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Imagem e percepção no pensamento de Hans Jonas

Image and perception in Hans Jonas’ thought

Resumo

O presente artigo tem o objetivo de tratar a questão da imagem na filosofia de Hans Jonas com a finalidade de compreender a função que a capacidade imaginativa exerce na experiência fenomenológica de apreensão da realidade. A investigação da relação entre imagem e percepção humana no pensamento de Jonas se mostra profícua na medida em que o tema da imagem possui um papel muito significativo em sua filosofia, pois é justamente na capacidade de criar imagens e reconhecê-las como representações do real que reside a diferença antropológica em relação aos outros animais.

Palavras-chave:
Imagem; Percepção; Hans Jonas; Homo Pictor

Abstract

This article aims to address the issue of image in the philosophy of Hans Jonas in order to understand the role that the imaginative capacity plays in the phenomenological experience of apprehending reality. The investigation of the relationship between image and human perception in Jonas’ thought proves to be fruitful as the theme of image has a significant role in his philosophy, as it is precisely in the ability to create images and recognize them as representations of the real that lies the anthropological difference in relation to other animals.

Keywords:
Image; Perception; Hans Jonas; Homo Pictor

Introdução

Este artigo é parte da minha tese de doutorado1 1 BOBSIN DUARTE, M. Hans Jonas: Imagens e afetos para uma ética ecológica. Tese (doutorado) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Filosofia. , trabalho no qual busquei lançar luz sobre a compreensão da relação entre imagens e afetos no pensamento de Hans Jonas. O presente texto trata especificamente da relação entre imagem e percepção. Este tema possui um lugar muito significativo na filosofia do autor, pois ele considera que a diferença antropológica consiste na capacidade de criar imagens e reconhecê-las como representações do real.

Para Jonas, a dimensão pictórica expressa a primeira forma de manifestação da liberdade propriamente humana, pois o homo pictor inaugurou uma nova maneira de se relacionar com os objetos, ou seja, foi pela liberdade galgada na expressão da faculdade da imagem que o ser humano desenvolveu os potenciais que resultaram nas capacidades intelectuais humanas.

Postulamos que, se para Jonas, a capacidade de produzir, reconhecer e se relacionar com imagens é um atributo específico do ser humano, isto significa que o autor considera a mediação pelas imagens, na medida em que são representações do real, como componentes fundamentais de nossa percepção da realidade e, por conseguinte, da concepção de mundo e da visão cosmológica, as quais podem condicionar as nossas ações no mundo.

Nossa hipótese é que Hans Jonas qualificou o ser humano como homo pictor justamente por considerar que a faculdade da imagem, além de seu potencial pictórico, é a competência propriamente humana que atribui sentido de modo primário aos dados apreendidos da realidade e, desta maneira, responde pela criação e associação de significados em um primeiro momento perceptivo.

Iniciaremos a reflexão sobre a questão da imagem no pensamento de Jonas abordando a ontologia do fenômeno da vida, pois aí se encontra explicitado o movimento da liberdade orgânica que culminou nos graus de objetivação da realidade pelo ser humano. Para o filósofo, é na capacidade de se relacionar com as imagens que a objetivação da realidade alcança uma de suas maiores expressões.

Depois de esclarecidos os fundamentos ontológicos do homo pictor, adentraremos a discussão sobre a constituição das imagens propriamente ditas e, também, a discussão sobre a relação das imagens com o pensamento e a percepção.

Gênese e desenvolvimento do Homo Pictor

O humano é um ser natural e, como tal, as suas capacidades são resultado do desenvolvimento das habilidades adquiridas ao longo da história evolutiva da vida. A peculiaridade da relação humana com a realidade está fundada, de acordo com Hans Jonas, na diferença antropológica manifestada, primariamente, como ser capaz de produzir e reconhecer as imagens como imagens.

Para compreendermos de forma mais clara este postulado de Jonas, faremos uma incursão nas ideias do autor sobre as condições, as etapas anteriores, que proporcionaram ao ser humano culminar em ser imaginativo ou homo pictor. Para tanto, começaremos explicitando as bases orgânicas subjacentes à capacidade imaginativa humana, ou seja, abordaremos o desenvolvimento do princípio de liberdade que se manifestou nas primeiras formas de vida e, no decorrer da evolução, resultou neste atributo especificamente humano.

Do fundamento na liberdade orgânica e na evolução

O conceito de liberdade é um dos fios condutores do pensamento de Hans Jonas, de modo que o autor fornece uma interpretação muito peculiar, considerando este conceito como o princípio da existência orgânica. Ou seja, através da manifestação da liberdade é que a vida surgiu da matéria inanimada. Sobre esta questão, Geneviève Pinsart assinala que, na filosofia de Jonas, “a fenomenologia da vida é a história da liberdade através da evolução dos seres vivos” (PINSART, 2002PINSART, M. G. Jonas et la liberte: dimensions théologiques, ontologuiques, éthiques et politiques. Paris: J. Vrin, 2002., p. 79).

