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Avaliação do dano mecânico em concreto submetido à compressão uniaxial e à tração por compressão diametral com ondas ultrassônicas longitudinais e transversais

Resumo

O trabalho discute o padrão de comportamento de ondas ultrassônicas longitudinais (compression waves) e transversais (shear waves) em concretos de variadas resistências submetidos a compressão axial e diametral. Foram ensaiados 45 corpos de prova confeccionados de concretos com variadas resistências a compressão. Os corpos de provas foram submetidos ao ensaio de compressão simples e tração por compressão diametral em máquina servo-controlada e, durante os ensaios, foram realizadas leituras de ondas de ultrassom longitudinais e transversais. Os resultados obtidos mostram que há alterações na velocidade de propagação de ondas, longitudinais e transversais, com o incremento do nível de tensão que é aplicado ao corpo de prova. Adicionalmente, foi possível observar que esta alteração de velocidade ultrassônica ocorre para nível de tensão próximo à tensão de ruptura. Os resultados obtidos indicam que ondas ultrassônicas longitudinais ou transversais podem ser aplicadas na avaliação do dano difuso (microfissuração na compressão uniaxial) ou dano concentrado (microfissuração de tração na compressão diametral) imposto ao concreto mecanicamente, através da aplicação de cargas.

Palavras-chave:
concreto; ultrassom; velocidade das ondas transversais e longitudinais; compressão uniaxial; compressão diametral

Abstract

In the research program both longitudinal and transverse ultrasonic waves were applied to concrete specimens under uniaxial compression and tensile diametrical compression. A total of 45 concrete specimens with five (5) different mixes were loaded until failure. While load was being applied - in compression and split tension - ultrasonic pulses were recorded and velocities calculated for both shear and pressure waves. The results indicate that longitudinal or transverse ultrasonic waves can be applied in the evaluation of diffuse damage (microcracking in uniaxial compression) or concentrated damage (tensile microcracking by diametrical compression) imposed on the concrete mechanically through the application of loads.

Keywords:
concrete; ultrasonic testing; transverse and longitudinal wave velocities; uniaxial compression; split tension

1. Introdução

A necessidade de se investigar o comportamento estrutural de concretos de variadas resistências, o crescente risco de agressividade do meio ambiente, o envelhecimento das estruturas, o entendimento do comportamento da estrutura ao longo de sua vida útil, os requisitos e critérios de desempenho das estruturas, contribuem para a demanda crescente por ensaios rápidos, facilmente aplicáveis e, ainda, confiáveis, que possam fornecer informações qualitativas e quantitativas sobre o desempenho do concreto em condições de utilização.

Muitas pesquisas inovadoras têm sido desenvolvidas, em nível nacional e internacional, para caracterizar os materiais avaliando de forma de maneira qualitativa as propriedades do concreto estrutural mediante o uso do ensaio de ondas ultrassônicas [1[1] POPOVICS, S.; ROSE, J. L.; POPOVICS, J. S. (1990): The behaviour of ultrasonic pulses in concrete, Cem Concr Res vol. 20, no. 2, pp. 259-270.].

Pesquisadores têm buscado correlacionar as propriedades de resistência e deformação do concreto com ensaios não destrutivos (END), visando analisar o material em situações reais de utilização, porém diversos fatores influenciam nessa correlação, tais como: relação água/cimento, tipo de agregado, adensamento.

