Adoção do papel, ansiedade, depressão e solidão em cuidadores familiares de pacientes com doenças crônicas

Objetivo:

descrever e explorar a relação entre a solidão, a ansiedade e a depressão com a adoção do papel de cuidador entre os indivíduos que cuidam de pessoas com doenças crônicas na Colômbia.

Método:

trata-se de um estudo exploratório e transversal que envolveu 960 cuidadores primários de indivíduos com doenças crônicas. Foi aplicada a Escala de Adoção do Papel de Cuidador, a Escala de Solidão da Universidade da Califórnia em Los Angeles e a Escala de Ansiedade e Depressão. Foram realizadas análises de componentes principais e de correspondência múltipla para o agrupamento.

Resultados:

entre os cuidadores participantes, 40,8% relataram ter depressão, 59% relataram ansiedade, 54,6% relataram solidão moderada a grave e 88,6% relataram uma adoção satisfatória do papel de cuidador. Os cuidadores que apresentaram níveis básicos ou insuficientes de adoção do papel tenderam a ter pontuações mais elevadas de ansiedade, depressão e solidão.

Conclusão:

a adoção do papel de cuidador é um mediador nos níveis de ansiedade, depressão e solidão entre os cuidadores. As estratégias destinadas a apoiar os cuidadores devem incluir o treinamento para o papel de cuidador, a fim de atenuar os impactos negativos da ansiedade, da depressão e da solidão.

Descritores:
Doença Crônica; Cuidadores; Ansiedade; Depressão; Solidão; Desempenho de Papéis

Objective:

to describe and explore the relationship of loneliness, anxiety and depression with adoption of the caregiver role among individuals caring for people with chronic diseases in Colombia.

Methods:

this was an exploratory and cross-sectional study involving 960 primary caregivers of individuals with chronic diseases. We applied the Caregiver Role Adoption Scale, the University of California at Los Angeles Loneliness Scale, and the Anxiety and Depression Scale. Principal component and multiple correspondence analyses were performed for clustering.

Results:

among the participating caregivers, 40.8% reported experiencing depression, 59% reported anxiety, 54.6% reported moderate to severe loneliness, and 88.6% reported satisfactory adoption of the caregiver role. Caregivers who presented basic or insufficient role adoption levels tended to have higher scores for anxiety, depression and loneliness.

Conclusion:

adoption of the caregiver role is a mediator in the anxiety, depression and loneliness levels among caregivers. Strategies aimed at supporting caregivers should include training for the caregiver role to mitigate the negative impacts of anxiety, depression and loneliness.

Descriptors:
Chronic Disease; Caregivers; Anxiety; Depression; Loneliness; Role Playing

Objetivo:

describir y explorar la relación de la soledad, la ansiedad y la depresión con la adopción del rol de cuidador entre personas que se ocupan de cuidar pacientes con enfermedades crónicas en Colombia.

Métodos:

se trató de un estudio exploratorio y transversal con la participación de 960 cuidadores principales de personas con enfermedades crónicas. Aplicamos la Escala de Adopción del Rol de Cuidador, la Escala de Soledad de la Universidad de California de Los Ángeles y la Escala de Ansiedad y Depresión. Se realizaron análisis de componentes principales y de correspondencia múltiple para el clustering .

Resultados:

el 40,8% de los cuidadores que participaron en el estudio informó padecer depresión, el 59% informó ansiedad, el 54,6% indicó soledad de moderada a grave y el 88,6% presentó adopción satisfactoria del rol de cuidador. Los cuidadores que presentaron los niveles básico o insuficiente en términos de adopción del rol tendieron a obtener puntuaciones de ansiedad, depresión y soledad más elevadas.

Conclusión:

adoptar el rol de cuidador es un mediador de los niveles de ansiedad, depresión y soledad entre los cuidadores. Las estrategias dirigidas a apoyar a los cuidadores deberían incluir preparación para dicho rol a fin de mitigar los efectos negativos de la ansiedad, la depresión y la soledad.

Descriptores:
Enfermedad Crónica; Cuidadores; Ansiedad; Depresión; Soledad; Desempeño de Papel

Destaques:

(1) Mais de metade dos cuidadores relataram ansiedade e solidão moderadas ou graves.

(2) Os cuidadores com baixos níveis de adoção do papel apresentaram mais ansiedade, depressão e solidão.

(3) A adoção satisfatória do papel de cuidador reduz a ansiedade, a depressão e a solidão.

