Resumos
OBJETIVO Verificar a associação entre proteína C-reativa (PCR) e pressão arterial (PA) elevada em crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade.
MÉTODOS Estudo transversal, realizado de abril de 2009 a abril de 2010, com 184 crianças e adolescentes de dois a 18 anos, obesos ou com sobrepeso. Realizou-se a classificação do estado nutricional por meio do índice da massa corpórea (IMC). Adotou-se a curva do Centers for Disease Control and Prevention, classificando-se os indivíduos em: sobrepeso (IMC entre percentil 85-95), obesidade (IMC entre percentil 95-97) e obesidade grave (IMC>percentil 97). Consideraram-se alterados valores de: PA sistólica (PAS) e/ou diastótica (PAD) ≥percentil 90, conforme curva de classificação da PA para crianças e adolescentes nas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial; circunferência abdominal (CA) ≥percentil 90 de acordo com a curva do National Cholesterol Education Program; e PCR ultrassensível (PCR-us) >3mg/dL. Para avaliar a associação de valores inadequados de PCR entre os grupos, utilizaram-se o teste do qui-quadrado e a análise de variância. As análises foram realizadas na versão 17.0 do programa Statistical Package for the Social Sciences, adotando-se nível de significância de 5%.
RESULTADOS Dos avaliados, 66,3% eram do sexo feminino, 63,5%, não brancos, 64,1% tinham obesidade grave, 78,3% apresentavam CA alterada e 70,6%, PA elevada. Verificou-se associação significante dos níveis aumentados de PCR com CA alterada e IMC ≥percentil 97. Nos adolescentes, a PCR aumentada associou-se à PAS elevada. Os valores médios da PCR foram superiores nos indivíduos que apresentaram PAS elevada.
CONCLUSÕES Valores inadequados da PCR-us associaram-se à obesidade grave e à PAS elevada na população estudada. Tais marcadores podem ser utilizados para identificar crianças e adolescentes com maior risco de desenvolver aterosclerose.
pressão arterial; proteína C-reativa; obesidade; doenças cardiovasculares; criança; adolescente
OBJECTIVE To investigate the association between C-reactive protein (CRP) and high blood pressure (BP) in overweight or obese children and adolescents.
METHODS Cross-sectional study with 184 overweight or obese children and adolescents aged from two to 18 years old, from April, 2009 to April, 2010. The classification of nutritional status used the body mass index (BMI). Based on the Centers for Disease Control and Prevention curve, individuals were classified as: overweight (BMI between the 85th-95th percentiles), obesity (BMI between 95th-97th percentiles) and severe obesity (BMI >97th percentile). Abnormal values were considered for systolic BP (SBP) and/or diastolic (DBP) if ≥90th percentile of the BP curve recommended for children and adolescents in the V Brazilian Guidelines on Hypertension, for waist circumference (WC) if ≥90th percentile of the curve established by the National Cholesterol Education Program, and for high sensitive CRP (hs-CRP) if >3mg/dL. To evaluate the association of inadequate values of CRP and the studied groups, chi-square test and analysis of variance were applied, using the Statistical Package for the Social Sciences version 17.0 and adopting a significance level of 5%.
RESULTS Among the evaluated sample, 66.3% were female, 63.5%, non-white, 64.1% had severe obesity, 78.3% had altered WC and 70.6% presented high BP. There was a significant association of CRP high levels with altered WC and BMI ≥97th percentile. In adolescents, high CRP was related to high SBP. CRP mean values were higher in individuals with elevated SBP.
CONCLUSIONS Inadequate values of hs-CRP were associated with severe obesity and high SBP in the studied population. These markers can be used to identify children and adolescents at higher risk for developing atherosclerosis.
arterial pressure; C-reactive protein; obesity; cardiovascular diseases; child; adolescent
OBJETIVO Verificar la asociación entre proteína C-reactiva (PCR) y presión arterial (PA) elevada en niños y adolescentes con sobrepeso u obesidad.
MÉTODOS Estudio transversal, realizado de abril de 2009 a abril de 2010, con 184 niños y adolescentes de 2 a 18 años, obesos o con sobrepeso, atendidos en el Centro de Obesidad Infantil. Se realizó la clasificación del estado nutricional por medio del índice de masa corporal (IMC). Se adoptó la curva del Centers for Disease Control and Prevention, clasificándose a los individuos en: sobrepeso (IMC entre percentil 85-95), obesidad (IMC entre percentil 95-97) y obesidad grave (IMC >percentil 97). Se consideraron alterados los valores de PA sistólica (PAS) y/o diastólica (PAD) ≥percentil 90 - conforme curva de clasificación de la PA para niños y adolescentes recomendada en las V Directrices Brasileñas de Hipertensión Arterial, circunferencia abdominal (CA) ≥percentil 90 - conforme a la curva establecida por el National Cholesterol Education Program, y PCR ultrasensible (PCR-us) >3mg/dL. Para evaluar la asociación de valores inadecuados de PCR entre los grupos, se utilizaron la prueba del chi-cuadrado y análisis de variancia. Los análisis fueron realizados en la versión 17.0 del programa Statistical Package for the Social Sciences, adoptándose nivel de significancia de 5%.
