestão coletiva;

  3. Participação em órgãos ligados à certificação da produção:

    • O sistema de rodízio na coordenação do grupo de certificação é uma prática que promove a distribuição equitativa de tarefas e incentiva a participação de todas as famílias nos diversos processos;

    • Durante os dois anos de liderança no grupo de certificação, os feirantes participaram ativamente das reuniões dos grupos gestores das hortas e da Cootap, demonstrando um compromisso contínuo com a gestão e certificação das atividades agrícolas;

  4. Frequência de reuniões:

    • A frequência das reuniões com a Cootap é decidida pela própria organização e ocorre aproximadamente a cada três meses, com flexibilidade para se adaptar às necessidades das famílias e dos coletivos aos quais estão ligadas;

    • Durante a pandemia, houve pausas, mas logo a seguir foram elas retomadas, mostrando uma capacidade de adaptação às circunstâncias e aos desafios que se apresentam cotidianamente na produção, acondicionamento, transporte e comercialização, dentro e fora dos espaços das feiras;

  5. Flexibilidade e tradição das reuniões:

    • As reuniões mensais do grupo de certificação foram uma tradição instituída pelo grupo desde o início, demonstrando um compromisso contínuo com a comunidade, mesmo quando não havia assuntos cruciais a serem abordados;

    • A certificadora não impõe um número rígido de reuniões, admitindo certa flexibilidade para que a comunidade organize as reuniões de acordo com suas necessidades. Isso não significa falta de rigor nos processos de controle. Há uma reputação a ser zelada pelas famílias no contexto das relações travadas com os consumidores de seus produtos.

5 Conclusões

Em dezembro de 1964 foi promulgado o Estatuto da Terra, nove meses depois da deflagração do golpe militar. O fato é que ambos os eventos marcaram indelevelmente a história nacional. Não representa nenhuma novidade o fato de a questão agrária ocupar um lugar destacado no epicentro dos acontecimentos que ensejaram, há 60 anos atrás, a deposição de um presidente (João Goulart), democraticamente eleito, e a ditadura que se seguiu nas duas décadas subsequentes (1964-1985). Deter o processo de democratização nacional e impedir qualquer ação destinada a promover a justiça social no campo está na raiz da aliança construída pelos setores mais reacionários (militares, latifundiários e capital internacional).

Destarte, 2024 é também marcante na medida em que se celebra os 40 anos do surgimento do MST, o mais importante movimento social da América Latina, cujas ações envolvem não somente a luta pela reforma agrária, mas a construção de sistemas agroalimentares justos e sustentáveis. O caso sobre o qual nos debruçamos neste artigo representa uma das facetas através da quais é possível compreender o fenômeno que a literatura internacional denomina “redes agroalimentares alternativas” em toda sua diversidade de propósitos e tipos de apelos. Nesse contexto, inclinamo-nos pelo termo “rede agroalimentar cívica” a partir das características anteriormente analisadas e da trajetória que guiou a sua construção.

Um dos pilares fundamentais que suportam a experiência das feiras agroecológicas da Região Metropolitana de Porto Alegre é a relação de confiança construída pelas famílias de assentados e os consumidores dos produtos. Esse vínculo só pode ser estabelecido a partir do fato de que as pessoas que comercializam são as mesmas que produzem artigos alimentícios, cuja elaboração segue rigorosamente os padrões técnicos definidos na legislação de orgânicos no Brasil. A força do coletivo se expressa no processo histórico que marcou o surgimento dos assentamentos e a luta por assegurar a reprodução social das famílias em seus lotes.

Apesar da excelente receptividade das feiras, o ambiente no entorno dos assentamentos se mostra complicado, quando não hostil, como comentado anteriormente. No âmbito interno dos assentamentos há preocupações relacionadas ao processo de envelhecimento dos agricultores e agricultoras e com o impacto do que essa mudança demográfica possa acarretar no que tange à sucessão nos estabelecimentos. Alguns depoimentos revelaram uma preocupação latente, como o de L (53):

A vida de feira é linda, construímos relações importantes e temos muito compromisso com o que fizemos, mas os desafios são grandes e as leis não ajudam ao produtor agroecológico, por isso mesmo nos incentive nossos filhos a ficar e eles queiram ficar. As leis não ajudam e a corda estoura sempre no lado mais fraco.

Apesar disso, resta o entendimento de que os últimos 30 anos estiveram marcados por grandes avanços, propiciando um processo de aprendizagem que vai muito além das questões técnicas, afetas ao campo estrito da produção agropecuária. Lidar com as preferências dos consumidores, interagir com agentes públicos e privados e superar inúmeras adversidades fortalece a convicção de muitas famílias de que há um futuro promissor para os assentamentos. O cataclismo produzido pela pandemia da Covid-19 colocou à prova a capacidade de superação das famílias rurais. Acostumadas às inclemências do tempo e à toda sorte de precariedades, os assentados encontraram, no plano do coletivo, a força requerida para atravessar momentos de grandes dificuldades e incertezas, bem como a solução para contornar um ambiente invariavelmente adverso.

  • 1
    Em maio de 1978, nada menos que 1.800 famílias tiveram que abandonar a terra depois da demarcação da Reserva Indígena de Nonoai, destinada à etnia Kaingang. Tal fato lançou um contingente de famílias a uma desesperadora condição. Sobre esse tema, consultar Fernandes (2000)Fernandes, B. M. (2000). A formação do MST no Brasil. Petrópolis: Vozes..
  • 2
    A Instrução Normativa n.º 19 de 2009 define três mecanismos de controle e informação da qualidade orgânica no Brasil, envolvendo um Organismo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC), o qual pode ser: 1) uma Certificadora, que estabelece uma certificação por Auditoria ou por terceira parte; 2) Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC), que estabelece a certificação via Sistema Participativo de Garantia (SPG) da Qualidade Orgânica; e 3) Organização de Controle Social (OCS). A terceira possibilidade permite exclusivamente a venda direta ao consumidor, que pode se dar tanto no caso de feiras como em compras governamentais, mas sem o direito ao Selo Orgânico. Nesse caso, a credibilidade é gerada por uma OCS. Independentemente de qual mecanismo de credibilidade é acionado, em todos os três casos os produtores precisam estar registrados no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos (CNPO) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
  • 3
    Ver a propósito a decisão do TRF4 em 25/04/23 e a matéria publicada no Brasil de Fato (2021)Brasil de Fato. (2021). TRF4 mantém proibição de pulverização perto de assentamento de Nova Santa Rita. Brasil de Fato. Recuperado em 14 de fevereiro de 2024, de https://www.brasildefators.com.br/2021/03/24/trf4-mantem-proibicao-de-pulverizacao-perto-de-assentamento-de-nova-santa-rita
    https://www.brasildefators.com.br/2021/0...
    .
  • Como citar: Chies, J. J., & Sacco dos Anjos, F. (2024). Ocupar, resistir e produzir: famílias assentadas e feiras agroecológicas na Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil . Revista de Economia e Sociologia Rural, 62(3), e283305. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2023.283305
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    14 Fev 2024
  • Aceito
    08 Jun 2024
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