(4) A adoção do papel deve ser objeto de intervenção para reduzir o impacto na saúde mental dos cuidadores.

Introdução

As doenças crônicas têm sido uma preocupação global proeminente e premente desde há várias décadas ^{( 1 )} . Embora tenham sido feitos esforços substanciais a nível mundial, os resultados têm sido limitados, principalmente devido às deficiências dos sistemas de registro e notificação destas doenças. Os dados disponíveis indicam uma tendência preocupante de aumento da sobrecarga das doenças nas últimas três décadas, com as doenças crônicas nos idosos contribuindo significativamente para estas estatísticas ^{( 2 )} . Esta sobrecarga crescente e as suas causas subjacentes podem ser atribuídas a fatores como o envelhecimento da população, o aumento da expectativa de vida e a exposição contínua a fatores de risco ^{( 2 )} . Alguns estudos mostraram que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) foram responsáveis por 1,62 bilhões de anos de vida corrigidos por incapacidade ( Disability-Adjusted Life Years , DALY), com um aumento substancial de 43,2% em 1990 para 63,8% em 2019 ^{( 3 )} . Em 2019, as DCNT registraram uma incidência de 13.100 milhões de novos casos, uma prevalência de 7.100 milhões de casos e 42 milhões de mortes, o que representa um aumento de 18,5% em relação aos valores de 2010. Por ordem decrescente, as doenças com maior DALY em 2019 foram o câncer, as doenças cardiovasculares, as doenças respiratórias crônicas, as doenças digestivas, os transtornos neurológicos e os transtornos mentais ^{( 2 )} .

O problema global das DCNTs é inegavelmente significativo e os esforços têm-se concentrado principalmente na avaliação da dimensão da sua sobrecarga. No entanto, é crucial reconhecer que estas doenças também exercem efeitos de grande alcance a outros níveis, particularmente no seio das famílias e nos cuidadores familiares ^{( 4 )} . O declínio funcional progressivo e a dependência multidimensional resultantes das DCNT muitas vezes exigem a designação de um cuidador familiar. Esta situação é particularmente comum em regiões como a América Latina, caracterizada por países de baixo e médio rendimento, onde os cuidados ao paciente continuam a ser predominantemente de responsabilidade familiar ^{( 5 )} . Os cuidadores familiares são empurrados para o seu papel devido a circunstâncias imprevistas, muitas vezes sem preparação suficiente para os cuidados complexos necessários em vários contextos, incluindo o ambiente doméstico. Têm de ajudar nas atividades básicas da vida diária, administrar medicamentos, gerir dispositivos invasivos, coordenar consultas médicas, tomar decisões cruciais e enfrentar vários desafios relacionados com a saúde do paciente ^{( 6 )} .

As responsabilidades substanciais inerentes à prestação de cuidados a indivíduos com DCNT, agravadas pelo contexto marcado pelo isolamento social e pelo apoio limitado em que os cuidadores operam, exercem efeitos prejudiciais ao seu bem-estar. Sobretudo, a ansiedade e a depressão são resultadas amplamente documentados na literatura ^{( 7 )} . Uma metanálise que inclui 93 estudos sobre cuidadores de idosos dependentes revelou uma elevada prevalência de depressão nesta população de cuidadores. Além disso, identificou uma correlação entre níveis elevados de sintomas depressivos nos cuidadores informais e níveis reduzidos de apoio social, englobando as dimensões percebidas e recebidas ^{( 7 )} .

A solidão é prevalente entre os cuidadores de indivíduos com DCNT, com estudos que indicam que tanto o estresse objetivo como o subjetivo associados aos cuidados diários ao paciente contribuem diretamente para sentimentos de solidão. Por sua vez, estes sentimentos estão associados a uma maior manifestação de sintomas depressivos ^{( 8 )} . Num estudo realizado no Reino Unido ^{( 9 )} , verificou-se que 43,7% dos cuidadores relataram sentir solidão moderada, enquanto 17,7% relataram solidão grave. Os cuidadores familiares enfrentam frequentemente uma redução do seu espaço pessoal e das suas oportunidades de interação social. Muitas vezes, debatem-se com perdas e privações nas suas relações interpessoais e são frequentemente afastados dos seus círculos sociais devido à sua dedicação em tempo integral à prestação de cuidados. Estas circunstâncias os expõem a sentimentos de solidão acentuados ^{( 10 )} .