RESULTADOS De los evaluados, el 66,3% eran del sexo femenino, el 63,5% no blancos, el 64,1% tenían obesidad grave, el 78,3% presentaban CA alterada y el 70,6%, PA elevada. Se verificó la asociación significante de los niveles aumentados de PCR con CA alterada e IMC ≥percentil 97. En los adolescentes, la PCR aumentada se asoció a la PAS elevada. Los valores medianos de la PCR fueron superiores en los individuos que presentaron PAS elevada.
CONCLUSIONES Valores inadecuados de PCR-us se asociaron a la obesidad grave y a la PAS elevada en la población estudiada. Es posible utilizar esos marcadores para identificar a niños y adolescentes con mayor riesgo de desarrollar aterosclerosis.
presión arterial; proteína C-reactiva; obesidad; enfermedades cardiovasculares; niño; adolescente
Introdução
A obesidade está intimamente associada a doenças cardiovasculares, uma vez que o excesso de gordura corporal pode predispor o indivíduo a várias comorbidades, como hipertensão arterial e dislipidemia( 1 , 2 ). Evidências científicas indicam que a obesidade relaciona-se a um processo inflamatório subclínico, pois o tecido adiposo secreta substâncias como o fator de necrose tumoral α (TNFα), interleucina-6 (IL-6), adiponectina e resistina, com ação no endotélio vascular e no metabolismo da glicose e dos lipídeos, contribuindo para a fisiopatologia de doenças cardiovasculares( 3 , 4 ).
A concentração da proteína C-reativa (PCR) apresenta relação direta com a intensidade da obesidade na infância, sendo utilizada como marcador inflamatório de aceleração da progressão da aterosclerose( 5 ). A determinação da PCR ultrassensível (PCR-us) mostra-se um preditor relativamente moderado de eventos cardiovasculares e hipertensão, uma vez que se associa a alterações na fibrinólise e aos componentes da síndrome metabólica (SM), como a hipertensão arterial sistêmica (HAS)( 6 - 8 ).
Poucos estudos avaliaram a relação entre a concentração de biomarcador inflamatório (PCR-us) e a pressão arterial (PA) elevada em crianças e adolescentes( 6 ). A PA elevada é considerada um preditor independente do aumento dos níveis de PCR, levando à hipótese de que a hipertensão arterial de adultos leva à aterosclerose, em parte, devido às doenças crônicas inflamatórias( 9 ). Além disso, observa-se associação de antecedentes familiares de hipertensão com aumento daPA em crianças e aquelas que apresentam hipertensão ou pré-hipertensão contam com maior nível de inflamação subclínica, medida pela PCR( 10 ).
Devido ao impacto gerado pela PA elevada na saúde da população e à associação observada entre a PCR e o aparecimento da doença - além do o pouco entendimento dessa relação na infância, especialmente em indivíduos com excesso de peso -, este estudo verificou a relação entre o biomarcador inflamatório (PCR-us) e a PA elevada em crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade de dois a 18 anos, atendidos em um centro de obesidade infantil.
Método
Estudo transversal, com abordagem quantitativa, realizado entre abril de 2009 e abril de 2010, como parte de um projeto maior intitulado Prevalência de fatores de risco cardiometabólicos entre crianças e adolescentes obesos ou com sobrepeso, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba. O estudo foi desenvolvido no Centro de Obesidade Infantil (COI), implantado no Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA), em Campina Grande, Paraíba, especificamente para atender à demanda desta pesquisa. O COI é formado por pesquisadores e equipe multiprofissional composta por endocrinologistas, nutricionistas, psicóloga, enfermeira, farmacêuticos, assistente social e preparador físico.
A amostra foi por conveniência e envolveu crianças e adolescentes de dois a 18 anos com sobrepeso ou obesidade. Entretanto, para verificar a representatividade do número estudado, calculou-se o tamanho da amostra ideal com o StatCalc do Epi-Info. Para tanto, levantou-se inicialmente a população entre dois e 19 anos cadastrada no Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) em 2008, que correspondeu a 65.980( 11 ). Considerou-se prevalência de sobrepeso e obesidade de 25%( 12 ) e de HAS de 37,5%( 13 ). Para erro alfa de 5%, o tamanho da amostra resultaria em 160 indivíduos. No entanto, trabalhou-se com número superior, devido à maior captação de indivíduos para o estudo.