Já Hans Jonas ressalta que, “a liberdade deve designar objetivamente um modo discernível de ser, isto é, uma maneira de executar a existência, distintivo do orgânico per se” (PL2 2 PL se refere à obra The Phenomenon of Life: Toward a Philosophical Biology. Evanston: Northwestern University Press, 2001. , p. 3). Esta sentença faz parte da introdução da obra The Phenomenon of Life: Toward a Philosophical Biology, de 1966, e expressa de forma condensada o que é, possivelmente, o principal objetivo do livro: atribuir ao fenômeno da vida orgânica o mesmo princípio que se manifesta nos seres humanos sob o signo da liberdade. Ou, em outras palavras, introduzir a liberdade na natureza.

Para o autor, a interpretação da manifestação da liberdade dos seres vivos estaria assentada na própria diversidade apresentada pelo fenômeno vital na evolução em graus distintos, em escala, nas esferas da percepção da ação.

Uma maneira de interpretar essa escala é em termos de escopo e distinção de experiência, de graus crescentes de percepção do mundo que se movem em direção à mais ampla e objetiva objetificação da soma do ser em percipientes individuais. Outra maneira, concomitante com os graus de percepção, é em termos de progressiva liberdade de ação. A correlação e a interpretação desses dois aspectos - percepção e ação, variedade e adequação de um, alcance e poder do outro - são temas constantes para o estudo empático de muitas formas de vida (PL, 2001, p. 2).

Jonas encontra, nos processos básicos da existência orgânica, o fundamento de suas afirmações, pois para estar vivo é necessário interagir com o meio circundante, tarefa que exige um mínimo de percepção do ambiente (mesmo que seja uma irritação causada por um simples estímulo) e de ação, que em um primeiro momento é direcionada intuitivamente ao mantenimento da existência.

No caso dos organismos mais simples, a liberdade (ou autodeterminação) se manifesta na atividade vital básica do metabolismo. A necessidade de buscar algo fora de si (a nutrição, por exemplo) conduz à primeira forma de percepção do mundo, pois, a fim de realizar a atividade metabólica, o ser vivo necessariamente deve perceber a matéria do espaço próximo para, assim, eleger os elementos que compõem positivamente com o seu ser e agir para realizar a sua metabolização. “A primeira aparição do princípio em sua simplicidade, forma-objeto elementar, significa a ruptura do ser para a gama indefinida de possibilidades que, daí em diante, estende-se até os confins da vida subjetiva, e como um todo está sob o signo da ‘liberdade’” (PL, p. 3).

Neste nível primário de liberdade, o ser orgânico deve necessariamente agir para se manter na existência, já que a possibilidade do não ser se encontra latente e de sua ação depende o seu perseverar, em outras palavras, em seu estágio inicial a liberdade se manifesta no exercício da potência de um ser como sua ação necessária. Para o autor “apenas são indivíduos as entidades cujo ser é seu próprio fazer” (PE3 3 PE se refere à obra Philosophical Essays: From Ancient Creed to Technological Man. New York: Atropos Press, 2010. , p.188), ou seja, os seres orgânicos, no seu empenho em se manter existindo e se renovando por seus próprios atos, demonstram o dinamismo de suas identidades e o alvorecer da subjetividade.

Afirmar que todos os seres orgânicos possuem o poder, mesmo ínfimo, de se autodeterminar implica necessariamente afirmar que cada ser vivo, ao seu modo, possui intencionalidade, embora em diferentes graus que formam uma hierarquia da liberdade cujo ápice é o ser humano. Para Jonas, a intencionalidade dos organismos simples se manifesta através da identidade funcional e dinâmica que visa permanecer na existência. Estas identidades nunca são as mesmas no decorrer do espaço-tempo, pois para continuar existindo elas necessitam agir em função de sua continuidade, precisam metabolizar, transformar o que vem de fora em substratos que contribuirão à manutenção de suas existências. Assim, “há sempre a intencionalidade do organismo como tal e a sua preocupação em viver: já eficaz em toda a tendência vegetativa, despertando a consciência primordial nos reflexos obscuros, (e na) reação irritadiça dos organismos mais simples” (PL, p. 90).