Alguns estudos documentaram a relação entre ansiedade e depressão, sendo que a solidão desempenha frequentemente um papel mediador. Entretanto, o entendimento de como a adoção do papel de cuidador contribui para o desenvolvimento destas condições permanece limitado ^{( 11 )} . Este estudo tem como objetivo avaliar a ansiedade, a depressão, a solidão e a adoção do papel de cuidador em cuidadores familiares de indivíduos com DCNT. Vários estudos de pesquisas sugerem que os cuidadores mais aptos a desempenhar o seu papel de cuidador e que se sentem mais capazes de o fazer estão mais bem equipados para utilizar os recursos disponíveis, como o apoio social e familiar. Podem também adotar melhores práticas de autocuidado, o que pode levar a uma redução da solidão e a menos problemas psicológicos entre os cuidadores ^{( 12 )} . O principal objetivo deste estudo é descrever e explorar a relação entre a solidão, a ansiedade, a depressão e a adoção do papel de cuidador entre os indivíduos que cuidam de pessoas com doenças crônicas na Colômbia.

Método

Tipo de estudo

Estudo descritivo, exploratório e transversal que cumpre as recomendações descritas nas diretrizes Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) para estudos transversais ^{( 13 )} .

Definição da coleta de dados

O estudo foi realizado em Bogotá, Cundinamarca (Cund.), Colômbia, entre cuidadores familiares que estavam inscritos ou frequentavam programas de apoio a cuidadores familiares, associações e organizações comunitárias dedicadas a cuidadores de indivíduos com doenças crônicas.

Período

O estudo foi realizado entre o segundo semestre de 2020 e o segundo semestre de 2021.

População e amostra

Este estudo incluiu cuidadores familiares de indivíduos com doenças crônicas na Colômbia através de amostragem não aleatória. Os participantes elegíveis eram cuidadores com pelo menos 18 anos de idade, atuando como cuidador familiar primário do paciente, possuindo estado mental intacto (pontuação de Pfeiffer de 0 a 2 erros) e vivendo na Colômbia. Foram excluídos os cuidadores que eram profissionais contratados.

No total, os pesquisadores compilaram uma lista de 1.480 potenciais participantes. Juntamente com o título e os objetivos do estudo, os convites de participação foram enviados por correio eletrônico ou mensagens telefónicas. Os indivíduos que manifestaram interesse e contataram os pesquisadores foram submetidos a uma verificação dos critérios de inclusão, receberam explicações pormenorizadas sobre os objetivos do estudo e foram selecionados para determinar se relatavam proficiência nas tecnologias de informação e comunicação necessárias para preencher o formulário online .

Procedimentos para a coleta de dados

A coleta de dados envolveu procedimentos heteroadministrados, que incluíram a realização de entrevistas telefónicas com participantes dispostos a participar e a distribuição de pesquisas on-line através do Google Forms para aqueles que relataram alta proficiência tecnológica. Para mitigar vieses potenciais, foram implementadas opções de configuração meticulosas no Google Forms para evitar a falta de dados. Foi fornecida uma seção introdutória como exemplo do preenchimento correto do formulário para minimizar os erros e aumentar a precisão dos dados. Além disso, os assistentes de pesquisa receberam treinamento extensivo não só para aplicar corretamente os questionários, mas também para criar um ambiente de confiança. Esta abordagem teve como objetivo encorajar os participantes a responder honestamente, promovendo um ambiente propício a uma comunicação aberta. Foram coletadas informações de um total de 672 cuidadores por meio do formulário online e 288 cuidadores por meio de entrevistas telefônicas.

Instrumentos para a coleta de dados

A caraterização da amostra foi feita através de um levantamento concebido para avaliar cuidadores familiares e pacientes ^{( 14 )} . Esse questionário englobou detalhes referentes aos aspectos demográficos, sociais e clínicos tanto dos cuidadores quanto dos indivíduos com DCNT. Incluía questões relativas a fatores como a idade, o gênero, o nível de escolaridade, o tempo como cuidador e o nível de apoio recebido na prestação de cuidados.

