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SARAIVADA DE SAMBAS: SEGUNDA GUERRA E MÚSICA POPULAR* ** O artigo não foi previamente publicado em plataforma preprint; as fontes e bibliografia são referidas no texto, em notas de rodapé e em seção específica. Registros fonográficos pesquisados no Museu Cearense da Comunicação, Acervo Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez), Fortaleza, CE.

BLAST OF SAMBAS: WORLD WAR II AND FOLK SONG

Resumo

No Brasil, várias canções foram compostas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), tendo o conflito como tema. Seus versos estão repletos de elogios às tropas aliadas bem como de críticas e deboches às lideranças inimigas. Este artigo, entretanto, enfoca certo tipo de ironia. No Brasil, à época, bem no início da década de 1940, o regime político era uma ditadura. Governos autoritários muito frequentemente tentam valer-se da dupla via da propaganda e da censura. Persuasão e repressão. Isso envolve os circuitos de produção musical, meios de comunicação de massa e radiodifusão. Em algumas canções sobre a Segunda Guerra Mundial, é possível ouvir contradições e confrontos de nossa própria sociedade, principalmente os relativos às pessoas pobres e negras. As principais fontes aqui foram gravações originais em 78 rpm. A transcrição das letras dos discos de cera é cheia de desafios (homofonias, termos que caíram em desuso, gírias). Na metodologia, os discursos das canções são lidos tentando-se estar atento aos seus sinais qualitativos, seus pontos de relevo.

Palavras-chave:
Segunda Guerra Mundial; Música Popular Brasileira; Radiodifusão; Estado Novo; Crítica social

Abstract

In Brazil, several songs were composed during the Second World War (1939-1945) having the conflict as subject. Their lyrics were full of praise to the allied troops as well as criticism and mockery of the enemies’ leaders. This paper, however, focuses on sambas with some kind of irony. In Brazil, at the beginning of the 1940’s, the political regime was a dictatorship. Authoritarian governments very often try to use the joint path of propaganda and censorship, namely persuasion and repression. This involves musical circuits of production, mass media and broadcasting. Some songs about the World War II show contradictions and confrontations of our own society, especially about the poor and black people. Original recordings at 78 rpm were used as main sources. The transcription of the lyrics at 78 rpm recording is full of challenges (homophones, terms that fell in disuse, slangs). As for methodology, the discourses of the songs are read trying to be attentive to its qualitative signals and points of relevance.

Keywords:
Second World War; Brazilian Popular Music; Broadcasting; New State; Social criticism

*

A Segunda Guerra Mundial deu samba. E mais, conforme os selos dos discos da época, foi glosada em marchas (recebendo aqui e acolá a qualificação de cívicas ou patrióticas), moda de viola, valsa, embolada, canção-tango, fado-canção, frevo-canção, samba-choro, toada, humorismo e fantasia. Criações como “A Muié e a Guerra” (Jararaca e Ratinho) ou “A carta” (Custódio Mesquita) lembram que não se gravou somente música, tendo sido postos na cera esquetes, causos e recitativos. Os compositores trabalhavam no calor dos acontecimentos, talvez por isso poucas tenham sido as criações de reconhecimento mais duradouro.

Autores como Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez), Gracio Barbalho e Jairo Severiano já destacaram o repertório que enfocou o conflito. Tais pesquisadores, junto com Alcino Santos, foram responsáveis pela edição da Discografia Brasileira em 78rpm, a mais completa catalogação dos títulos lançados entre 1902 e 1964. Gracio Barbalho era médico e residia em Natal, RN, em 1982, quando lançou o livro O popular em 78 rotações, no qual dedicava um capítulo à “Música popular brasileira e a Segunda Guerra Mundial”, avaliando que o período foi marcado pela valorização de ritmos estrangeiros e por relativo declínio na inspiração local. Jairo Severiano, em Yes, nós temos Braguinha, destacava que fatos históricos eram temas correntes no cancioneiro popular, com o acréscimo de que a Segunda Guerra Mundial motivara um recorde de composições. Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez) (2012)AZEVEDO, Miguel Ângelo de [Nirez]. A história cantada no Brasil em 78 rotações. Fortaleza: Edições UFC, 2012., em seu livro A história cantada no Brasil em 78 Rotações, comenta mais de cem canções sobre o assunto. Na literatura acadêmica, o assunto foi tratado com esmero e sensibilidade em Os Carnavais de Guerra (TUPY, 1985TUPY, Dulce. Carnavais de guerra: o nacionalismo no samba. Rio de Janeiro: ASB, 1985.).

Os autores sugerem rubricas para a classificação desse vasto repertório, cujas linhas gerais seriam as de exaltação dos aliados e desmoralização dos adversários. Gracio Barbalho discernia três grupos principais de gravações: as que estimulariam o dever patriótico, as que fixariam acontecimentos e as de sátira aos inimigos (BARBALHO, 1982BARBALHO, Gracio. O popular em 78 rotações. Natal: Fundação José Augusto, 1982., p. 34). Jairo Severiano observava que tais canções enfocavam variados aspectos do conflito, com acentos temáticos de exortação à luta, louvor das vitórias dos aliados, elogio à presença brasileira nos campos de batalha e resignação ante os sacrifícios impostos pelas circunstâncias; além destas, de forma crítica, havia as que escarneciam dos líderes dos regimes hostis e dos simpatizantes das causas inimigas e aquelas que condenavam os malefícios da guerra (SEVERIANO, 1987SEVERIANO, Jairo. Yes, nós temos Braguinha. Rio de Janeiro: Funarte , 1987., p. 67).

Os esforços de guerra reclamavam uma mobilização geral. A música dita “popular”1 1 Jacques Revel chama atenção para o tratamento do termo popular em mais de um artigo. No ano de 1970, em parceria com Michel de Certeau e Dominique Julia, redigiu “A Beleza do Morto” (inserido em A Invenção da Sociedade) (Revel, 1990). Em 1986, publicou “Cultura Popular: usos e abusos de uma ferramenta historiográfica” e, em 1995, veio a lume o estudo “O Inverso das Luzes: os intelectuais e a cultura ‘popular’ na França (1650-1800)”, ambos reproduzidos em Proposições (Revel, 2009). Revel não defende que o termo seja abandonado. Antes de valer-se da noção de “popular” como categoria de análise, os historiadores deveriam problematizar, historicizar, tomar como objeto de exame a própria constituição das fronteiras entre os níveis culturais. As oposições culto × leigo, douto × iletrado, ciência × crendice seriam dissimétricas, na medida em que definições, hierarquias e classificações emanavam, apenas ou prioritariamente, do polo considerado erudito. Assim, muitas vezes, o “popular” era encarado a partir de faltas e falhas decididas pelo circuito “erudito”. As aproximações do “popular” com a infância legitimavam os arroubos pedagógicos ou de magistratura social, tendentes a corrigir o que seriam as obscuridades, arcaísmos, rusticidades e superstições. Em “A Beleza do Morto”, os autores sintetizariam que não raro, o interesse pelo “popular” assumia contornos e práticas de um “culto castrador”. era muito criticada (o próprio termo pode assumir tons pejorativos), mas, mesmo assim, apresentou sua colaboração, que não raro destacava artes e manhas do “soldado sambista”. Este artigo não ambiciona examinar a variedade de temas das canções de guerra. O interesse concentra-se no filão de crítica camuflado entre estrofes e estribilhos pretensamente cívicos e entusiasmados. Ritmos tão combatidos que se assumem combatentes possibilitam discutir afinidades e discrepâncias das falas do pracinha “boa praça” com a retórica política e social do Estado Novo.

Batalhas da vida, vida de batalhas

O “Trio de Ouro”, formado por Herivelto Martins, Dalva de Oliveira e Nilo Chagas, gravou em maio de 1945, com acompanhamento de Abel Ferreira e orquestra, o samba “Negro artilheiro”, da autoria de Herivelto e Sinval Silva.

Negro artilheiro

Roda de samba de “nego” não tem mais cachaça

Há muito negro artilheiro, defensor da raça

Negro que pensa na vida, na sua pátria querida

Na sua prole sadia, grandeza da sua vida

Rezando negro pede a Deus

Por todos e pelos filhos seus

Cantando no ritmo do coração

Sempre pronto a defender nosso torrão

“Nego”

Quando foi convocado

Esqueceu seu roçado

E partiu pra brigar

“Nego”,

Dispensou o ordenado

Esqueceu que é casado

E tem filhos pra criar

Preferiu ir brigar

Preferiu ir morrer

Pra que o filho crescesse

E pudesse viver.2 2 NEGRO artilheiro. Intérprete: Trio de Ouro, Abel Ferreira e orquestra. Compositores: Sinval Silva e Herivelto Martins. [S. l.]: Odeon, jul. 1945. 1 disco de 78 rotações. 12.601-B. Samba.

