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Aspectos metodológicos e éticos da avaliação da maturação sexual de adolescentes

Resumos

OBJETIVO

Analisar os aspectos metodológicos e éticos na avaliação da maturação sexual em adolescentes.

FONTES DE DADOS

Livros e teses, artigos e legislações encontrados nas bases Medline, SciELO e Science Direct, além de documentos de instituições como a Organização Mundial da Saúde e as Sociedades Brasileira e Paulista de Pediatria. Considerou-se o período de 1962 a 2012. Utilizaram-se as palavras-chave em português e inglês: "maturidade sexual", "auto-avaliação", "ética", "avaliação clínica da maturação sexual", "puberdade", "adolescente" e "desenvolvimento do adolescente".

SÍNTESE DOS DADOS

A avaliação da maturação sexual é usada em estudos populacionais e em atendimento clínico, sendo a avaliação direta realizada por médico especializado e a autoavaliação realizada pelo próprio adolescente. Deve-se realizar essa avaliação em local adequado, de forma cuidadosa e ética, não constrangendo o paciente. Deve-se sempre manter a privacidade do adolescente e respeitar a confidencialidade. Antes da avaliação, independentemente do método usado, o adolescente deverá ser informado e esclarecido sobre o procedimento e os instrumentos que serão utilizados, tendo o direito de querer ou não um responsável junto a ele.

CONCLUSÕES

Os estudos de validação da autoavaliação mostraram que esta é inferior à avaliação clínica e, por isso, deve ser realizada apenas quando não for possível o exame direto por um médico.

puberdade; ética; adolescente; desenvolvimento do adolescente; maturidade sexual; autoavaliação


OBJECTIVE

To analyze methodological and ethical aspects in the sexual maturation assessment of adolescents.

DATA SOURCES

Books and theses, articles and legislations on the Medline, SciELO, Science Direct databases, besides institutional documents of the World Health Organization and the Pediatric Societies of Brazil and São Paulo, considering the period from 1962 to 2012. The following keywords were used in Portuguese and English: "sexual maturation", "self-assessment", "ethics", "OBJECTIVE assessment of sexual maturation", "puberty", "adolescent", and "adolescentdevelopment".

DATA SYNTHESIS

The sexual maturation assessment is used in populatinal studies and in clinical daily care. The direct evaluation is performed by a specialized physician, whereas the self-assessment is carried out by the adolescent. This evaluation should be carefully performed in the appropriate place, taking into account the ethical aspects. The patient should not be constrained and the physician must respect the privacy and the confidentiality. Before this evaluation and independently of the used method, the adolescent should receive information and explanation about the procedure and the tools that will be applied. Furthermore, the patient has the right to want or not an adult close to him.

CONCLUSIONS

Validation studies showed that self-assessment is inferior to clinical assessment and should, therefore, be performed only when the direct examination by physicians is not possible.

puberty; ethics; adolescent; adolescent development; sexual maturation; self-assessment


OBJETIVO

Analizar los aspectos metodológicos y éticos en la evaluación de la maturación sexual en adolescentes.

FUENTES DE DATOS

Libros y tesis, artículos y legislaciones encontrados en las bases Medline, SciELO y Science Direct, además de documentos de instituciones como la Organización Mundial de la Salud y las Sociedades Brasileña y Paulista de Pediatría. Se consideró el periodo de 1962 a 2012.Se utilizaron las palabras clave en portugués e inglés: "madurez sexual", "autoevaluación", "ética", "evaluación clínica de la maturación sexual", pubertad, "adolescente" y "desarrollo del adolescente".

SÍNTESIS DE LOS DATOS

La evaluación de la maturación sexual se usa en estudios poblacionales y en atención clínica, siendo la evaluación directa realizada por médico especializado y la autoevaluación realizada por el adolescente mismo. Se debe realizar esa evaluación en local adecuado, de modo cuidadoso y ético, no constriñendo al paciente. Se debe siempre mantener la privacidad del adolescente y respetar la confidencialidad. Antes de la evaluación, independiente del método usado, el adolescente deberá ser informado y aclarado sobre el procedimiento y los instrumentos que serán utilizados, teniendo el derecho de querer o no un responsable junto de sí.