A intenção de continuidade na existência que percebemos em nós mesmos se mostra no fenômeno da vida de modo inexorável. “Se chamamos isso de sentido interno, sensibilidade e resposta ao estímulo, apetite ou nisus - em algum grau de ‘consciência’ abriga a suprema preocupação do organismo com o seu próprio ser e continuação no ser” (PL, p. 84). Isso se reflete na seletividade da busca pela satisfação momentânea do desejo. Esta seletividade, no entanto, não é fechada nem radicalmente absoluta, ao contrário, ela apresenta uma “abertura” ao encontro com a novidade advinda da diversidade ou da escassez material presente no ambiente do organismo. Pois, devido à possibilidade de mudança nas condições nas quais o organismo está se desenvolvendo, existe sempre a possibilidade de adaptação às novas condições.

Para Jonas, ser vivo significa desfrutar de um horizonte aberto a essas novas possibilidades e a “abertura” significa poder ser afetado pelo exterior e perceber em algum nível a presença do que é externo. A percepção do exterior, por mais obscura que se apresente, é incorporada ao campo existencial do ser que percebe pela excitação causada, pela mensagem vinda do exterior. “Com o primeiro amanhecer do reflexo subjetivo, a mais germinal experiência do ‘toque’, uma fenda como que se abre na opacidade do ser dividido, abrindo uma dimensão onde as coisas existirão uma vez mais em forma de objeto” (PL, p. 85).

A abertura ao encontro com o exterior é um traço importante para a evolução das formas de vida, dado que a relação do organismo com o “mundo”, ou o que é externo a si, apresenta, além da dependência vital, uma gama de possibilidades que podem ser atualizadas em novas formas vivas, o que significa que essa relação é baseada na precariedade da forma viva e na dependência dela em relação ao meio na sua autoafirmação. Eis o que Jonas chamará de “liberdade dialética”: conforme a complexificação decorrente da evolução, a liberdade vai galgando graus diferenciados, expressando-se em uma percepção mais aguçada do ambiente, motilidade, emoção, visão, como também, da capacidade imaginativa e do exercício da razão.

A mediaticidade da experiência humana

O processo de individuação animal, proporcionado principalmente pela capacidade motora e pelo desenvolvimento da emoção e da percepção, alcançou no ser humano o seu auge, acarretando formas cada vez mais mediadas de relações com o mundo. Para Jonas esta afirmação se deve, principalmente, ao fato de os humanos possuírem a capacidade imaginativa. Ou seja, segundo o autor, os fenômenos considerados característicos da humanidade se encontram fundados na capacidade dos humanos de produzirem, manipularem, reconhecerem e utilizarem as imagens livremente. Aí reside justamente a diferença antropológica.

Reconhecer uma imagem como imagem configura um grau a mais no desenvolvimento da liberdade orgânica. Pois, de acordo com o autor, abre-se, com o advento da capacidade imaginativa, toda uma nova gama de possibilidades evolutivas devido à inauguração desta nova forma de se relacionar com o mundo.

Os artefatos dos animais têm um uso físico direto na promoção de fins vitais, como nutrição, reprodução, hibernação. Uma representação, no entanto, não altera nem o ambiente nem a condição do próprio organismo. Uma criatura criadora de imagens, portanto, é aquela que se dedica à fabricação de objetos inúteis, ou tem fins além dos biológicos, ou pode servir aos últimos de maneira remota da utilidade direta de coisas instrumentais (PL, p. 158).

O caráter representacional da imagem assevera uma nova relação com os objetos na medida em que demonstra uma nova habilidade no âmbito da vida, a capacidade de abstrair as formas da realidade. Diferentemente dos demais animais, que para Jonas são capazes de interpretar a realidade somente de forma unívoca, o ser humano é o ser que pode atribuir diferentes sentidos ao que se mostra. É o ser que sabe discernir entre o que é uma representação e o que é de fato representado. É o ser que manipula as formas e as sabe distinguir.

A elaboração dos significados atribuídos a uma imagem demonstra a existência do elemento intencional na produção da semelhança nas imagens mesmo nas pinturas rupestres. Segundo Jonas, isto contribuiu para um aumento progressivo da compreensão simbólica do ser humano, na medida em que a intenção de representar produz dissimilaridades muitas vezes compreendidas mais pela força do simbolismo que carregam do que por conta de suas similitudes com o objeto representado. Desta maneira, “para o artista e para o espectador, até mesmo as semelhanças forçadas e imperfeitas são representações do objeto em questão. Não há quase nenhum limite para a força da imaginação que a capacidade de compreensão simbólica possa comandar.” (PL, p. 161-162).

Isto significa que, para o autor, a força da imaginação possibilitou o desenvolvimento da capacidade de experienciar simbolicamente a realidade. Tal movimento foi proporcionado pela liberdade ocasionada pelas lacunas existentes entre as experiências, ou seja, na ausência da presença de determinados objetos foi possível “criar”, a partir de imagens previamente abstraídas, uma experiência virtual de evocação de sentido para o que não está presente. Esta habilidade funda, segundo o autor, uma nova gama de possibilidades abstrativas que culminam na elaboração conceitual da realidade.