A avaliação da adoção do papel recorreu à Escala de Adoção do Papel de Cuidador, que mede a transição para o papel de cuidador de indivíduos com doenças crônicas. Este questionário foi desenvolvido com base na Teoria das Transições de Meleis, especificamente adaptado ao contexto de cuidador ^{( 15 )} . Adicionalmente, foi validado numa população de cuidadores de indivíduos com DCNT na Colômbia ^{( 15 )} . As propriedades psicométricas deste instrumento foram avaliadas quanto à validade de construto utilizando os testes de rotação Varimax, Quartimax e Equimax em conjunto com um método de extração de componentes principais. Estas análises revelaram uma estrutura de três fatores: a) Respostas ao papel (itens 1 a 7); b) Organização do papel (itens 8 a 15); e c) Tarefas do papel (itens 16 a 22). O coeficiente alfa de Cronbach para a escala total foi superior a 0,8. O questionário é composto por 22 itens, cada um respondido numa escala de resposta do tipo Likert de 1 a 5. Para efeitos de interpretação, pontuações entre 22 e 60 pontos indicam adoção insuficiente do papel, pontuações entre 61 e 77 indicam adoção básica e pontuações entre 78 e 110 significam adoção satisfatória do papel de cuidador ^{( 15 )} .

A solidão foi avaliada através da Escala de Solidão da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) ^{( 16 )} , composta por dez questões. Esta escala apresenta uma estrutura de um fator, analisada através da rotação Varimax, com uma variância explicada de 71,6%. O seu coeficiente alfa de Cronbach é de 0,94. Na sua versão validada em espanhol, testada numa população adulta ^{( 16 )} , pontuações mais baixas indicam maior solidão. No entanto, para efeitos de análise estatística neste estudo, as pontuações dos itens foram invertidas, o que significa que as pontuações mais elevadas representam agora níveis de solidão mais elevados. Por conseguinte, a solidão grave é definida como 31 ou mais pontos, a solidão moderada situa-se no intervalo de 20 a 30 pontos e a ausência de solidão corresponde a pontuações inferiores a 20 pontos.

A ansiedade e a depressão foram avaliadas através da Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão ( Hospital Anxiety and Depression Scale , HADS) ^{( 17 )} , composta por 14 itens: sete dedicados à medição da ansiedade e os outros sete à depressão. Esta escala tem sido utilizada em contextos comunitários para avaliar estes constructos e tem demonstrado sensibilidade (entre 0,74 e 0,84) e especificidade (entre 0,78 e 0,8) satisfatórias. Examinadas numa população semelhante de pacientes adultos, as propriedades psicométricas da escala indicam uma validade de construção adequada, com uma estrutura de dois fatores que explica 44,84% da variância e uma consistência interna com um coeficiente alfa de Cronbach de 0,85. Para interpretar a escala, pontuações entre zero e sete pontos sugerem um estado normal (sem sintomas), pontuações entre 8 e 10 indicam um estado duvidoso e pontuações iguais ou superiores a 11 significam preocupação clínica relacionada à ansiedade e à depressão.

Tratamento e análise de dados

A informação recolhida foi organizada numa planilha do Microsoft Excel e submetida a análise no programa R. As variáveis qualitativas (nominais e ordinais) foram avaliadas por meio do cálculo de contagens e proporções, enquanto as variáveis primárias tiveram seus intervalos examinados.

As variáveis quantitativas foram submetidas às seguintes análises: a) As variáveis de caraterização foram avaliadas através da média e do desvio-padrão; b) As pontuações de solidão, ansiedade, depressão e adoção do papel foram examinadas em termos de proporções; e c) Foi realizada uma análise multivariada de agrupamentos utilizando técnicas de componentes principais e de agrupamentos para explorar as inter-relações entre as variáveis do estudo. A significância estatística foi determinada para valores com um valor de p inferior a 0,05.

Aspectos éticos

Este estudo foi aprovado pelo Comité de Ética da Escola de Enfermagem da Universidade Nacional da Colômbia (AVAL-028-2019). Antes de participar do estudo, os cuidadores familiares forneceram seu consentimento informado virtual, assinando-o.

Resultados

Um total de 960 cuidadores familiares respondeu aos questionários. A maioria era do sexo feminino (85%), com idade média de 50,47 anos. A maioria era casada (35,63%), realizava tarefas domésticas (58%) e tinha baixo nível socioeconómico (86,87%). Dos cuidadores, 47,6% eram filhos dos pacientes com DCNT, 79,9% eram cuidadores desde o momento do diagnóstico e 55,1% percebiam sua relação com o familiar como muito boa. A Tabela 1 apresenta uma caraterização detalhada dos cuidadores.