CONCLUSIONES

Los estudios de validación de la autoevaluación mostraron que ésta es inferior a la evaluación clínica y, por ello, se debe realizarla solamente cuando no sea posible el examen directo por un médico.

pubertad; ética; adolescente; desarrollo del adolescente; madurez sexual; autoevaluación


Introdução

A adolescência é o período de transição da infância para a idade adulta, que compreende a faixa de dez a 19 anos, caracterizada por intensas transformações biopsicossociais( 11. World Health Organization. Nutrition in adolescence - issues and challenges for the health sector: issues in adolescent health and development. Geneva: WHO; 2005. ) e influenciada pela realidade do indivíduo, por contextos sociais e culturais( 22. Saito MI. Adolescência, cultura, vulnerabilidade e risco. Pediatria (São Paulo) [serial on the Internet]. 2000;22(3) [cited 2012 Dec 20]. Available from: http://www.pediatriasaopaulo.usp.br/upload/html/473/body/01.htm
Available from: http://www.pediat...
, 33. Brasil - Ministério da Saúde. Secretaria de atenção à saúde - área de saúde do adolescente e do jovem. Marco legal: saúde, um direito de adolescentes. [Série A - Normas e Manuais Técnicos]. Brasília: Ministério da Saúde, 2005. ), podendo ser vivenciada de forma diferente entre os membros da mesma família( 11. World Health Organization. Nutrition in adolescence - issues and challenges for the health sector: issues in adolescent health and development. Geneva: WHO; 2005. ).

"A puberdade refere-se ao período de transição biológica entre a infância e a vida adulta, variando de indivíduo para indivíduo quanto à idade de seu início e velocidade das mudanças, período no qual as características sexuais secundárias começam a se desenvolver e a capacidade de reprodução sexual é atingida"( 44. Adami F. Obesidade e maturação sexual precoce: um estudo transversal com escolares em Florianópolis - SC [tese de mestrado]. Florianópolis (SC): UFSC; 2007. ). A maturação sexual é biológica e pode ser definida como a progressão em direção ao estado maduro, quando ocorrem a especialização e a diferenciação celular( 55. Malina R, Bouchard C. Growth, maturation, and physical activity. Champaign: Human Kinetics; 1991. , 66. Rogol AD, Roemmich JN, Clark PA. Growth at puberty. J Adolesc Health 2002;31 (Suppl 6):192-200. ).

A avaliação da maturação sexual é importante em estudos populacionais e no atendimento clínico. A idade da menarca e os estágios de maturação sexual propostos por Tanner( 77. Tanner JM. Growth at adolescence. Oxford: Blackwell; 1962. ) são os métodos mais utilizados para avaliar a maturação sexual. A avaliação direta da maturação sexual é feita por um médico especializado e devidamente treinado. Já, na autoavaliação, o indivíduo deve indicar qual estágio mais se assemelha ao que ele se encontra, sendo mais subjetiva, pois depende da avaliação do próprio indivíduo. Porém, ambos os métodos apresentam limitações e devem ser realizados de forma cuidadosa em ambiente próprio, do ponto de vista ético, não constrangendo o paciente e mantendo a privacidade do indivíduo avaliado.

Este artigo de revisão analisou os aspectos metodológicos e éticos da avaliação da maturação sexual de adolescentes, abordando mudanças que ocorrem na puberdade, métodos de avaliação da maturação sexual, validação da autoavaliação e fatores éticos relacionados a essa avaliação.