Sobre a imagem

O elemento da semelhança é o ponto de partida de Jonas para caracterizar a imagem devido à sua obviedade notória. A imagem é sempre imagem de alguma coisa, ela é sempre uma representação de outra coisa que não ela mesma. A imagem, para o autor, é a representação de algo e não a sua dissimulação, o seu simulacro. “A propriedade mais óbvia (da imagem) é a da ‘semelhança’. Uma imagem é um objeto que é claramente reconhecível, ou à vontade discernível, a sua semelhança com outro objeto” (PL, p. 159). De maneira sucinta, a imagem possui a função de representar a realidade, e com tal, há subjacente à ideia de imagem a noção de que ela não pretende ser uma cópia do real e sim simbolizar, trazer à tona uma mensagem que representa determinada faceta da realidade.

Jonas considera a produção da semelhança na imagem como fruto da atividade intencional humana, já que a intencionalidade se apresenta no sujeito como a estrutura que propicia a experiência da imagem como imagem, ou seja, a intencionalidade se manifesta no objeto como a representação da intenção de seu autor ao mesmo tempo em que é a condição de possibilidade de seu reconhecimento como representação. Para Jonas, “a intenção externa do criador é suportada como ‘intencionalidade’ intrínseca no produto” (PL, p. 159), ou seja, a própria imagem é em si a expressão da intenção de alguém em representar algo. Desta maneira, não haveria, de acordo com o autor, a produção de imagens na natureza no mesmo sentido atribuído à criação de imagens na esfera humana, visto que o caráter intencional da imagem se manifesta justamente na artificialidade de sua produção, na medida em que é considerada um modo humano de apropriação da realidade.

Da mesma forma, a incompletude da imagem em relação ao objeto representado assegura a livre expressão da composição na representação, pois a imagem não é cópia e a sua diferença deve permanecer visível ao espectador. Em outras palavras, para Jonas, há sempre dissimilaridades e incompletude na comparação da imagem com o objeto representado, pois, “a incompletude da semelhança deve ser perceptível, de modo a qualificar a semelhança como ‘mera semelhança’” (PL, p. 159).

O autor destaca que, justamente por possuir o caráter de incompletude, a imagem configura “graus de liberdade” devido a sua “dimensão constituída pela ‘incompletude ontológica’” (PL, p. 160). Pois, como dito acima, o papel da imagem é representativo e a incompletude da imagem abre espaço para a seleção dos aspectos representativos do que está sendo representado.

Esta seleção pode implicar no aparecimento de outras formas e na expansão do significado primariamente atribuído a algo. Conforme Wendell E. S. Lopes em sua apreciação sobre as características da imagem segundo Jonas, “a idealização é o aspecto positivo da incompletude” (LOPES, 2014LOPES, W. E. S. Hans Jonas e a diferença antropológica. 2014. 411 p. Tese (Doutorado em Filosofia) - FAFICH, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014., p. 257). Através da idealização do objeto, a seleção de determinados aspectos configura, então, ganho em expressividade e economia de detalhes. Deste modo, a emancipação do sentido literal da imagem, atributo da capacidade imaginativa, contribuiu para o surgimento da novidade no campo das invenções de novas formas, pois, através desta habilidade, “a norma de um objeto dado pode ser abandonada inteiramente para a criação de formas nunca vistas” (PL, p. 162).

Há, assim, uma relação entre a incompletude da imagem e a intencionalidade de sua produção como sua característica intrínseca, pois, na medida em que há a omissão de alguns elementos em favor de outros, a intenção do artista-autor da imagem está em uma condição em que pode efetuar a escolha dos elementos que irão representar simbolicamente um objeto ou, até mesmo, atribuir novas formas para representá-lo.

Isto é considerado por Jonas como um fator que, a longo prazo, acarretou o alargamento da compreensão simbólica do ser humano, pois somos seres capazes de representar uma ideia ou objeto através de uma gama variada de formas. Ou seja, desenvolvemos a capacidade de comunicar e compreender o sentido de uma representação de diversas formas, desde a mais realista até a mais abstrata.

Outro aspecto característico da imagem apontado pelo autor se refere à diferença positiva entre o objeto representado e a sua representação, a qual pode aparecer como “uma alteração das feições selecionadas, como meio de aumentar a similaridade simbólica” (PL, p. 161), mas não somente isso, a diferença positiva também pode ser produto da inabilidade como também da seleção de determinados caracteres. Como por exemplo, os desenhos feitos por crianças. O exagero de alguns traços pode, por um lado, ser fruto da falta de habilidade ou coordenação motora infantil, mas, por outro, pode representar simbolicamente a ênfase dada a determinados aspectos do que se deseja representar.

