Eficácia de um programa no aumento das estratégias de coping em bombeiros: ensaio clínico randomizado ¹

Objective:

to evaluate the effectiveness of a program in increasing coping strategies focused on military firefighters’ problems and emotions.

Method:

randomized, parallel, single-masked clinical trial. The sample consisted of 51 participants in the intervention group and 49 in the control group. The intervention group received the intervention program including coping strategies based on the Nursing Interventions Classification, lasting six consecutive weeks, one day a week. The control group followed the Service Unit routine. Descriptive statistics, Student’s T test with Welch’s correction and the Mann-Whitney test were used for the analyses. The magnitude of the intervention effect was calculated using Cohen’s d index. A p-value of ≤0.05% was considered.

Results:

in the analysis of the mean difference between the scores in the groups, the means of the intervention group increased significantly for the coping strategies: social support (p = 0.009), acceptance of responsibility (p = 0.03), problem solving (p = 0.05) and positive reappraisal (p = 0.05). The impact of the intervention was moderate in magnitude for social support (d = 0.54).

Conclusion:

the intervention program enabled the increase of coping strategies focused on military firefighters’ problems and emotions. ReBEC: RBR-8dmbzc.

Descriptors:
Occupational Stress; Adaptation Psychological; Nursing Process; Nursing; Firefighters; Randomized Controlled Trial

Objetivo:

evaluar la eficacia de un programa en el aumento de las estrategias de coping enfocadas en el problema y en la emoción en bomberos militares.

Método:

ensayo clínico aleatorizado, paralelo, con enmascaramiento simple. La muestra se constituyó de 51 participantes en el grupo intervención y 49 en el control. El grupo intervención recibió el programa interventivo incluyendo las estrategias de coping basadas en la Clasificación de las Intervenciones de Enfermería, con una duración de seis semanas consecutivas, un día por semana. El grupo control siguió la rutina de la Unidad de Servicio. Para los análisis se utilizó estadística descriptiva, test T de Student con corrección de Welch y el test de Mann-Whitney. La magnitud del efecto de la intervención se calculó con el índice d de Cohen. Se consideró valor p≤0,05%.

Resultados:

en el análisis del promedio de la diferencia entre los puntajes en los grupos, los promedios del grupo intervención aumentaron significativamente para las estrategias de coping: soporte social ( p = 0,009), aceptación de la responsabilidad ( p = 0,03), resolución de problemas ( p = 0,05) y reevaluación positiva ( p = 0,05). El impacto de la intervención presentó magnitud moderada para el soporte social ( d = 0,54).

Conclusión:

el programa interventivo posibilitó el aumento de estrategias de coping enfocadas en el problema y en la emoción en bomberos militares. ReBEC: RBR-8dmbzc.

Descriptores:
Estrés Laboral; Adaptación Psicológica; Proceso de Enfermería; Enfermería; Bomberos; Ensayo Clínico Controlado Aleatorio

Destaques:

(1) O programa interventivo aumenta as estratégias de coping .

(2) O estudo contemplou os bombeiros militares.

(3) O suporte social foi a principal estratégia do estudo.

(4) Grupo intervenção apresentou resultados melhores que o grupo controle.

(5) O uso da Classificação de Intervenção de Enfermagem foi efetivo.

Introdução

Os bombeiros são profissionais de segurança pública que executam ações voltadas para a defesa civil, prevenção e combate a incêndio, busca e salvamento, com o objetivo de salvaguardar a vida das pessoas e seus bens contra qualquer tipo de catástrofe ^{( 1 )} . Assim, pertencem a uma categoria exposta a muitos tipos de agentes estressores no trabalho ^{( 2 - 4 )} .

O agravamento do estresse ocupacional tem chamado a atenção de pesquisadores, devido às consequências negativas na saúde física e mental de trabalhadores ^{( 5 - 6 )} . As repercussões de elevados níveis de estresse persistem ao final do plantão de trabalho, impactando no bem-estar e na saúde geral do trabalhador, além de interferir na assistência que os profissionais prestam à sociedade ^{( 5 )} .

Os bombeiros estão constantemente suscetíveis a eventos traumáticos ^{( 2 )} , psicossociais ^{( 3 )} e físicos ^{( 4 )} . Concernente aos elementos psicossociais, destaca-se o escrutínio público sentido de forma negativa, principalmente quando ocorrem complicações durante um atendimento à vítima ^{( 3 )} , além da exigência emocional pelo aumento da rotatividade, que se associa à insatisfação ^{( 4 )} . Em relação aos impactos físicos, um aspecto a ser citado é o estresse térmico causado em dias de calor intenso ^{( 7 )} .

Um dos fatores associados à gravidade do estresse ocupacional em bombeiros é a Síndrome de Burnout (SB) ^{( 8 )} . Considerada um problema de saúde pública, a SB surge da exigência emocional do trabalho ^{( 9 )} e está relacionada à cronificação do estresse ^{( 10 )} , a qual é acentuada pelo acúmulo de sobrecargas diárias ^{( 5 )} .

O nível elevado de estresse ocupacional também contribui para o desenvolvimento da fadiga por compaixão (FC), presente principalmente entre profissionais que prestam assistência às pessoas ^{( 11 )} . Nos serviços de atendimento, o autossacrifício na assistência ao outro contribui para o esquecimento de si ^{( 12 )} . O aumento da FC é proporcionalmente associado ao aumento da SB entre bombeiros ^{( 13 )} . Contudo, existem aspectos positivos que podem contribuir para a redução da FC e SB, como a resiliência e a satisfação por compaixão (SC) ^{( 14 )} . A SC está diretamente relacionada com o sentimento de motivação do trabalhador para exercer suas atividades com qualidade, mesmo sob o efeito constante de estressores responsáveis pelo adoecimento e improdutividade laboral ^{( 5 )} . A resiliência, por sua vez, associa-se à redução de danos psicológicos ^{( 15 )} .

Os fatores de risco e de proteção para as doenças relacionadas ao estresse ocupacional em bombeiros associam-se à percepção de estresse e à escolha de estratégias de enfrentamento ^{( 16 )} . A forma como o indivíduo avalia e enfrenta cada situação estressora interfere na resposta de comportamento ^{( 17 )} , além disso, o controle do estresse minimiza o impacto negativo à saúde mental ^{( 18 )} .

