As pilhas a combustível de óxido sólido - PaCOS - representam um dispositivo excepcionalmente eficiente para a geração de eletricidade e calor. Quando alimentadas com hidrogênio ou com o reformado da reforma a vapor do metano, possuem anodo convencional que utiliza o óxido de níquel como eletrocatalisador. Esse material vem sendo utilizado há muitos anos na composição do anodo das PaCOS e atende aos principais requisitos desse componente, principalmente no que se refere à compatibilidade mecânica, à estabilidade química e à condutividade eletrônica [1[1] MINH, N. Q., System technology for solid oxide fuel cells, in Fuel Cell Science and Engineering, Materials, Processes, Systems and Technology, v. 2, In: Stolten, D., Emonts, B. (eds), Weinheim, Germany, Wiley-VCH, pp. 963-1010, 2013. ]. Entretanto, outros requisitos são requeridos quando se deseja fazer uso de combustíveis carbonosos [2[2] MIRANDA, P. E. V., "Materiais para um Novo Paradigma da Indústria Química", Matéria, v.20, n.3, 2015.] ou quando é necessário o uso de anodos multifuncionais [3[3] MIRANDA, P. E. V., "Síntese de Eletrocatalisadores Cerâmicos Nanométricos", Matéria, v.20, n.4, pp.I-IV, 2015.]. Além disso, a tendência atual é de utilizar anodos com condutividade mista, isto é, que sejam capazes de simultaneamente conduzir elétrons e íons oxigênio, o que aumenta a dimensão e a efetividade das regiões de triplas fases, onde as principais reações eletroquímicas de interessem ocorrem.
O anodo convencional de PaCOS composto de óxido de níquel sobre eletrólito de zircônia estabilizada com ítria - ZEI - é reduzido a níquel metálico na temperatura de operação da PaCOS, o qual atua como eletrocatalisador para a oxidação do combustível, produzindo elétrons. Devido a falhas na operação do dispositivo ou em eventuais paradas para manutenção ele reoxida-se, formando novamente o óxido de níquel. Esses ciclos de oxi-redução gera variações volumétricas com o consequente surgimento de trincas no eletrólito. Tal problema foi resolvido misturando-se o óxido de níquel com ZEI [4[4] KLEMENSOE, T., CHUNG, C., LARSEN, P. H., et al. "The Mechanism Behind Redox Instability of Anodes in High-Temperature SOFCs", Journal of the Electrochemical Society, v.152, n.11, pp. A2186-A2192, 2005.].
Recentemente [5[5] VENÂNCIO, S.A., MIRANDA, P. E. V., "Solid oxide fuel cell anode for the direct utilization of ethanol as a fuel", Scripta Materialia, v.65, n.2, pp. 1065-1068, 2011.], o uso do Aluminato de Cério, CeAlO3, como eletrocatilisador em anodo de PaCOS com condutividade mista revelou uma transformação reversível similar àquela antes observada para o anodo convencional à base de óxido de níquel. A Figura 1 ilustra esse comportamento para o anodo convencional condutor eletrônico, constituído de NiO/ZEI quando oxidado, ou de Ni/ZEI quando reduzido, assim como para o anodo cerâmico condutor misto, constituído de Céria-Alumina, quando em atmosfera oxidante ou de Aluminato de Cério, quando em atmosfera redutora, durante a operação normal da pilha a combustível. Esse mecanismo de transformação reversível de fases do eletrocatalisador cerâmico é particularmente interessante devido à mudança de cargas envolvida no processo, já que o cério tem valência +3 no aluminato de cério e valência +4 na céria. Isso é o que está indicado na Figura 2, que mostra a célula unitária tetragonal com estrutura da perovskita do aluminato de cério, Fig.2.a, e a célula unitária cúbica da céria, Fig.2.b. Essa mudança de carga influencia diretamente a capacidade de armazenamento de íons O-2, o que é importante para a cinética das reações eletroquímicas de interesse.