O processo de fissuração e degradação das propriedades elásticas do concreto submetido a ensaios de compressão simples mediante emissão de ondas ultrassônicas longitudinais e transversais levou a um decréscimo da amplitude com o incremento do nível de carga ao qual o elemento de concreto encontra-se submetido [2[2] NOGUEIRA, C. L.; WILLAM, K. (2001): Ultrasonic testing of damage in concrete under uniaxial compression, ACI Mat J vol. 98, no. 3, pp. 265 - 275.]. Esta constatação pode se constituir numa valiosa ferramenta para se avaliar o grau de dano no elemento investigado. Uma importante observação da pesquisa foi que houve algum incremento na amplitude medida para baixos níveis de tensão de compressão para ondas longitudinais. Para as ondas transversais, foi observado uma queda consistente nesta amplitude para todos os níveis de tensão estudados. Na avaliação da alteração de velocidade do pulso ultrassônico como uma medida do dano em concretos estruturais submetidos à compressão simples, foi observada uma queda na velocidade de pulso de maneira repentina a partir de um nível de tensão equivalente a 85% da tensão de ruptura. Em outra pesquisa, os autores utilizaram a técnica para estimar, de maneira eficiente, a abertura de fissuras em níveis distintos de tensão [3[3] QASRAWI, H. Y.; MARIE, I. A. (2003): The use of USPV to anticipate failure in concrete under compression, Cem Concr Res vol. 33, no. 12, pp. 2017-2021.]. Além disso, o ensaio de ultrassom também pode ser utilizado para avaliar o perfil de dano térmico em estruturas de concreto expostas a altas temperaturas [4[4] COLOMBO, Matteo; FELICETTI, Roberto. New NDT techniques for the assessment of fire-damaged concrete structures. Fire Safety Journal. Milan, Italy, p. 461-472. 21 Jun. 2007.] [5[5] SILVA FILHO, Luis Carlos Pinto da et al. Estudos de caso sobre avaliação de estruturas de concreto através da utilização de ensaios não destrutivos. Revista Alconpat, [s.l.], v. 1, n. 3, p.186-198, 30 set. 2011. Revista ALCONPAT. http://dx.doi.org/10.21041/ra.v1i3.14.
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].

No presente trabalho, o método de propagação de ondas ultrassônicas foi utilizado para entender o padrão de propagação de ondas ultrassônicas longitudinais e transversais em concreto de variadas resistências à compressão, submetidos a ensaios de compressão simples e compressão diametral. A pesquisa realizada avança no conhecimento em ensaios de corpo de prova, na medida em que foram utilizadas ondas transversais (shear waves) em vez de apenas ondas longitudinais (compression waves), como costuma ocorrer em ensaios de ondas ultrassônicas no concreto. Ademais, a investigação também considerou o fato de o concreto estar carregado em compressão simples e à compressão diametral, quando submetido aos ensaios ultrassônicos, permitindo capturar, desta forma, a alteração do perfil de propagação da onda ultrassônica com o nível de tensão aplicado ao corpo de prova, tanto para as ondas longitudinais quanto para as ondas transversais.

1.1 Importância da pesquisa

A necessidade de obter informações sobre o comportamento das estruturas ao longo de sua vida útil é cada vez premente, inclusive, para o atendimento às recentes normas de desempenho NBR 15575 que foram editadas no país no ano de 2013 e que se tornou de utilização compulsória já em meados daquele ano, trazendo exigências mais rigorosas, em particular para as estruturas de concreto armado [6[6] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15575: Edificações habitacionais - Desempenho. Rio de Janeiro: ABNT, 2013.].

O ensaio de ondas ultrassônicas se mostra um importante aliado dos construtores e projetistas de edificações em concreto armado, pois possibilita a obtenção de informações qualitativas das estruturas em condições de utilização sem a necessidade de intervenções destrutivas [7[7] ANDREUCCI, Ricardo. Ensaio por ultrasom: Aplicação Industrial. São Paulo: Abende, 2008.].

A utilização do ensaio de propagação de ondas ultrassônicas longitudinais e transversais para acessar informações qualitativas do concreto de variadas resistências à compressão está em perfeita consonância com as normas brasileiras de projeto e execução de estruturas de concreto atuais que, no ano de 2014, passou a incorporar a possibilidade de projeto com concretos com resistência superior a 50 MPa, situação que não era prevista nas normas anteriores. Atualmente, pode-se projetar e executar obras com concretos de alta resistência à compressão, que certamente apresentam comportamento distinto dos concretos de moderada resistência [8[8] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. 8953, 2015: Concreto para fins estruturais - Classificação pela massa específica, por grupos de resistência e consistência. Rio de Janeiro, Brazil.] [9[9] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. 6118, 2014: Projeto de Estruturas de concreto, Rio de Janeiro, Brazil.].

