Open-access Razões do abandono do tratamento de obesidade por crianças e adolescentes

Resumos

OBJETIVO  Analisar as razões de abandono do acompanhamento de tratamento da obesidade, em ambulatório especializado, por crianças e adolescentes obesos.

MÉTODOS  Estudo descritivo com 41 pacientes, incluindo informações de prontuários e de questionário realizado e gravado por telefone, com duas questões abertas e oito fechadas: motivo do abandono, dificuldades estruturais e financeiras (distância e custo de transporte), relação com profissionais, evolução da obesidade, continuidade do tratamento, conhecimento das dificuldades e complicações da obesidade.

RESULTADOS  Nas entrevistas, 29,3% relataram tempo elevado despendido e dificuldade em adaptar os horários das consultas às atividades dos pacientes e pais. Outros motivos foram: recusa das crianças em realizar o tratamento (29,3%), insatisfação com o resultado (17,0%), acompanhamento em outro serviço (12,2%), dificuldade em agendar retorno (7,3%) e demora no atendimento (4,9%). Todos negaram problemas de relacionamento individual ou em grupo com profissionais. Dos entrevistados, 85,4% afirmaram que continuam acima do peso. Relataram-se barreiras para alimentação e realização de exercícios físicos adequados (dificuldade financeira, falta de tempo dos pais, limitação física e falta de segurança). Dos 33 entrevistados que relataram dificuldades com a obesidade, 78,8% tinham transtornos emocionais como bullying, ansiedade e irritabilidade; 24,2% apresentaram cansaço; 15,1%, dificuldades no momento de se vestir e 15,1%, dor. Foi mais frequente o conhecimento das seguintes complicações: cardíacas (97,6%), estéticas (90,2%), psicológicas (90,2%), permanência da obesidade no adulto (90,2%), diabetes (85,4%) e câncer (31,4%).

CONCLUSÕES  A partir dos resultados, podem-se elaborar programas públicos de controle de peso que sejam de mais fácil acesso quanto à localidade do atendimento e com incentivo a alimentação e atividades físicas adequadas à prevenção da obesidade.

pacientes desistentes do tratamento; obesidade; criança; adolescente


OBJECTIVE  To analyze the reasons for non-adherence to follow-up at a specialized outpatient clinic for obese children and adolescents.

METHODS  Descriptive study of 41 patients, including information from medical records and phone recorded questionnaires which included two open questions and eight closed ones: reason for abandonment, financial and structural difficulties (distance and transport costs), relationship with professionals, obesity evolution, treatment continuity, knowledge of difficulties and obesity complications.

RESULTS  Among the interviewees, 29.3% reported that adherence to the program spent too much time and it was difficult to adjust consultations to patientsâ€(tm) and parentsâ€(tm) schedules. Other reasons were: childrenâ€(tm)s refusal to follow treatment (29.3%), dissatisfaction with the result (17.0%), treatment in another health service (12.2%), difficulty in schedule return (7.3%) and delay in attendance (4.9%). All denied any relationship problems with professionals. Among the respondents, 85.4% said they are still overweight. They reported hurdles to appropriate nutrition and physical activity (financial difficulty, lack of parentsâ€(tm) time, physical limitation and insecure neighborhood). Among the 33 respondents that reported difficulties with obesity, 78.8% had emotional disorders such as bullying, anxiety and irritability; 24.2% presented fatigue, 15.1% had difficulty in dressing up and 15.1% referred pain. The knowledge of the following complications prevailed: cardicac (97.6%), aesthetic (90.2%), psychological (90.2%), presence of obesity in adulthood (90.2%), diabetes (85.4%) and cancer (31.4%).

CONCLUSIONS  According to the results, it is possible to create weight control public programs that are easier to access, encouraging appropriate nutrition and physical activities in order to achieve obesity prevention.

patient dropouts; obesity; child; adolescent


OBJETIVO  Analizar los motivos de abandono del seguimiento, en ambulatorio especializado, por niños y adolescentes obesos.

MÉTODOS  Estudio descriptivo, con 41 pacientes, incluyendo informaciones de prontuarios y de cuestionario realizado y grabado por teléfono, con dos cuestiones abiertas y ocho cerradas: motivo del abandono, dificultades estructurales y financieras (distancia y costo de transporte), relación con profesionales, evolución de la obesidad, continuidad del tratamiento, conocimiento de las dificultades y complicaciones de la obesidad.