Recrutaram-se crianças e adolescentes mediante divulgação da pesquisa nas Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF) do município, realizada pela Secretaria de Saúde. Os indivíduos que apresentavam os critérios para inclusão no estudo foram convidados a participar e encaminhados pelos profissionais das equipes de saúde ao COI. Nesse período, compareceram 200 crianças e adolescentes no COI, excluindo-se aqueles que, no momento da coleta de dados, eram portadores de alguma doença crônica, como hipertensão secundária, diabetes tipo 1, processo inflamatório, etilismo, tabagismo ou se estivessem em uso de medicamentos que interferissem no metabolismo glicídico ou lipídico. Excluíram-se dois indivíduos por uso de corticoide e 14 por apresentarem valores da PCR-us superiores a 10mg/dL; no final, obteve-se um total de 184 indivíduos avaliados. Após o esclarecimento dos objetivos, métodos e condutas a serem seguidas, os pais ou responsáveis que concordaram em participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Inicialmente, aplicou-se um formulário com as variáveis clínicas (sexo e idade) e antropométricas (peso, estatura, índice de massa corpórea - IMC e circunferência abdominal) e PA aferida por discentes previamente treinados, sendo agendados os exames laboratoriais para determinar a concentração de PCR-us.
As variáveis antropométricas peso e estatura foram coletadas em duplicata, com base nos critérios de padronização recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Considerou-se a média das duas medidas. Para obtenção do peso, utilizou-se balança digital tipo plataforma (Welmy) com capacidade para 150kg e precisão de 0,1kg, com as crianças descalças, usando roupas leves e posicionadas no centro da plataforma da balança. A estatura foi medida por meio de estadiômetro (Toneli), com precisão de 0,1cm, estando as crianças descalças, em posição ortostática, braços ao longo do corpo, pés unidos, joelhos esticados, cabeça orientada no plano horizontal de Frankfurt, após inspiração profunda( 14 ). Avaliou-se a circunferência abdominal por meio de fita métrica inelástica com precisão de 0,5cm, no ponto médio entre a borda superior da crista ilíaca e o último rebordo costal, com o paciente em pé, sem roupa, com os braços posicionados ao longo do corpo e na fase expiratória da respiração( 15 ). Valores acima do percentil 90 foram considerados aumentados, porém com limite máximo de 88cm para meninas e 102cm para os meninos, conforme recomendação da curva adotada pelo National Cholesterol Education Program (NCEP)( 16 ).
Para a classificação do estado nutricional, calculou-se o IMC e, conforme recomendação da curva utilizada pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC)( 17 ), classificaram-se os indivíduos em uma das seguintes categorias: sobrepeso (IMC entre o percentil 85 e 95), obesidade (IMC entre o percentil 95 e 97) e obesidade grave (IMC≥percentil 97).
A PA foi aferida em três momentos, com intervalos de repouso de cerca de dois minutos, de acordo com o método estabelecido nas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial( 18 ), com esfigmomanômetro de mercúrio (Tycos), usando-se manguitos de tamanhos adequados. A média das duas últimas medidas foi considerada como a pressão arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD). Como a PA foi mensurada em apenas uma ocasião e, segundo a recomendação da V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial( 18 ) para a confirmar o diagnóstico de HAS é necessário repetir a aferição da PA após duas semanas em indivíduos assintomáticos, optou-se por adotar a nomenclatura "PA elevada". A PAS ou a PAD foram consideradas normais abaixo do percentil 90 para sexo, idade e estatura, limítrofes entre o percentil 90 e 95 e elevadas acima ou no percentil 95, de acordo com a curva de classificação da PA para crianças e adolescentes adotada nas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial( 18 ), sendo recategorizada em PA normal, quando inferior ao percentil 90, e alterada, se maior ou igual ao percentil 90 para sexo, idade e estatura, para fins de análise estatística.
Avaliou-se a PCR-us por quimioluminescência em equipamento automatizado IMMULITE 1000 (SIEMENSÂ(r)). Excluíram-se da análise do PCR os indivíduos que apresentaram valores de PCR≥10mg/dL, uma vez que, nesses casos, recomenda-se a repetição do exame( 6 , 18 ). Consideraram-se como ponto de corte os valores de PCR≤3mg/L (baixo risco para evento cardiovascular) e PCR>3mg/L (risco elevado para evento cardiovascular)( 6 ).
