EDITORIAL
Apud
Ana Cecília Magtaz; Manoel Tosta Berlinck
"Apud" é uma palavra latina empregada em bibliografia para designar a origem de uma citação indireta.
Serve para o autor se referir a um texto considerado inacessível e que é citado por outro autor.
Trata-se de um recurso que deve ser utilizado com muita parcimônia e depois de um genuíno esforço de pesquisa da citação direta.
A suposta inacessibilidade do texto citado é sempre relativa já que ele foi citado por um autor que a ele teve acesso.
Frequentemente, as revistas brasileiras publicam artigos contendo citações indiretas através do recurso do "apud". Por exemplo, "Falret apud Pereira" ou "Lasègue apud Magtaz" indicam que o autor cita Falret de acordo com o texto de Pereira ou Lasègue de acordo com o texto de Magtaz. Entretanto, Pereira e Magtaz citam Falret e Lasègue tendo acesso aos textos desses autores.
Ora, o autor que utiliza o "apud' referindo-se a textos acessíveis (e, hoje, um grande número de textos da literatura psicopatológica são acessíveis) está com preguiça de pesquisar.
Nada contra a preguiça. Mas, a pesquisa científica não deve ser regida pela preguiça.
Em primeiro lugar, quem foi que disse que Pereira fez uma leitura correta de Falret ou que Magtaz traduz com propriedade o pensamento de Lasègue? Quando um autor é citado ele foi lido e, portanto, interpretado pelo autor que cita. O recurso ao "apud" neste caso serve para abrir mão da leitura de textos que podem levar o pesquisador a outras linhas de pensamento. Trata-se, portanto, de um comodismo da pesquisa e do pensamento.
Em segundo lugar, um argumento que lança mão de citações secundárias é fraco, pois não explora com precisão o pensamento do autor citado pela escrita de outro autor. Em outras palavras, revela um empobrecimento da investigação.
Finalmente, não menos importante, o recurso ao "apud" assemelha-se à fofoca, algo da ordem do disse me disse sem nenhum cuidado com a fonte original da informação.
Graças à expansão do acervo das bibliotecas, das bases de dados, dos periódicos, como a Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, e da internet, a literatura psicopatológica clássica tornou-se acessível.
Além disso, os pesquisadores em psicopatologia precisam ler bem textos em francês, inglês, espanhol e alemão.
Não há, pois, desculpas para o uso licencioso das citações secundárias. E tanto os editores, quanto os consultores das revistas científicas, devem coibir este recurso e estimularem os autores a buscarem e lerem textos que citam pela escrita de terceiros.
ANA CECÍLIA MAGTAZ
Psicóloga, psicanalista, Doutora pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP/Br.), Professora do Curso de Especialização em Psicopatologia e Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP/Br.), Diretora Administrativa da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental - AUPPF, Editora Associada do Latin American Journal of Fundamental Psychopathology Online, autora de diversos artigos.
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MANOEL TOSTA BERLINCK
Sociólogo, psicanalista, Ph.D. (Cornell University, Ithaca, N.Y., USA), Professor Titular da Universidade Estadual de Campinas (1972-1992) (UNICAMP, Campinas, SP/Br.), Professor do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP/Br.), onde dirige o Laboratório de Psicopatologia Fundamental, presidente da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental - AUPPF (2002-2010), Diretor da Editora Escuta (1986-2009), Diretor da Livraria Pulsional (1986-2009), consultor editorial, editor responsável da Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, membro da World Association of Medical Editors - WAME (Associação Mundial de Editores Médicos), autor de Psicopatologia Fundamental (São Paulo: Escuta, 2000) e de Erotomania, com German E. Berrios (São Paulo: Escuta, 2009), entre outros livros e numerosos artigos.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
28 Maio 2010 -
Data do Fascículo
Mar 2010