RESULTADOS  En las entrevistas, el 29,3% relataron tiempo elevado empleado y dificultad en adaptar los horarios de las consultas a las actividades de los pacientes y padres. Otros motivos fueron: recusa de los niños en realizar el tratamiento (29,3%), insatisfacción con el resultado (17%), seguimiento en otro servicio (12,2%), dificultad en marcar el retorno (7,3%) y demora en la atención (4,9%). Todos negaron problemas de relación individual o en grupo con profesionales. De los entrevistados, el 85,4% afirmaron que continúan con más peso que lo recomendado. Se relataron barreras para alimentación y realización de ejercicios físicos adecuados (dificultad financiera, falta de tiempo de los padres, limitación física y falta de seguridad). De los 33 entrevistados que relataron dificultades con la obesidad, el 78,8% tenían trastornos emocionales como bullying, ansiedad e irritabilidad; el 24,2% presentaron cansancio; el 15,1%, dificultades en el momento de vestirse y el 15,1%, dolor. Fue más frecuente el conocimiento de las complicaciones a continuación: cardíacas (97,6%), estéticas (90,2%), psicológicas (90,2%), permanencia de la obesidad en el adulto (90,2%), diabetes (85,4%) y cáncer (31,4%).

CONCLUSIONES  A partir de los resultados, se pueden elaborar programas públicos de control de peso que sean de más fácil acceso respecto a la localidad de la atención y con incentivo a la alimentación y actividades físicas adecuadas a la prevención de la obesidad.

pacientes desistentes del tratamiento; obesidad; niño; adolescente


Introdução

A prevalência da obesidade em crianças e adolescentes em países desenvolvidos e em desenvolvimento, incluindo o Brasil, aumentou de forma significativa nas últimas três décadas, sendo atualmente considerada uma doença crônica de saúde pública( 1 - 3 ).

Em crianças e adolescentes, é importante salientar que a obesidade pode ter impacto na qualidade de vida e levar a distúrbios psicossociais, como bullying, baixa autoestima, falta de confiança e piora da imagem corporal, fatores que favorecem maior dificuldade de emagrecimento( 4 - 6 ). A obesidade também influencia na expectativa de vida por relacionar-se à permanência na idade adulta, às complicações metabólicas e cardiovasculares, além de distúrbios ortopédicos, apneia do sono e maior risco de câncer, os quais são cada vez mais diagnosticadas na infância e na adolescência (2,7,8). Tais preocupações aumentam, pois, em adultos, a principal causa de morte é a doença cardiovascular, diretamente relacionada ao excesso de peso( 9 ).

Para evitar o aumento da pandemia da obesidade, programas de prevenção, apesar de escassos, tanto em crianças saudáveis como com excesso de peso, têm sido recomendados, com resultados promissores. Acredita-se que, se esses programas fossem mais duradouros, melhores resultados seriam obtidos( 10 ). Como tratamento, preconizam-se hábitos saudáveis de vida muito dependentes do envolvimento familiar, incluindo compreensão psicossocial, hábitos alimentares, atividade física, horário de sono e considerações culturais( 11 , 12 ). No entanto, por ser a obesidade uma doença crônica, aparentemente assintomática e de difícil aceitação, tanto pelo paciente como pelos responsáveis, esta resulta em baixa resposta ao tratamento em longo prazo e perda de acompanhamento.

Nesse contexto, o presente estudo identificou as razões do abandono de tratamento das crianças acompanhadas em ambulatório de obesidade.

Método

Estudo prospectivo descritivo de pacientes de ambos os sexos, que abandonaram o acompanhamento do Ambulatório de Obesidade na Criança e no Adolescente do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), de 2005 a 2009. Com base em estudo anterior, que acompanhou 150 pacientes e observou 43% de abandono, sendo 25% já na primeira consulta( 13 ), selecionaram-se 96 pacientes e realizaram-se 41 entrevistas gravadas por telefone de março a julho de 2011, com os respectivos responsáveis. Os outros pacientes não foram contatados por falta de endereço ou telefone disponível. Consideraram-se os indivíduos que abandonaram o tratamento, aqueles que não receberam alta dos médicos e que não compareceram ao ambulatório por mais de seis meses após a última consulta. Essa informação foi obtida nos prontuários, assim como os dados clínicos.

No início das ligações, apresentaram-se as características do estudo e seus objetivos, solicitando-se consentimento oral gravado. Após o consentimento, utilizou-se o questionário. Excluíram-se os pacientes cujos pais ou responsáveis apresentavam surdez, problemas mentais ou fonoaudiólogos que os impedissem de responder ao questionário.