De todo modo, a similaridade simbólica enfatiza a prevalência de alguns elementos da representação em detrimento de outros, estimulando assim a imaginação a atribuir significação ao que é dado na imagem, e desta maneira contribuindo também para o avanço da habilidade simbólica humana. Nas palavras de Jonas, “a função representacional talvez esteja menos na similitude real que na mera ‘reconhecibilidade’ da intenção” (PL, p. 162).

Para Jonas, esta característica da imagem, ou seja, o reconhecimento da diferença específica, relaciona-se fortemente com o fato de as imagens serem objetos visuais nos quais a forma prevalece como o aspecto reconhecível na representação.

Outro aspecto pontuado pelo autor é o caráter inativo da imagem, embora a imagem possa descrever movimento, ela é considerada atemporal por ser estática e inativa no sentido de não apresentar diretamente as suas relações causais com o passado e com o presente. Assim, “o que é representado no modo da imagem é, na imagem, removido do comércio causal das coisas e transposto a uma existência não dinâmica, que é a existência da imagem adequada” (PL, p. 162).

Desta maneira, haveria uma distinção entre o que é considerado propriamente uma imagem (a representação), a realidade imaginada (o que é representado) e o objeto físico que “carrega” a imagem devido ao fato de serem “estratos diferentes na constituição ontológica da imagem” (PL, p. 163). Enquanto a imagem não possui nexo causal, “na imagem o nexo causal é cortado” (PL, p. 164), a realidade imaginada (a coisa representada) e objeto que contém a imagem (veículo da representação), no entanto, estão condicionados ao devir. Isto significa que a imagem, por ser distinta de seu veículo e da coisa que representa, tem a função de representar sem acarretar o que está representando, ela pode evocar o sentido sem causar realmente o que está evocando.

A diferença entre os três estratos constitutivos da imagem, segundo Jonas, é o que possibilita a imagem “desfrutar o descrito modo de uma presença não causal, eximida dos acidentes dos eventos reais” (PL, p. 164), pois a imagem pode ser considerada por si só, independentemente do objeto ao qual a carrega e, da mesma maneira, pode ser pensada separada da realidade que representa. Isto permite à imagem “representar o perigo sem pôr em perigo, o prejudicial sem prejudicar, o desejável sem saciar” (PL, p. 163). É a culminação da função ideal da imagem, já que independentemente da quantidade de veículos que “carreguem” uma mesma imagem (como no caso da reprodução das obras de arte) a imagem é apenas uma dada expressão da mesma ideia contida em todas as cópias.

Sobre a faculdade da imagem e a capacidade conceitual

Para Jonas, a condição de possibilidade básica da produção de um imagem não difere da condição de apreensão de uma imagem como imagem. “Isto significa que quem pode perceber uma representação pictórica como tal é o tipo de ser cuja natureza pertence à faculdade representacional” (PL, p. 165). Esta faculdade do ser humano revela um modo próprio ou essencial da nossa relação com a realidade e se apresenta acertadamente como uma via de acesso ao real a qual serve de fundo à manifestação de outras capacidades características da nossa espécie.

Entre estas capacidades, a aptidão conceitual aparece como uma camada que se mistura a este fundo constituído pela faculdade da imagem de tal maneira que a relação da faculdade da imagem com a capacidade para formar conceitos é concebida por Jonas como evidentemente profunda. Ao passo que, para fazer uma imagem ou reconhecer uma imagem é necessário apreender o elemento de semelhança e este tipo de apreensão não se restringe à percepção somente física dos objetos. Ou seja, “a equação perceptiva subjacente à experiência da semelhança deve, portanto, ser qualificada como uma distinção não perceptual” (PL, p. 166) na medida em que é performada por um elemento ideal.

Desta maneira, conforme Jonas, a percepção da semelhança das formas, necessária para a concepção de uma imagem, demonstra o aparecimento da dimensão conceitual no ser humano já na época da elaboração das pinturas rupestres. Pois, se a “imagem não é uma função do grau de semelhança perceptual, mas uma dimensão conceitual própria dentro da qual todos os graus de semelhança podem ocorrer” (PL, p. 166), temos que a relação humana com as imagens já configura um patamar de elaboração conceitual das formas desde o seu princípio, de modo que é possível pensar a gênese da dimensão conceitual muito próxima a da faculdade da imagem.

Para os outros animais, ao que indica Jonas, a distinção entre as coisas é “uma mera questão de discriminação sensorial” (PL, p. 166). No caso dos humanos esta é apenas a primeira parte do processo cognitivo, uma vez que a percepção da diferença e da semelhança das formas não está atrelada somente à matéria, e sim configura um nível de distinção não perceptual.

