Resumos
OBJETIVO: descrever a prática de atividade física e o hábito de assistir à televisão entre adultos brasileiros.
MÉTODOS: estudo descritivo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013; foram calculadas as prevalências de adultos (≥18 anos) ativos no lazer, no deslocamento, e insuficientemente ativos (considerando-se três domínios: lazer, deslocamento e trabalho), além da proporção de adultos assistindo à televisão por três ou mais horas/dia.
RESULTADOS: 22,5% dos adultos atingiram as recomendações de atividade física no lazer (IC95% 21,8-23,1), sendo esse percentual de prevalência maior entre homens e residentes na área urbana; 31,9% (IC95% 31,0-32,7) eram ativos no deslocamento e 46,0% (IC95% 45,2-46,8) insuficientemente ativos; a proporção de adultos que assistia à televisão por três ou mais horas/dia foi de 28,9% (IC95% 28,2-29,6).
CONCLUSÃO: praticamente metade da população brasileira não atingiu os níveis recomendados de prática de atividade física, sugerindo a necessidade do fortalecimento de ações de promoção de atividade física no país.
Atividade Física; Inquéritos Epidemiológicos; Adulto; Epidemiologia Descritiva
OBJECTIVE: to describe physical activity and television viewing habits among Brazilian adults.
METHODS: data from the 2013 National Health Survey with adults (aged 18 and over) were analyzed; prevalence of physical activity during leisure-time, when commuting and at work, as well as physical inactivity and watching television for three or more hours/day was calculated.
RESULTS: 22.5% achieved recommended physical activity during leisure-time (95%CI 21.8-23.1), with this proportion being higher among men and urban area residents; 31.9% (95%CI 31.0-32.7) of the participants were active when commuting and 46.0% (95%CI 45.2-46.8) were considered inactive in all domains; the proportion of television viewing time (three or more hours/day) was 28.9% (95%CI 28.2-29.6).
CONCLUSION: given that practically half the Brazilian adult population did not achieve recommended levels of physical activity, this suggests the need to strengthen actions to promote physical activity in Brazil.
Physical Activity; Health Surveys; Adult; Epidemiology, Descriptive
OBJETIVO: describir la práctica de actividad física y el hábito de ver televisión en adultos brasileños.
MÉTODOS: estudio descriptivo con datos de la Encuesta Nacional de Salud 2013; calculamos las prevalencias de adultos (≥18 años) activos en su tiempo libre, activos para desplazarse e insuficientemente activos (teniendo en cuenta tres dominios: ocio, viajes y trabajo), además de la proporción de adultos que ven televisión por más de tres horas/día.
RESULTADOS: entre los adultos, 22,5% (IC95% 21,8-23,1) llegaron a las recomendaciones de actividad física en su tiempo libre, siendo esta prevalencia más altas en hombres y residentes de zonas urbanas; 31,9% (IC95% 31,0-32,7) eran activos al desplazarse y 46,0% (IC95% 45,2-46,8) insuficientemente activos; la proporción de adultos que veían televisión por más de tres horas/día fue de 28,9% (IC95% 28,2 a 29,6).
CONCLUSIÓN: Prácticamente la mitad de la población brasileira no cumple con los niveles recomendados de practica de actividad física, esto sugiere la necesidad de fortalecer acciones para promover actividad física en la población.