Nesse sentido, as estratégias de coping, isto é, as interações cognitivas e comportamentais diante da avaliação de um evento estressor, são manejos importantes no gerenciamento, sendo consideradas ferramentas inteligentes na condução desse processo ^{( 17 , 19 )} . A estratégia de coping é focada tanto na emoção – referente a manejos cognitivos para reduzir a resposta emocional – quanto no problema, que consiste em estratégias que atuam diretamente na causa da situação de estresse ^{( 19 )} .

Uma revisão sistemática, realizada com profissionais de segurança pública, evidenciou a urgência em identificar estratégias de enfrentamento eficazes para reduzir os efeitos psicológicos provenientes das exposições ocupacionais traumáticas ^{( 20 )} . Ademais, o estudo apontou a importância de padronizar as pesquisas futuras para garantir resultados de enfrentamento a longo prazo como benefício para a saúde mental dos trabalhadores ^{( 20 )} .

Além disso, um relatório sobre estimativas de riscos ocupacionais, publicado conjuntamente por órgãos internacionais, enfatizou a necessidade de políticas para implementar ações e prevenir os danos referentes à exposição laborativa ^{( 21 )} . O desenvolvimento de programas interventivos nos corpos de bombeiros torna-se uma demanda importante a ser atendida, considerando as repercussões do contexto laboral ^{( 16 )} .

Diante do exposto, cabe destacar que o enfermeiro é um dos profissionais com habilidades para atuar em diversos ambientes, utilizando a estrutura de teorias de estresse para promover respostas adaptativas, além de favorecer o enfrentamento e a promoção de novas estratégias para lidar com as situações ^{( 22 )} . Para isso, tais profissionais podem contar com a Classificação das Intervenções de Enfermagem (NIC), que proporciona o uso de intervenções próprias do enfermeiro.

Neste estudo, foi considerada a utilização da NIC como intervenção para favorecer as estratégias de coping em bombeiros. Há relatos de poucos estudos no Brasil sobre a saúde mental de bombeiros ^{( 23 )} . Nesse sentido, uma revisão sistemática aponta que muitos estudos sobre estresse foram realizados com delineamentos seccionais e com enfoque na avaliação de parâmetros, como frequência cardíaca, análise de cortisol, condutância da pele, temperatura corporal e volume de sangue no pulso ^{( 5 )} .

As intervenções destinadas a prevenir, identificar e gerenciar o estresse ocupacional agudo entre bombeiros militares, policiais e socorristas possuem efeitos positivos no retorno ao trabalho, absenteísmo e angústia ^{( 24 )} . Alguns estudos utilizaram terapias integrativas e complementares para a redução do estresse ocupacional ^{( 25 - 26 )} , porém, mesmo que as intervenções fossem similares às da NIC, em nenhum deles mencionou-se o uso da taxonomia.

O aumento de estratégias de coping está associado à redução e ao gerenciamento do estresse ocupacional ^{( 27 - 28 )} . Sendo assim, desenvolveu-se e aplicou-se a intervenção Programa Estratégias de Coping (PEC), em bombeiros militares. A hipótese principal do estudo considera que o PEC aumenta os escores de coping focados no problema e na emoção, resiliência e SC e reduz os escores de estresse ocupacional, burnout e FC, entre os bombeiros militares. Portanto, este estudo teve como objetivo avaliar a eficácia de um programa no aumento das estratégias de coping focadas no problema e na emoção em bombeiros militares.

Método

Tipo de estudo

Trata-se de um ensaio clínico randomizado, paralelo e com mascaramento simples (avaliadores de desfechos), e taxa de alocação 1:1. O estudo seguiu as orientações da lista de verificação do Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) – nonpharmacologic treatments (NPTs) .

População, local e período

A pesquisa foi realizada com bombeiros integrantes de uma unidade de batalhão de bombeiros militares, em um município da região do Triângulo Sul, Minas Gerais, Brasil. O estudo ocorreu de novembro de 2021 a março de 2022.

Critérios de seleção

Os critérios de inclusão levaram em consideração os(as) integrantes do batalhão de bombeiros militares de ambos os sexos, em situação ativa, ou seja, sem afastamento durante o período de coleta, que manifestaram disponibilidade e interesse em participar do estudo. Já os critérios de exclusão foram para os(as) integrantes que, ao serem abordados individualmente, referiram estar em tratamento psicológico, para, desse modo, evitar interferências na intervenção que o(a) participante receberia.

Viabilidade do estudo e definição da amostra

Para verificar a viabilidade do estudo e a utilidade dos procedimentos metodológicos, inicialmente, conduziu-se um estudo-piloto, norteado pela extensão da declaração CONSORT 2010 para ensaios piloto randomizados e de viabilidade ^{( 29 )} . A partir da população total (n=167), 20 bombeiros foram randomizados com auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21. Foram alocados 10 participantes no Grupo Intervenção (GI), os quais passaram pelo PEC, além disso 10 participantes foram direcionados ao Grupo Controle (GC), isto é, seguiram a rotina da Unidade de Serviço. Entretanto, como ocorreu a perda de seguimento de três participantes em cada grupo, devido a afastamentos de saúde, recusas, aposentadorias e transferências de cidade, permaneceram sete participantes por grupo.

O estudo-piloto permitiu a ambientação com o local da pesquisa e com a rotina de serviço, bem como o acesso às informações sobre profissionais ativos ou não. Tais aspectos orientaram a verificação dos critérios de seleção e direcionaram alguns ajustes para o estudo principal, pois verificou-se que não foi possível padronizar o local e o tempo de realização de cada sessão, devido à complexidade e à dinâmica das atividades do bombeiro.

Referente à aplicação dos instrumentos selecionados, os entrevistadores solicitaram que os participantes relatassem quaisquer tipos de dificuldades para respondê-los, mas nada foi sinalizado. Na condução do PEC, não foram registradas intercorrências que justificassem modificações, além daquelas já sugeridas pelos juízes da intervenção.

Ainda, embora nenhum fator de coping tenha apresentado significância estatística, houve aumento da média no escore do fator de autocontrole de 2,00±2,64 para o GI, sendo esses valores adotados para calcular o tamanho da amostra pelo aplicativo Power Analysis and Sample Size (PASS), versão de 2013. Considerando um erro do tipo I α=0,05 e um erro do tipo II β=0,2, a amostra mínima requerida para validade externa foi de 98 participantes (49 por grupo). Porém, o número de tentativas de entrevista foi de 124 (62 por grupo), levando em conta uma possível perda de amostragem de 20% (recusa, perda de seguimento devido à mudança de cidade, acompanhamento de familiar ou afastamento para tratamento de saúde). Dessa forma, partindo de uma população de 147 bombeiros militares elegíveis, 124 participantes foram randomizados por meio do SPSS, versão 21, e alocados em GI e GC (n = 62, cada). Ressalta-se que os integrantes do corpo de bombeiros que participaram do estudo-piloto (n = 20) não foram incluídos no estudo principal.