Apresentaram-se os dados por meio de proporções, médias e desvios-padrão (DP). A associação entre a PA e os grupos (faixa etária, sexo e estado nutricional) foi verificada pelo teste do qui-quadrado de Pearson ou teste exato de Fisher, quando apropriado. Já para comparação de médias, utilizou-se a ANOVA "one way". Realizaram-se todas as análises com a versão 17.0 do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Inc., Chicago, EUA), sendo significante p<0,05.
Resultados
Analisaram-se 184 crianças e adolescentes; 66,3% eram do gênero feminino, 63,5% não brancos, 64,1% tinham obesidade grave e 78,3% apresentavam circunferência abdominal (CA) alterada. A PA alterada esteve presente em 70,6% dos avaliados. Não se verificou associação de PA, PAS e PAD elevada com sexo, faixa etária, PCR-us, IMC e CA (Tabela 1).
Na Tabela 2, verifica-se que a PCR alterada esteve associada à CA elevada (p<0,001) e à obesidade acentuada (IMC≥97)(p=0,005). A chance de apresentar níveis aumentados de PCR foi maior nos seguintes grupos: CA elevada (Razão de Prevalência - RP=8,08) e obesidade acentuada (RP=2,70). Os valores médios da PCR foram superiores nos indivíduos que apresentaram PAS elevada (p=0,013), fato não observado em relação à PAD (Tabela 3). Observou-se associação significativa entre níveis aumentados de PCR e PAS elevada (p=0,031) apenas nos adolescentes. A análise bivariada entre os desfechos PA, PAS e PAD elevada e os fatores estudados não se mostrou estatisticamente significante. A estratificação por faixa etária revelou associação (p=0,013), indicando que os adolescentes com PCR elevada têm chance duas vezes maior de apresentar PAS alterada do que aqueles com PCR normal [RP=2,35 (IC95% 1,07-5,14)] (Tabela 4).
Discussão
A importância do reconhecimento da obesidade como um estado inflamatório se deve à possibilidade de a inflamação ser um dos elos entre a obesidade e a resistência à insulina, a HAS e a doença cardiovascular( 19 ).
Neste estudo, observou-se alta prevalência de PA elevada em crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade. Isso é preocupante, uma vez que o risco prematuro para doenças cardiovasculares pode ser potencializado em idades mais jovens simplesmente pela presença do excesso de peso corporal( 20 ). Como a obesidade na infância e na adolescência predispõe à obesidade na idade adulta, a alta prevalência de PA elevada encontrada nesta pesquisa, em todas as faixas etárias, representa um alerta para as condições de saúde desses indivíduos( 21 ).
A PA elevada foi mais prevalente no sexo masculino, em adolescentes e obesos graves, corroborando o estudo transversal realizado por Costanzi et al ( 22 ) com 1.413 crianças entre sete e 12 anos idade, estudantes de escolas públicas e privadas. Nesse estudo, observou-se prevalência de PA elevada de 13,8%, sendo o dobro naqueles com obesidade ou sobrepeso. Já em estudo realizado na Paraíba com 674 adolescentes de escolas públicas e privadas, a prevalência de PA elevada foi de 7,4%, sendo maior nos rapazes (10,2%) do que nas moças( 23 ).
O risco de a PA atingir valores elevados varia de acordo com a duração e a intensidade da obesidade. Não se pode afirmar que a PA elevada cresceu com o avanço da idade - já que não houve acompanhamento longitudinal dos pacientes, porém apresentou-se mais frequente na faixa etária mais velha, ou seja, na adolescência. Também é possível que o período de tempo em que esses indivíduos encontram-se expostos ao excesso de tecido adiposo tenha contribuído para a elevação dos valores pressóricos( 24 ).
Neste trabalho, não se verificou associação entre PA elevada e estado nutricional ou CA, assim como em estudo realizado com escolares chilenos, no qual não se notou associação direta entre as crianças com PA elevada e o grau de obesidade( 10 ).
A medida da CA em adultos é aceita como ferramenta importante para avaliar o risco de doenças, especialmente da aterosclerose. Na infância e na adolescência, entretanto, a escassez de estudos prospectivos de longo prazo não permite a simples extrapolação desse conhecimento. Além disso, o fato de essa medida apresentar variação, em razão do crescimento físico, faz com que os pontos de corte tenham de ser diferentes para cada faixa etária( 25 ).