Com o objetivo de avaliar a eficiência dos métodos de pulsos ultrassônicos na detecção de processo de fissuração interna em elementos de concreto, estudos avaliam as velocidades e amplitudes do sinal ultrassônico na direção perpendicular e paralela ao plano de fissuração. Os resultados obtidos indicaram que tanto a velocidade quanto a amplitude do sinal ofereciam informações valiosas sobre a extensão do processo de fissuração, muito embora a velocidade tenha se mostrado um parâmetro mais sensível [10[10] KNAB, L. I.; BLESSING, G. V.; CLIFTON, J. R. (1983): Laboratory evaluation of ultrasonics for crack detection in concrete, ACI Mat J vol. 80, no. 3, pp. 17-26.]. A velocidade do pulso ultrassônico depende do nível de tensão no concreto até o valor de 70% a tensão de ruptura [1[1] POPOVICS, S.; ROSE, J. L.; POPOVICS, J. S. (1990): The behaviour of ultrasonic pulses in concrete, Cem Concr Res vol. 20, no. 2, pp. 259-270.].

Em uma analise das condições do estado de conservação do concreto de pilares de um estudo de caso no Rio Grande do Sul, foi realizada uma investigação em um conjunto de pilares em utilização, no qual havia suspeitas de redução de resistência à compressão no lote de corpo de prova de concreto ensaiado. Para a solução da investigação do problema foi utilizado o ensaio de velocidade de propagação do pulso ultrassônico (VPU), onde foi possível constatar a eficiência do ensaio na solução desse problema. O ensaio de VPU pode ser considerado um dos mais promissores para a avaliação de estruturas de concreto [5[5] SILVA FILHO, Luis Carlos Pinto da et al. Estudos de caso sobre avaliação de estruturas de concreto através da utilização de ensaios não destrutivos. Revista Alconpat, [s.l.], v. 1, n. 3, p.186-198, 30 set. 2011. Revista ALCONPAT. http://dx.doi.org/10.21041/ra.v1i3.14.
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]. O estudo indica que ensaios de VPU são sensíveis a variações de homogeneidade e densidade, assim fornecendo dados importantes para a tomada de decisão a respeito das condições de estruturas de concreto. A execução de ensaios de VPU é possível contribuir com o controle da qualidade das estruturas de concreto [11[11] LORENZI, Alexandre et al. Avaliação da capacidade de detecção de falhas no concreto através do ensaio ultrassônico. Revista Alconpat, [s.l.], v. 7, n. 3, p.286-301, 29 set. 2017. Revista ALCONPAT. http://dx.doi.org/10.21041/ra.v7i3.127.
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].

2. Materiais e programa experimental

Foi confeccionado um total de 45 corpos de prova cilíndricos (D = 10 cm e h = 20 cm), submetidos a níveis crescentes de compressão simples e tração por compressão diametral até a ruptura e, simultaneamente, transmitidos e capturados pulsos longitudinais e transversais com transdutores monocristais. Foram confeccionados 05 traços de concreto, sendo para cada traço 9 amostras (três amostras para obter a resistência à compressão de referência, três amostras para o ensaio de velocidade de propagação do pulso ultrassônico com compressão axial e três amostras para o ensaio de velocidade de propagação do pulso ultrassônico à tração por compressão diametral).

O cimento utilizado no programa experimental foi o CP II F 32 - Cimento Portland Composto com Filler. Este cimento apresenta classe de resistência à compressão de 32 MPa, constituído de 90 a 94% de clínquer e de 6 a 10% de fíller calcário, conforme a ABNT NBR 11578:1991. A finalidade da escolha desse cimento é devido a sua adição ser inerte, não reagindo quimicamente, visando a minimização das interferências na velocidade da propagação das ondas longitudinais e transversais no interior dos corpos de prova confeccionados. Foram utilizados agregados graúdos e miúdos, brita 19 e areia grossa, respectivamente. Os materiais foram caracterizados em um laboratório de tecnologia dos materiais da construção civil.