Randomização e mascaramento

Após a randomização pelo software SPSS, gerou-se uma lista numerada sequencialmente, para a alocação dos participantes aos grupos da pesquisa. Dos 124 profissionais randomizados, 100 bombeiros concluíram o estudo, sendo 51 no GI e 49 no GC. Todo o processo de randomização foi realizado com o auxílio de um estatístico sem envolvimento no estudo. O mascaramento simples foi assegurado, já que os avaliadores de desfechos não tinham conhecimento da alocação de cada integrante do batalhão de bombeiros militares nos grupos. Não foi possível mascarar, no entanto, os participantes da pesquisa e a pesquisadora responsável por aplicar a intervenção, levando em conta que estes estavam cientes da alocação no GI, que recebeu o PEC. O estudo contou com uma pesquisadora, a qual aplicou a intervenção; dois avaliadores de desfechos, que aplicaram os instrumentos de pesquisa; uma coordenadora geral, que organizou o estudo e direcionou o momento dos avaliadores e da intervenção; além de um estatístico para as análises, mascarado quanto à alocação dos grupos. Manteve-se a mesma equipe do estudo-piloto. A seguir, a Figura 1 apresenta o fluxo da amostra do estudo segundo os GI e GC.

Figura 1
- Fluxograma de coleta de dados conforme CONSORT-NPT

Instrumentos

Na primeira abordagem dos grupos, foi aplicado um questionário sociodemográfico/econômico e laboral elaborado pelos pesquisadores, incluindo os seguintes dados: sexo, faixa etária, estado conjugal, renda familiar, formação acadêmica, posto no batalhão de bombeiros, tipo de atividade desenvolvida atualmente, carga horária semanal e tempo de serviço no batalhão. Tais variáveis são comuns na temática, inclusive para o público-alvo deste estudo ^{( 8 )} . O instrumento foi avaliado por dois peritos enfermeiros, com experiência em método quantitativo, responsáveis por avaliar o conteúdo (se a questão estava adequada ou não) e indicar sugestões, fato que não ocorreu. Ainda, na primeira abordagem e ao término de seis semanas referentes à intervenção, utilizou-se os seguintes instrumentos validados e amplamente usados no público geral ^{( 30 )} ou de trabalhadores ^{( 31 - 32 )}: Inventário de Estratégias de Coping ^{( 30 )} , Escala de Estresse no Trabalho (EET) ^{( 31 )} , Escala de Qualidade de Vida Profissional (ProQol-BR) ^{( 32 )} e Escala Breve de Resiliência (EBR) ^{( 33 )} .

O Inventário de Estratégias de Coping apresentou valor do coeficiente alfa de Cronbach entre 0,81 a 0,84 no estudo de adaptação, o que indica boa homogeneidade e consistência dos itens ^{( 30 )} . O inventário classifica a extensão em que a pessoa utiliza as estratégias de coping ^{( 30 )} . Contém 66 itens referentes aos pensamentos e ações adotados para lidar com demandas internas ou externas resultantes de um evento estressante específico, além de questões distratoras, que não são pontuadas na escala de conversão ^{( 30 )} . Há oito fatores diferentes sugeridos pela análise fatorial: confronto; afastamento; autocontrole; suporte social; aceitação de responsabilidade; fuga-esquiva; resolução de problemas; reavaliação positiva ^{( 30 )} .

Antes do preenchimento do instrumento, o participante deve relatar uma situação ocorrida no último mês de trabalho que considera como estressora e, posteriormente, indicar a estratégia mais utilizada para lidar com o problema, marcando no instrumento 0 (não usei esta estratégia), 1 (usei um pouco), 2 (usei bastante) ou 3 (usei em grande quantidade) ^{( 30 )} .

A EET foi construída e validada com um coeficiente alfa de Cronbach equivalente a 0,91 (confiabilidade excelente) e a análise fatorial indicou a existência de um único fator composto por 23 itens ^{( 31 )} . Essa versão foi validada considerando o seu fator geral, contando com todos os seus itens, com um escore que varia de 23 até 115 pontos ^{( 31 )} . Cada um dos 23 itens apresenta um tipo de estressor e um tipo de reação a este estressor, analisados por meio de uma escala de concordância do tipo Likert de 1 a 5 pontos (1 – discordo totalmente; 2 – discordo; 3 – concordo em parte; 4 – concordo; 5 – concordo totalmente) ^{( 31 )} .

A escala ProQol-BR utilizada possui 28 itens ^{( 32 )} . A validação teve êxito em manter o sentido das sentenças e as propriedades psicométricas do instrumento original ^{( 32 )} . A análise de consistência dos fatores por meio do alfa de Cronbach apresentou índices de 0,81, 0,83 e 0,76 para o primeiro, segundo e terceiro fatores, respectivamente ^{( 32 )} . A escala apresenta um aspecto negativo, a FC, composta pelas subescalas de estresse traumático secundário (ETS) (10 itens) e burnout (3 itens); e um aspecto positivo, a SC (15 itens) ^{( 32 )} . As questões são respondidas em uma escala Likert que varia de 1 (raramente) a 5 (quase sempre) ^{( 32 )} .

A EBR mensura a resiliência e apresentou boa adequação e alfa de Cronbach de 0,84 ^{( 33 )} . É composta por seis itens, com formato de resposta variando de 1 (discordo fortemente) a 5 (concordo fortemente) ^{( 33 )} . Três de suas questões são positivas e as outras três foram construídas com frases no sentido negativo, com o objetivo de controlar o efeito de desejo social ao responder ^{( 33 )} . Destaca-se que os itens 2, 4 e 5 devem ser recodificados como 1 = 5; 2 = 4; 3 = 3; 4 = 2; 5 = 1 ^{( 33 )} . Após essa recodificação, a soma dos pontos da escala é realizada e os valores mais elevados indicam maior resiliência ^{( 33 )} .