Um dos maiores desafios à história cultural é a sondagem das apropriações, não no sentido de confisco, mas como um consumo, uma maneira de lidar com visões de mundo e formas de vida. A pesquisa e interpretação de práticas e representações, mesmo valendo-se de procedimentos seriais e de quantificação, almeja rastrear aspectos e elementos qualitativos; ou seja, para além do quanto, importa tentar perceber o como. Ressalve-se, entretanto, que esse “como” não cabe ser deduzido ou generalizado a partir do sentido identificado por quem analisa a fonte. Seria ambição do historiador pretender dar conta da totalidade de sentidos, diversidade de usos e pluralidade de leituras nos circuitos de produção e circulação desses bens culturais, que são também construções e miradas sobre a sociedade (CHARTIER, 1990CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Tradução: Maria Manuela Galhardo. Lisboa: Difel, 1990.). No caso da fonografia, muitas criações estão em diálogo musical ou poético com realizações de seus pares. Conversas amistosas ou ferinas. De reptos e réplicas. Um samba podia ser respondido com outro. É possível pensar que “Negro artilheiro” contesta o “Samba de Nego”, de Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana), popularizado pela gravação de Francisco Alves, em 1928. Abel Cardoso Junior, autor de Francisco Alves. As mil canções do Rei da Voz, observa que na partitura editada pela Casa Vieira Machado consta como autor da letra o nome de Baiano (Cícero de Almeida).

Samba de Nego

Samba de nego

Não se pode frequentar

Só tem cachaça

Pra gente se embriagar

Eu fui num samba

Em casa de Mãe Inês

No melhor da festa

Fomos todos pro xadrez…3 3 SAMBA de nego. Intérprete: Francisco Alves. Compositor: Pixinguinha [Alfredo da Rocha Vianna]. [S. l.]: Odeon, fev. 1928. 1 disco de 78 rotações. 10.111-B. Samba. Cf. transcrição da letra em Cardoso Junior (1998, p. 88).

“Samba de nego” tem ambiência evocativa da “pequena África” do Rio de Janeiro, estudada por Roberto Moura (1983)MOURA, Roberto. Tia Ciata e a pequena África no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Funarte, 1983. e Muniz Sodré (1988)SODRÉ, Muniz. Samba: o dono do corpo. 2ª edição. Rio de Janeiro: Mauad, 1998.. Era gente que enfrentara a chamada diáspora baiana. Eram as tias Perciliana, Bebiana, Sadata, Amélia, Rosa e Aciata, dentre outras, algumas afamadas quituteiras. O termo samba designa aí um encontro, uma festividade. De acordo com o depoimento ao Museu da Imagem e do Som prestado por João da Baiana (filho de Perciliana Maria Constança, que no nome artístico fazia questão de frisar tal ascendência), esses sambas podiam durar vários dias. Nos diversos cômodos das amplas residências, fazia-se um determinado tipo de música: choro na sala de visitas, chula, umbigada e capoeiragem no quintal. Isso, no lado recreativo. Havia, ainda, uma parte religiosa, com os cultos de candomblé. Inclusive, uma estrofe que Francisco Alves não gravou aludia a pratos e bebidas servidos em oferenda aos orixás. Outros versos de “Samba de nego”, aliás, tratam do transe místico, meio que misturado ao delírio amoroso (“No fim do samba/ Minha caboca chegô/ Virei os ôio/ E meu Santo me pegou”). Para o transcurso tranquilo dessas festas, era necessário conseguir autorização com a chefatura de polícia. Caso contrário, podia acontecer de a brincadeira ser desfeita, quedando presos seus participantes.

“Negro artilheiro” destoa de “Samba de nego” desde o primeiro verso. O que um afirma, o outro tenta contraditar. Ainda se realizavam rodas de samba, mas o elemento do vício e da embriaguez, defende-se, havia sido eliminado. “Samba de nego” foi gravado em 1928, embora trate mais precisamente da atmosfera de fins do século XIX e alvores do XX, época de rupturas nos regimes político e de trabalho, com a instauração da República e o término da escravocracia. Os sobressaltos dos acontecimentos e as mudanças de conjunturas não implicam, todavia, a transformação imediata nas ideias e costumes. Decerto que esses também mudam, mas parecem obedecer a outros ritmos e esquivar-se de uma determinação estritamente política ou econômica. Um intelectual como Joaquim Nabuco já advertia em O Abolicionismo (1883) que o regime ilegítimo e ilegal da escravidão, quando chegasse ao fim, ainda teria seus efeitos deletérios propagados por muito tempo. Há trezentos anos perseverava um sistema que retardava o desenvolvimento material e corrompia o caráter do país. O mal não seria da raça, mas da nacionalidade. E o problema não seria o negro, senão o cativeiro. Idealmente, se bem conduzida, a abolição teria efeitos benéficos também para os senhores e demais homens livres, que poderiam tentar se libertar de ignorâncias, superstições e preconceitos, mas não foi bem isso o que ocorreu.

O samba de Herivelto Martins e Sinval Silva tenta demarcar o novo mo(vi)mento dos negros na sociedade, transcorridos mais de cinquenta anos desde a abolição. A pecha dos pretos como vadios era contraposta com sua inserção na lógica produtiva (ele pensa na vida e tem um trabalho). O abuso que via “gente de cor” como suja e doente era replicado afirmando-se os cuidados com a saúde dos filhos. O discurso mesmo sobre a religiosidade africana (tachada por muitos pejorativamente como crendice) padece acomodações: fala-se de um Deus e não mais em caboclos e orixás. A reza, ao invés dos rituais. Mais que a avidez de desfrutar o instante, o “negro artilheiro” está preocupado com o futuro da raça e da pátria. Os afetos coletivos aí preponderam sobre os laços familiares (o casamento e a prole). Esse soldado ostenta valores próximos aos do romanceiro de cavalaria, como valentia e honra (dispensou o soldo, preferiu ir brigar, está disposto a morrer). Vá lá que o negro tenha mudado em relação à sociedade, persiste, contudo, a inquietação sobre se a sociedade mudou em relação ao negro. E um aguilhão aí está à espreita: por que os batalhões verde e amarelo eram constituídos, em sua maioria, por pretos e pobres?

Alguns sambas e marchas glosaram o lema latino, de Horácio e de Virgílio, pro patria mori.4 4 Jean-Jacques Rousseau professava que os republicanos deveriam beber o amor pátrio juntamente com o leite de suas mães. Reforça-se, assim, a ideia de que esse sentimento deveria ser cultivado, nutrido (através, dentre outras coisas, dos ritos da “religião civil”). Ratificam-se, ademais, as imagens da pátria como figura maternal, que instaura origens, filiações, linhagens, irmandades, heranças e autoridades. Fernando Catroga salienta que o lema “morrer pela Pátria” soa mais evocativo que “morrer pela Nação” e muitíssimo mais que “morrer pelo Estado”. A Nação é corpo político, comunidade contratual ou orgânica (étnica e linguística). O Estado afigura-se como símbolo do poder institucionalizado, é quem cobra impostos, mantém a polícia, instaura a demarcação entre governantes e governados. A Pátria, porém, é paisagem. Diz da população e do território. É algo bem mais fraterno. Aqui ou acolá, a ideia de pátria podia recair para algo tachado como “provincianismo” - o apego à chamada “pequena pátria”, o solo mais familiar dos antepassados e da comunidade -, por isso mesmo, cabia intensificar a mítica da “pátria comum”, berço e lar que conferia identidades e merecia ser defendido (CATROGA, 2011, 2013). Ernst Kantorowicz discernia alguns entendimentos e usos do termo “pátria” à época medieval. O sentido menos usual provinha da antiguidade clássica e denotava o emaranhado de valores e virtudes. Uma acepção mais corriqueira era a de cantão, distrito, aldeia, povoado. Era berço, lar e leito sepulcral. Legistas e literatos ajudaram a difundir a imagem da pátria como reino, sem oposição à ideia de solo provincial. A partir da Igreja Católica propagou-se a mensagem de que o cristão seria cidadão, também, de uma Jerusalém celestial. Com as Cruzadas, acentuou-se o sentimento de que o sacrifício em prol da pátria comunicava-se mais com o ideal de caridade, que propriamente com a noção de fidelidade, tônica das relações entre vassalos e suseranos. Ademais, as “guerras santas” conferiam ao amor patriae - e às decorrências do pugna pro patria e do pro patria mori - um aspecto virtuoso, feito fosse um martírio a favor da justiça, da verdade e do bem (KANTOROWICZ, 1998, p. 146-169). Contudo, se a Pátria é genitora, muitos de sua prole podiam ser vistos feito bastardos ou enjeitados. Se a Pátria é berço, muitos pareciam desterrados. Se a Pátria é o leito de morte dos antepassados, demasiadas eram a indigência, as covas rasas e as valas comuns. Se a Pátria é solo, berço, leito e chão, como entender tantos conflitos, tamanhos massacres? Se a Pátria é paisagem, a linha do horizonte segue a ondulação dos morros e espraia-se pelas periferias. Se a Pátria é lar, pontificam os barracos, casebres e zungus. Eis, enfim, uma pátria de párias.

Em maio de 1942, os “Anjos do Inferno” lançaram pela gravadora Columbia o samba “Mulato patriota”, da autoria de David Nasser e J. Batista.

Mulato patriota

Eu vivo num barraco no São Carlos

Onde há paz e harmonia

Onde há samba noite e dia

Eu tenho uma nega, um violão

Um herdeiro que mais tarde

Ficará com o barracão

(Meu Deus, que “bão”)

Mas, se a pátria precisar

Boto meu fuzil no ombro

Largo tudo e vou brigar.

Vocês estão pensando

Que estou contando lorota

Sou mulato patriota

Meu sangue nunca negou

Tem lá em casa um baú

Que por dinheiro nenhum eu dou

Dentro tem uma medalha

Que foi do meu bisavô

(Que em campanha ganhou).5 5 MULATO patriota. Intérprete: Anjos do Inferno. Compositores: David Nasser e J. Batista. [S. l.]: Columbia, maio 1942. 1 disco de 78 rotações. 55.342-B. Samba.