Actividad Motora; Encuestas Epidemiológicas; Adulto; Epidemiología Descriptiva
Introdução
A prática de atividade física tem papel crucial no enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), responsáveis por 72% das mortes ocorridas no Brasil em 2007.1 Estudo conduzido por Lee e colaboradores2 estimou que a inatividade física - definida como 'Não praticar pelo menos 150 minutos semanais de atividade física moderada/vigorosa' - foi responsável, em 2008, por 6% das mortes por doença coronariana, 7% das mortes por diabetes tipo 2, 10% das mortes por câncer de mama e 10% das mortes por câncer de colón, causando mais de 5 milhões de mortes por ano no mundo.2 No Brasil, em 2008, mais de 13% das mortes ocorridas foram atribuídas à inatividade física.2
Hallal e cols.,3 ao analisarem dados sobre a prevalência de inatividade física em 122 países no ano de 2012, encontraram que 31% da população mundial na idade de 15 anos ou mais não atingiam as recomendações de atividade física para a saúde, com grande variação dessa prevalência entre diferentes regiões do mundo.3 Considerando-se apenas a população brasileira, estimou-se que 49,2% dos adultos não praticavam pelo menos 150 minutos semanais de atividade física moderada a vigorosa na semana, sendo essa prevalência de 47,2% entre homens e de 51,6% nas mulheres. Além da inatividade física, o comportamento sedentário tem sido descrito com um importante fator de risco para a saúde, sendo estimado que 41,5% da população mundial com 15 anos ou mais despende quatro horas ou mais por dia em comportamento sedentário.3
O diagnóstico do estado de saúde comunitário tem grande importância no cuidado da saúde da população e no planejamento de ações voltadas à gestão do Sistema Único de Saúde. Frente à amplitude geográfica e à diversidade cultural e socioeconômica do Brasil, as quais interferem diretamente no perfil de fatores de risco e doenças que afetam a população, a realização de inquéritos de abrangência nacional é ferramenta importante para subsidiar o planejamento de ações de prevenção de DCNT e promoção da saúde, incluindo a promoção de atividade física.
Dada a importância da atividade física no contexto da Saúde Pública, o Brasil tem incorporado a mensuração da atividade física em seu sistema de monitoramento e vigilância. Em 2013, uma parceria firmada entre o Ministério da Saúde e a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) permitiu a realização da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), uma investigação de representatividade nacional com o propósito de retratar questões relacionadas à saúde dos brasileiros.4
O objetivo do presente estudo foi descrever a prática de atividade física e o tempo assistindo televisão entre adultos brasileiros.
Métodos
Este estudo foi realizado com dados coletados pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS). A PNS é uma pesquisa de base domiciliar que faz parte do Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares (SIPD) do IBGE. A população-alvo do estudo constitui-se de adultos residentes em domicílios particulares do Brasil, à exceção daqueles localizados em setores censitários especiais (quartéis, bases militares, alojamentos, acampamentos, embarcações, penitenciárias, colônias penais, presídios, cadeias, asilos, orfanatos, conventos e hospitais). O processo de amostragem foi construído de forma a se conseguir uma amostra representativa, com desagregação geográfica, considerando-se as macrorregiões do país, Unidades da Federação e capitais. O processo de amostragem foi realizado em três estágios, sendo os setores censitários ou conjunto de setores como unidades primárias de amostragem, os domicílios como unidades secundárias e os moradores adultos (18 anos ou mais) como unidades terciárias de amostragem. Em cada domicílio pertencente à amostra, foi selecionado - de forma equiprobabilística - um adulto. Cada participante respondeu um questionário sobre informações do domicílio, um questionário sobre o estado de saúde dos demais moradores do domicílio e um questionário individual sobre estilo de vida e estado de saúde. Para este estudo, foram utilizadas apenas as informações coletadas pelo questionário individual. Detalhes adicionais sobre a PNS, o processo de amostragem e instrumentos utilizados são descritos no relatório oficial da pesquisa.5
A prática de atividade física foi mensurada com base nas respostas a um questionário composto por perguntas sobre frequência e duração da prática de atividade física em diferentes domínios. Para cada um dos domínios avaliados, foram construídos escores de prática de atividade física multiplicando-se a frequência semanal pelo tempo de duração nos dias em que a atividade era realizada. Esse instrumento segue o modelo de questionário aplicado pelo sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), o qual investiga a prática de atividade física no lazer, no deslocamento e em atividades no trabalho. Neste artigo, foram estudados os seguintes indicadores:
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a) ativo no lazer - proporção de participantes que praticaram pelo menos 150 minutos por semana de atividades físicas leves ou moderadas, ou pelo menos 75 minutos/semana de atividades físicas vigorosas no lazer, ou um combinado de atividades físicas moderadas e vigorosas totalizando 150 minutos semanais;
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b) ativos no deslocamento - proporção de adultos que relataram despender pelo menos 30 minutos deslocando-se a pé ou de bicicleta para o trabalho ou outras atividades habituais.