Intervenção

A intervenção tem como base a taxonomia da NIC ^{( 34 )} , especificamente as intervenções de “Apoio Emocional” e “Melhora do Enfrentamento”, a Teoria do Estresse e Enfrentamento ^{( 17 , 19 )} e a Teoria de Aprendizado do Adulto ^{( 35 )} , sendo submetida à avaliação das evidências de validade de conteúdo e face por quatro juízes doutores e enfermeiros. Os juízes foram selecionados por meio do Currículo Lattes e possuíam domínio sobre processo de enfermagem, educação permanente em enfermagem, estratégias de assistência em enfermagem e sistemas de linguagem padronizada, além de atuarem na docência, na gestão em enfermagem, em departamento didático científico e saúde do trabalhador. Os juízes possuíam mais de 10 anos de atuação na pesquisa em Enfermagem.

Os quatro juízes receberam um instrumento de avaliação da intervenção quanto ao conteúdo das atividades de cada um dos seis dias do PEC. Deveriam julgar como adequado ou não adequado e/ou indicar sugestões. Todos os juízes registraram sugestões unicamente para a atividade 1 e sugeriram aplicá-las para os demais dias, por se tratar de um programa. Apenas um juiz marcou as atividades como não adequadas. Dessa forma, a equipe da pesquisa se atentou para as sugestões que foram avaliadas qualitativamente. As sugestões foram acatadas em sua totalidade, considerando a convergência entre os juízes , sendo: I) usar o verbo “dialogar” ao invés de “discutir”, na 1ª etapa; II) focar em estratégias de coping e tratar fatores associados como secundários; III) dividir as atividades do PEC em duas partes; IV) estratégia de coping focada na emoção e no problema, ao invés de ser educativa, pois permite que o participante seja proativo e aponte a solução para a situação de estresse vivenciada; V) retomar o assunto do dia anterior, inclusive o coping . Incorporadas as sugestões, a proposta foi reenviada aos juízes que julgaram o roteiro como adequado ( Figura 2 ), permitindo a aplicação no estudo-piloto, com a necessidade dos ajustes já mencionados.

Para a descrição da intervenção foi utilizado The Template for Intervention Description and Replication (TIDieR), uma extensão do CONSORT 2010 (item 5) e da declaração Standard Protocol Items: Recommendations for Interventional Trials (SPIRIT) 2013 (item 11), elaborado com a finalidade de garantir a integralidade da intervenção ^{( 36 )} .

A intervenção se trata de um programa, o PEC, elaborado para possibilitar reflexões sobre as estratégias necessárias para lidar com os estressores e suas consequências no cotidiano de trabalho. O PEC consistiu em seis atividades, um encontro por semana com duração média de 35 minutos, totalizando seis semanas.

Cada atividade da intervenção foi aplicada de forma presencial e individual, respeitando as normas de precaução padrão da pandemia do novo coronavírus ^{( 37 )} , nos períodos matutino, vespertino ou noturno, de segunda-feira a domingo, de acordo com a disponibilidade do participante. O PEC foi aplicado em salas ou ambientes privados, nos locais de trabalho de cada participante, segundo a realidade e dinâmica identificados no estudo-piloto.

A intervenção foi realizada por uma enfermeira, especialista em enfermagem do trabalho, com mestrado em atenção à saúde e experiência na condução de consultas de enfermagem em trabalhadores há 10 anos. A pesquisadora realizou disciplinas e capacitações sobre o assunto para a aquisição do conhecimento necessário, bem como participou de treinamentos com o grupo de pesquisa antes da realização do estudo.

Durante a execução da intervenção, o tempo de exposição ao programa foi modificado para alguns profissionais, conforme ajuste identificado no estudo-piloto. Portanto, ao invés de seis semanas, alguns concluíram o PEC em uma média de 5,7 semanas, de acordo com a disponibilidade do participante, que experimentou as mesmas seis sessões, porém, com intervalo menor ou maior que sete dias entre uma e outra. Esta condição ocorreu porque alguns profissionais estavam em processo de transferência ou aposentadoria, de férias ou de atestado médico prolongado e demonstraram interesse em concluir a participação na pesquisa, sendo, portanto, a intervenção ajustada quanto ao intervalo de execução.

Cada dia do PEC foi dividido em duas etapas. Na primeira, realizou-se um diálogo prévio, a partir da técnica de brainstorming , sobre estresse e coping ou temas relacionados ao estresse e coping (dias: 1° estresse, 2° estresse ocupacional, 3° burnout , 4° FC, 5° SC e 6° resiliência), ou, ainda, referentes às vivências/experiências do participante. Nessa mesma etapa foram contempladas as atividades da intervenção da NIC de Apoio Emocional ^{( 34 )} representadas por: discussão de experiências emocionais, reconhecimento de respostas e estratégias frente ao estresse, estímulo para a redução de demandas quando em situação de doença ou fadiga. A etapa também contemplou a Teoria do Aprendizado do Adulto por considerar as experiências trazidas pelo participante ^{( 35 )} .

Na segunda etapa do PEC ocorreu a abordagem sobre os temas de estudo: estresse e coping , estresse ocupacional e coping , burnout e coping, FC e coping , SC e coping e resiliência e coping . Para cada tema, foram apresentados o conceito, os sintomas associados e a relação com o estresse e o coping . As estratégias de coping focadas na emoção e no problema ^{( 17 , 19 )} foram trabalhadas todos os dias, por meio de seis apresentações de slides a partir do Power Point e do uso de notebook . A estratégia de coping focada na emoção é representada pelos fatores: aceitação de responsabilidade, reavaliação positiva, autocontrole, fuga-esquiva e afastamento ^{( 19 )} . A de coping focado no problema são confronto e resolução de problemas, sendo que somente o fator suporte social faz parte dos dois ^{( 19 )} .

Ainda na segunda etapa, utilizou-se um roteiro contendo 12 itens focados no tema do dia: 1) Identificar o que causa(ou) ou prejudica(ou) a situação de um dos temas do dia (estresse geral, estresse ocupacional, burnout , FC, SC ou resiliência), reconhecimento da avaliação primária/cognitiva do participante; 2) Avaliar os recursos disponíveis para solucionar o problema (avaliação secundária/comportamental do participante); 3) Identificar as metas adequadas a curto e longo prazo; 4) Dialogar sobre as mudanças que gostaria de fazer para solucionar o problema; 5) Avaliar soluções realistas (reconhecimento do coping focado na emoção e no problema); 6) Reconhecer quais mudanças são possíveis e quais não são; 7) Identificar o sentimento sobre o que pode ser mudado e modos alternativos de enfrentamento; 8) Reconhecer os benefícios e consequências de cada alternativa; 9) Incentivar a escolher uma alternativa; 10) Identificar ganhos e perdas sobre o estilo pessoal de enfrentamento; 11) Fornecer um feedback positivo para as tentativas de mudança; 12) Avaliar conjuntamente os resultados.