Verificou-se, entretanto, que as densidades de potência atingidas na operação da PaCOS ainda eram insuficientes e que o dispositivo requer uma maior capacidade de armazenamento e liberação de íons oxigênio, tendo sido neste caso também proposta a mistura do eletrocatalisador ativo com ZEI com partícula de tamanho nanométrico [6[6] MIRANDA, P. E. V., VENÂNCIO, S.A., SARRUF, B. J. M., et al., "Direct Utilization of Ethanol in Solid Oxide Fuel Cells: Preparation and Characterization of CeO2-Al2O3 Based Anodes", Presented at the 40th, International Conference and Exposition on Advanced Ceramics and Composites, Daytona Beach, Fl, USA, Jan. 24-29, 2016.]. A razão de realizar tal mistura aqui não foi, contudo, com o objetivo de controlar variações volumétricas do anodo, como feito para o anodo a base de óxido de níquel. Foi encontrada a possibilidade de formar fases do tipo ZrxCe1-xO2 ao invés do aluminato de cério, que permitem ativar um mecanismo de transferência de carga com a absorção de lacunas de oxigênio, situação na qual o íon de cério assume a valência Ce+4, e a emissão de espécies de reação, quando o íon de cério passa a ter valência Ce+3, conforme representado esquematicamente na Figura 3.
O novo anodo cerâmico obtido da mistura de aluminato de cério com ZEI nanométrica produziu fases do tipo ZrxCe1-xO2 nas quais os pequenos íons de zircônio, Zr+4, substituem os íons de cério de maior diâmetro, Ce+4, o que contribui para aumentar a capacidade de armazenamento de oxigênio e aumenta a cinética das reações eletroquímicas desejadas na pilha a combustível de óxido sólido.
A discussão de mecanismos fundamentais que permitam esclarecer comportamentos de materiais em dispositivos para aplicações na área de energia são de especial interesse da revista Matéria.
Transformação reversível de fases no anodo de uma PaCOS: a) convencional, condutor eletrônico, composto de óxido de níquel e zircônia estabilizada com ítria; b) cerâmico, condutor misto, eletrônico-iônico, composto de aluminato de cério.
a) Célula unitária tetragonal com estrutura da perovskita do aluminato de cério; e b) célula unitária cúbica da céria, com indicação do posicionamento relativo dos íons Ce+3, Ce+4, Al+3 e O-2.
BIBLIOGRAPHY
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[1]MINH, N. Q., System technology for solid oxide fuel cells, in Fuel Cell Science and Engineering, Materials, Processes, Systems and Technology, v. 2, In: Stolten, D., Emonts, B. (eds), Weinheim, Germany, Wiley-VCH, pp. 963-1010, 2013.
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[2]MIRANDA, P. E. V., "Materiais para um Novo Paradigma da Indústria Química", Matéria, v.20, n.3, 2015.
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[3]MIRANDA, P. E. V., "Síntese de Eletrocatalisadores Cerâmicos Nanométricos", Matéria, v.20, n.4, pp.I-IV, 2015.
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[4]KLEMENSOE, T., CHUNG, C., LARSEN, P. H., et al. "The Mechanism Behind Redox Instability of Anodes in High-Temperature SOFCs", Journal of the Electrochemical Society, v.152, n.11, pp. A2186-A2192, 2005.
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[5]VENÂNCIO, S.A., MIRANDA, P. E. V., "Solid oxide fuel cell anode for the direct utilization of ethanol as a fuel", Scripta Materialia, v.65, n.2, pp. 1065-1068, 2011.
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[6]MIRANDA, P. E. V., VENÂNCIO, S.A., SARRUF, B. J. M., et al., "Direct Utilization of Ethanol in Solid Oxide Fuel Cells: Preparation and Characterization of CeO2-Al2O3 Based Anodes", Presented at the 40th, International Conference and Exposition on Advanced Ceramics and Composites, Daytona Beach, Fl, USA, Jan. 24-29, 2016.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar 2016