Método

Realizou-se a revisão de literatura com base em periódicos nacionais e internacionais, livros e teses, além de documentos de instituições, como a Organização Mundial de Saúde e as Sociedades Brasileira e Paulista de Pediatria, que abordam assuntos relacionados à maturação sexual e aos aspectos éticos envolvidos no processo. As bases consultadas foram Medline, SciELO e Science Direct, buscando-se o período de 1962 a 2012. A data inicial refere-se ao estudo de Tanner( 77. Tanner JM. Growth at adolescence. Oxford: Blackwell; 1962. ), que propôs a avaliação da maturação sexual por estágios de desenvolvimento. As palavras-chave utilizadas na busca dos artigos foram: "maturidade sexual" ("sexual maturation"), "auto-avaliação" ("self-assessment"), "puberdade" ("puberty"), "ética" ("ethics"), "adolescente" ("adolescent") e "desenvolvimento do adolescente" ("adolescent development"). Além dessas, utilizou-se também o termo "avaliação clínica da maturação sexual" ("objective assessment of sexual maturation") na busca de artigos referentes às Sociedades Brasileira e Paulista de Pediatria, pela maior facilidade de se encontrarem artigos relacionados ao tema a partir desse termo. Na busca dos artigos, após inclusão dos descritores em conjunto, encontraram-se aproximadamente 300 referências relacionadas ao tema. Logo após a análise dos artigos, optou-se pela utilização de 36 referências mais importantes, incluindo artigos, teses e documentos das sociedades brasileira e internacional.

Revisão de literatura

Puberdade

A puberdade é definida por uma série de eventos maturacionais inter-relacionados, que promovem mudanças corporais (estirão pubertário) e desenvolvimento da função reprodutiva e dos caracteres sexuais secundários( 88. Silva AC, Adan LF. Growth in boys and girls with precocious puberty. Arq Bras Endocrinol Metab 2003;47:422-31. ). Nesse período, ocorre a maior diferenciação sexual desde a vida fetal e a mais rápida taxa de crescimento linear desde os primeiros anos de vida, além do ganho de estatura e peso( 66. Rogol AD, Roemmich JN, Clark PA. Growth at puberty. J Adolesc Health 2002;31 (Suppl 6):192-200. ).

A puberdade envolve o desenvolvimento de caracteres primários (nas meninas: ovário, útero e vagina; nos meninos: testículos, próstata e espermatogênese) e secundários (mamas, pênis, pelos pubianos, axilares e faciais e modificação da voz). No sexo masculino, o primeiro sinal da maturação sexual é o aumento do volume testicular e, no feminino, o desenvolvimento mamário, sendo a menarca considerada indicador de maturidade sexual, uma vez que ocorre, geralmente, no final da puberdade, em torno dos 12 e 13 anos( 66. Rogol AD, Roemmich JN, Clark PA. Growth at puberty. J Adolesc Health 2002;31 (Suppl 6):192-200. ).

Na puberdade, ocorrem modificações no padrão de secreção de vários hormônios, sendo que a ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal desencadeia, sob estímulo das gonadotrofinas, a secreção dos esteroides sexuais, predominantemente, a testosterona no sexo masculino e o estradiol no feminino, responsáveis pelas modificações morfológicas na puberdade( 99. Barbosa KB, Franceschini SC, Priore SE. Influence of the stages of sexual maturation in the nutritional status, anthropometrics and corporal composition of adolescents. Rev Bras Saude Mater Infant 2006;6:375-82. ).

Avaliação da maturação sexual

A sequência dos eventos puberais foi sistematizada por Tanner( 77. Tanner JM. Growth at adolescence. Oxford: Blackwell; 1962. ), que considerou o desenvolvimento mamário para o sexo feminino, o desenvolvimento da genitália externa para o masculino e o desenvolvimento dos pelos pubianos em ambos os sexos. Os critérios foram enumerados de um a cinco. Essa avaliação pode ser realizada por médico com experiência em adolescentes ou por autoavaliação, em que o adolescente identifica seu estágio de maturação com base em fotografias/figuras de Tanner.