O roteiro da segunda etapa teve como base a intervenção da NIC de Melhora do Enfrentamento ^{( 34 )} representada pelas atividades: auxílio na identificação de metas adequadas, recursos disponíveis, avaliação dos eventos de estresse, habilidades, opções realistas e limitações. Também se pautou na Teoria do Estresse e Enfrentamento ao estimular o participante à avaliação cognitiva e comportamental da situação solicitada ^{( 17 , 19 )} . Cada participante pode avaliar e compreender os recursos e habilidades disponíveis para lidar com o estresse, ao anotá-los em post-it ^® . A intervenção dialogou sobre as experiências emocionais do participante conforme o tema do dia, apresentou novas informações e estratégias de coping focadas na emoção e no problema e ainda levou o participante a refletir sobre como lidar com o estresse vivenciado.

A apresentação geral do PEC com a divisão das duas etapas em cada dia da atividade apresenta-se na Figura 2 a seguir:

Figura 2
- Apresentação do PEC ^* aplicado em bombeiros militares, segundo cada etapa no dia da atividade. Uberaba, MG, Brasil, 2022

Semanas/ Dias	Apresentação das etapas de atividades do PEC *
Primeira	1ª Etapa: Dialogar sobre estresse e coping . Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Abordar sobre estresse (conceito do tema, sintomas associados e a relação estresse/ coping ). Abordar coping focado na emoção e no problema. Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.
Segunda	1ª Etapa: Dialogar sobre estresse ocupacional. Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Retomar o tema anterior, inclusive o coping focado na emoção e no problema. Abordar sobre o estresse ocupacional (conceito do tema, sintomas associados e relação estresse ocupacional/ coping ). Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.
Terceira	1ª Etapa: Dialogar sobre burnout. Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Retomar o tema anterior, inclusive o coping focado na emoção e no problema. Abordar sobre burnout (conceito do tema, sintomas associados e a relação burnout /estresse ocupacional/ coping ). Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.
Quarta	1ª Etapa: Dialogar sobre FC ‡ . Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Retomar o tema anterior, inclusive o coping focado na emoção e no problema. Abordar sobre FC ‡ (conceito do tema, sintomas associados e a relação FC ‡ /estresse ocupacional /coping ). Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.
Quinta	1ª Etapa: Dialogar sobre SC § . Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Retomar o tema anterior, inclusive o coping focado na emoção e no problema. Abordar sobre SC § (conceito do tema, sintomas associados e a relação SC § /estresse ocupacional /coping ). Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.
Sexta	1ª Etapa: Dialogar sobre resiliência. Dialogar sobre as experiências emocionais e uso das atividades da intervenção da NIC † de Apoio Emocional.	2ª Etapa: Retomar o tema anterior, inclusive o coping focado na emoção e no problema. Abordar sobre resiliência (conceito do tema, sintomas associados e a relação resiliência/estresse ocupacional /coping ). Uso do roteiro do PEC * (12 itens) baseado nas atividades de intervenção da NIC † de Melhora do Enfrentamento.

• ^*
  PEC = Programa Estratégia de Coping ;
• ^†
  NIC = Classificação das Intervenções de Enfermagem;
• ^‡
  FC = Fadiga por Compaixão;
• ^§
  SC = Satisfação por Compaixão

Os integrantes do GC seguiram a rotina da Unidade de Serviço dos bombeiros militares durante seis semanas. Responderam aos instrumentos de pesquisa no primeiro contato com os avaliadores e após seis semanas. Alguns, entretanto, encerraram a participação no estudo com um período médio de nove semanas, devido à indisponibilidade do participante no dia e horário em que o avaliador compareceu, além de questões de férias, viagens a trabalho e atestados de saúde prolongados.

Análise dos dados

Os dados foram analisados pelo software SPSS, versão 21, por meio de estatísticas descritivas, com uso de frequências absolutas e relativas, e medidas de tendência central (média, mediana, posto médio) e de variabilidade (amplitudes, desvio padrão, valor mínimo e máximo).

No desfecho primário, para analisar a média da diferença entre os escores dos GI (PEC) e GC (rotina da Unidade de Serviço), realizou-se a subtração das médias dos escores de cada um dos oito fatores de coping , pré e pós-intervenção ou rotina da Unidade de Serviço, em ambos os grupos. Aplicou-se o teste t de Student com correção de Welch para amostras independentes em sete fatores, exceto para a reavaliação positiva, que adotou o teste de Mann-Whitney para amostras independentes.

Para os desfechos secundários, na comparação entre as médias dos GI e GC para o estresse ocupacional, a FC, a SC, o burnout e a resiliência, calculou-se as médias das diferenças dos escores, obtidas após a subtração, pré e pós-intervenção ou rotina da Unidade de Serviço, em ambos os grupos. A análise da média da diferença foi realizada pelo teste de Mann-Whitney para amostras independentes.

Foram considerados todos os pressupostos necessários para a utilização dos testes paramétricos (t de Student com correção de Welch), tais como a homocedasticidade. Quando os pressupostos recomendados não foram atendidos, utilizou-se o teste baseado em postos de Mann-Whitney. Foi utilizado o teste de Shapiro-Wilk para avaliar a normalidade dos dados. As correlações de Pearson e Spearman foram utilizadas para avaliar as variáveis quantitativas quanto à variação do tempo entre as sessões da intervenção no GI. A análise da magnitude do efeito da intervenção foi avaliada por meio do coeficiente d de Cohen. Para todos os testes foi considerado um nível de significância de α ≤ 5%.

Aspectos éticos

A presente investigação foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (HC-UFTM), sob o parecer: 5.121.639/2021, Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE): 31313420.9.0000.8667. Foram mantidos os preceitos éticos de pesquisas envolvendo seres humanos da Resolução 466/12. A assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos participantes ocorreu em duas vias, houve esclarecimentos quanto aos objetivos do estudo e direitos dos participantes de desistir ou continuar o estudo. Cadastrado no Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (REBEC), código: RBR-8dmbzc.