A vida que se descreve no samba é humilde porém feliz. Um teto, a companhia da esposa e filho, distração diuturna. O violão, destacado entre os bens do narrador, não distava muito, havia sido visto como algo marginal, próprio ao ócio e à boemia. Indício dessa maneira de ver as coisas pode ser rastreado em singela cantiga de roda anotada por Heitor Villa-Lobos: “Pai Francisco/ Entra na roda/ Tocando seu violão/ Dararão, dão, dão/ Vem de lá seu delegado/ E pai Francisco/ Vai pra prisão” (VILLA-LOBOS, 1941VILLA-LOBOS, Heitor. Guia prático: estudo folclórico musical, v. 1. Rio de Janeiro: Irmãos Vitale Editores, 1941., p. 88). O trabalho não é tão valorizado (e como seria, se os sambas soavam incessantemente) nem bem o dinheiro. A sugestão é de que contariam mais alguns deleites e brios. São Carlos era o morro que encimava imediações tão decantadas como a Praça Onze de Junho (palco do Carnaval, balança de façanhas fonográficas) e o Largo do Estácio de Sá, em meio ao tráfego de bondes e ladeado por uma escola normal, uma casa de correção e uma zona de meretrício. Os foliões daí criaram uma “batida diferente”, deram andamento diverso ao samba: seria a diferença entre “Jura”, de Sinhô, e “Se você jurar”, de Ismael Silva, Nilton Bastos e Francisco Alves. Esse novo estilo de samba (e de sambar), além do ritmo, insinuava-se também nos assuntos e na dicção, apresentando-se como berço e reduto de bambas, valentes e malandros (FRANCESCHI, 2010FRANCESCHI, Humberto M. Samba de sambar do Estácio: 1928-1931. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2010.; OLIVEIRA FILHO, 2002OLIVEIRA FILHO, Arthur Loureiro de. Pioneiros do Samba: Carlos Cachaça, Ismael Silva e Bicho Novo. Rio de Janeiro: Museu da Imagem e do Som, 2002.; SANDRONI, 2001SANDRONI, Carlos. Feitiço decente: transformações do samba no Rio de Janeiro (1917-1933). Rio de Janeiro: Zahar , 2001.). A medalha ganha em combate pelo antepassado tinha valor, mas não tinha preço. Era um atestado de honra que não cabia vender ou penhorar.

Na performance, os “breques” realçam trechos, quebram cadências e desestabilizam sentidos. Quando canta sobre a honraria conquistada em combate por seu ancestral, isso pode aludir a duas ocorrências principais: à Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870) ou à Campanha de Canudos (1896-1897). No libelo antiescravista publicado em Londres, em 1883, Joaquim Nabuco sentenciava em relação à Guerra do Paraguai: “Os títulos de nobreza concedidos aos senhores que forneciam escravos para o exército, mostram o interesse que tinha o Estado em achar soldados entre os escravos” (NABUCO, 2002NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. Rio de Janeiro: Nova Aguilar , 2002. Coleção Intérpretes do Brasil, v. 1., p. 55). A rigor, inexistia serviço militar obrigatório no Brasil do século XIX e o recrutamento não abrangia os escravos, por não serem considerados cidadãos. Para formar os contingentes, eram empreendidas verdadeiras “caçadas humanas”. Negros podiam ser alforriados para servir no lugar de seus senhores. E havia a Guarda Nacional, organizada de maneira própria. Sérgio Buarque de Holanda considera que o ingresso nas fileiras militares era mais comum entre desprotegidos e desocupados (HOLANDA, 2005HOLANDA, Sérgio Buarque de. História geral da civilização brasileira, t. 2: o Brasil monárquico, v. 7: do Império à República. 7ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005., p. 381). A opção pelo serviço militar e os casos de voluntariado contrastam com os estratagemas que eram acionados por uns que tinham poder econômico ou influência política para burlar sorteios e recrutamentos. De modo tortuoso, o samba recorda a cor e a condição social de grande parte dos pracinhas.6 6 Celso Castro reconstitui aspectos e instantes da institucionalização da obrigatoriedade do serviço militar no Brasil. Os apologistas da conscrição recorriam ao exemplo prussiano para afirmar a caserna como “escola da nacionalidade”, reduto propagador de um catecismo cívico e de retidão moral. Contudo, o lema da “nação em armas” não era ponto pacífico. Os principais anátemas provieram do movimento operário (principalmente dos anarquistas) e do apostolado positivista. Os discípulos de Comte lembravam que as sociedades militares corresponderiam à etapa teológica, portanto, ultrapassada. Ao estágio positivo que se augurava deveria corresponder uma sociedade ilustrada e industrial. Embora a propaganda militar recorresse à analogia da pátria com a mãe, os anarquistas esclareciam o antagonismo entre a farda e a família e enfatizavam que filhos, pais e esposos seriam sacrificados por interesses de lucro e poder, disfarçados de causas e orgulhos nacionais (CASTRO, 2012, p. 53-82).

E se, porém, a “campanha” aludida no samba fosse a de Canudos? Euclides da Cunha - no “Caderno de Lorena” e em rodapé da “Nota Preliminar” de Os Sertões - evoca Tucídides e o ideal de narrar os acontecimentos sopesando-os pela crítica dos testemunhos. Mas, será que a imagem do conflito que dilacerou a Hélade não indicava também o trágico das guerras internas? As analogias com a Antiguidade iam além: quando o politécnico sintetizava o estranhamento dos expedicionários frente a outros hábitos, paisagens e gentes, a impressão, enfim, de sentir-se fora do Brasil, o afastamento da pátria e a perturbação da unidade nacional, tudo isso, reverberava o sentimento antigo dos idos de Ulisses de surpreender-se estrangeiro em sua própria terra. Eloquente é a ordem do dia do comandante da primeira coluna da Quarta Expedição, segundo a qual, durante cinco anos na Guerra da Tríplice Aliança, nada vira parecido com a chuva de balas que partia das trincheiras dos jagunços, na demanda da conquista do alto da Favela. Vários dos que combateram em Canudos, de regresso ao Rio de Janeiro, chamaram de “Favela” a um dos morros que emolduram a cidade. Nos glossários da obra de Euclides, fica-se sabendo tratar-se de uma “euforbiácea ou leguminosa” que vicejava no morro desnudo e áspero, ao sopé do qual se alastrava o mundéu de vielas e taperas dos beatos do Conselheiro. E num “ensaio de psicologia do soldado brasileiro”, o escritor observou que os recrutas iam às batalhas como se fossem a algum folguedo turbulento. A “guerra do fim do mundo”, todavia, não foi um entrudo. Bacamartes, clavinotes, trabucos, lazarinas e pederneiras eram manejados pelos magotes de jagunços, e o exército brasileiro munido com artefatos bélicos da indústria europeia, principalmente alemã: mosquetões Comblain, metralhadoras Nordenfeldt, carabinas Mauser, obuses Schrapnels, canhões Krupp e Withworth 32 (apelidado pelos sertanejos de “A Matadeira”), rifles Mannlinchers e até dinamite. Para combater um povo que, Euclides viria a reconhecer, somente defendia o lar invadido (CUNHA, 1995CUNHA, Euclides da. Ciclo D’Os Sertões. In: CUNHA, Euclides da. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1995, v. 2., p. 97-515).

Em “Mulato patriota”, uma das lutas é contra os preconceitos de sangue e cor, daí que retoricamente o âmbito cívico prevalece em relação ao ambiente doméstico. Se fosse necessário, para de sambista fazer-se soldado, ele renunciaria à paz e harmonia de seu casebre, largaria afazeres e prazeres cotidianos, daria adeus à esposa e ao filho e iria para a guerra. Mas nem todos pareciam tão resolutos. Em outubro de 1943 foi lançado pela Victor o samba “Anda, nego”, composto por Vicente Paiva e Sá Roris. Gravado pela cantora Marilu, versa sobre uma cobrança amorosa.

Anda, nego

Se você gosta de mim, na verdade

Eu quero uma prova já do seu amor

Andam dizendo que negro não é gente

Você deve mostrar que num homem de cor

Também palpita um coração brasileiro

Que vibra ardentemente pelo nosso Brasil

Anda, nego, deixa a escola de samba

Mete a farda no couro e empunha o fuzil.

Quero ver meu neguinho lutando

Na linha de frente, com todo vigor

Pra combater essa gente

Que anda no mundo espalhando o terror

Deixe, agora, o pandeiro

Pra ser bom brasileiro

Honra a tua nação

Se quiser merecer meu coração.7 7 ANDA, nego. Intérprete: Marilu e Regional. Compositores: Vicente Paiva e Sá Roris. [S. l.]: Victor, out. 1943. 1 disco de 78 rotações. 80-0120-B. Samba.