O exemplo dado por Jonas se refere à percepção de um pássaro sobre o espantalho, que opera simplesmente pela distinção sensorial. Diferentemente do ser humano, o pássaro pode perceber a figura do espantalho como uma figura humana ou não e, neste sentido, não há espaço para uma terceira alternativa. De acordo com Wendell E. S. Lopes, “o que Jonas destaca aqui é a diferença da capacidade humana em perceber a estratificação ontológica envolvida na percepção de uma imagem” (LOPES, 2014LOPES, W. E. S. Hans Jonas e a diferença antropológica. 2014. 411 p. Tese (Doutorado em Filosofia) - FAFICH, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014., p. 261) em comparação com os outros animais.

Graças à estratificação ontológica da imagem o ser humano pode apreender a semelhança como “unicamente semelhança” (PL, p. 167). A distinção não perceptual é concebida como parte desta estratificação do processo de concepção e apreensão das imagens. Neste processo, a abstração da semelhança física é o primeiro passo, em seguida há a comparação mental das correspondências e diferenças entre imagem e objeto e, então, o elemento conceitual. Assim, temos que: a imagem é abstraída de seu portador físico, da mesma forma que é diferenciada do objeto imaginado e, deste modo, por fim, temos o elemento não perceptual como um terceiro elemento do processo. Jonas nos explica que:

através do elemento da semelhança como intermediário, o objeto diretamente percebido é apreendido não como ele mesmo, mas como o objeto de outro objeto. Está lá apenas para representar outra entidade, e isso é apenas representado; assim, paradoxalmente, o vínculo ideal, a similitude ou o eidos como tal, torna-se o objeto real de apreensão (PL, p. 167).

Desta maneira, o elemento da semelhança ou eidos opera na mediação, através da faculdade da imagem, como uma ligação ideal entre a realidade e o objeto representado. Isto significa que o nosso processo de apreensão das imagens passa pela abstração dos conteúdos da realidade para compará-los idealmente com noções previamente concebidas, ou seja, conforme dito anteriormente, em nossa relação com as imagens somos mediados também por conceitos4 4 Jonas não trata diretamente do processo de formação de conceitos, no entanto, temos algumas pistas dadas pelo autor referente a este tema em sua leitura da fenomenológica da visão: “a distância da aparência produz uma ‘imagem’ neutra que, diferentemente dos ‘efeitos’, pode ser vista e comparada, na memória retida e lembrada, na imaginação variada e livremente composta” (PL, p. 149). . “O princípio aqui envolvido por parte do sujeito é a separação mental da forma e da matéria. É isso que possibilita a presença vicária do fisicamente ausente de uma só vez com a autoanulação do fisicamente presente” (PL, p. 167).

Para Jonas, é justamente no processo abstrativo característico da apreensão e concepção da imagem que reside o elemento de liberdade galgado pela faculdade da imagem, pois a semelhança da imagem é sempre, segundo o autor, incompleta e, por isso, livre. Isto se deve ao fato já mencionado anteriormente de a imagem representar a coisa e não ser uma duplicação sua, pois se todas as suas propriedades forem reproduzidas, teremos uma cópia e não propriamente uma imagem. Esta liberdade galgada na faculdade da imagem é considerada por Jonas como o ponto de partida que resultará na criação de conceitos, “da percepção visual, conceito e ideia herdam o padrão ontológico de objetividade que a visão criou pela primeira vez” (PL, p. 149).

E, devido ao seu caráter representativo e livre, a semelhança é o elemento fundante de toda uma ordem simbólica que possui correspondência com a realidade, ao mesmo tempo que, por ser um lócus de liberdade, é também um espaço para a invenção.

Desta forma, a relação dos humanos com as imagens vai muito além da simples percepção dos diferentes graus de semelhança entre as coisas e abre espaço para a elaboração de significados mais complexos a partir de uma representação.

A percepção e a faculdade da imagem

Jonas propõe que para entendermos a faculdade da imagem ou “faculdade de perceber a semelhança” (PL, p. 167) temos que partir da realidade dada, visto que o eidos, a forma, “é um objeto dos sentidos, mas não todo o seu objeto” (PL, p. 167), na medida em que possui uma dimensão conceitual (a qual será discutida mais adiante). Por conseguinte, devemos ter em consideração que a compreensão da realidade no pensamento de Jonas está muito próxima ao realismo por entender que as coisas existem independentemente da consciência, ou seja, “já estão aí” e me afetam com a sua presença.

A percepção, para o autor, “é intrinsecamente a consciência de tal presença auto doadora (das coisas externas) - a experiência da realidade do objeto como coexistindo comigo aqui e agora e por si mesmo determinando a minha condição sensorial” (PL, p. 168). Este primeiro momento perceptivo, da consciência e do encontro com as coisas que estão existindo realmente, ou seja, a autocomunicação dos objetos, é considerada pelo autor como parte da evidência interna que tenho da existência desses objetos “além do conteúdo eidético da percepção” (PL, p. 168). É o afeto experienciado pelo contato com o mundo que proporciona esta evidência.