A entrevista constituiu-se de duas questões abertas e oito fechadas, sendo muitas correlacionadas. As perguntas abordaram diferentes dimensões: avaliação do responsável quanto ao que levou o filho a abandonar o tratamento, dificuldades estruturais e financeiras (distância e custo de transporte), relação com os profissionais do ambulatório, participação no atendimento em grupo, orientações dietéticas e de atividade física, evolução quanto à obesidade, continuidade do tratamento, distúrbios relacionados e o conhecimento das complicações da doença.

Todos os dados foram computados em uma ficha clínica e analisados pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 13.0. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp.

Resultados

Entre os pacientes selecionados e os entrevistados, não houve diferença estatisticamente significativa quanto ao sexo, à idade de abandono, ao número de consultas realizadas e ao escore Z de índice de massa corpórea (IMC) (Tabela 1). Questionaram-se os responsáveis, sendo 32 (78,1%) entrevistas com a mãe, seis (14,6%) com o pai, duas (4,9%) com a avó e uma (2,4%) com a mãe e o pai. Em média, as entrevistas ocorreram 3,6 anos após o abandono e a idade média dos pacientes era de 14,0 anos.

Tabela 1
Caracterização dos 96 pacientes que abandonaram o tratamento de acordo com a realização ou não da entrevista

As razões do abandono - incluindo dificuldade em adaptar horários das consultas às atividades de pacientes e pais (29,3%) e recusa das crianças em retornar ao tratamento, como rebeldia, insatisfação etc. (29,3%) - estão descritas na Tabela 2.

Tabela 2
Relato dos 41 responsáveis sobre as razões para abandono do tratamento

A avaliação das dificuldades estruturais e financeiras (distância e custo de transporte), o tipo de atendimento, a evolução quanto ao tratamento e à obesidade, os distúrbios relacionados e o conhecimento das complicações da doença estão descritos na Tabela 3.

Tabela 3
Questões exploratórias para verificar as possíveis razões de abandono do tratamento, respondidas pelos 41 responsáveis nas entrevistas telefônicas

Nenhum dos entrevistados relatou problemas de relacionamento com a equipe de profissionais do ambulatório. Dos entrevistados, 34,1% afirmaram ter participado do atendimento em grupo, sendo que, desses, 35,7% consideraram-no ótimo, 42,9%, bom e 21,3%, ruim.

Quanto à reeducação alimentar, 80,5% disseram ter recebido orientação da nutricionista. Desses, 12,2% apresentaram dificuldade em entendê-la; entretanto, a maioria relatou que a principal dificuldade era segui-la. Dentre as dificuldades, os familiares mencionaram que não conseguiam negar alimentos aos filhos e não tinham controle sobre o que comiam, já que trabalhavam durante todo o dia e apresentavam limitações financeiras para comprar alimentos adequados à dieta. A maioria que realizou dieta afirmou que, após a interrupção, houve aumento do peso.

Quanto às atividades físicas, 61% dos entrevistados receberam orientação específica de educador físico. Desses, 55,9% relataram algum tipo de dificuldade para a execução das atividades; dentre as justificativas mais citadas, destacam-se: dificuldade financeira para realizar a atividade recomendada, como natação e academia; limitação de tempo dos filhos e dos pais, associada à falta de segurança pública e à própria limitação física do paciente devido à obesidade. No período de acompanhamento, 17,9% não praticavam nenhum tipo de exercício físico, 5,1% praticavam apenas uma vez por semana, 23,1%, duas vezes, 28,2%, três, 5,1%, quatro, 7,7%, cinco e 12,8%, sete vezes por semana. Na data da entrevista, 24,4% afirmaram que não praticavam nenhum tipo de exercício físico, 7,3% praticavam atividade física apenas uma vez por semana, 19,5%, duas vezes, 7,3%, três, 12,2%, quatro, 17,1%, cinco e 12,2%, sete vezes por semana.

Observou-se também que 85,4% dos avaliados continuam acima do peso, sendo que 36,6% engordaram desde que houve o abandono, 36,6% perderam peso e, em 24,4%, não houve alteração.

Dos entrevistados, 29,2% passaram a fazer tratamento em outro local. Desses, 49,8% passaram a ser atendidos em Centros de Saúde, 24,9%, em consultório particular e 16,7%, em outro hospital. Dos pacientes que iniciaram novo acompanhamento, 66,5% afirmaram que não obtiveram sucesso.