Na confecção dos traços de concreto estudados, foram utilizados 3 tipos de aditivos (Tabela 1), um plastificante, um superplastificante e um retardador de pega. O aditivo plastificante e superplastificante foram utilizados nos traços onde se teve maior dificuldade para obter uma adequada trabalhabilidade, devido ao elevado teor de materiais secos. O retardador de pega foi utilizado nos traços em que, com o uso do superplastificante, as misturas entravam em pega com muita rapidez, dificultando a moldagem dos corpos de prova. Na Tabela 2 acham-se sumarizadas as composições dos traços utilizados na confecção do concreto (traços A, B, C, E e F).

Tabela 1
Dados técnicos dos aditivos utilizados na pesquisa

Tabea 2
Dosagens para confecção dos concretos (kg/m³)

Após a desmoldagem, as amostras passaram por o procedimento de cura úmida durante 28 dias. Antes da realização dos ensaios destrutivos e não destrutivos, os corpos de prova passaram por um tratamento de retificação no topo e na base. Foram realizados cortes laterais no corpo de prova para permitir a fixação dos transdutores durante o ensaio ultrassônico (Figura 1). A partir da retificação realizada foi obtida uma nova área para os corpos de prova com aproximadamente 73,34 cm², de forma que a distância entre as faces paralelas criadas pela retificação é de 9,66 cm. Todos os ensaios foram realizados na Escola Técnica SENAI Água Fria, Recife-PE, no laboratório LETMACC - Laboratório de Ensaios Tecnológicos em Materiais da Construção Civil.

Figura 1
Retificação dos corpos de prova para acoplar os transdutores

2.1 Ensaio Velocidade de Propagação de Pulso Ultrassônico (VPU)

O instrumento ultrassônico para a realização do ensaio de VPU foi o PUNDIT. Foram utilizados transdutores longitudinais e transversais, ambos com frequência de 500 KHz, todos os transdutores são produzidos pela Panametrics. As frequências são tais que os comprimentos de onde interagem com os traços, a granulometria, dos concretos. Todos os corpos de prova foram submetidos ao ensaio de VPU sem carregamento. Os transdutores foram posicionados de forma que a leitura da onda fosse de transmissão direta, que se constitui na maneira mais eficiente de transmissão da onda ultrassônica em meios contínuos [12[12] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. 8802, 2013: Concreto endurecido - Determinação da velocidade de propagação de onda ultrassônica, Rio de Janeiro.].

2.1.1 Ensaio de VPU com carregamento à compressão simples

Para a realização deste ensaio foram necessários os seguintes equipamentos: notebook, equipamento de VPU, transdutores longitudinais e transversais com frequência de 500 KHz; prensa universal servo-hidráulica com microprocessadora para ensaio de concreto com capacidade máxima de 2.000 kN; acoplantes apropriados para o tipo de onda ultrassônica; fôrma de PVC para acoplamento dos transdutores (Figura 2) e peça de chaveamento.

Figura 2
Fôrma de PVC para acoplar os transdutores

Para a realização deste ensaio os transdutores longitudinais e transversais foram fixados ao corpo de prova, apoiados na fôrma de PVC e presos por um elástico. A velocidade de carregamento utilizada para este ensaio variou durante sua realização. Até um nível de tensão de aproximadamente 70% da tensão última aplicada no corpo de prova a velocidade de aplicação da carga foi de 2 MPa/minuto e nos últimos 30% a velocidade foi de 0,5 MPa/minuto. Este procedimento foi adotado para se obter o máximo de pontos possíveis nas leituras das ondas ultrassônicas longitudinais e transversais ao longo do ensaio de cada corpo de prova. Para obter uma estimativa da tensão última para cada traço de concreto estudado, três corpos de prova foram rompidos à compressão simples para estimar a resistência à compressão de cada traço. Esses valores foram utilizados como referência para o ensaio de VPU com carregamento, detalhado a seguir.