Mesmo nas circunstâncias de um alistamento militar ampliado e exigido (formalmente, desde a presidência do marechal Hermes da Fonseca e, de forma mais direta, a partir do decreto nº 1.187, de 4 de Abril de 1939), alguma dose de propaganda, ainda que não fosse oficial, seria bem-vinda. Nem tanto como peça de convencimento, visto que para muitos setores (homens maiores de idade, funcionários públicos) isso era obrigação. Tratava-se de tentar convencer o restante da sociedade e legitimar a importância da caserna para a casa. Em “Anda, nego”, o elemento masculino parece não estar muito preocupado com o esforço de guerra. A conflagração que lhe interessa está entre as escolas de samba. É a personagem feminina que cobra decisão e virilidade. A provação, porém, não seria apenas de fervor cívico. Caberia atestar a humanidade das gentes de cor. Afinal, quem dizia que negro não era gente? Afirmações assim seriam exclusivas das doutrinas totalitárias? De fato, racismos e ressentimentos nacionais foram decisivos na Segunda Guerra. Os preconceitos contra judeus, negros e ciganos não tiveram início aí e, infelizmente, também não tiveram aí seu fim. A voz de mulher em “Anda, nego” tem algo de Penélope, que entende e exige que seu Ulisses arrisque a vida em nome de uma civilidade. Ele precisa afastar-se para que seu retorno seja ansiado. O amor à pátria (também ela uma espécie de mãe) condiciona o amor erótico. A historiadora Michelle Perrot examinou discursos que recomendavam que os homens, em situações específicas, precisariam afastar-se das mulheres. Isso, em decorrência de representações da sexualidade feminina como arrebatadora e insaciável. As fêmeas esgotariam as energias dos varões. O soldado ou o atleta deviam privar-se dos prazeres das amantes (PERROT, 2013PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. 2ª edição. São Paulo: Contexto, 2013., p. 65).

Mas, viver debaixo do mesmo teto também poderia ser uma “guerra”. Rosina Pagã foi a intérprete de “Desculpa de ocasião”, samba-choro de Herivelto Martins e Darci de Oliveira, lançado pela gravadora Odeon, no qual a voz feminina interpela o companheiro (vislumbrado ainda como uma espécie de provedor) sobre as más condições daquela vida a dois. A resposta meio malandra vinha urdida a partir de preceitos do esforço de guerra.

Desculpa de ocasião

Qualquer coisa que eu reclame

A resposta eu sei de cor

Você vive me dizendo:

- Na Europa está pior

Se eu passo sem almoço

Sem jantar, sem alimento

Você diz que é ensaio pro racionamento

Moramos num porão sem o menor asseio

Você diz que é refúgio contra bombardeio

Se eu digo que você está todo rasgado

Você diz que é disfarce, que está camuflado

Nesse país imenso aonde a paz é mato

Você falar em guerra é um desacato

E assim continuando

Eu vou tratar do meu lado

Aí mesmo é que você acabará bombardeado

(Sem essa vítima a seu lado).8 8 DESCULPA de ocasião. Intérprete: Rosina Pagã, Benedito Lacerda e conjunto. Compositores: Herivelto Martins e Darci de Oliveira. [S. l.]: Odeon, jun. 1942. 1 disco de 78 rotações. 12.159-A. Samba-choro.

O disco com “Desculpa de ocasião” foi lançado em junho de 1942. Antecede, portanto e por pouco, a declaração brasileira de beligerância em relação aos países do Eixo, datada de 22 de agosto do mesmo ano. A voz feminina roga a mobilização de seu “neguinho”, porém, para as batalhas da vida. O afeto pátrio soa quase acessório. Somente se diz ser o país grande e pacífico. O cotidiano das pessoas pobres nem por isso seria menos árduo ou desafiante. Comida, vestimenta, moradia, tudo isso representava algo a ser conquistado. A voz masculina (expressa indiretamente) malandramente fazia uso de diretrizes da retórica militar e governamental para tentar resolver as coisas dentro de sua maloca. Lemas do esforço de guerra podiam ser apropriados e invertidos como um jeito de deixar as coisas como estavam para ver como iam ficar. “Desculpa de ocasião” trata da luta pela sobrevivência e das astúcias para contornar algumas exigências. Embora o fecho desse samba seja uma ameaça de separação, tem-se que apelos aos discursos de mobilização e civismo podiam vir a calhar como argumentos nas tentativas de superar crises conjugais, exigindo do outro sua quota de sacrifício, sem compromisso recíproco e equivalente ou expectativa de recompensa. Mesmo que os “lances” de apropriação malandra dos discursos oficiais nem sempre fossem eficazes, sua ocorrência assinala bastante significância e diversos significados. “Desculpa de ocasião” é de antes da entrada do Brasil na guerra, mas do tempo da ditadura do Estado Novo! Sobre esse regime, que valha a lembrança de Mário Lago de um gracejo de Alberto Ribeiro, que afirmava que a “voz orgulho do Brasil”, o tenor Vicente Celestino (que começara sua carreira cantando em picadeiros e palcos, sem auxílio de microfones), era o “único que gritava sem acabar preso” (LAGO, 1977LAGO, Mário. Bagaço de beira-estrada. 2ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 1977., p. 71). Um berro podia dar cadeia; posta em samba, talvez a mesma reivindicação ou crítica encontrasse brechas.

A dureza do batedor

Podia ocorrer de o “soldado sambista” expressar laivos de malandragem. A dupla Zé & Zilda lançou em outubro de 1943 o samba “Fim do Eixo”.

Fim do Eixo

Hitler, Mussolini e Hirohito

Já são três peixinhos fritos no azeite de dendê

Quanto mais o tempo dá o suíte

Mais me abre o apetite

Desses peixinhos comer

Eu peço todo dia à minha sorte

Que antes da minha morte

Eu quero ter esse prazer de ver

Hitler, Mussolini e Hirohito

Na Pedreira São Diogo

Pulando feito um cabrito

Hitler com uma broca na mão

Uma marreta, uma enxada, um enxadão

E Mussolini numa grande sinuca

Bancando o mestre-cuca

Em volta de um caldeirão de macarrão

E Hirohito no carrinho de mão

Carregando macadame

Pra encher um caminhão.9 9 FIM do eixo. Intérpretes: Zé & Zilda. Compositor: José Gonçalves [Zé com Fome]. [S. l.]: Victor, out. 1943. 1 disco de 78 rotações. 80-0123-B. Samba.

O compositor de “Fim do Eixo”, José Gonçalves, era cavaquinista e residente em Mangueira. Por muitos anos foi apresentado pela alcunha de Zé com Fome. Ao conhecer sua parceira nos palcos e na intimidade, ficou sendo o Zé da Zilda e ela a Zilda do Zé, formando a dupla Zé & Zilda. Tal samba pode certamente ser entendido como daqueles de “sátira aos chefes inimigos” (conforme classificação de Gracio Barbalho) ou de crítica “às figuras, símbolos e costumes representativos do nazifascismo”, de acordo com os modos elencados por Jairo Severiano. Primeiramente, o alemão, o italiano e o japonês eram rebaixados a uma condição de animalidade, viravam “peixinhos”. Ressalte-se, entretanto, que os apelos à zoomorfia nem sempre se faziam para o achincalhe. Basta lembrar que tropas brasileiras escolheram o avestruz e a cobra (até respondendo à provocação de Vargas que afirmara ser mais fácil uma cobra fumar que o Brasil entrar na guerra) como seus mascotes. Nos sambas sobre a guerra é possível encontrar caracterizações elogiosas dos soviéticos como ursos, da Inglaterra como um touro e dos que combatiam no norte da África como camelos. O interessante seria a intimidação através de força e ferocidade descomunais. Para o deboche eram acionadas as imagens da serpente, do gambá, da galinha verde e do papagaio, as últimas servindo também para identificação dos integralistas. Ao tratar pessoas como bichos - para negar humanidade ou frisar bestialidade - fica mais saliente o aspecto irracional das guerras. Curioso é o caso da “Lurdinha”: figuração antropomórfica e anímica de uma metralhadora. Pessoas tratadas como animais e coisas tratadas feito gente, isso é bem um emblema da desrazão bélica.

Em “Fim do Eixo”, ao dispor-se à chacota das lideranças da “trinca perversa”, contudo, José Gonçalves acabava por incorrer na ideia de que o trabalho é uma pena. O batente seria, assim, um modo de pagar, ao invés de receber, pelo que se faz. Mesmo os supostos pendores correcionais do trabalho radicavam na ideia de que a regeneração do espírito viria de fadigas e suplícios corporais. A imprecação do sambista traduz a vontade de ver os “grandes” pegando no pesado, exercendo esforços físicos, em ambientes insalubres, batendo a terra, quebrando pedra. O que se rogava eram extenuações. Que as penitências se inscrevessem nas carnes! Se não derramassem sangue, ao menos que vertessem suor! A visão do trabalho como castigo destoava da prédica do regime brasileiro, tendente a afirmar a labuta como dignificante. Ressoa no samba de Zé da Zilda algo da dicção malandra que enxerga o batente como coisa de otário.