Em relação aos indivíduos com DCNT, observou-se que eles eram predominantemente do sexo feminino (61,35%) e que a média de idade era de 67,92 anos (Desvio Padrão [DP] = 20,45). Dentre eles, 50% eram pacientes pluripatológicos, com média de 10,97 (DP = 11,55) anos desde o diagnóstico. Adicionalmente, 55,42% dos pacientes tinham um único cuidador que dedicava uma média de 16,97 horas por dia aos cuidados (DP = 8,38).

A maioria dos cuidadores familiares participantes do estudo obteve pontuação satisfatória na adoção do papel. Quando somadas as pontuações de dúvida e problema clínico, a depressão e a ansiedade tiveram prevalência de 40,8% e 58,9%, respectivamente. Por outro lado, a solidão não foi um problema significativo para a maioria dos participantes, tendo sido relatada por apenas 45,4%. A Tabela 2 apresenta uma descrição pormenorizada dos resultados para estas variáveis com base nos intervalos de pontuação.

Tabela 1
- Caracterização sociodemográfica dos cuidadores participantes (n = 960). Bogotá, Colômbia, 2021

Variáveis		n = 960	Porcentagem
Gênero	Feminino	816	85%
	Masculino	144	15%
Idade	Média (DP * )	50,47 (14,02)
Estado civil	Casado(a)	342	35,63%
	Divorciado(a)	113	11,77%
	Solteiro(a)	294	30,63%
	União estável	172	17,92%
Nível de escolaridade	Viúvo(a)	39	4,06%
	Nenhum	23	2,40%
	Ensino fundamental	179	18,65%
	Ensino médio	293	30,52%
	Nível técnico	191	19,90%
	Estudos universitários	192	20%
	Estudos de pós-graduação	80	8,33%
Ocupação	Trabalhador de tempo integral	219	22,81%
	Estudante	20	2,08%
	Dona de casa	531	55,31%
	Freelancer	190	19,79%
Nível socioeconômico	Baixo	834	86,87%
	Médio	119	12,39%
	Alto	7	0,72%
Relação com a pessoa que recebe os cuidados	Amigos	37	3,85%
	Parceiros	197	20,52%
	Irmãos	31	3,23%
	Filhos adultos	457	47,60%
	Outros	104	10,83%
	Pais	134	13,96%
Cuidados desde o momento do diagnóstico	Sim	767	79,9%
	Não	193	20,1%
Percepção da qualidade da relação com o paciente	Muito boa	529	55,1%
	Boa	373	38,8%
	Regular	56	5,83%
	Ruim	2	0,21%

• ^*
  DP = Desvio Padrão

Tabela 2
- Resultados correspondentes à ansiedade, depressão, solidão e adoção do papel nos cuidadores por intervalos de pontuação (n = 960). Bogotá, Colômbia, 2021

Variáveis	Intervalos de pontuação	Porcentagem
Nível de depressão	Sem depressão (de zero a sete pontos)	59,2%
	Depressão duvidosa (de oito a dez pontos)	21,0%
	Problema clínico (onze pontos ou mais)	19,8%
Nível de ansiedade	Sem ansiedade (de zero a sete pontos)	41,0%
	Ansiedade duvidosa (de oito a dez pontos)	21,1%
	Problema clínico (onze pontos ou mais)	37,8%
Nível de solidão	Sem solidão (19 pontos ou menos)	45,4%
	Solidão moderada (de 20 a 30 pontos)	35,8%
	Solidão grave (31 ou mais pontos)	18,8%
Nível de adoção do papel	Adoção insuficiente do papel (de 22 a 60 pontos)	0,6%
	Adoção básica do papel (de 61 a 77 pontos)	10,7%
	Adoção satisfatória do papel (78 pontos ou mais)	88,6%

Foi efetuada uma Análise de Componentes Principais (ACP), tal como ilustrado na Figura 1 , utilizando as pontuações totais relativas a Adoção do papel, Ansiedade, Depressão e Solidão. A análise focou-se nas duas primeiras dimensões, que, coletivamente, representaram 80,6% da variação total. Adicionalmente, estas duas primeiras dimensões explicaram mais de 75% da variação nos totais. Isto sugere uma associação positiva entre as pontuações totais de ansiedade e depressão, indicando que os cuidadores com níveis mais elevados de ansiedade tendem a ter também níveis mais elevados de depressão. De fato, tal como medido pelo coeficiente de correlação linear de Pearson, o grau de associação linear entre estas duas pontuações é r = 0,696 (p < 0,001). Por outro lado, as pontuações de ansiedade e depressão na Escala Hospitalar de Depressão e Ansiedade apresentam uma associação negativa moderada com a adoção do papel (r = -0,337). Além disso, as pontuações de ansiedade, depressão e adoção do papel não apresentaram correlações significativas com a pontuação de solidão, como indicado por r = 0,141, r = 0, 126 e r = 0,256, respectivamente.