Resultados

Dos 124 bombeiros elegíveis e randomizados, 24 não iniciaram a participação na pesquisa, pois cinco não atenderam aos critérios de inclusão, sete recusaram-se a participar do estudo, três foram transferidos da sede, seis aposentaram-se, um foi exonerado e dois tiveram afastamento de saúde. Dessa forma, participaram 51 bombeiros militares no GI e 49 no GC. Investigou-se a homogeneidade dos grupos quanto ao sexo (teste Qui-Quadrado de Pearson, p = 0,936), formação acadêmica (teste de Mann-Whitney, p = 0,221) e tempo de serviço no batalhão (teste t de Student, p = 0,709). Os grupos eram homogêneos para tais variáveis, ou seja, não foram constatadas diferenças nas características sociodemográficas/econômicas e laborais ( Tabela 1 ).

Tabela 1
- Caracterização dos bombeiros segundo variáveis sociodemográficas/econômicas e laborais. Uberaba, MG, Brasil, 2022

Variável	GI * (n=51) n (%)	GC † (n=49) n (%)	Total (n=100) n (%)
Sexo
Masculino	44 (86,30)	42 (85,70)	86 (86,00)
Feminino	7 (13,70)	7 (14,30)	14 (14,00)
Faixa etária
20-29 anos	5 (9,80)	4 (8,20)	9 (9,00)
30-39 anos	32 (62,70)	33 (67,30)	65 (65,00)
40-49 anos	13 (25,50)	12 (24,50)	25 (25,00)
50-59 anos	1 (2,00)	0 (0,00)	1 (1,00)
Estado conjugal
Solteiro	4 (7,80)	8 (16,30)	12 (12,00)
Casado	38 (74,50)	30 (61,20)	68 (68,00)
Amasiado	7 (13,70)	8 (16,30)	15 (15,00)
Separado/Divorciado	2 (3,90)	3 (6,10)	5 (5,00)
Renda familiar ‡
Até 5 salários	10 (19,60)	9 (18,40)	19 (19,00)
6 a 9 salários	26 (51,00)	30 (61,20)	56 (56,00)
Mais de 10 salários	15 (29,40)	10 (20,40)	25 (25,00)
Formação acadêmica
Ensino médio	17 (33,30)	24 (49,00)	41 (41,00)
Ensino superior	28 (54,90)	18 (38,80)	47 (47,00)
Pós-graduação	61 (11,80)	6 (12,20)	12 (12,00)
Posto no batalhão de bombeiros
Capitão	3 (5,90)	0 (0,00)	3 (3,00)
Tenente	5 (9,80)	3 (6,10)	8 (8,00)
Sargento	18 (35,30)	20 (40,80)	38 (38,00)
Cabo	15 (29,40)	17 (34,70)	32 (32,00)
Soldado	10 (19,60)	9 (18,40)	19 (19,00)
Tipo de atividade desenvolvida atualmente
Operacional	28 (54,90)	32 (65,30)	60 (60,00)
Administrativa	16 (31,40)	9 (18,40)	25 (25,00)
Prevenção e vistoria	4 (7,80)	7 (14,30)	11 (11,00)
Teleatendimento	3 (5,90)	1 (2,00)	4 (4,00)
Carga horária semanal
24 a 32 horas	3 (5,90)	3 (6,10)	6 (6,00)
Até 48 horas	34 (66,70)	40 (81,60)	74 (74,00)
De 48 a 72 horas	13 (25,50)	6 (12,20)	19 (19,00)
Mais de 72 horas	1 (2,00)	0 (0,00)	1 (1,00)
Tempo de serviço no batalhão
Até 5 anos	5 (9,80)	4 (8,20)	9 (9,00)
6 a 10 anos	10 (19,60)	11 (22,4)	21 (21,00)
11 a 15 anos	24 (47,10)	23 (46,90)	47 (47,00)
16 a 20 anos	5 (9,80)	8 (16,30)	13 (13,00)
Acima de 21 anos	7 (13,70)	3 (6,10)	10 (10,00)

• ^*
  GI = Grupo Intervenção;
• ^†
  GC = Grupo Controle;
• ^‡
  Salário mínimo, Brasil, 2022, R$ 1.212,00

Os fatores de coping estatisticamente significativos foram o suporte social ( p = 0,009), a aceitação da responsabilidade ( p = 0,03), a resolução de problemas ( p = 0,05) e a reavaliação positiva ( p = 0,05). Os fatores de confronto ( p = 0,73), afastamento ( p = 0,77), autocontrole ( p = 0,06) e fuga-esquiva ( p = 0,24) não sofreram significância estatística. O d de Cohen apresentou magnitude do efeito da intervenção moderada para o escore do fator suporte social (d = 0,54) ( Tabela 2 ).

Tabela 2
- Medidas de tendência central e variabilidade para os GI ^* e GC ^† , segundo os escores da diferença (pré e pós) dos fatores do Inventário de Estratégias de Coping . Uberaba, MG, Brasil, 2022

Fatores de coping	Média DP ‡	Mediana	AI §	p	d ||
Confronto
GI *	1,14±2,63	1,00	3,00	0,73 ¶	0,07
GC †	1,35±3,28	1,00	6,00
Afastamento
GI *	0,41±3,85	0,00	4,00	0,77 ¶	0,06
GC †	0,20±3,31	0,00	3,00
Autocontrole
GI *	1,82±3,33	2,00	5,00	0,06 ¶	0,39
GC †	0,43±3,85	1,00	5,00
Suporte social
GI *	2,12±3,10	2,00	4,00	0,009 ¶	0,54
GC †	0,53±2,79	0,00	3,00
Aceitação da responsabilidade
GI *	1,27±2,33	1,00	2,00	0,03 ¶	0,44
GC †	0,22±2,40	0,00	3,00
Fuga-esquiva
GI *	-0,04±2,82	0,00	2,00	0,24 ¶	0,24
GC †	-0,78±3,37	-1,00	4,00
Resolução de problemas
GI *	2,20±3,82	1,00	4,00	0,05 ¶	0,40
GC †	0,73±3,50	1,00	5,00
Reavaliação positiva
GI *	2,69±3,06	3,00	3,00	0,05 **	0,36
GC †	1,45±3,93	1,00	4,00

• ^*
  GI = Grupo Intervenção;
• ^†
  GC = Grupo Controle;
• ^‡
  DP = Desvio-Padrão;
• ^§
  AI = Amplitude Interquartil;
• ^||
  d = d de Cohen;
• ^¶
  Test T;
• ^**
  Teste Mann-Whitney

O PEC não foi estatisticamente significante nos desfechos secundários, ou seja, não reduziu os escores de estresse ocupacional ( p = 0,42), FC ( p = 0,57), burnout ( p = 0,67), SC ( p = 0,52) e resiliência ( p = 0,68) ( Tabela 3 ).