-
Para a construção deste indicador, foi considerado o tempo de 30 minutos diários, assumindo-se que os deslocamentos relatados pelos participantes ocorreriam em pelo menos cinco dias da semana, de forma a totalizar 150 minutos semanais;
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c) Insuficientemente ativos - adultos que não atingiram pelo menos 150 minutos semanais de atividade física considerando-se o lazer, o trabalho e o deslocamento -; e
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d) hábito de assistir à televisão - proporção de participantes que relataram assistir à televisão por três ou mais horas/dia.
Para cada um dos indicadores, foram calculadas as respectivas prevalências (na forma de proporções, em percentuais) e intervalos de confiança de 95% (IC95%). Os indicadores foram descritos de acordo com o sexo (masculino; feminino), unidades da Federação, macrorregiões do país (Nordeste; Norte; Sudeste; Sul; e Centro-Oeste) e área de residência (urbana; rural). Todas as análises foram realizadas considerando-se os pesos amostrais. Os resultados da amostra foram expandidos para a população brasileira. As análises foram conduzidas no pacote estatístico Stata versão 12.1.
O estudo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), sob o Parecer no 328.159, de 26 de junho de 2013, em conformidade com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) no 466, de 12 de dezembro de 2012. Todos os indivíduos participantes foram consultados, esclarecidos e aceitaram participar da pesquisa mediante assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Resultados
Foram selecionados para a amostra da PNS 81.167 domicílios em todo o Brasil, sendo entrevistados 60.202 indivíduos (proporção de resposta: 74,2%). Para as análises dos dados de atividade física, foram validadas informações de 59.667 participantes. Os dados da amostra estudada podem ser expandidos para 146,1 milhões de adultos.
A descrição dos indicadores de atividade física e do hábito de assistir à televisão, entre a população geral e de acordo com o sexo, encontra-se na Tabela 1.
A prevalência de adultos ativos no lazer foi de 22,5% (IC95% 21,8-23,1), sendo maior nos homens (27,1%; IC95% 26,1-28,0) quando comparada à das mulheres (18,4%; IC95% 17,5-19,2). Foram classificados como ativos no deslocamento 31,9% (IC95% 31,0-32,7) da população estudada. Considerando-se apenas o deslocamento para o trabalho, 12% relataram mais de 30 minutos por dia para ir/voltar a pé ou de bicicleta ao trabalho (dados não mostrados). Praticamente metade da população estudada (46,0%; IC95% 45,2-46,8) não atingiu as recomendações de pelo menos 150 minutos semanais de prática de atividade física considerando-se o lazer, o trabalho e o deslocamento, sendo essa prevalência maior entre mulheres (51,5%; IC95% 50,5-52,5); 28,9% (IC95% 28,2-29,6) da população relatou assistir à televisão por três ou mais horas diárias.
De maneira geral, houve pouca variação nos indicadores estudados de acordo com as macrorregiões do país (Figura 1).
Prevalências (%) e intervalos de confiança de 95% dos indicadores de atividade física e do hábito de assistir à televisão a entre adultos, de acordo com as macrorregiões do país - Pesquisa Nacional de Saúde. Brasil, 2013
A prevalência de ativos no lazer, por exemplo, variou de 22,2% (IC95% 20,8-23,6) na região Norte a 24,1% (IC95% 22,7-25,4) na região Centro-Oeste. A prevalência de ativos no deslocamento variou entre 25,9% (IC95% 24,4-27,4) na região Centro-Oeste e 35,2% (IC95% 33,7-36,7) na região Nordeste.
A Figura 2 apresenta a descrição dos indicadores de atividade física de acordo com a área de residência. As prevalências de deslocamento ativo e inatividade física apresentaram pouca variação entre os participantes residentes na área urbana ou rural. Por sua vez, a prevalência de ativos no lazer entre aqueles residentes na área urbana foi praticamente o dobro da prevalência de ativos no lazer entre residentes na área rural. Da mesma forma, o hábito de assistir à televisão foi maior entre aqueles que residiam na área urbana (30,1%; IC95% 29,3-30,9) quando comparados aos residentes na área rural (21,4%; IC95% 20,0-22,8).