Avaliação clínica versus autoavaliação

A avaliação direta pode ser feita apenas pela inspeção visual ou pela palpação, com uso comparativo de orquidômetro (para testículos), que aumentam a exatidão e a precisão. A obtenção de medidas por meio de orquidômetro e palpação torna-se importante, principalmente em pesquisas nas quais existem vários avaliadores, pois o uso dessas técnicas associado à padronização dos avaliadores pode minimizar o erro inerente à utilização de vários avaliadores, aumentando a confiabilidade inter e intra-avaliador( 55. Malina R, Bouchard C. Growth, maturation, and physical activity. Champaign: Human Kinetics; 1991. , 1010. Parent AS, Teilmann G, Juul A, Skakkebaek NE, Toppari J, Bourguignon JP. The timing of normal puberty and the age limits of sexual precocity: variations around the world, secular trends, and changes after migration. Endocr Rev 2003;24:668-93. ). O Quadro 1 apresenta as vantagens e as limitações dos dois métodos de avaliação da maturação sexual.

Quadro 1
Vantagens e limitações dos métodos de avaliação da maturação sexual

Validação da autoavaliação

Vários estudos realizaram a validação da autoavaliação da maturação sexual, comparada à avaliação por médico, como observado no Quadro 2.

Quadro 2
Estudos de validação da autoavaliação da maturação sexual

A Organização Mundial da Saúde( 1717. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Technical Report Series, n. 854. Geneva: WHO; 1995. ) recomenda, para estudos populacionais, o uso de marcadores biológicos para o início e o final do estirão puberal, que ocorrem, aproximadamente, um ano antes e um ano após o pico de velocidade de crescimento. Para as meninas, considera-se a menarca e o estágio dois do desenvolvimento mamário e, para os meninos, o estágio três do desenvolvimento da genitália e a mudança do timbre de voz. Alguns estudos também avaliam a maturação sexual no sexo masculino levando em conta a presença de pelos axilares e faciais, uma vez que ocorrem mais tardiamente, em geral dois ou três anos após o aparecimento dos pelos pubianos( 1818. Colli AS. Crescimento e desenvolvimento físico do adolescente. In: Maakaroun MF, Souza RP, Cruz AR, editors. Tratado de adolescência: um estudo multidisciplinar. Rio de Janeiro: Cultura Médica; 1991. p. 243-57. , 1919. Priore SE. Composição corporal e hábitos alimentares de adolescentes: uma contribuição à interpretação de indicadores do estado nutricional [tese de mestrado]. São Paulo (SP): Unifesp; 1998. ).

Estratégias que podem minimizar os erros do método de autoavaliação

Trabalho realizado na Tailândia por Wacharasindhu et al ( 2020. Wacharasindhu S, Pri-Ngam P, Kongchonrak T. Self-assessment of sexual maturation in Thai children by Tanner photograph. J Med Assoc Thai 2002;85:308-19. ) mostrou que a acurácia da autoavaliação foi melhor quando os pacientes tiveram mais tempo para realizá-la. Outro fator que pode melhorar a eficácia e a confiabilidade da autoavaliação é o uso de material gráfico mais bem elaborado, apesar de dois estudos semelhantes, de Martin et al ( 2121. Martin RH, Uezu R, Parra SA, Arena SS, Bojikian LP, Böhme MT. Auto-avaliação da maturação sexual masculina por meio da utilização de desenhos e fotos. Rev Paul Educ Fis 2001;15:212-22. ) e Bojikian et al ( 1515. Bojikian LP, Massa M, Martin RH, Teixeira CP, Kiss MA, Böhme MT. Females' self-assessment of sexual maturation. Rev Bras Ativ Fis Saude 2002;7:24-34. ), não mostrarem diferença na autoavaliação por meio de fotos ou desenhos em meninos e, posteriormente, em meninas.