A questão, porém, torna-se mais intricada à lembrança de outros sambas também alusivos à pedreira de São Diogo. “Dormi no molhado”, criação de Moreira da Silva, foi gravado pelo autor com Garoto (Aníbal Augusto Sardinha) e seu conjunto e lançado pela Odeon em maio de 1942. O tema aí não é a guerra, mas uma reprimenda a um jovem que pedia esmolas. Concomitantemente à sua carreira radiofônica e discográfica, Moreira da Silva teve diversos empregos, dentre os quais o de motorista de ambulância. A imagem do “Tal” (apelido dado pelo locutor César Ladeira) esteve, contudo, bastante associada à figura do malandro, o que era reforçado por inúmeras gravações, como “Jogo proibido” (“Não quero outra vida/ Senão jogar chapinha/ De cerveja Cascatinha/ Navalha no bolso/ Lenço no pescoço/ Chapéu de palhinha/ Eu ando melhor/ Do que qualquer doutor…”).10 10 JOGO Proibido/ Malandro bombardeado. Intérprete: Moreira da Silva. Compositores: Tancredo Silva, David Silva, José Gonçalves e Moreira da Silva. [S. l.]: Continental, mar. 1953. 1 disco de 78 rotações. 16.724-B. Sambas. Em “Dormi no molhado”, ao afirmar não sentir compaixão de um rapaz de pouca idade e de talento que não queria trabalhar, o compositor enumera uma série de situações difíceis e ocupações pesadas, dentre as quais: “Eu enfrentei uma marreta/ Na Pedreira São Diogo/ Quebrando pedra bonita/ Passando a pão e a linguiça”. Em outro samba-choro de crítica ao hábito de mendigar dinheiro, “Me dá, me dá”, da autoria de Portelo Juno e Cícero Nunes, gravado em 1937 por Carmen Miranda com Benedito Lacerda e seu regional, o breque final sentenciava: “Vai quebrar pedra na pedreira que é bem bom pro seu pulmão”.11 11 ME DÁ, me dá. Intérprete: Carmen Miranda. Compositores: Portelo Juno e Cícero Nunes. [S. l.]: Odeon, ago. 1937. 1 disco de 78 rotações. 11.494-B. Samba-choro. Ao pé da letra, a mendicância não seria malandragem. Certos expedientes, mesmo que não fossem sempre os expedientes certos, como cafetinagem, jogatina e pequenos golpes, existiam para quem quisesse “arrumar” dinheiro. Isso seria diferente de suplicar tostões e vinténs.12 12 Gilberto Vasconcelos e Matinas Suzuki Junior consideram que a música urbana desenvolvida entre meados do século XIX e alvores do período republicano já nascera sob o signo da malandragem; contemporânea, ademais, da miséria, do desequilíbrio e da rebeldia. A aversão ao trabalho tinha sua razão de ser em uma sociedade marcada pela escravocracia ou pela percepção da exploração subjacente ao trabalho assalariado. O malandro teria correspondências com a figura do pícaro e raízes ainda mais remotas na métis grega (astúcia, arte e manha) (VASCONCELOS; SUZUKI JR, 2007, p. 612-638). Cláudia Neiva de Matos pontua que, para além de uma temática, a malandragem configura-se também como uma dicção; ou seja, mais que decantar a malandragem, alguns sambas cantavam malandramente, explorando ambiguidades e jogos de linguagem. A ambivalência seria um dos principais atributos da poética dos submundos urbanos e, se isso não conseguia estabelecer uma verdade própria, bastava para desestabilizar, adulterar ou desconstruir as “verdades oficiais”. Um desafio para a pesquisa e interpretação em ciências sociais concerne às estratégias nas quais muito que é dito sobre os excluídos provém da visão dos excludentes. Nesse sentido, a autora sublinha a significância dos sambas como documentos verbais das camadas e classes populares (MATOS, 1982).

No morro de São Diogo havia um mangue e uma pedreira. Depois, quiseram fazer passar pelos arredores uma estrada de ferro. Tudo isso demandava trabalhos pesados. Zé da Zilda, ao imaginar como castigo supremo para os líderes inimigos uma série de encargos penosos (quebrar granito, carregar calçamento de estradas, mexer fervuras), talvez tivesse em mente a ideia de pecado. Se a guerra assinalava de vez um paraíso perdido, a condenação havia de ser infernal, daí a projeção da fritura em óleo e de tormentos físicos. Ou será que por linhas tortas chega-se a uma releitura do catecismo liberal que apregoa que o trabalho dignifica o homem? E a correção de homens indignos estaria em trabalhos proporcionalmente mais cheios de suplícios? Afigura-se, assim, mais uma ameaça de pauperização dos ofícios manuais e de marginalização de seus executantes. O espectro que ronda a ironia de Zé da Zilda é que, em um país de ranço colonialista e escravocrata como o Brasil, várias ocupações manuais foram vistas com desprezo. Na marcha “Três palhaços na berlinda”, lançada por Ataulfo Alves em março de 1943, o desejo dos compositores (Alocin, Odausico Mota e Nelson Trigueiro) era ver Hitler, Mussolini e Hirohito “marcando passo de pá e picareta na mão/ abrindo estrada lá no sul do Maranhão”.13 13 TRÊS PALHAÇOS na berlinda. Intérpretes: Ataulfo Alves e sua Academia de Samba. Compositores: Alocin, Odausico Mota e Nelson Trigueiro. [S. l.]: Odeon, mar. 1943. 1 disco de 78 rotações. 12.281-A. Marcha. É tudo muito engraçado e muito sério. Além do menoscabo do batedor de muita gente honesta, o charme da canção ainda opera uma apartação dentro do próprio país: tanto se escracha o fato de o Maranhão parecer remoto quanto o de se tentar abrir comunicações para lá. Suburbano, nortista, sertanejo, operário… marcas de nossos preconceitos, chistes, afãs de domínio e punição em relação ao outro. Mesmo sendo ele um de nós.

Linha dura, corpo mole

O debate historiográfico beneficiou-se muito com estudos que intentavam frisar o lado autoritário e repressivo do Estado Novo. As análises tendiam a destrinçar os ardis da censura e da propaganda, bem como a denunciar a polícia política, os ódios étnicos e religiosos, os excessos dos apologistas do regime e os ataques à cidadania. Problematizava-se, inclusive, o quanto a História teria sido mal contada, pela monumentalização da versão dos vencedores ou pelo apagamento de rastros contraditórios. Se a “mestra da vida” tinha alguma lição, talvez fosse a de que o passado deveria ser conhecido como forma de evitar-se o perigo de sua repetição. Cabia desvendar os truques da simbologia e da retórica autoritárias como meio de reduzir sua eventual eficácia. O ímpeto historiográfico da denúncia, contudo, podia, aqui e ali, sobrepesar o raio de atuação e eficiência dos órgãos de censura; como se o ideal dos discursos tivesse sido completamente posto em prática. A partir do recorte da chamada “música popular”, tal abordagem aparecia, por exemplo, na temática da malandragem: o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) censurava tudo, os compositores foram cooptados, a prédica do trabalhismo foi introjetada, o Bonde São Januário leva mais um operário, como consignado na pioneira investigação de Antonio Pedro Tota (1980)TOTA, Antonio Pedro. Samba da legitimidade. Dissertação de mestrado em História, Universidade de São Paulo, 1980. sobre o Samba da legitimidade.14 14 Uma análise mais aprofundada e abrangente sobre a historiografia dos estudos políticos e da música popular, em relação ao que foi meramente esboçado aqui, é empreendida por Adalberto Paranhos, que pondera que os ímpetos de dominação ideológica eram redefinidos ativamente pelos “dominados”. Se a aproximação do Estado em relação aos sambistas ocorreu de maneira seletiva, buscando uniformidades com o ideário de governo, os compositores e artistas também atuavam de modo a filtrar o que fosse de seus interesses. Daí não poderem ser vistos meramente como “caixas de ressonância”. Isso não implica diminuir as responsabilidades da censura ou da polícia política, mas sublinhar a ação (e a capacidade de agência) das pessoas. Os sambas “desafi(n)avam o coro dos contentes” do Estado-Novo no tratamento de perfis sexuais (o provedor, a mãe de família) carnavalizados pela imagem da mulher fatal ou do valente que trabalha e anda no “miserê”. O humor e a sátira também valiam como instrumentos de crítica. Esse “Lado B” do “Brasil brasileiro” era povoado ainda por uma legião de excluídos. Das gravações da “era de ouro do rádio” não é difícil recordar que há um que faz tanta casa e não tem casa para morar; outro que tem como cama duas folhas de jornal e como cobertor esse imenso céu de anil, outra com uma lata d’água na cabeça, um que come bastante no almoço para não pensar no jantar e ainda aquele Rousseau do morro que entoava que “se o homem nasceu bom/ e bom não se conservou/ a culpa é da sociedade/ que o transformou” (PARANHOS, 2015). Mas, quando Aristheu Achilles, na brochura Aspectos da Ação do DIP, editado por esse Departamento em 1941ACHILLES, Aristheu. Aspectos da ação do DIP. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa e Propaganda, 1941., ao comentar as responsabilidades das Divisão de Rádio, informava que “foram censuradas milhares de letras para serem musicadas” (ACHILES, 1941ACHILLES, Aristheu. Aspectos da ação do DIP. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa e Propaganda, 1941., p. 63) e, em 1940, o número de vetos chegava a 373, duas leituras, que não são necessariamente excludentes, podem ser suscitadas. Se havia tanta censura, quiçá fosse limitado o convencimento. Do mesmo mês e gravadora que “O Bonde São Januário” (Wilson Batista e Ataulfo Alves) é “O Bonde do horário já passou” (Haroldo Lobo e Milton de Oliveira), que passou até pela censura, não obstante contasse o caso de um operário que todos os dias da semana urdia nova desculpa para fugir ao batedor. Amiúde, recorreu-se até ao conceito de “totalitarismo”. Decerto, aqui pontificava um líder carismático e havia a ideia de movimento, de pôr-se em ação. Os entes federados foram suprimidos em nome da centralidade da União e funcionavam também órgãos secretos e polícias especiais. Todos esses pontos convergem com apanágios do totalitarismo, contudo a diferença crucial entre ditaduras, tiranias e regimes totais talvez radique no índice de convencimento, proporcional ao nível de atomização, de sua população. Vários estudos ajudaram a perceber que existem desejos de controle, projetos de controle, controles efetivos; mas, também, limites, burlas, sabotagens, pressões, confrontos, atenuações etc. A leitura dessas denúncias podia suscitar curiosidades respeitantes a possíveis brechas, não para amenizar a feição policialesca e ditatorial do regime, mas como inquietações acerca de indícios de “resistências”, “conflitos”, “contrapartidas” ou “táticas”, de grupos e indivíduos. Uma das qualidades de uma boa pesquisa é estimular a realização de outros estudos e esse é um mérito adicional em tais trabalhos.15 15 Dentre outros, é possível recordar Lenharo (1989), Cancelli (1994), Carneiro (2001). A procura de um ponto de equilíbrio entre a denúncia da censura e a percepção de artimanhas ainda tem que aprecatar-se contra outros perigos: o de transtornar o poder em musa, como se o enfretamento de situações limitadas de liberdade tornasse os autores mais criativos, inteligentes e inspirados; ou o de patrulhar artistas que, eventualmente, tenham se valido do apoio de algum regime.