2.1.2 Ensaio de VPU com carregamento à tração por compressão diametral

O ensaio de VPU com propagação de ondas longitudinais e transversais foi realizado em conjunto com o ensaio à tração por compressão diametral, em 15 corpos de prova cilíndricos, sendo 3 amostras para cada traço confeccionado.

A norma estabelece o esquema e os acessórios necessários para o ensaio de tração por compressão diametral, mas de forma a possibilitar o acoplamento dos transdutores para o ensaio de ultrassom, foi preciso desenvolver um molde para a fixação das unidades à peça de concreto, enquanto as mesmas eram carregadas. Para a fixação dos transdutores transversais e longitudinais nos corpos de prova durante o ensaio de compressão diametral foi necessário utilizar um molde de aço para essa fixação, conforme Figura 3. O molde é constituído de quatro pontos de acoplamento dos transdutores, sendo dois em cada lado, paralelamente posicionados, e fixado às peças ensaiadas através de quatro borrachas.

Figura 3
Detalhe da fixação dos transdutores para o ensaio de tração à compressão diametral

Durante a realização do ensaio destrutivo (compressão diametral e à compressão simples) e não destrutivo (VPU), foram realizadas pausas para leitura da onda longitudinal e transversal. As pausas foram feitas a cada 20 kN até chegar a 70% do carregamento e, nos demais, 30%, as pausas diminuíram para 10 kN. A velocidade de carregamento foi de 0,66 MPa/minuto.

3. Resultados e discussões

3.1 Comportamento das ondas longitudinais e transversais em corpos de prova submetidos à ensão vertical crescente de compressão simples

Analisando os resultados obtidos no ensaio de VPU das ondas longitudinais e ondas transversais em amostras de concreto submetidos à tensão de compressão simples (Tabela 3), é possível observar que as ondas apresentaram entre si um comportamento diferenciado. A propagação da onda ultrassônica longitudinal foi maior no traço de concreto tipo “C” e menor no traço de concreto tipo “F”, com 3.850,71 m/s e 3.363,66 m/s, respectivamente. O concreto tipo “C” é constituído de sílica ativa (microsilica), elemento químico usado em concreto com o intuito de melhorar suas propriedades, tais como, durabilidade e resistência à compressão, assim o concreto apresenta melhor compacidade reduzindo o índice de vazios na amostra, favorecendo a propagação da onda ultrassônica longitudinal. Além disso, o concreto tipo “C” apresenta menor relação agua/cimento (0,192) dentre as amostras analisadas. O concreto tipo “F” que apresentou menor propagação da onda longitudinal é uma amostra que apresenta menor relação agua/cimento (0,55) e maior consumo de agregado miúdo se comparado com o concreto tipo “E” (concreto com dosagem parecida com a do concreto tipo “F”). O aumento da relação água/cimento e de material mais fino influenciou na propagação da onda ultrassônica longitudinal, como o material fino absorve mais água por te maior superfície específica, reduzindo a resistência e promovendo um maior índice de vazios no compósito.

Tabela 3
Resumo dos resultados do ensaio de ultrassom e resistência à compressão simples em amostras de concreto

Ainda analisando as amostras submetidas ao ensaio de compressão simples com propagação da onda ultrassônica transversal, o concreto tipo “B” apresentou maior velocidade da onda e, o concreto tipo “F” menor velocidade da onda ultrassônica, 2.518,07 m/s e 2.197,33 m/s, respectivamente. O concreto tipo “B” é a amostra que apresenta a segunda menor relação água/cimento (0,235) dentre as amostras analisadas.

Na análise do comportamento do ensaio de VPU da onda ultrassônica longitudinal (Figura 4) e da onda transversal (Figura 5) em todos os concretos estudados observou-se que os traços de concreto de resistência à compressão mais elevadas, tais como o traço “A”, “B” e “C”, só apresentaram uma redução na velocidade da onda longitudinal e transversal ao final do carregamento, ou seja, perto da ruptura do corpo de prova.