Chan et al ( 2222. Chan NP, Sung RY, Kong AP, Goggins WB, So HK, Nelson EA. Reliability of pubertal self-assessment in Hong Kong Chinese children. J Paediatr Child Health 2008;44:353-8. ), ao compararem a autoavaliação realizada com desenhos explicativos dos estágios de Tanner à avaliação objetiva posterior por pessoal médico treinado, com 354 crianças e adolescentes chineses de oito a 18 anos, observaram evidências do uso de fotos como fator de melhor correlação na autoavaliação puberal. Vale destacar que não basta apenas melhorar o material gráfico, acrescentando textos explicativos, se não for considerada a limitação de capacidade intelectual ainda vigente em parcela considerável de nossa população, o que torna o desenvolvimento desse material uma tarefa mais complexa, como observam Guimarães e Passos( 2323. Guimarães JP, Passos AD. Analysis of agreement between self-assessment and observed classification of pubertal development among school girls. Rev Saude Publica 1997;31:263-71. ).

O cuidado maior em esclarecer previamente o avaliado leva à maior segurança para identificar o estágio de desenvolvimento do qual ele mais se aproxima( 2121. Martin RH, Uezu R, Parra SA, Arena SS, Bojikian LP, Böhme MT. Auto-avaliação da maturação sexual masculina por meio da utilização de desenhos e fotos. Rev Paul Educ Fis 2001;15:212-22. ).

Aspectos éticos na avaliação da maturação sexual

Os marcos legais que definem a adolescência ou o que significa ser um adulto são variados e acabam trazendo dificuldades no atendimento à saúde dos adolescentes, pois impedem que estes tenham clareza quanto aos seus direitos e deveres, o que pode gerar conflitos em situações que envolvem o direito à autonomia, à privacidade e à confidencialidade( 2424. Taquette SR, Vilhena MM, Silva MM, Vale MP. Ethical conflicts in health care for adolescents. Cad Saude Publica 2005;21:1717-25. ).

No Brasil, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990), consideram-se adolescentes os indivíduos na faixa etária de 12 a 18 anos( 33. Brasil - Ministério da Saúde. Secretaria de atenção à saúde - área de saúde do adolescente e do jovem. Marco legal: saúde, um direito de adolescentes. [Série A - Normas e Manuais Técnicos]. Brasília: Ministério da Saúde, 2005. ). O Código Civil determina a maioridade aos 18 anos; entretanto, permite-se votar aos 16 anos. Ou seja, de um lado, já se é adulto aos 16 anos para votar e, de outro, só aos 18 anos o indivíduo torna-se apto a casar, criar empresas, submeter-se a determinados procedimentos, etc.( 2424. Taquette SR, Vilhena MM, Silva MM, Vale MP. Ethical conflicts in health care for adolescents. Cad Saude Publica 2005;21:1717-25. ) Para a Organização Mundial da Saúde, a adolescência compreende a faixa etária de dez a 19 anos e a juventude, dos 15 aos 24 anos( 1717. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Technical Report Series, n. 854. Geneva: WHO; 1995. ), considerando-se adolescentes jovens aqueles com idade entre 15 e 19 anos e adultos jovens, entre 20 e 24 anos( 33. Brasil - Ministério da Saúde. Secretaria de atenção à saúde - área de saúde do adolescente e do jovem. Marco legal: saúde, um direito de adolescentes. [Série A - Normas e Manuais Técnicos]. Brasília: Ministério da Saúde, 2005. ). Esse enquadramento variável quanto à faixa etária confunde o profissional e o próprio adolescente, que, às vezes, passa por tratamentos diferentes para situações semelhantes, dependendo da idade( 2424. Taquette SR, Vilhena MM, Silva MM, Vale MP. Ethical conflicts in health care for adolescents. Cad Saude Publica 2005;21:1717-25. , 2525. Taquette SR. Ethical behavior in attention of the health of adolescents. Adolesc Saude 2010;7:6-11. ).