Figura 1
- Análise de componentes principais das pontuações totais para ansiedade, depressão, solidão e adoção do papel (n = 960). Bogotá, Colômbia, 2021

Em análises posteriores realizadas com as variáveis sociodemográficas dos cuidadores, não foram identificadas associações significativas com as pontuações totais nas várias escalas. No entanto, verificou-se um ligeiro decréscimo na Adoção do papel entre os cuidadores de pacientes do sexo feminino, entre os cuidadores que não eram pais ou tinham ocupações como estudantes, e entre os que pertenciam a níveis socioeconómicos médio e alto. Adicionalmente, foi realizada uma Análise de Correspondência Múltipla utilizando as faixas de pontuação, conforme ilustrado na Figura 2 . Esta análise explicou 40,7% das associações entre as categorias de pontuação. É importante notar que os cuidadores com problemas de ansiedade e depressão foram mais frequentemente associados a um nível moderado de solidão e à adoção básica do papel. Por outro lado, aqueles com níveis mais baixos de depressão e ansiedade não relataram sentir solidão.

A Figura 3 apresenta uma análise de agrupamento utilizando as pontuações totais para adoção do papel, ansiedade, depressão e solidão. Utilizando o método k-means , a análise revelou a possibilidade de agrupar os cuidadores em três categorias diferentes. O primeiro grupo compreendeu 120 cuidadores caracterizados por níveis normais de ansiedade e depressão, adoção satisfatória do papel e solidão severa, explicando 64,6% da variância (EV). O segundo grupo incluiu 341 cuidadores com níveis clínicos de ansiedade e depressão, adoção básica do papel e solidão moderada, explicando 68,4% da variância (EV). Finalmente, o terceiro grupo era constituído por 499 participantes que apresentavam níveis normais de ansiedade e depressão, sem solidão e com significativa adoção do papel, explicando 64,9% da variância (EV).

Figura 2
- Representação da classificação correspondente às pontuações de ansiedade, depressão, solidão e adoção do papel com Análise de Correspondência Múltipla (n = 960). Bogotá, Colômbia, 2021

Figura 3
- Análise de agrupamento dos cuidadores utilizando k-means e três grupos (n = 960). Bogotá, Colômbia, 2021

Por fim, foi realizada uma Análise de Componentes Principais dentro de cada um dos três grupos, utilizando as pontuações totais das variáveis. No grupo 1, observou-se uma associação positiva entre as pontuações totais de Ansiedade e Depressão, enquanto ambas apresentaram uma associação negativa com a pontuação de Solidão. Notavelmente, a pontuação total para a Adoção do papel não mostrou qualquer correlação significativa com as outras três variáveis. Pelo contrário, no grupo 2, os cuidadores obtiveram pontuações de Adoção do papel que se associaram negativamente à pontuação total da Solidão, e a Depressão apresentou uma associação positiva moderada com a Solidão. Finalmente, no grupo 3, a Adoção do papel apresentou uma associação negativa com a Depressão, enquanto a Ansiedade e a Solidão se associaram positivamente e, por sua vez, não apresentaram correlação com as outras duas variáveis (Adoção do papel e Depressão).

Discussão

Este estudo revelou vários aspectos referentes à ansiedade, depressão, solidão e adoção do papel entre os cuidadores de indivíduos com DCNTs no contexto colombiano, dada a limitada evidência disponível. Em primeiro lugar, destaca-se a alta prevalência de adoção do papel em níveis satisfatórios, com 88,6% dos cuidadores se autoclassificando nesse nível. É de salientar que o nível de adoção do papel de cuidador exerce impactos diretos nas suas respostas, estratégias organizacionais e tarefas que realizam nesse papel ^{( 15 )} .