A análise correlacional indicou que os escores de coping e o número de dias não interferiram na condução da intervenção, mostrando correlações que não foram estatisticamente significantes, sendo o suporte social: r = 0,001; p = 0,99 ( Pearson ) e r = 0,03; p = 0,83 (Spearman).

Tabela 3
- Diferença dos escores de estresse ocupacional, FC ^* , SC ^† , burnout e resiliência (pré e pós), entre o GI ^‡ e GC ^§ . Uberaba, MG, Brasil, 2022

Desfechos secundários	Mediana	Posto médio	DP ||	AI ¶	p **
Estresse ocupacional
GI ‡	0,00	52,81	13,90	12,00	0,42
GC §	-1,00	48,09	10,02	10,00
Fadiga por compaixão
GI ‡	0,00	52,13	6,64	6,00	0,57
GC §	0,00	48,81	5,36	5,00
Satisfação por compaixão
GI ‡	0,00	52,33	5,88	7,00	0,52
GC §	-1,00	48,59	8,90	10,00
Burnout
GI ‡	0,00	49,31	2,22	3,00	0,67
GC §	0,00	51,73	2,16	2,00
Resiliência
GI ‡	0,00	49,33	3,31	2,00	0,68
GC §	0,00	51,71	3,80	4,00

• ^*
  FC = Fadiga por Compaixão;
• ^†
  SC = Satisfação por Compaixão;
• ^‡
  GI = Grupo Intervenção;
• ^§
  GC = Grupo Controle;
• ^||
  DP = Desvio-Padrão;
• ^¶
  AI = Amplitude Interquartil;
• ^**
  p = Teste Mann-Whitney

Discussão

O PEC apresentou aumento tanto nas estratégias de coping focadas no problema – a exemplo da resolução de problemas – quanto nas estratégias focadas na emoção – como a aceitação da responsabilidade e a reavaliação positiva, e o suporte social que faz parte dos dois enfoques. Tais enfrentamentos destacam-se como importantes na condução de um evento de estresse ^{( 19 )} .

Não houve significância estatística para: confronto, autocontrole, afastamento e fuga-esquiva. Era esperado que a intervenção não alcançasse resultados significativos em estratégias de coping focadas na emoção, como, por exemplo, as associadas ao comportamento evitativo de afastamento e fuga-esquiva ^{( 19 )} , pois estão relacionadas ao Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) e à SB ^{( 38 )} .

A intervenção não apresentou eficácia sobre o estresse ocupacional, FC, burnout , SC e resiliência, refutando a hipótese inicial da pesquisa. Os resultados não significativos para os desfechos secundários não eram previstos, pois o aumento de estratégias de coping é considerado favorável para a redução do estresse no trabalho ^{( 27 - 28 )} , mesmo em um público que vivencia eventos traumáticos e diferenciados rotineiramente.

Dentre os fatores que sofreram efeito positivo do PEC, a aceitação da responsabilidade é uma estratégia em que o indivíduo aceita a realidade do problema e acredita na sua responsabilidade pelo evento; a resolução de problemas envolve o planejamento para resolver questões baseada em planos e ações ^{( 19 )} . A reavaliação positiva é uma estratégia cognitiva para reestruturar o acontecimento, amenizar os danos emotivos e procurar resolução ^{( 19 )} .

A adoção de estilos de enfrentamento positivos e a resolução das situações estressantes entre bombeiros, assim como a promoção do apoio social, contribuem para reduzir atitudes evitativas geralmente relacionadas ao TEPT e à SB ^{( 38 )} .

Uma investigação realizada com 987 socorristas em Estados da América do Norte e do Sul – nos Estados Unidos, Ilhas Virgens e Porto Rico – apontou que estratégias de regulação emocional são ferramentas eficazes no processo adaptativo e reduzem o risco de sintomas de TEPT, ansiedade e depressão ^{( 39 )} . A reavaliação cognitiva, a expressão de emoções e a comunicação adequada colaboraram para o desenvolvimento da resiliência ^{( 39 )} .

Verificou-se que o fator suporte social, caracterizado pela busca de apoio de pessoas próximas para resolver o problema, como familiares e amigos ^{( 19 )} , foi o mais expressivo neste estudo. A magnitude do efeito da intervenção para esse fator foi moderada, ou seja, os bombeiros do GI aumentaram o uso de estratégias de coping nas situações de estresse por eles vivenciadas. Por representar a estratégia mais efetiva do estudo e considerando a importância dessa ferramenta na literatura científica internacional ^{( 40 )} , será dada ênfase ao suporte social.

As estratégias de coping focadas no problema e na emoção estão positivamente relacionadas e, quando combinadas, exercem um papel eficaz no comportamento da emoção, de forma que uma completa a outra no processo geral do enfrentamento ^{( 41 )} . Assim, contribuem para aliviar os efeitos negativos dos estressores à saúde mental ^{( 41 )} .

O fortalecimento do apoio social é uma medida protetora contra os malefícios dos estressores psicossociais de bombeiros, que afetam a saúde e o bem-estar ^{( 40 )} . O suporte organizacional e, principalmente, o apoio social podem contribuir até mesmo para a redução de sintomas de ideação suicida ^{( 16 )} . Entre bombeiros, o fortalecimento do relacionamento interpessoal de qualidade, em casa e no trabalho, reduz os efeitos do estresse laborativo ^{( 42 )} , beneficiando-os.

Um estudo realizado com 828 profissionais de segurança pública do Canadá, o qual objetivou identificar as estratégias de coping adaptativas em resposta às exposições repetidas de estressores ocupacionais, mostrou que as estratégias mais enfatizadas foram aquelas envolvendo educação, autoconfiança, tratamento baseado em evidências e apoio dos colegas e chefias ^{( 18 )} . Os participantes expressaram que gostariam do apoio e interesse de seus empregadores nas questões de saúde mental antes, durante e após as exposições traumáticas ^{( 18 )} , o que demonstra a necessidade de intervir nesse fator, que foi o mais utilizado na presente pesquisa.