Coda

Em novembro de 1942, a dupla Nhô Pai & Nhô Fio lançou, da autoria de Ariowaldo Pires, a moda de viola “O Brasil entrou na guerra”. Em uma das estrofes cantava-se que:

O Brasil entrou na guerra

Tiradentes e Caxias

Floriano, Santos Dumão

O preto Henrique Dias

E o índio Camarão

Seja branco, preto ou bugre

Nós semos tudo irmão

Na vida, mercê de Deus

Nessa glória de nação.16 16 O BRASIL entrou na guerra. . Intérpretes: Nhô Pai & Nhô Fio. Compositor: Ariowaldo Pires. [S. l.]: Odeon, nov. 1942. 1 disco de 78 rotações. 12.227-A. Moda de viola.

Evoca-se aí determinado tratamento da nacionalidade cuja formulação remonta a meados do século XIX e comunica impasses e preocupações de então. Alguns pontos contribuíam para que no Oitocentos o Brasil pudesse assemelhar-se a uma “flor exótica” na América: o idioma português, uma monarquia entre repúblicas e a centralização do Estado (CARVALHO, 2003CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial; Teatro de Sombras: a política imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.). Diferentemente dos quatro vice-reinados espanhóis - que nos processos de independência originaram dezenas de países -, aqui de dois vice-reinos derivou um Estado centralizado. Isso, porém, ocorreu de forma tumultuada tanto no campo político quanto no das ideias. Uma das inquietações era a de que ao Estado não pareciam corresponder povo ou sentimento nacional. Mesmo em 1907, Capistrano de Abreu (1988)ABREU, João Capistrano Honório de. Capítulos de história colonial (1500-1800). 7ª edição. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1988. concluía seus Capítulos de História Colonial ponderando que a obra de três séculos de colonização, afora a aversão ou desprezo pelo português, não conseguira que cinco grupos étnicos, ainda que ligados por língua e religião, sentissem apreço ou solidariedade uns com os outros. E Capistrano era dos maiores conhecedores da obra do Visconde de Porto Seguro, tendo assinado seu necrológio e trabalhado incessantemente na edição anotada da História Geral do Brasil.

Francisco Adolfo de Varnhagen foi o formulador de uma proposta bastante influente de identidade nacional. Na História Geral do Brasil (publicada entre 1854 e 1857) e na História das lutas com os holandeses no Brasil: desde 1624 a 1654 (redigida durante a Guerra do Paraguai e editada em 1871) esse confrade meio rebelde do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) argumentava que o sentimento de nacionalidade remontava suas origens à quadra colonial, quando da união entre brancos (personificados em André Vidal), índios (potiguares, Felipe e Ana Camarão) e negros (batalhão dos Henriques) contra o invasor, o estrangeiro, tratado muitas vezes como herege. O século XVII regia-se pela lealdade a casas dinásticas e não propriamente pela ideia de estado nacional, que viria a ser própria do período em que Varnhagen estava escrevendo. A identidade seria reforçada pela diferenciação, pelo contraste com o outro; mais até que firmada a partir de afinidades e afetos comuns.

Em julho de 1942 foi lançado mais um disco do “cantor das multidões”. Orlando Silva interpretava, da autoria de Ataulfo Alves e Wilson Batista, o samba “Terra boa”:

Terra boa

Que terra boa

Para se ganhar o pão

Tem batucada, tem luar, tem violão

Terra da liberdade

Onde o verso é um esporte

Por essa terra

Dou meu peito à própria morte

Terra que tem ferro e aço

Pra viver a eternidade

Canta a ave no espaço

O hino da liberdade

Tem lourinhas, tem morenas

Desde o sul até o norte

Por essa terra

Dou meu peito à própria morte

Terra de Santos Dumont

Carlos Gomes, Rui Barbosa

Grande Duque de Caxias

Castro Alves, Noel Rosa

Tem ainda um grande homem

Destemido e braço forte

Por essa terra

Dou meu peito à própria morte.17 17 TERRA boa. Intérprete: Orlando Silva. Compositores: Ataulfo Alves e Wilson Batista. [S. l.]: Victor, jul. 1942. 1 disco de 78 rotações. 34.938-A. Samba.

“Terra boa” é uma síntese de aspectos e complexidades das canções de guerra e das relações entre música popular e política nos idos da década de 1940. A verve do samba é uma alusão ao trecho da letra do “Hino Nacional Brasileiro” - escrita por Joaquim Osório Duque Estrada e oficializada nos festejos do Centenário da Independência - que versava sobre o desafio de morrer em prol da liberdade. A estrutura é quase de partido-alto, com a glosa de um lema/tema que no caso é o “por essa terra/ dou meu peito à própria morte” que evoca o “desafia nosso peito a própria morte” do hino cívico. A melodia de Francisco Manuel da Silva (realçada pelas orquestrações de Alberto Nepomuceno e Leopoldo Miguez) desfrutava apreço e despertava entusiasmo. É sentimental, pretende-se mobilizadora. Tocada por bandas, em coretos, desfiles, escolas, solenidades, gravada em discos, irradiada… trata-se de composição conhecida e altamente exitosa em suas funções simbólicas. O sucesso comercial não lhe serve de medida, mas, como intuíram os bambas Ataulfo e Wilson, podia beneficiar-se de uma “casquinha”, uma evocação do hino. A terra era boa, embora não fosse mais um paraíso: era preciso ganhar o pão. Mas, logo em seguida, os atenuantes dos luares e batucadas. “Liberdade” no hinário cívico tem mais comumente as acepções de independência política e igualdade em relação às outras nações. No “Hino da Proclamação da República”, de Leopoldo Miguez e Medeiros e Albuquerque, “liberdade” diz respeito ao fim do cativeiro e escravização, no samba “Terra boa” o termo e a ideia aparecem reiteradamente, inclusive com o recurso às imagens da ave e do voo. Ainda que a expressão “é um esporte” fosse usual, uma gíria, não deixa de ser possível pensar em jogo, no uso tático de regras, riscos imponderáveis etc. Afirmar o Brasil como “terra da liberdade” no auge da ditadura varguista não poderia ser uma maneira de jogar com a censura? Acenos simpáticos também eram destinados à propaganda, com menção à siderurgia, indústria estratégica para os esforços de guerra e elemento de barganha para a entrada do Brasil no conflito. Ferro e aço, signos do progresso, serviriam ainda para perpetuar tradições. Os efeitos corrosivos da passagem dos dias é como se quedassem amainados, gravando no metal eventos, vultos e visões da memória nacional. As canções de guerra podem ser pensadas como contidas em conjunto maior, o do chamado “samba-exaltação”, cujo protótipo foi fixado por “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso. São característicos aí o elogio à natureza, ao traço sentimental de seu povo e à alegria de sua gente. Mas aí também perseveram ambiguidades: não é cômodo predicar a positividade do trabalho em um país no qual a natureza é rica e bela (convidando à contemplação). Os encômios à beleza das gentes daqui muito facilmente deslanchavam para uma visão sensualizada e hedonista. Em “Terra boa”, a paráfrase não é apenas em relação ao Hino Nacional, mas também ao “Hino do Carnaval Brasileiro” (Lamartine Babo), dentre tantas outras marchinhas que (de)cantam atrativos eróticos de mulatas, lourinhas e morenas. O samba-exaltação é antes de tudo uma exaltação do samba, festa e gênero musical que era visto por muitos como coisa de pretos, pobres, ignorantes e degenerados. É astuta e audaz a inclusão de Noel Rosa no rol dos heróis da nação. Deve-se lembrar que Wilson Batista, um dos autores de “Terra boa”, ficou tristemente célebre como rival em intensa “polêmica” discográfica com o “filósofo cantor”, falecido em maio de 1937.