Em termos de respostas, foi estabelecido que assumir o papel de cuidador, especialmente quando confrontado com elevadas exigências de cuidados num contexto isolado e pouco apoiado, conduz a efeitos adversos na qualidade de vida ^{( 18 )} , na sobrecarga do cuidador ^{( 19 )} , e na ansiedade e depressão ^{( 7 )} . Está documentado que a organização do papel de cuidador e as tarefas específicas desempenhadas pelos cuidadores influenciam diretamente os resultados dos indivíduos com DCNT. Simultaneamente, estes resultados afetam reciprocamente os cuidadores, numa relação simbiótica ^{( 20 )} . Por conseguinte, uma das principais prioridades neste domínio deve ser a expansão da nossa compreensão do processo de adoção do papel de cuidador e a promoção da sua transição sem problemas. Este esforço tem como objetivo melhorar os resultados não só para os cuidadores, mas também para os próprios pacientes ^{( 21 )} .

Neste estudo, a prevalência de ansiedade foi de 59% e a de depressão de 40,8%, ambas com pontuações no limite de cada escala. É de salientar que a prevalência de ansiedade ultrapassou os 42,3% relatados num estudo meta-analítico anterior ^{( 7 )} que envolveu cuidadores de indivíduos com câncer, enquanto a depressão teve uma prevalência muito próxima dos 46,55% relatados no mesmo estudo. É importante salientar que tanto a ansiedade como a depressão são problemas confirmados na população colombiana de cuidadores. Embora a ansiedade pareça ser mais prevalente do que a depressão, é crucial manter o foco tanto na pesquisa como no apoio ao cuidador. Esta ênfase é justificada pelo fato de a literatura amplamente documentar a influência da ansiedade como um preditor da depressão ^{( 22 )} .

Os resultados deste estudo indicam uma adoção satisfatória do papel de cuidador, ao lado de uma notável prevalência de ansiedade e depressão. Além disso, foi observada uma elevada prevalência de solidão, com 54,6% dos participantes do estudo tendo relatado algum grau de solidão. Esta descoberta está em consonância com a prevalência de 60,7% de solidão relatada num estudo anterior realizado no Reino Unido ^{( 9 )} . É evidente que a percepção da solidão é um problema inegável entre os cuidadores familiares de indivíduos com doenças crônicas, em grande parte devido à natureza abrangente do papel de cuidador.

No presente estudo foram recolhidos dados sobre variáveis que podem influenciar este sentimento de isolamento. Por exemplo, 55,42% dos pacientes relataram ter apenas um cuidador, 79,9% dos cuidadores mencionaram ter prestado cuidados desde o momento do diagnóstico, e foi evidente uma dedicação diária de 16,97 horas aos cuidados do paciente. Neste contexto, é concebível que os cuidadores estejam em maior risco de se perceberem como solitários. A natureza exigente e a grande dedicação de tempo necessária para a prestação de cuidados deixam poucas oportunidades para os cuidadores se envolverem com as suas redes de apoio imediatas ou reservarem tempo para si próprios. Ademais, o estudo revelou uma relação significativa e direta entre solidão, depressão e ansiedade, o que corrobora ainda mais com as evidências existentes sobre a interação entre essas três variáveis. Isto reforça a necessidade premente de intervenções destinadas a atenuar estes efeitos adversos na saúde dos cuidadores ^{( 23 )} .

Um dos resultados mais significativos deste estudo emergiu das análises de agrupamento. Cuidadores com níveis mais baixos de adoção do papel apresentaram níveis marcadamente mais altos de solidão, ansiedade e depressão. Este achado está de acordo com pesquisas anteriores de outros países ^{( 22 )} mas representa um acréscimo notável à nossa compreensão da saúde dos cuidadores no contexto colombiano. Este dado ganha particular significado quando se considera que os cuidadores familiares na Colômbia desempenham o seu papel num contexto caracterizado por negligência, apoio institucional inadequado e inúmeros desafios económicos associados à prestação de cuidados num país com um rendimento per capita médio a baixo ^{( 24 )} . Uma descoberta inédita neste estudo diz respeito ao efeito mediador da adoção do papel de cuidador sobre as outras variáveis, sublinhando a necessidade imperativa de alargar o quadro teórico em torno da prestação de cuidados. Em vez de ser apenas uma tarefa instrumental, este papel é construído através de interações com outras pessoas significativas e evolui no meio de mudanças contínuas, exigindo apoio através de cuidados transitórios ^{( 25 )} .