Na avaliação da maturação sexual, seja pela avaliação clínica, seja pela autoavaliação, não se pode esquecer dos aspectos éticos envolvidos. Ressalta-se que, antes da avaliação da maturação sexual, independentemente do método a ser usado, o adolescente deverá ser informado e esclarecido sobre como o exame ocorrerá, quais instrumentos serão utilizados e o seu direito de querer ou não um responsável junto a ele. Sugere-se que o exame seja explicado ao adolescente em consulta anterior e que o médico envolvido na prática da medicina do adolescente se preocupe com as dimensões éticas da relação médico-paciente nesse período da vida.

Ressalta-se a importância do consentimento informado que corresponde ao "registro em prontuário de uma decisão voluntária, por parte do paciente ou de seus responsáveis legais, tomada após um processo informativo e esclarecedor, para autorizar um tratamento ou procedimento médico específico, consciente de seus riscos, benefícios e possíveis consequências"( 2626. Hirschheimer MR, Constantino CF, Oselka GW. Informed consent in pediatrics. Rev Paul Pediatr 2010;28:128-33. ). No caso de pesquisas, a participação do adolescente só é possível mediante sua assinatura e de seu responsável do termo de consentimento livre e esclarecido para os menores de 18 anos, segundo o art. 3º das Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde)( 2727. Brasil - Conselho Nacional de Saúde. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Conselho Nacional de Saúde - Resolução 196/96. Pesqui Odontol Bras 2003;17 (Suppl 1):33-41. ).

O bom atendimento médico, mesmo quando o desfecho é desfavorável, depende da empatia entre a equipe de saúde, o paciente e sua família. O envolvimento da família nas questões de saúde do adolescente é desejável e deve ser estimulado, porém os limites dessa participação devem estar bem definidos para a família, para o jovem e para o próprio profissional de saúde( 2828. Loch JA, Clotet J, Goldim JR. Privacidade e confidencialidade na assistência à saúde do adolescente: percepções e comportamentos de um grupo de 711 universitários. Rev Assoc Med Bras 2007;53:240-6. ). Para participar das decisões sobre sua saúde, o paciente e seus responsáveis legais precisam ser esclarecidos sobre a enfermidade, o prognóstico, a necessidade de exames complementares e de procedimentos e as opções terapêuticas, com seus riscos, benefícios e custos. Deve-se detalhar e abordar tais informações em termos que possam ser entendidos pelo paciente e por seus responsáveis legais. "Documentar que tais informações foram transmitidas e compreendidas é o espírito do consentimento informado. Ele expressa o respeito ao direito do paciente ou de seus responsáveis legais de decidir, conscientemente, a respeito de qualquer ato praticado para fins de diagnóstico e tratamento da doença"( 2626. Hirschheimer MR, Constantino CF, Oselka GW. Informed consent in pediatrics. Rev Paul Pediatr 2010;28:128-33. ). Além disso, é dever do profissional da área da saúde recomendar a conduta que considera mais adequada, com base nas melhores evidências disponíveis, respeitando o direito do paciente e de seus responsáveis legais de escolherem livremente o melhor tratamento e considerando valores religiosos, espirituais, morais, éticos e culturais. Por isso, o consentimento informado não é mera formalidade para comprovar qualidade de atendimento por parte das instituições de saúde( 2626. Hirschheimer MR, Constantino CF, Oselka GW. Informed consent in pediatrics. Rev Paul Pediatr 2010;28:128-33. ).