Figura 4
Resumo do comportamento da onda longitudinal em amostras de concreto submetidas à compressão simples

Figura 5
Resumo do comportamento da onda transversal em amostras de concreto submetidas à compressão simples

Comparando os resultados da resistência à compressão submetida a ondas longitudinais com os resultados da resistência à compressão submetida a ondas transversais, observou-se que houve inicialmente uma maior redução da propagação da onda ultrassônica em amostras com onda longitudinal, sendo a transversal apresentando alteração na velocidade perto da ruptura, a partir de 60%, enquanto a onda longitudinal a partir de 40%.

No ensaio de compressão, as microfissuras nos corpos de prova ocorrem de modo difuso, geralmente nas interfaces dos agregados com a pasta endurecida. Tal microfissuração, nas interfaces agregado-pasta endurecida, com o aumento do carregamento, apresentam microfissuras que levam o concreto à ruptura [2[2] NOGUEIRA, C. L.; WILLAM, K. (2001): Ultrasonic testing of damage in concrete under uniaxial compression, ACI Mat J vol. 98, no. 3, pp. 265 - 275.]. Nos concretos mais resistentes, entretanto, microfissuras normalmente se desenvolvem através dos agregados, partindo-os [13[13] METHA, P. K., MONTEIRO, P. J. M., “Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais”, Ibracon, São Paulo, Brazil, 2008.]. Tal diferença de comportamento entre os concretos mais resistentes e aquele menos resistente, pode justificar as diferenças observadas nos ensaios de VPU. Uma vez que os traços mais resistentes apresentaram maior redução nas velocidades, tal redução pode indicar a ocorrência de microfissuração através dos agregados e não somente ao redor destes. Os resultados, dessa forma, permitem concluir que, para o dano difuso no concreto (microfissuras decorrentes da compressão), as ondas ultrassônicas longitudinais e transversais podem ser utilizadas para a avaliação da integridade do material. A realização de mais ensaios, entretanto, em um conjunto de amostras com maior intervalo de resistências, é recomendada para melhor avaliar e quantificar as distinções no comportamento do ensaio de VPU quando aplicado na avaliação de dano difuso em concreto de resistência normal e em concretos de alta resistência.

3.2 Comportamento das ondas longitudinais e transversais em corpos de prova submetidos à tensão de tração por compressão diametral

Na Tabela 4 estão sumarizados os resultados do ensaio de VPU longitudinal e transversal nos corpos de prova de concreto, antes de serem submetidos ao ensaio de tração por compressão diametral. O traço de concreto que apresentou a maior velocidade da onda longitudinal e transversal foi o traço “C” (velocidades: 3.782,88 m/s e 2.450,00 m/s, respectivamente) e o traço com menor velocidade da onda longitudinal e transversal observada foi o traço “F” (velocidades: 3.400,78 m/s e 2.188,78 m/s, respectivamente). Ocorrendo, dessa forma, o mesmo padrão de velocidades observadas nas amostras submetidas ao ensaio de compressão simples apresentado anteriormente.

Tabela 4
Resumo dos resultados do ensaio de ultrassom e resistência à tração por compressão diametral em amostras de concreto

As Figuras 6 e 7 apresentam o comportamento da onda longitudinal e transversal para todas as amostras de concretos submetidas ao ensaio de tração por compressão diametral.

Figura 6
Resumo do comportamento da onda longitudinal em amostras de concreto submetidas à tração por compressão diametral

Figura 7
Resumo do comportamento da onda transversal em amostras de concreto submetidas à tração por compressão diametral