No entanto, conforme postula Jonas, a apreensão objetiva somente é alcançada com o balanceamento deste elemento de encontro com o real pelo elemento de abstração “sem o qual a sensação não chegaria à percepção” (PL, p. 168). Isto configura um paradoxo, segundo Jonas, já que os dados apreendidos da afecção pela realidade, os quais são absolutamente necessários para a percepção, passam por um desengajamento para se tornarem discerníveis.

Este processo é descrito pelo autor da seguinte maneira:

Em primeiro lugar, em um sentido um tanto forçado do termo, há ‘abstração’ do estado de estimulação sensorial em si no próprio fato de alguém perceber o objeto em vez de seu próprio afeto orgânico. Algum tipo de desengajamento da causalidade do encontro fornece a liberdade neutra para deixar o ‘outro’ aparecer por si mesmo. Nesse aparecimento, a base afetiva (estímulo, irritação) é cancelada, o seu registro é neutralizado. Em segundo, e em um sentido mais aceito, a percepção continuamente ‘abstrai’ do conteúdo sensorial imediato da afecção ao permitir ao objeto a sua identidade além da mudança de suas visões. (PL, p. 168).

Ou seja, a percepção dos objetos existentes no mundo supõe um certo desengajamento das condições nas quais estamos colocados. Pois, para conseguirmos sintetizar os dados recebidos das afecções e sensações causadas pelos objetos é necessário, de acordo com Jonas, abstrair das “diferenças das sensações sucessivas, ou do material dos sentidos” (PL, p. 168) para então reconhecer os objetos.

A recognição de determinado objeto não é baseada no conglomerado de sensações provocadas, já que, de acordo com o autor, a repetição das condições as quais geraram determinadas sensações ou mesmo os dados visuais dificilmente se repetem. Os “atos de recognição” (PL, p. 169)5 5 Jonas faz referência a Kant e a síntese de recognição. Para o autor, a abstração visual é a responsável por esta síntese. Ao que tudo indica, Jonas entende por síntese o ato de unificar as afecções percebidas pelo corpo com o eidos já existente na memória. Diferentemente de Kant, para quem a síntese é o ato de unificar as diferentes representações compreendendo a multiplicidade em um ato cognitivo (Cf. KANT A 77). são proporcionados pela percepção das possíveis variações da forma de um mesmo objeto. “O que é equacionado em tais atos de reconhecimento não são os conglomerados de dados semelhantes dos sentidos, mas fases variantes de transformações contínuas das séries de um padrão ou configuração” (PL, p. 169).

Como dito anteriormente, a percepção das variações das formas dos objetos e a sua abstração são realizadas proeminentemente pela visão (‘ver’ não se resume a apreensão dos dados pelo olho), que tem a capacidade de neutralizar os conteúdos afetivos e integrar a diversidade de dados simultâneos apreendidos, os quais mantém determinada identidade através de uma escala de possíveis variações.

Jonas destaca que a escala de possíveis transformações visuais dos objetos é governada por leis estruturais e qualitativas, “as quais formam um padrão de ordem superior” (PL, p. 169), que pode ser entendido como um padrão que engloba o conjunto de transformações com suas variações de perspectiva, tamanho, luz, entre outros aspectos que formam séries contínuas de atributos. Embora esses padrões das formas sejam constituídos continuamente, segundo o autor, podemos reconhecer os padrões de maneira descontínua porque os seres humanos possuem familiaridade com as leis estruturais e qualitativas que os constituem6 6 Ao que tudo indica, Jonas não esclarece como se dá o conhecimento das leis estruturais e qualitativas das formas. Postulamos, a partir da obra do autor, que este conhecimento seja fruto do constructo que originou a percepção humana da realidade, ou seja, é um conhecimento empírico das possíveis variações das formas que se formou ao longo do percurso evolutivo do homo pictor. . Portanto, “o reconhecimento ao longo de cada uma das extensões, dada a suficiente familiaridade com sua lei, pode ocorrer de forma descontínua; ou seja, a sequência intermediária não precisa ser executada na experiência atual” (PL, p. 169).

Cada transformação é compreendida por Jonas como uma espécie de imagem possível do objeto e, neste sentido, “os aspectos singulares (fases) não se sustentam por si só” (PL, p. 169), mas sim possuem a referência do todo do qual é apenas uma variação, ou seja, por ser uma imagem possível do objeto a semelhança é reconhecida em relação ao todo o qual representa. Na condição de imagem de alguma coisa, a “fase” ou imagem do padrão “autoriza a recognição do mesmo objeto, ou tipo de objeto através da semelhança que compreende dissimilitude” (PL, p. 169), visto que nenhuma das fases do padrão se adequam de modo idêntico ao objeto, mas sim o representam como um símbolo.