O Quadro 3 apresenta os aspectos éticos envolvidos na avaliação da maturação sexual. A privacidade é o direito que o adolescente possui, independentemente da idade, de ser atendido sozinho, em espaço privado de consulta; deve-se manter essa condição também durante o exame físico, como sinônimo de crescimento e responsabilidade( 2929. Saito MI, Leal MM, Silva LE. Confidential health care for adolescents: ethical requirements. Pediatria (São Paulo) 1999;21:112-6. ). A confidencialidade é definida como um acordo entre o profissional de saúde e o paciente, no qual as informações discutidas durante e depois da consulta ou entrevista não podem ser passadas aos pais e/ou responsáveis sem a permissão explícita do adolescente. A confidencialidade apoia-se em regras da bioética médica, mediante princípios morais e de autonomia( 2929. Saito MI, Leal MM, Silva LE. Confidential health care for adolescents: ethical requirements. Pediatria (São Paulo) 1999;21:112-6. ).

Quadro 3
Aspectos éticos envolvidos na avaliação da maturação sexual

A Sociedade Brasileira de Pediatria( 3030. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the Internet]. Adolescência, contracepção e ética [cited 2012 september 1]. Available from: http://www.sbp.com.br/pdfs/adolescencia_contra_etica_diretrizes.pdf
Available from: http://www.sbp.co...
) destaca a importância do sigilo, da confidencialidade e da privacidade no atendimento ao adolescente: "Algumas vezes, este não deseja revelar informações confidenciais na presença de seus pais. Para lhe oferecer a oportunidade de falar de si, é necessário que o atendimento sempre ocorra em dois momentos, no primeiro, com seu responsável e, no segundo, a sós com o profissional. A diferença da relação médico-paciente no adolescente em relação à da criança é que a primeira deixa de ser uma relação profissional-responsável e passa a ser uma relação profissional-adolescente. Trata-se de uma questão ética a ser discutida, na medida em que o responsável precisa dar autorização para que o menor seja atendido com sigilo e confidencialidade garantidos".

Além disso, a Sociedade Brasileira de Pediatria( 3030. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the Internet]. Adolescência, contracepção e ética [cited 2012 september 1]. Available from: http://www.sbp.com.br/pdfs/adolescencia_contra_etica_diretrizes.pdf
Available from: http://www.sbp.co...
) também ressalta que o adolescente, desde que identificado como capaz de avaliar seu problema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, tem o direito de ser atendido sem a presença dos pais ou responsáveis no ambiente da consulta, garantindo-se a confidencialidade e a execução dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos necessários. Dessa forma, o jovem tem o direito de optar sobre procedimentos diagnósticos, terapêuticos ou profiláticos, assumindo integralmente seu tratamento. Os pais ou responsáveis somente serão informados sobre o conteúdo das consultas com o expresso consentimento do adolescente. O Código de Ética Médica, cap. IX, artigo 74( 3131. Brasil [homepage on the Internet]. Resolução CFM nº 1931/2009. Aprova o Código de Ética Médica [cited 2012 november 20]. Available from: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2009/1931_2009.htm
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), estabelece que é vedado ao médico "revelar sigilo profissional relacionado a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que o menor tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente".

Estudo realizado nos Estados Unidos( 3232. Reddy DM, Fleming R, Swain C. Effect of mandatory parental notification on adolescents girls' use of sexual health care services. JAMA 2002;288:710-4. ) mostra que, quando o direito do sigilo e a confidencialidade não são garantidos, a maioria dos adolescentes não revela informações importantes ao atendimento. Justifica-se a quebra do sigilo somente nos casos em que possa haver danos ao adolescente ou a outras pessoas. O Quadro 4 destaca as recomendações do Departamento de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo( 3333. Departamentos de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo. Aspectos éticos do atendimento médico do adolescente. Rev Paul Pediatr 1999;17:95-7. , 3434. Oselka G, Troster EJ. Aspectos éticos do atendimento médico do adolescente. Rev Assoc Med Bras 2000;46:306-7. ) sobre o atendimento ao adolescente.