Concentrações superiores de PCR-us foram encontradas entre os obesos e nas faixas etárias pré-escolar e escolar. Os valores da PCR elevaram-se à medida que o IMC aumentou, tendo os obesos graves prevalência três vezes maior de PCR aumentada. Os níveis de PCR elevados foram mais frequentes nos indivíduos com CA aumentada. Diversos estudos realizados com crianças e adolescentes sugerem que a concentração de PCR-us seja fortemente relacionada ao índice ponderal (26).
Junqueira, Romêo Filho e Junqueira( 27 ) afirmam que níveis elevados de PCR associam-se ao acúmulo de tecido adiposo visceral e aos componentes da síndrome metabólica. Esses dados sugerem um possível papel do tecido adiposo visceral na gênese da aterosclerose. Portanto, obesidade, síndrome metabólica e aterosclerose estão intimamente relacionadas e podem ser determinantes de uma resposta aumentada da inflamação vascular.
Pela facilidade de determinação da concentração sérica, pelo baixo custo e pela melhor correlação clínico-epidemiológica, quando comparada a outros marcadores inflamatórios, como a IL-6 e o TNFα, a PCR é de especial interesse, dada a possibilidade de elucidar novos caminhos para prevenir e tratar doenças de alta prevalência, morbidade e mortalidade( 28 ). Estudos mostraram que indivíduos com níveis normais de PCR-us e PA apresentam maior sobrevida livre de eventos cardiovasculares, quando comparados a pessoas com níveis elevados( 28 ). Tais achados sugerem que a inflamação e a hipertensão podem agir em conjunto para promover a aterosclerose( 9 ).
Estudos do National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES) encontraram que a adiposidade foi o melhor preditor de níveis elevados de PCR-us( 29 ). Assim, entre os que apresentam excesso de peso, quanto maior a concentração da PCR-us, maior o número de anormalidades metabólicas encontradas( 30 ). Ao se analisar a PAS como variável contínua, encontraram-na independentemente associada com níveis de PCR-us em meninas de 12 a 17 anos de idade. Já no presente estudo, observou-se associação da PAS alterada e PCR-us na adolescência e a PCR teve um valor médio significantemente maior nos que apresentaram PAS elevada.
Estudos clínicos e anatomopatológicos sugerem que a aterosclerose pode se desenvolver nos adolescentes, sendo mais prevalente naqueles com PA elevada( 6 ). Tais achados, juntamente com o papel da inflamação crônica na patogênese da aterosclerose, têm levado pesquisadores a estudar a relação entre PCR-us elevada, níveis de PA e outros fatores de risco cardiovascular em crianças e adolescentes. A realização da PCR-us apenas em crianças e adolescentes com excesso de peso e o corte transversal são limitações do presente estudo, não podendo definir causalidade, sendo necessárias novas pesquisas, de delineamento longitudinal, para melhor compreender tal relação. O entendimento dos determinantes da inflamação sistêmica em idades precoces pode ter implicações importantes para prevenção primária de muitas doenças relacionadas com inflamação crônica( 3 ).
Outra limitação do estudo foi a realização da medida de PA em uma única visita, não podendo ser utilizada para caracterizar hipertensão arterial. Essa medida deve ser usada como indicador de risco de hipertensão arterial para comparações transversais, em estudos epidemiológicos realizados com crianças e adolescentes. A literatura mostra que a prevalência de pressão arterial elevada pode variar de acordo com população estudada, valores dos cortes adotados (valores desejáveis ou normais), bem como variáveis educacionais, culturais e genéticas. Essas constatações remetem a uma das limitações deste estudo, a qual reside no fato de que os diferentes critérios adotados, assim como as diferentes populações estudadas, dificultaram as comparações. No entanto, é importante ressaltar que não foram encontrados na literatura estudos envolvendo crianças e adolescentes com excesso de peso que tenham incluído o número de casos e a ampla faixa de idade como a enfocada neste trabalho.
Desta forma, o presente estudo demonstrou elevada prevalência de PA alterada em crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade e associação significativa da PCR-us com obesidade grave, circunferência abdominal aumentada e PAS, podendo-se utilizar tais marcadores para identificar crianças e adolescentes com maior risco para o desenvolvimento da aterosclerose.
A prevenção da obesidade desde a infância pode evitar que o estado metabólico/inflamatório desfavorável persista ao longo dos anos, trazendo graves consequências na vida adulta. O tratamento precoce de criança e adolescentes com excesso de peso pode diminuir a incidência de comorbidades na vida adulta. Novas pesquisas são necessárias para demonstrar a associação dos marcadores inflamatórios e as comorbidades relacionadas à obesidade na infância e adolescência, que hoje é um dos principais problemas de saúde pública.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Set 2013
Histórico
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Recebido
05 Out 2010 -
Aceito
14 Fev 2013