Investigação realizada no Canadá com 4.820 profissionais de segurança pública mostrou que os estressores ocupacionais estão relacionados com transtornos mentais, e que eventos psicologicamente traumáticos na carreira são inevitáveis, por isso conclamam os apoios políticos ^{( 43 )} . Os estressores organizacionais e operacionais como o apoio da liderança, a redução do estigma, a melhoria do sono e do ambiente social são modificáveis ^{( 43 )} . Dessa forma, é preciso propor mudanças com o objetivo de reduzir suas repercussões e favorecer a saúde mental do trabalhador ^{( 43 )} . Mais uma vez, o suporte social aparece como estratégia funcional na administração do estresse, quando se refere ao apoio da liderança e melhora do ambiente social.

O aumento do suporte social encontra-se associado à menor propensão de TEPT e sintomas depressivos ^{( 44 )} . No Canadá, um estudo que envolveu 4.238 profissionais de segurança pública, dos quais 592 eram bombeiros, evidenciou que, para cada aumento na pontuação de apoio social, ocorria uma redução de 7% a 10% na probabilidade para TEPT e de 11% a 15% para depressão ^{( 44 )} . Portanto, percebe-se que essa estratégia influencia a saúde mental do trabalhador de forma positiva.

Entretanto, em outro estudo, o efeito do apoio social foi considerado estável em longo prazo, pois o suporte adequado de familiares e amigos é reconhecido como benéfico entre os profissionais de segurança pública ^{( 45 )} . Acrescenta-se que, por exercerem atividade de trabalho de caráter coletivo, a cooperação de colegas e supervisores também contribui para aliviar o desgaste mental no trabalho ^{( 45 )} . Os achados indicam que o apoio social proporciona motivação para que o indivíduo enfrente o estresse vivenciado de forma mais adaptativa ^{( 45 )} .

A implementação de intervenções psicológicas com vistas ao desenvolvimento do apoio social em corporações de bombeiros para minimizar o burnout é vista como crucial ^{( 45 )} . Ainda, o aconselhamento em grupo é uma estratégia efetiva para reduzir os estressores ocupacionais ^{( 45 )} .

Em suma, o apoio social, estratégia mais eficaz do PEC, foi apontado na literatura científica como mediador do estresse ocupacional ^{( 39 , 45 )} e fator de proteção para estressores psicossociais de bombeiros ^{( 40 )} , relacionado à redução de distúrbios mentais provenientes do estresse ^{( 16 )} , como burnout ^{( 45 - 46 )} , atitudes evitativas geralmente relacionadas ao TEPT e à SB ^{( 38 )} e redução de pensamentos suicidas ^{( 16 )} .

O apoio social mitiga o surgimento de transtornos mentais e a implementação deste nas instituições pode favorecer a resiliência, além de ser uma proposta de promoção à saúde que pode firmar o apoio real ^{( 44 )} e facilitar as ligações entre famílias e amigos ^{( 44 , 47 )} . Tais evidências indicam que a estratégia pode ter aplicabilidade para o público deste estudo.

Embora o burnout não tenha sido o desfecho principal desta pesquisa e o PEC não tenha tido impacto direto em significância, a literatura mostra que a base do suporte social tem efeito na SB, e também está associada à redução de estresse ocupacional ^{( 43 )} . Assim, pode favorecer o desenvolvimento da resiliência e a regulação de sofrimentos psíquicos ^{( 41 )} .

As ações para o gerenciamento do estresse ocupacional, como as estratégias de coping, precisam ser continuadas, uma vez que os eventos traumáticos são variáveis e frequentes. O suporte social precisa ser melhor compreendido e trabalhado entre as equipes de segurança pública.

A limitação do estudo refere-se à impossibilidade de padronização do tempo da intervenção, uma vez que dependeu da disponibilidade de cada participante e da ausência de ocorrências no trabalho, pois a pesquisa foi realizada no ambiente laboral. Mesmo assim, os participantes do GI receberam todas as atividades do PEC. Ainda, o local de realização da presente investigação dependeu do recurso disponível nas unidades de trabalho, sendo adaptado, quando cabível, para manter o sigilo adequado e a comodidade. Outro aspecto é sobre o tempo de coleta e a dificuldade de controle das situações que poderiam ter ocorrido nesse período, que podem interferir na resposta de coping dos participantes. No entanto, apesar das limitações identificadas, esses aspectos não afetaram a adesão do participante nem a continuidade da pesquisa.

Como implicações para o avanço do conhecimento científico para a área de saúde e Enfermagem, trata-se de um estudo sobre as estratégias de coping no contexto de saúde do trabalhador, sobretudo de bombeiros militares. O estresse ocupacional está associado negativamente à saúde mental e física, sendo apontada, na literatura científica, a necessidade de métodos para seu gerenciamento. Esta investigação contribui para o avanço da Enfermagem por se tratar de uma intervenção baseada na NIC que contempla intervenções próprias do enfermeiro.

Conclusão

A intervenção PEC mostrou-se eficaz no aumento de estratégias de coping focadas no problema (suporte social e resolução de problemas) e nas estratégias focadas na emoção (aceitação da responsabilidade e reavaliação positiva). O suporte social, pertencente às duas estratégias, merece destaque como perspectiva no gerenciamento do estresse, pois apresentou magnitude do efeito moderada e representa uma alternativa na administração de estressores laborais.

Considerando a importância do suporte social na literatura científica como promotor de saúde mental, este estudo recomenda o investimento na estratégia por parte das corporações de bombeiros. Contudo, mais estudos são necessários em áreas e com profissionais distintos ao da presente pesquisa, para que se possa conhecer o alcance de estratégias de coping para redução e gerenciamento do estresse ocupacional, principalmente em trabalhadores que experienciam eventos traumáticos constantes e inevitáveis, como os bombeiros.

Agradecimentos

Agradecemos a Evânio Coimbra Rosa pela colaboração na fase de coleta de dados.

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• ^*
  Artigo extraído da tese de doutorado “Eficácia de uma intervenção sobre o manejo de estresse ocupacional em bombeiros militares: ensaio clínico randomizado”, apresentada à Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Brasil.
• Todos os autores aprovaram a versão final do texto.
• Como citar este artigo
  Coimbra MAR, Ikegami EM, Souza LA, Haas VJ, Barbosa MH, Ferreira LA. Efficacy of a program in increasing coping strategies in firefighters: randomized clinical trial. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2024;32:e4179 [cited ano mês dia]. Available from: URL . https://doi.org/10.1590/1518-8345.6807.4179

Editado por

Editor Associado:

Ricardo Alexandre Arcêncio

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Jun 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  11 Abr 2023
• Aceito
  02 Fev 2024