Quanto às dificuldades que a obesidade acarreta ao filho, 8 (19,5%) responsáveis negaram esse problema. Dos outros 33, 26 (78,8%) relataram transtorno emocional, como bullying, ansiedade e irritabilidade; 8 (24,2%), cansaço; 5 (15,1%), dificuldades no momento de se vestir e 5 (15,1%), dor, principalmente osteoarticular.

Quanto ao risco de morbidades associadas à obesidade, 97,6% dos entrevistados conheciam a associação da doença com problemas no coração, 90,2%, com alterações estéticas, 90,2%, com dificuldades psicológicas, 90,2%, com a permanência da obesidade na idade adulta, 85,4%, com diabetes e 31,4%, com câncer.

Discussão

O Ambulatório de Obesidade na Criança e no Adolescente do Hospital das Clínicas da Unicamp objetiva atuar, por meio de intervenções de conscientização dos pacientes e de seus familiares, quanto aos riscos da doença e suas consequências, além de oferecer tratamento de complicações decorrentes da obesidade, orientações nutricionais e estimular o aumento da atividade física( 12 , 13 ). Para tal abordagem, apresenta equipe multiprofissional composta por docentes e residentes de primeiro ano de Pediatra, bem como nutricionista, educador físico, psicólogo e fisioterapeuta, de acordo com o que a literatura preconiza( 14 , 15 ). O atendimento ocorre uma vez por semana, sendo atendidos de sete a dez pacientes por dia. Entretanto, estudo prévio realizado com pacientes do mesmo ambulatório constatou abandono do acompanhamento de 43%, não se observando diferenças estatisticamente significativas entre idade, sexo, idade de início, escore Z de peso, altura e IMC, nem alterações laboratoriais que justificassem essa atitude( 13 ).

Em entrevista com os pacientes, verificou-se que os motivos de abandono relacionam-se principalmente à dificuldade em adaptar os horários das consultas às atividades dos pacientes e dos pais, à recusa das crianças em fazer o tratamento, à insatisfação com o resultado e, em menor número, à mudança de local de acompanhamento, à dificuldade de agendamento e à demora no atendimento. Esses dados são semelhantes aos de outros estudos que obtiveram como causas do abandono o foco do tratamento, a distância e os conflitos de horário( 16 , 17 ). Trabalho canadense observou barreiras físicas, de organização clínica e o programa educacional como fatores relacionados à interrupção do acompanhamento( 18 ).

Neste estudo, dentre as dificuldades estruturais, observam-se a distância, o tempo despendido e o custo. A maioria dos pacientes entrevistados não era proveniente de Campinas (SP), sendo que aproximadamente 40% residiam em cidades distantes a mais de 50km do município. A distância entre a moradia e o local de atendimento também foi referida como obstáculo ao seguimento em outros estudos( 19 , 20 ). Nesta pesquisa, o tempo de transporte gasto entre a moradia e o local de atendimento por grande parte dos pacientes era superior a uma hora. Além disso, como aproximadamente 50% utilizavam transporte de saúde municipal, isso significava ficar o dia inteiro no hospital. Tal demora gera dificuldade em adaptar os horários das consultas às atividades dos pacientes e dos pais, como verificado em outros estudos( 21 ). Para os que passam o dia todo no hospital, ocorre acréscimo no custo com a alimentação. Estudo semelhante mostrou que 25% dos pacientes abandonaram o tratamento de obesidade devido ao tempo e à dificuldade em adaptar os horários das consultas às atividades dos pacientes e dos pais, 27,9% devido à falta escolar, 23,3% por causa da distância e 10,3% pelos custos( 16 ).

Aproximadamente 30% dos entrevistados participaram de atendimento em grupo. Essa forma de avaliação apresenta menor índice de abandono, de acordo com dados de Minniti et al ( 22 ). É interessante ressaltar que nenhum dos entrevistados mencionou problemas de relacionamento com a equipe de profissionais do ambulatório, diferentemente de estudo em que se observou insatisfação com a equipe e com o foco de tratamento( 16 ).

Na orientação nutricional, poucos referem dificuldades em entendê-la, mas a maioria apresenta dificuldades em realizá-la. Constatou-se que os responsáveis encontram barreiras para controlar a alimentação dos filhos, seja por dificuldades financeiras para a compra de alimentos recomendados, seja porque a maioria trabalha e não tem condições de controlar a alimentação, além da dificuldade em negar alimentos para o filho. Esses fatores também foram relatados por outros autores( 23 ).