A experiência trágica da guerra também foi tratada pela ótica do humor.18 18 Elias Thomé Saliba observa as dificuldades de o humor deixar-se aprisionar por uma definição categórica, pois mais que uma essência, pesaria aí a história. Para aproximar-se de uma “cultura cômica” valeria atentar, para além dos conteúdos, para os usos sociais de piadas e anedotas. Na “Época Bela” (e alguns contemporâneos enxergaram no termo um travo de ironia) ao menos três grandes autores meditaram sobre o humor. Henri Bergson ressaltou o ridículo das interações desastradas entre coisas, mecanismos e seres vivos. O riso seria deflagrado por confusões, desequilíbrios, trapalhadas e surpresas. Luigi Pirandello enfatizou a nuance compreensiva latente nas situações estapafúrdias. Quem escorrega na casca de banana não ri. Nem bem quem se coloca naquela pele ou ocasião. A passagem do cômico ao humorístico corresponderia ao desabrochar de um sentimento empático, de identidade ante o burlesco do mundo e as zombarias da vida. Sigmund Freud percebeu analogias entre o chiste e os sonhos, operando na liberação de emoções represadas e na quebra de determinismos, alívio de tensões e desvio das expectativas. A eficácia do humor radica também na ambivalência da linguagem e, não raro, na irreverência perante convenções e formalismos. Daí, ser tão nítida a sua função desmistificadora. As representações humorísticas da História do Brasil frequentemente desnudaram o inusitado do cotidiano, a instabilidade social e o artificialismo de alguns costumes, contrapondo ao vazio moral outra ótica e outra ética, mesmo que ilusória e efêmera. (SALIBA, 2002). “Haja pão/ Que é negócio da China”. Essas são as linhas iniciais de “Haja pão!”, marcha de Felisberto Martins e Russo do Pandeiro, lançada por Joel e Gaúcho, em janeiro de 1944. Explorando o cacófato, os versos dão conta de duas situações diferentes, porém, relacionadas: no plano internacional, na guerra na frente oriental, o Japão como inimigo do exército chinês; no âmbito interno, contudo, a sacada é de que, em tempos de carestia e racionamento, a panificação seria algo lucrativo. Em um caso, a estratégia de guerra entre dois povos acostumados a antigas contendas nas áreas do Oceano Índico das quais procuravam assenhorar-se; em outro, o desejo de lucro, mesmo que às custas da exploração do semelhante (o freguês) e dos expedientes do jeitinho (em relação às regras do esforço de guerra). Em resumo: alguns sambas e marchas, mesmo que camuflados, apresentaram caracterizações do trabalho como suplício; fizeram elogios ao soldado capoeira e meio malandro; lembraram que o panteão das guerras não é feito somente de generais, mas também do pé de poeira; rogaram por democracia e liberdade; apontaram rancores, ódios e preconceitos internos; e inventaram piadas e protestos contra o racionamento e a consequente exploração no comércio de produtos como açúcar, carne, trigo, gasolina e papel. Aqui e acolá, nos sambas e marchas da época da Segunda Guerra despontam, portanto, a crônica e a crítica de muitas das batalhas em nosso país.

  • **
    O artigo não foi previamente publicado em plataforma preprint; as fontes e bibliografia são referidas no texto, em notas de rodapé e em seção específica. Registros fonográficos pesquisados no Museu Cearense da Comunicação, Acervo Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez), Fortaleza, CE.
  • 1
    Jacques Revel chama atenção para o tratamento do termo popular em mais de um artigo. No ano de 1970, em parceria com Michel de Certeau e Dominique Julia, redigiu “A Beleza do Morto” (inserido em A Invenção da Sociedade) (Revel, 1990REVEL, Jacques. A invenção da sociedade. Tradução: Vanda Anastácio. Lisboa: Difel , 1990.). Em 1986, publicou “Cultura Popular: usos e abusos de uma ferramenta historiográfica” e, em 1995, veio a lume o estudo “O Inverso das Luzes: os intelectuais e a cultura ‘popular’ na França (1650-1800)”, ambos reproduzidos em Proposições (Revel, 2009REVEL, Jacques. Proposições: ensaios de história e historiografia. Tradução: Claudia O’Connor dos Reis. Rio de Janeiro: Eduerj, 2009.). Revel não defende que o termo seja abandonado. Antes de valer-se da noção de “popular” como categoria de análise, os historiadores deveriam problematizar, historicizar, tomar como objeto de exame a própria constituição das fronteiras entre os níveis culturais. As oposições culto × leigo, douto × iletrado, ciência × crendice seriam dissimétricas, na medida em que definições, hierarquias e classificações emanavam, apenas ou prioritariamente, do polo considerado erudito. Assim, muitas vezes, o “popular” era encarado a partir de faltas e falhas decididas pelo circuito “erudito”. As aproximações do “popular” com a infância legitimavam os arroubos pedagógicos ou de magistratura social, tendentes a corrigir o que seriam as obscuridades, arcaísmos, rusticidades e superstições. Em “A Beleza do Morto”, os autores sintetizariam que não raro, o interesse pelo “popular” assumia contornos e práticas de um “culto castrador”.
  • 2
    NEGRO artilheiro. Intérprete: Trio de Ouro, Abel Ferreira e orquestra. Compositores: Sinval Silva e Herivelto Martins. [S. l.]: Odeon, jul. 1945. 1 disco de 78 rotações. 12.601-B. Samba.
  • 3
    SAMBA de nego. Intérprete: Francisco Alves. Compositor: Pixinguinha [Alfredo da Rocha Vianna]. [S. l.]: Odeon, fev. 1928. 1 disco de 78 rotações. 10.111-B. Samba. Cf. transcrição da letra em Cardoso Junior (1998, p. 88)CARDOSO JUNIOR, Abel. Francisco Alves: as mil canções do Rei da Voz. Curitiba: Revivendo, 1998..
  • 4
    Jean-Jacques Rousseau professava que os republicanos deveriam beber o amor pátrio juntamente com o leite de suas mães. Reforça-se, assim, a ideia de que esse sentimento deveria ser cultivado, nutrido (através, dentre outras coisas, dos ritos da “religião civil”). Ratificam-se, ademais, as imagens da pátria como figura maternal, que instaura origens, filiações, linhagens, irmandades, heranças e autoridades. Fernando Catroga salienta que o lema “morrer pela Pátria” soa mais evocativo que “morrer pela Nação” e muitíssimo mais que “morrer pelo Estado”. A Nação é corpo político, comunidade contratual ou orgânica (étnica e linguística). O Estado afigura-se como símbolo do poder institucionalizado, é quem cobra impostos, mantém a polícia, instaura a demarcação entre governantes e governados. A Pátria, porém, é paisagem. Diz da população e do território. É algo bem mais fraterno. Aqui ou acolá, a ideia de pátria podia recair para algo tachado como “provincianismo” - o apego à chamada “pequena pátria”, o solo mais familiar dos antepassados e da comunidade -, por isso mesmo, cabia intensificar a mítica da “pátria comum”, berço e lar que conferia identidades e merecia ser defendido (CATROGA, 2011CATROGA, Fernando. Ensaio respublicano. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2011., 2013CATROGA, Fernando. A geografia dos afectos pátrios: as reformas político-administrativas (sécs. XIX e XX). Coimbra: Almedina, 2013.). Ernst Kantorowicz discernia alguns entendimentos e usos do termo “pátria” à época medieval. O sentido menos usual provinha da antiguidade clássica e denotava o emaranhado de valores e virtudes. Uma acepção mais corriqueira era a de cantão, distrito, aldeia, povoado. Era berço, lar e leito sepulcral. Legistas e literatos ajudaram a difundir a imagem da pátria como reino, sem oposição à ideia de solo provincial. A partir da Igreja Católica propagou-se a mensagem de que o cristão seria cidadão, também, de uma Jerusalém celestial. Com as Cruzadas, acentuou-se o sentimento de que o sacrifício em prol da pátria comunicava-se mais com o ideal de caridade, que propriamente com a noção de fidelidade, tônica das relações entre vassalos e suseranos. Ademais, as “guerras santas” conferiam ao amor patriae - e às decorrências do pugna pro patria e do pro patria mori - um aspecto virtuoso, feito fosse um martírio a favor da justiça, da verdade e do bem (KANTOROWICZ, 1998KANTOROWICZ, Ernst H. Os dois corpos do Rei: um estudo sobre teologia política medieval. Tradução: Cid Knipel Moreira. São Paulo: Companhia das Letras, 1998., p. 146-169).
  • 5
    MULATO patriota. Intérprete: Anjos do Inferno. Compositores: David Nasser e J. Batista. [S. l.]: Columbia, maio 1942. 1 disco de 78 rotações. 55.342-B. Samba.
  • 6
    Celso Castro reconstitui aspectos e instantes da institucionalização da obrigatoriedade do serviço militar no Brasil. Os apologistas da conscrição recorriam ao exemplo prussiano para afirmar a caserna como “escola da nacionalidade”, reduto propagador de um catecismo cívico e de retidão moral. Contudo, o lema da “nação em armas” não era ponto pacífico. Os principais anátemas provieram do movimento operário (principalmente dos anarquistas) e do apostolado positivista. Os discípulos de Comte lembravam que as sociedades militares corresponderiam à etapa teológica, portanto, ultrapassada. Ao estágio positivo que se augurava deveria corresponder uma sociedade ilustrada e industrial. Embora a propaganda militar recorresse à analogia da pátria com a mãe, os anarquistas esclareciam o antagonismo entre a farda e a família e enfatizavam que filhos, pais e esposos seriam sacrificados por interesses de lucro e poder, disfarçados de causas e orgulhos nacionais (CASTRO, 2012CASTRO, Celso. Exército e nação: estudos sobre a história do Exército Brasileiro. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2012., p. 53-82).
  • 7
    ANDA, nego. Intérprete: Marilu e Regional. Compositores: Vicente Paiva e Sá Roris. [S. l.]: Victor, out. 1943. 1 disco de 78 rotações. 80-0120-B. Samba.
  • 8
    DESCULPA de ocasião. Intérprete: Rosina Pagã, Benedito Lacerda e conjunto. Compositores: Herivelto Martins e Darci de Oliveira. [S. l.]: Odeon, jun. 1942. 1 disco de 78 rotações. 12.159-A. Samba-choro.
  • 9
    FIM do eixo. Intérpretes: Zé & Zilda. Compositor: José Gonçalves [Zé com Fome]. [S. l.]: Victor, out. 1943. 1 disco de 78 rotações. 80-0123-B. Samba.
  • 10
    JOGO Proibido/ Malandro bombardeado. Intérprete: Moreira da Silva. Compositores: Tancredo Silva, David Silva, José Gonçalves e Moreira da Silva. [S. l.]: Continental, mar. 1953. 1 disco de 78 rotações. 16.724-B. Sambas.
  • 11
    ME DÁ, me dá. Intérprete: Carmen Miranda. Compositores: Portelo Juno e Cícero Nunes. [S. l.]: Odeon, ago. 1937. 1 disco de 78 rotações. 11.494-B. Samba-choro.
  • 12
    Gilberto Vasconcelos e Matinas Suzuki Junior consideram que a música urbana desenvolvida entre meados do século XIX e alvores do período republicano já nascera sob o signo da malandragem; contemporânea, ademais, da miséria, do desequilíbrio e da rebeldia. A aversão ao trabalho tinha sua razão de ser em uma sociedade marcada pela escravocracia ou pela percepção da exploração subjacente ao trabalho assalariado. O malandro teria correspondências com a figura do pícaro e raízes ainda mais remotas na métis grega (astúcia, arte e manha) (VASCONCELOS; SUZUKI JR, 2007VASCONCELOS, Gilberto & SUZUKI JÚNIOR, Matinas. A malandragem e a formação da música popular brasileira. In: FAUSTO, Boris (org.). História geral da civilização brasileira, t. 3: o Brasil republicano, v. 11: economia e cultura (1930-1964). 4ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2007, p. 612-638., p. 612-638). Cláudia Neiva de Matos pontua que, para além de uma temática, a malandragem configura-se também como uma dicção; ou seja, mais que decantar a malandragem, alguns sambas cantavam malandramente, explorando ambiguidades e jogos de linguagem. A ambivalência seria um dos principais atributos da poética dos submundos urbanos e, se isso não conseguia estabelecer uma verdade própria, bastava para desestabilizar, adulterar ou desconstruir as “verdades oficiais”. Um desafio para a pesquisa e interpretação em ciências sociais concerne às estratégias nas quais muito que é dito sobre os excluídos provém da visão dos excludentes. Nesse sentido, a autora sublinha a significância dos sambas como documentos verbais das camadas e classes populares (MATOS, 1982MATOS, Cláudia. Acertei no milhar: samba e malandragem no tempo de Getúlio. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1982.).
  • 13
    TRÊS PALHAÇOS na berlinda. Intérpretes: Ataulfo Alves e sua Academia de Samba. Compositores: Alocin, Odausico Mota e Nelson Trigueiro. [S. l.]: Odeon, mar. 1943. 1 disco de 78 rotações. 12.281-A. Marcha.
  • 14
    Uma análise mais aprofundada e abrangente sobre a historiografia dos estudos políticos e da música popular, em relação ao que foi meramente esboçado aqui, é empreendida por Adalberto Paranhos, que pondera que os ímpetos de dominação ideológica eram redefinidos ativamente pelos “dominados”. Se a aproximação do Estado em relação aos sambistas ocorreu de maneira seletiva, buscando uniformidades com o ideário de governo, os compositores e artistas também atuavam de modo a filtrar o que fosse de seus interesses. Daí não poderem ser vistos meramente como “caixas de ressonância”. Isso não implica diminuir as responsabilidades da censura ou da polícia política, mas sublinhar a ação (e a capacidade de agência) das pessoas. Os sambas “desafi(n)avam o coro dos contentes” do Estado-Novo no tratamento de perfis sexuais (o provedor, a mãe de família) carnavalizados pela imagem da mulher fatal ou do valente que trabalha e anda no “miserê”. O humor e a sátira também valiam como instrumentos de crítica. Esse “Lado B” do “Brasil brasileiro” era povoado ainda por uma legião de excluídos. Das gravações da “era de ouro do rádio” não é difícil recordar que há um que faz tanta casa e não tem casa para morar; outro que tem como cama duas folhas de jornal e como cobertor esse imenso céu de anil, outra com uma lata d’água na cabeça, um que come bastante no almoço para não pensar no jantar e ainda aquele Rousseau do morro que entoava que “se o homem nasceu bom/ e bom não se conservou/ a culpa é da sociedade/ que o transformou” (PARANHOS, 2015PARANHOS, Adalberto. Os desafinados: sambas e bambas no “Estado Novo”. São Paulo. Intermeios, 2015.).
  • 15
    Dentre outros, é possível recordar Lenharo (1989)LENHARO, Alcir. Sacralização da Política. 2ª edição. Campinas: Papirus, 1989., Cancelli (1994)CANCELLI, Elizabeth. O mundo da violência: a polícia da era Vargas. 2ª edição. Brasília, DF: Editora UnB, 1994. , Carneiro (2001)CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. O Anti-semitismo na Era Vargas. São Paulo: Perspectiva, 2001..
  • 16
    O BRASIL entrou na guerra. . Intérpretes: Nhô Pai & Nhô Fio. Compositor: Ariowaldo Pires. [S. l.]: Odeon, nov. 1942. 1 disco de 78 rotações. 12.227-A. Moda de viola.
  • 17
    TERRA boa. Intérprete: Orlando Silva. Compositores: Ataulfo Alves e Wilson Batista. [S. l.]: Victor, jul. 1942. 1 disco de 78 rotações. 34.938-A. Samba.
  • 18
    Elias Thomé Saliba observa as dificuldades de o humor deixar-se aprisionar por uma definição categórica, pois mais que uma essência, pesaria aí a história. Para aproximar-se de uma “cultura cômica” valeria atentar, para além dos conteúdos, para os usos sociais de piadas e anedotas. Na “Época Bela” (e alguns contemporâneos enxergaram no termo um travo de ironia) ao menos três grandes autores meditaram sobre o humor. Henri Bergson ressaltou o ridículo das interações desastradas entre coisas, mecanismos e seres vivos. O riso seria deflagrado por confusões, desequilíbrios, trapalhadas e surpresas. Luigi Pirandello enfatizou a nuance compreensiva latente nas situações estapafúrdias. Quem escorrega na casca de banana não ri. Nem bem quem se coloca naquela pele ou ocasião. A passagem do cômico ao humorístico corresponderia ao desabrochar de um sentimento empático, de identidade ante o burlesco do mundo e as zombarias da vida. Sigmund Freud percebeu analogias entre o chiste e os sonhos, operando na liberação de emoções represadas e na quebra de determinismos, alívio de tensões e desvio das expectativas. A eficácia do humor radica também na ambivalência da linguagem e, não raro, na irreverência perante convenções e formalismos. Daí, ser tão nítida a sua função desmistificadora. As representações humorísticas da História do Brasil frequentemente desnudaram o inusitado do cotidiano, a instabilidade social e o artificialismo de alguns costumes, contrapondo ao vazio moral outra ótica e outra ética, mesmo que ilusória e efêmera. (SALIBA, 2002SALIBA, Elias Thomé. Raízes do Riso. A representação humorística na história brasileira: da Belle Époque aos primeiros tempos do rádio. São Paulo: Companhia das Letras , 2002.).