Uma primeira significante observação para os resultados obtidos nos ensaios de tração é que as duas ondas, longitudinais e transversais, apresentaram redução de velocidades próximas à tensão de ruptura. Tal redução de velocidades demonstra a capacidade dos pulsos ultrassônicos de detectar a formação da fissura de tração no interior das amostras durante a aplicação das cargas. Destaque-se que, nos ensaios de tração por compressão diametral, diferentemente do que se observa no ensaio de compressão uniaxial, inexiste dano difuso (decorrente de microfissuração); o dano associado à compressão diametral é localizado: formação de um plano de tração e, posteriormente, de uma fissura de tração, perpendicularmente à direção de propagação das ondas. Dessa forma, os ensaios mostraram que, além de plenamente aplicáveis para verificação de danos difuso no concreto, o ensaio de VPU também pode ser usado para a avaliação de dano concentrado - formação de fissura decorrente de tração aplicada. Ademais, a queda mais brusca, mais acentuada, das velocidades dos pulsos quando na proximidade da tensão de ruptura, apontam para o caráter súbito (não progressivo) da formação da fissura de tração. Novamente, os pulsos ultrassônicos se apresentam plenamente aplicáveis à avaliação da formação de fissuras de tração - ainda que tal formação se dê forma abrupta.

4. Conclusões

O nível de dano mecanicamente imposto ao corpo de prova decorrente da aplicação de tensões (compressão simples ou tração por compressão diametral) afeta diretamente a velocidade de propagação das ondas ultrassônicas longitudinais e transversais no concreto. Os dois tipos de onda ultrassônica utilizadas na pesquisa exibiram redução de velocidades próximas à carga de ruptura dos corpos de provas ensaiados. Tal redução de velocidades demonstra a capacidade dos pulsos ultrassônicos de detectar a formação de microfissuras de tração no interior das amostras durante a aplicação das cargas e na detecção de microfissuras decorrentes da compressão uniaxial, ou seja, o ensaio é eficiente para amostras submetidas a cargas de tração e de compressão, avaliando assim a integridade do material.

Para o dano localizado, decorrente da compressão diametral (com a formação de um plano de tração e, posteriormente, de uma fissura de tração, perpendicularmente à direção de propagação das ondas), os ensaios mostraram que o ensaio de VPU é eficiente na sua avaliação. Nos ensaios de compressão simples, entretanto, para as amostras de concreto estudadas, a velocidade de propagação da onda longitudinal se mostrou mais sensível ao nível de tensão aplicado, quando comparada com a onda transversal. Ou seja, a onda ultrassônica longitudinal que é a mais utilizada por pesquisadores nesse tipo de ensaio representa melhor a realidade e a integridade da amostra analisada, não deixando de detectar nenhum tipo de vazio que venha a existir na amostra, provavelmente devido a forma como essa onda se propaga no meio.

A composição do concreto influencia no comportamento da onda ultrassônica, seja longitudinal ou transversal, além disso, a relação água/cimento e a resistência do concreto são informações de grande importância a ser considerada na analise dos resultados do ensaio de VPU.

Os resultados, em seu conjunto, para os dois tipos de pulsos ultrassônicos utilizados, atestam a viabilidade da aplicação dos ensaios não destrutivos de ultrassom na análise do dano difuso e do dano concentrado no concreto.

Vários estudos são necessários para se conseguir obter o conhecimento do comportamento do concreto em utilização através de ensaios não destrutivos. Mas com base nos resultados obtidos nessa pesquisa é possível observar que a velocidade de propagação ultrassônica é um ensaio extremamente importante para o controle tecnológico do concreto, principalmente se correlacionado com a relação a/c, dado este que é obtido no início da dosagem do concreto, já que a sua resistência será obtida após 28 dias e com a peça de concreto em utilização.

5. Agradecimentos

A primeira autora agradece à CAPES e ao CNPq pelo apoio financeiro, fundamental para a conclusão dessa grande etapa. Ao SENAI e ao LETMACC- Laboratório de Ensaios Tecnológicos em Materiais da Construção Civil, em especial a coordenadora Ana Paula Alencar pela amizade, presteza e disponibilidade do laboratório para a realização dos ensaios tecnológicos. Aos técnicos do laboratório, David Macedo, Felipe Clayton e Nelson Martins pelo auxílio fundamental na realização dos ensaios.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2018

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2017
  • Aceito
    21 Dez 2017
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