Prevalências (%) e intervalos de confiança de 95% dos indicadores de atividade física e do hábito de assistir à televisão a entre adultos, de acordo com a área de residência - Pesquisa Nacional de Saúde. Brasil, 2013
Em relação à prevalência de ativos no lazer de acordo com as Unidades da Federação (Figura 3), em 16 delas, a prevalência do indicador esteve entre 21 e 24%. No estado do Amazonas, 1/4 da população foi classificada como ativa no lazer, enquanto Rondônia foi o estado com menor prevalência de ativos no lazer (17%; IC95% 14,0-20,1). Rondônia também foi o estado que apresentou a maior prevalência de insuficientemente ativos (57,3%; IC95% 52,8-61,7), enquanto Minas Gerais (41,0%; IC95% 37,6-44,5) foi aquele com essa prevalência menor entre todas as Unidades da Federação (Figura 4). Apenas em 11 estados, o percentual de insuficientemente ativos foi menor que a prevalência nacional.
Prevalência (%) e intervalos de confiança de 95% de adultos ativos no lazer, de acordo com as Unidades da Federação - Pesquisa Nacional de Saúde. Brasil 2013
Prevalência (%) e intervalos de confiança de 95% de adultos insuficientemente ativos, de acordo com as Unidades da Federação - Pesquisa Nacional de Saúde. Brasil, 2013
Discussão
Os dados do presente estudo mostram que praticamente metade da população brasileira não atingiu os níveis recomendados de prática de atividade física. Apenas um em cada quatro a cinco adultos atingiu as recomendações de atividade física no lazer e 31% foram classificados como ativos no deslocamento. Aproximadamente um terço da população despendia mais de três horas diárias assistindo à televisão. A distribuição desses indicadores revelou padrões específicos, de acordo com variáveis regionais e área de residência. Estes resultados são impactantes e apontam um caminho repleto de desafios para o enfrentamento de DCNT.
No Brasil, a produção científica em epidemiologia da atividade física tem crescido bastante nos últimos anos, com destaque para estudos realizados sobre o tema nas regiões Sul e Sudeste.6 Entretanto, apesar desse avanço, a comparabilidade entre achados de diferentes pesquisas vê-se muitas vezes limitada, devido aos diferentes instrumentos empregados e aos aspectos relacionados com os domínios da atividade física.6 A partir dos dados da PNS, é possível desenhar um panorama bastante ampliado da prática de atividade física no Brasil.
O entendimento do contexto no qual ocorre a prática de atividade física é fundamental para o desenvolvimento de políticas de prevenção de DCNT e promoção da saúde. Entre os domínios da atividade física, o lazer é o que apresenta grande potencial de intervenção. Neste estudo, observou-se pouca variação regional na prática de atividade física no lazer. No Brasil, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo IBGE em 2008 mostraram que apenas 10,5% dos participantes com 14 anos ou mais de idade relataram praticar atividades físicas leves ou moderadas em cinco dias ou mais na semana por pelo menos 30 minutos e/ou praticaram atividades físicas vigorosas em três dias ou mais na semana por pelo menos 20 minutos.7 Dados de tendência temporal em adultos residentes nas capitais de estados brasileiros mostraram que entre 2006 e 2012, houve um aumento na prevalência de adultos que praticaram atividade física no lazer por pelo menos 30 minutos em cinco ou mais dias na semana.8 Cabe destacar que as prevalências de ativos no lazer encontradas por este estudo não devem ser comparadas com os resultados da PNAD 2008, devido aos diferentes instrumentos empregados nos inquéritos.
Em torno de um terço da população brasileira foi classificada como ativa no deslocamento. O debate sobre esse domínio da atividade física pode ser realizado sob mais de uma perspectiva. O incentivo a formas de deslocamento ativo, como o uso de bicicleta e o deslocamento a pé, pode contribuir para o aumento dos níveis populacionais de atividade física e, consequentemente, para o enfrentamento das DCNT. Contudo, é importante salientar que a forma de deslocamento de uma população é pouco influenciada por escolhas individuais, sendo o acesso a bens e serviços essenciais, como segurança, transporte público de qualidade e ambientes favoráveis à mobilidade urbana, determinantes sociais da saúde individual e coletiva com impacto direto sobre o deslocamento ativo.