Desta maneira, é possível inferir, de acordo com o postulado de Jonas, que a nossa relação com os objetos reais é mediada pelas imagens que representam simbolicamente o eidos (ou semelhança) correspondente a esses objetos, os quais foram constituídos e são constantemente atualizados pela experiência dos indivíduos.

Considerações finais

Em nosso percurso pelo tema da imagem em Hans Jonas, vimos que nós humanos somos o ápice de um processo de evolução no qual o jogo do acaso, aliado à finalidade intrínseca a todos os organismos de perseverarem na existência, a qual paulatinamente foi desenvolvendo formas diferenciadas que configuram ganhos em liberdade, resultou em seres que atingiram graus de objetivação cada vez maiores na relação com a realidade. Isto é, somos o ápice do movimento que resultou em relações cada vez mais mediadas com o ambiente. Especificamente, a nossa mediação por eidos, ou seja, pelas formas ideais, as quais respondem por uma espécie de “esquema” organizador de nossa percepção do real, resultou em uma relação com a realidade mediada por representações.

Isto ficou mais claro ao passo que percebemos o papel atribuído por Jonas à visão e às imagens em nossa via prioritariamente visual de conhecimento do mundo, aliadas ao funcionamento de nossos atos de recognição pela semelhança das formas. A performance da visão, por conseguinte das imagens, é caracterizada por Jonas como desprovida de acesso às conexões causais devido ao ganho em objetividade alcançado por este sentido, manifestado como um ganho da liberdade orgânica em sua relação com o mundo. Assim, as imagens apreendidas são remetidas à memória e à imaginação para a atribuição dos significados que estão livremente dispostos através das lembranças dos eidos dos objetos em questão.

Pensar a questão da imagem na filosofia de Hans Jonas nos possibilita nos orientarmos quanto às potencialidades das representações em nossa conduta ética em relação à preservação das condições naturais de existência de uma humanidade futura digna desse nome.

Referências

  • FROGNEUX, N. Hans Jonas ou la vie dans le monde. Bruxelles: De Boeck, 2001.
  • JONAS, H. The Phenomenon of Life: Toward a Philosophical Biology. Evanston: Northwestern University Press, 2001.
  • JONAS, H. The Imperative of Responsability. In a Search of na Ethics for the Tecnological Age. Chicago: The University of Chicago Press, 1985.
  • LOPES, W. E. S. Hans Jonas e a diferença antropológica. 2014. 411 p. Tese (Doutorado em Filosofia) - FAFICH, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014.
  • MORRIS, T. Hans Jonas's Ethic of Responsibility: From Ontology to Ecology. New York: Sunny Press, 2013.
  • OLIVEIRA, J. Por que uma ética do futuro precisa de uma fundamentação ontológica segundo Hans Jonas. Revista de Filosofia Aurora, v. 24, nº 35, p. 387-416, 2012.
  • PINSART, M. G. Jonas et la liberte: dimensions théologiques, ontologuiques, éthiques et politiques. Paris: J. Vrin, 2002.
  • 1 BOBSIN DUARTE, M. Hans Jonas: Imagens e afetos para uma ética ecológica. Tese (doutorado) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Filosofia.
  • 2 PL se refere à obra The Phenomenon of Life: Toward a Philosophical Biology. Evanston: Northwestern University Press, 2001.
  • 3 PE se refere à obra Philosophical Essays: From Ancient Creed to Technological Man. New York: Atropos Press, 2010.
  • 4 Jonas não trata diretamente do processo de formação de conceitos, no entanto, temos algumas pistas dadas pelo autor referente a este tema em sua leitura da fenomenológica da visão: “a distância da aparência produz uma ‘imagem’ neutra que, diferentemente dos ‘efeitos’, pode ser vista e comparada, na memória retida e lembrada, na imaginação variada e livremente composta” (PL, p. 149).
  • 5 Jonas faz referência a Kant e a síntese de recognição. Para o autor, a abstração visual é a responsável por esta síntese. Ao que tudo indica, Jonas entende por síntese o ato de unificar as afecções percebidas pelo corpo com o eidos já existente na memória. Diferentemente de Kant, para quem a síntese é o ato de unificar as diferentes representações compreendendo a multiplicidade em um ato cognitivo (Cf. KANT A 77).
  • 6 Ao que tudo indica, Jonas não esclarece como se dá o conhecimento das leis estruturais e qualitativas das formas. Postulamos, a partir da obra do autor, que este conhecimento seja fruto do constructo que originou a percepção humana da realidade, ou seja, é um conhecimento empírico das possíveis variações das formas que se formou ao longo do percurso evolutivo do homo pictor.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    08 Set 2021
  • Aceito
    03 Fev 2023
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