Este estudo tem várias implicações para a prática de Enfermagem. Em primeiro lugar, compreender o processo de adoção do papel fortalece os enfermeiros no reconhecimento dos desafios únicos enfrentados pelos cuidadores e fornece apoio personalizado para ajudá-los a navegar em suas novas responsabilidades. Isto pode implicar a oferta de orientação e recursos para melhorar as suas capacidades de cuidado. Em segundo lugar, reconhecendo a prevalência da ansiedade, solidão e depressão nos cuidadores, os enfermeiros e o sistema de saúde podem implementar intervenções direcionadas para responder às necessidades de saúde mental dos cuidadores. Isto pode incluir aconselhamento, facilitar a ligação a grupos de apoio e criar oportunidades de participação social. Além disso, a oferta de cuidados temporários pode ser fundamental para aliviar as sobrecargas impostas aos cuidadores. Em terceiro lugar, ao integrar estes conhecimentos na prática de Enfermagem, os profissionais de saúde podem contribuir para melhorar o bem-estar dos cuidadores, promover uma prestação de cuidados eficaz e, em última análise, melhorar os resultados dos pacientes no contexto da gestão das doenças crônicas.

Este estudo tem limitações, incluindo a amostragem intencional, que restringe a generalização dos resultados para além da amostra. No entanto, foi apresentada uma descrição abrangente da amostra para aumentar a aplicabilidade dos resultados a contextos com indivíduos que partilham características semelhantes às dos participantes. Outra limitação importante é o potencial impacto da pandemia de COVID-19 nas variáveis de interesse. Os dados foram coletados em meio a fechamentos e ordens de isolamento impostos pelo governo durante a segunda e terceira ondas de infecções por COVID-19 na Colômbia. Está documentado que a pandemia exacerbou a ansiedade, a depressão e a solidão devido ao distanciamento social ^{( 26 )} . Visto que esta variável não foi controlada neste estudo, é plausível que os níveis de ansiedade, depressão e solidão possam ter sido significativamente influenciados não só pelo papel de cuidador, mas também pela própria pandemia, que amplificou problemas preexistentes nos cuidadores.

Além disso, o fato de se ter recorrido a diversos métodos de coleta de dados, tais como formulários on-line e chamadas telefónicas, vieses podem ter sido introduzidos. Para atenuar esta situação, a equipe de pesquisa deu treinamento completo aos assistentes de pesquisa, dotando-os das competências necessárias para ajudar os participantes a responder aos questionários e garantir o preenchimento correto dos formulários on-line. Além disso, é de salientar que a amostra foi constituída principalmente por cuidadores familiares com níveis de escolaridade relativamente elevados, tendo a maioria completado pelo menos o Ensino Secundário ou Superior, com uma média de idade de 50 anos. Estas características demográficas sugerem níveis razoáveis de familiaridade e proficiência com levantamentos on-line, o que pode ajudar a mitigar potenciais vieses associados aos métodos de coleta de dados on-line. No entanto, é essencial reconhecer o potencial viés introduzido pelos vários métodos de coleta de dados ao interpretar os resultados do estudo.

Conclusão

Os cuidadores familiares de indivíduos com doenças crônicas eram predominantemente mulheres que dedicavam um número substancial de horas por dia à prestação de cuidados, resultando num compromisso cumulativo que englobava as consideráveis exigências de prestação de cuidados decorrentes do estado de dependência dos seus familiares. O estudo identificou uma relação significativa entre a adoção do papel de cuidador e as respostas à ansiedade, depressão e solidão. Especificamente, os cuidadores com níveis mais baixos de adoção do papel apresentaram níveis significativamente mais elevados de ansiedade, depressão e solidão.

É necessária mais investigação neste domínio para melhorar os conhecimentos sobre a adoção do papel e para explorar estudos de intervenção destinados a facilitar uma transição mais suave para os cuidadores. Estas intervenções poderão desempenhar um papel fundamental na redução da prevalência da ansiedade, da depressão e da solidão nesta população de cuidadores.

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• Todos os autores aprovaram a versão final do texto.
• Como citar este artigo
  Carreño-Moreno S, Pacheco-López M, Arias-Rojas M. Role adoption, anxiety, depression and loneliness in family caregivers of patients with chronic diseases. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2024;32:e4140 [cited ano mês dia]. Available from: URL . https://doi.org/10.1590/1518-8345.6926.4140

Editado por

Editora Associada:

Sueli Aparecida Frari Galera

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Jun 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  29 Jun 2023
• Aceito
  01 Dez 2023