Nesse sentido, para que haja aumento nos níveis populacionais de atividade física no deslocamento, faz-se necessário promover ações intersetoriais envolvendo a construção de ambientes propícios à prática de deslocamento ativo. As políticas para transporte ativo têm potencial para aportar benefícios à saúde, aumentando os níveis de atividade física e contribuindo para a redução da poluição,9 a qual também está relacionada a maiores taxas de DCNT. O incentivo a formas de deslocamento ativo são capazes de melhorar o tráfego, além de seu reflexo positivo sobre aspectos sociais e ecológicos.10,11 Dados sobre deslocamento entre adultos residentes nas capitais mostraram uma redução na proporção de adultos que se deslocaram a pé ou de bicicleta para o trabalho, tanto no período entre 2006 e 2008 quanto entre 2009 e 2012.8 Dos adultos residentes nas capitais brasileiras em 2012, 11,0% se deslocaram para o trabalho dessa forma. No presente estudo, considerando-se apenas o deslocamento para o trabalho, 12% relataram mais de 30 minutos para ir/voltar a pé ou de bicicleta ao trabalho (dados não mostrados).
A literatura científica tem sugerido que o comportamento sedentário (tempo sentado) está associado a maior risco de eventos cardiovasculares12 e maiores taxas de mortalidade por todas as causas.13 A PNS 2013 utilizou como medida de comportamento sedentário o tempo despendido assistindo à televisão - este, também, associado ao maior risco de mortalidade por doenças cardiovasculares.12,14 Praticamente um terço da população brasileira relatou assistir à televisão por três horas ou mais/dia, sendo esse hábito mais frequente entre mulheres e residentes na área urbana. Apesar desse padrão também ser demostrado em outros estudos,15 faz-se mister uma interpretação cautelosa desses achados no que tange à atribuição de maior exposição a comportamentos sedentários nesses grupos populacionais. É necessário destacar o papel do tempo sentado diante da televisão como grande responsável pelo total de comportamento sedentário e como opção de lazer acessível para grupos específicos, especialmente entre a população com menor escolaridade.15 É possível que outras formas de comportamento sedentário não avaliadas neste estudo, como por exemplo, o trabalho sentado e o tempo despendido diante de outros tipos de tela (p. ex.: tela-monitor do computador), possam representar grande parte do total de comportamento sedentário entre adultos.
Os dados apresentados mostraram que a relação entre sexo e prática de atividade física depende do indicador analisado. No presente estudo, encontrou-se que os homens foram mais ativos que as mulheres no lazer, ao passo que as mulheres relataram maior tempo assistindo à televisão. No que se refere as esses dois indicadores, tal padrão tem sido frequentemente reportado pela literatura.3,7,8,15
Quando a prática de atividade física foi considerada em mais de um domínio, observou-se uma prevalência de insuficientemente ativos maior entre as mulheres quando comparada à mesma prevalência entre os homens. Dados da PNAD 20087 mostram que a prevalência de inativos, definidos como participantes que não praticavam qualquer atividade física em todos os domínios (deslocamento, atividade laboral, faxina no ambiente doméstico e atividades no lazer), foi de 25,6% em homens e de 15,2% em mulheres.15 Apesar de os resultados apresentados não mostrarem padrão semelhante aos achados da PNAD, é importante destacar que a construção dos indicadores revela distinções marcantes. Diferentemente da PNAD 2008, para a construção do indicador do presente estudo, atividades realizadas no ambiente doméstico não foram consideradas e, possivelmente, tal diferença explicaria a inconsistência nos achados.