O ECA( 3535. Brasil - Congresso Nacional. Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília: Senado Federal, 1990. ) estabelece a prioridade do atendimento médico ao adolescente, o direito à autonomia e sua absoluta proteção à vida e à saúde, de forma que permita seu desenvolvimento sadio e harmonioso. Em nenhum momento, o ECA condicionou o acesso do adolescente a esses serviços ou o direito de anuência de seus pais ou responsáveis. O estatuto garante que toda criança ou adolescente seja ouvido e sua opinião, considerada, no momento em que se decidir sobre fatos que envolvam sua vida íntima( 3636. Saito MI, Leal MM. Adolescence and emergency contraception: Forum 2005. Rev Paul Pediatr 2007;25:180-6. ). No entanto, ainda ocorrem situações conflituosas, nas quais normas estabelecidas parecem ser insuficientes para responder com clareza às questões éticas envolvidas no atendimento ao adolescente, principalmente quanto à avaliação da maturação sexual. Diante disso, os profissionais devem avaliar a maturidade do adolescente quanto ao entendimento e à capacidade de solucionar o problema; conhecer as leis e os estatutos; documentar cuidadosamente as informações nos prontuários( 2424. Taquette SR, Vilhena MM, Silva MM, Vale MP. Ethical conflicts in health care for adolescents. Cad Saude Publica 2005;21:1717-25. ) e pautar sua conduta nos princípios éticos, garantindo ao adolescente um atendimento adequado e de qualidade( 2929. Saito MI, Leal MM, Silva LE. Confidential health care for adolescents: ethical requirements. Pediatria (São Paulo) 1999;21:112-6. ).

Quadro 4
Recomendações do Departamento de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo(3232. Reddy DM, Fleming R, Swain C. Effect of mandatory parental notification on adolescents girls' use of sexual health care services. JAMA 2002;288:710-4.,3333. Departamentos de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo. Aspectos éticos do atendimento médico do adolescente. Rev Paul Pediatr 1999;17:95-7.)

Dessa forma, ressalta-se a fala de Saito e Leal( 3636. Saito MI, Leal MM. Adolescence and emergency contraception: Forum 2005. Rev Paul Pediatr 2007;25:180-6. ) sobre a postura profissional no atendimento ao adolescente: "o respeito da autonomia da criança e do adolescente, o que implica para este último em privacidade e confidencialidade, faz com que esses indivíduos passem de objeto a sujeito de direito. Sempre que se fala em privacidade e em confidencialidade se fala em ética, mas não em lei. O profissional que assim se conduz não fere nenhum preceito ético, não devendo temer nenhuma penalidade legal".

Considerações finais

A avaliação da maturação sexual é utilizada em estudos envolvendo adolescentes, mas também é muito importante para o atendimento clínico. Sugere-se a autoavaliação como um método válido quando o exame direto por um médico não é possível, principalmente em estudos populacionais. Porém, os estudos de validação da autoavaliação aqui discutidos mostraram ser esta inferior à avaliação clínica e, por isso, deve-se ter cautela na utilização do método.

Independentemente do método utilizado, é preciso considerar os apsectos éticos envolvidos no cuidado e na pesquisa com adolescentes, como o local adequado de atendimento e a privacidade, evitando-se o constrangimento do indivíduo avaliado. Além disso, é essencial, antes da avaliação da maturação sexual, qualquer que seja o método empregado, esclarecer o adolescente sobre como o exame ocorrerá, quais os instrumentos utilizados e garantir-lhe o direito de decidir ter ou não um responsável junto a ele. Sugere-se que o exame seja apresentado ao adolescente em consulta anterior. Portanto, o uso dos métodos de avaliação da maturação sexual deve ser cuidadoso quanto aos aspectos éticos por parte dos profissionais que trabalham com jovens em processo de crescimento e desenvolvimento. Esses métodos podem auxiliar na estimativa da idade biológica, desde que se tome o cuidado de interpretar os resultados de crescimento e desenvolvimento como um todo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2013

Histórico

  • Recebido
    14 Jul 2012
  • Aceito
    17 Dez 2012
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