Referências Bibliográficas

Referências Bibliográficas
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    • FIM do eixo. Intérpretes: Zé & Zilda. Compositor: José Gonçalves [Zé com Fome]. [S. l]: Victor, out. 1943. 1 disco de 78 rotações. 80-0123-B. Samba.
    • JOGO Proibido/ Malandro bombardeado. Intérprete: Moreira da Silva. Compositores: Tancredo Silva, David Silva, José Gonçalves e Moreira da Silva. [S. l]: Continental, mar. 1953. 1 disco de 78 rotações. 16.724-B. Sambas.
    • ME DÁ, me dá. Intérprete: Carmen Miranda. Compositores: Portelo Juno e Cícero Nunes. [S. l]: Odeon, ago. 1937. 1 disco de 78 rotações. 11.494-B. Samba-choro.
    • MULATO patriota. Intérprete: Anjos do Inferno. Compositores: David Nasser e J. Batista. [S. l]: Columbia, maio 1942. 1 disco de 78 rotações. 55.342-B. Samba
    • NEGRO artilheiro. Intérprete: Trio de Ouro, Abel Ferreira e orquestra. Compositores: Sinval Silva e Herivelto Martins. [S. l]: Odeon, jul. 1945. 1 disco de 78 rotações. 12.601-B. Samba.
    • O BRASIL entrou na guerra.. Intérpretes: Nhô Pai & Nhô Fio. Compositor: Ariowaldo Pires. [S. l]: Odeon, nov. 1942. 1 disco de 78 rotações. 12.227-A. Moda de viola.
    • SAMBA de nego. Intérprete: Francisco Alves. Compositor: Pixinguinha [Alfredo da Rocha Vianna]. [S. l]: Odeon, fev. 1928. 1 disco de 78 rotações. 10.111-B. Samba. Cf. transcrição da letra em Cardoso Junior (1998, p. 88).
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    • TRÊS PALHAÇOS na berlinda. Intérpretes: Ataulfo Alves e sua Academia de Samba. Compositores: Alocin, Odausico Mota e Nelson Trigueiro. [S. l]: Odeon, mar. 1943. 1 disco de 78 rotações. 12.281-A. Marcha.

    Editado por

    Editores Responsáveis: Iris Kantor e Rafael de Bivar Marquese

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Nov 2020
    • Data do Fascículo
      2020

    Histórico

    • Recebido
      21 Fev 2019
    • Aceito
      28 Ago 2019
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