Quanto às atividades físicas, percebe-se que, após o abandono do tratamento, houve aumento do número dos que não praticavam nenhum tipo de exercício físico. Além disso, a maioria relata algum tipo de dificuldade em realizá-la. Dentre os empecilhos, verificou-se dificuldade financeira para proporcionar tratamento adequado, pouca disponibilidade de tempo dos pais para supervisionar os filhos e a falta de segurança pública, que impede o acesso das crianças às brincadeiras nas praças, ruas e parques, como citado em outras investigações( 24 - 26 ).

É interessante ressaltar que 29,3% procuraram novo local para tratamento após o abandono, mas apenas 12,2% citam essa justificativa. Além disso, a maioria que mudou de atendimento afirmou falta de sucesso no tratamento, o que pode levar à hipótese de o abandono ser decorrente de múltiplas causas sociais que desestimulam o seguimento( 16 - 18 , 26 ).

Além dos fatores estruturais, neste estudo observa-se abandono por rebeldia e insatisfação das crianças, além de insucesso no tratamento. Como o resultado geralmente não é imediato, ao contrário, a perda de peso ocorre em longo prazo, isso pode desestimular o paciente( 23 , 27 ). A insatisfação da criança pode influenciar os pais e responsáveis que, muitas vezes, sentem-se frustrados, envergonhados e culpados, pois não sabem como ajudar os filhos a perder peso( 5 ). Independentemente da resposta ao tratamento, 85,4% dos responsáveis consideram que seus filhos estão acima do peso e, mesmo que tenha havido redução na vigência do tratamento, os mesmos voltam a engordar após a interrupção. De acordo com a literatura, apenas 5% dos adolescentes que perdem peso conseguem mantê-lo após cinco anos de tratamento( 27 ), justificando uma das dificuldades do acompanhamento.

Assim como em outros estudos, observou-se que a maioria dos responsáveis reconhece as dificuldades que a obesidade acarreta, enfatizando o aspecto emocional, relatando-se problemas de relacionamento com amigos e familiares, bem como em atividades diárias (cansaço e dor), aparecimento de apelidos pejorativos que afetam a autoestima, bullying, irritabilidade e dificuldade no momento de se vestir( 5 , 6 , 23 , 28 ). Esses problemas podem levar à marginalização da criança e do adolescente, afastando-o de atividades físicas preconizadas e aumentando seu tempo em frente a televisão, videogame ecomputador. As complicações psicológicas, apesar de frequentes, são de difícil caracterização e discute-se se são causa ou consequência da obesidade( 5 ). Em geral, pacientes com alterações psicológicas procuram mais atendimento, mas também são os que possuem maior insucesso na perda de peso e abandono do tratamento( 5 , 6 ). Por esses dados, preconiza-se o acompanhamento psicológico, sendo esse um fator que influencia a resposta ao tratamento da obesidade( 5 , 6 ).

Os responsáveis também têm informações sobre as complicações clínicas: riscos cardíacos, metabólicos e até maior risco de câncer. É interessante ressaltar que esse conhecimento não gerou estímulo para dar seguimento ao tratamento. Portanto, as dificuldades estruturais e psicológicas parecem mais influentes na aderência ou no abandono da criança ao tratamento( 23 ).

Este estudo, mesmo com o pequeno número de pacientes avaliados, devido à dificuldade de contato (aproximadamente metade dos selecionados) e ao grande intervalo de tempo para a realização da entrevista, aponta as principais razões do abandono. Portanto, devem-se realizar novos e maiores estudos. Apesar dessa limitação, observa-se que o conhecimento da obesidade como doença pelos responsáveis existe, assim como suas comorbidades, porém apontam-se barreiras físicas e econômicas que dificultam as alterações no modo de vida, como observado em outro estudo( 29 ). As alterações psicológicas também são relevantes e reconhecidas, o que pode associar-se ao abandono por insatisfação e rebeldia e à busca por "soluções mágicas".

A diminuição da prevalência da obesidade tem obtido pouco sucesso nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, apesar do grande aumento de programas específicos e de estudos para esse fim. Com os dados desta pesquisa, pode-se sugerir que os locais para os programas de controle de peso sejam de mais fácil acesso e que as orientações alimentares e de atividades físicas sejam adaptáveis para as condições socioeconômicas da família( 11 , 30 ), juntamente com avaliação dos aspectos emocionais. Devido à não realização das orientações propostas, associada ao abandono do acompanhamento, devem-se desenvolver programas que atuem na prevenção da obesidade o mais precocemente possível( 10 ).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2013

Histórico

  • Recebido
    18 Set 2012
  • Aceito
    04 Fev 2013
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