Mesmo com o aumento da taxa de urbanização no Brasil observado nos últimos anos, a população residente em áreas rurais representa aproximadamente 16% da população brasileira,16 variando entre 27% nas regiões Norte e Nordeste e 7% na região Sudeste. Não obstante a crescente produção de literatura sobre os níveis de atividade física no Brasil, poucos estudos têm-se ocupado do contexto rural. Os resultados do presente estudo indicam que apenas 13% dos adultos residentes na área rural atingiram os níveis recomendados de atividade física no lazer versus 24% de residentes na área urbana com essa mesma indicação. Em estudo realizado com duas comunidades rurais situadas no Vale do Jequitinhonha, estado de Minas Gerais, Bicalho e cols.17 encontraram uma prevalência de ativos no lazer próxima de 10%, em 2008-2009. Apesar das baixas prevalências de prática de atividade física no lazer entre moradores da área rural, é preciso interpretar esse resultado dentro do contexto no qual as atividades laborais são realizadas, principalmente por meios manuais. No mesmo estudo conduzido em Minas Gerais (2008-2009),17 mais de 80% daqueles que relataram trabalhar praticavam mais de 150 minutos de atividade físicas moderadas e vigorosas no trabalho. A elaboração de estratégias de promoção da atividade física no meio rural, portanto, devem considerar aspectos contextuais, assim como outros domínios da prática de atividade física. Os resultados apresentados apontam para a necessidade de estudos capazes de identificar as barreiras encontradas por residentes em áreas rurais para desenvolverem um lazer ativo, além de analisar e/ou propor políticas públicas que ampliem o acesso dessa população a iniciativas de promoção de atividade física.
Nos últimos anos, o Brasil tem empreendido diversos esforços para o enfrentamento de DCNT, tendo pautado o aumento da prática de atividade física como um dos fatores-chave desse processo.18 Nesse sentido, algumas ações merecem destaque. Em 2006, o Ministério da Saúde lançou a Política Nacional de Promoção da Saúde, atualizada em 2014;19 e em 2011, o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2012.20-21 A prática de atividade física tem recebido atenção especial nesses documentos, com a criação de diretrizes específicas voltadas ao aumento dos níveis de atividade física entre a população. A título de exemplo, pode-se mencionar a criação do Programa Academia da Saúde em 2011, com previsão de financiamento de até 4.000 polos de desenvolvimento de intervenções comunitárias de promoção da saúde - incluída a promoção de atividade física sem custo para a população -, facilitando o acesso da sociedade a espaços apropriados para a prática de atividade física.22
A inclusão de indicadores de atividade física na PNS é extremamente positiva. A PNS servirá como linha de base para o monitoramento, em escala nacional, de fatores de risco para DCNT. Entretanto, para que não se perca essa linha de base, será imprescindível a manutenção da comparabilidade entre instrumentos e indicadores comuns, a serem utilizados nos inquéritos futuros.
Quanto às limitações do presente estudo, destaca-se a construção do indicador 'ativo no deslocamento'. Aqui, foram considerados ativos os indivíduos que relataram deslocar-se a pé ou de bicicleta por pelo menos 30 minutos/dia. Dessa forma, assumiu-se todos os deslocamentos ocorridos nos cinco dias úteis da semana. Apesar dessas limitações, acredita-se que os resultados da presente análise tenham validade aceitável, pelo motivo de que um indicador mais rigoroso poderia subestimar a prevalência de ativos a deslocamento. Outra limitação a ser mencionada foi a exclusão do domínio de atividades domésticas no indicador 'insuficientemente ativo'. Essa estratégia foi adotada com o objetivo de construir indicadores mais conservadores, uma vez que as atividades domésticas poderiam superestimar as prevalências encontradas.23 Outra razão considerada para não se incluir atividades domésticas no indicador 'insuficientemente ativo' foi a intenção de tornar as estimativas da Pesquisa Nacional de Saúde - PNS - mais próximas, em termos de comparabilidade, dos indicadores utilizados internacionalmente.3
Por fim, para que haja um aumento dos níveis populacionais de atividade física, são necessárias ações intersetoriais que proponham a criação de ambientes dinâmicos, onde a escolha por comportamentos ativos seja motivada por valores e prazer como pontos-chave do sucesso.
No sentido da melhoria dos indicadores de saúde da população, os resultados deste estudo podem servir de apoio à organização do sistema de saúde brasileiro, no que se refere à proposição de ações capazes de promover a saúde tendo a prática de atividade física como um de seus eixos auxiliares. O atual cenário nacional da prática de atividade física, de alta prevalência de inatividade física e baixa prevalência de adultos praticando atividade física no lazer, sugere a necessidade do fortalecimento de ações de promoção de atividade física em nível populacional no Brasil.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Jun 2015
Histórico
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Recebido
09 Fev 2015 -
Aceito
05 Maio 2015