Resumos
OBJETIVO Identificar as percepções dos gestores pedagógicos a respeito da relação da alimentação na escola e a promoção dos hábitos alimentares entre escolares.
MÉTODOS Estudo do tipo descritivo, com abordagem qualitativa, desenvolvido no município de Guarulhos por meio de entrevistas com informantes-chave de escolas públicas municipais. Selecionaram-se escolas públicas (n=13), classificadas quanto ao nível de exclusão social, tamanho e atividade econômica da região onde a escola se localiza. Entrevistaram-se coordenadores e diretores individualmente, a partir de um roteiro de perguntas semiestruturadas.
RESULTADOS Observaram-se três categorias temáticas relacionadas à percepção dos diretores e coordenadores pedagógicos: Alimentação no contexto escolar; Papel da alimentação na escola e o Conceito de Segurança Alimentar e Nutricional, evidenciando a alimentação escolar como parte da rotina da escola para atender às necessidades fisiológicas de energia e nutrientes. Entretanto, a alimentação na escola não foi percebida pelos entrevistados como uma ação pedagógica sob sua responsabilidade.
CONCLUSÕES A relação entre a alimentação escolar e a formação de hábitos alimentares não é um tema usualmente discutido entre os diferentes atores sociais envolvidos. A execução de políticas promotoras de saúde em sua plenitude somente será possível com amplo debate sobre como cada escola e sua equipe pedagógica realizam efetivamente as diretrizes do programa e como os atores envolvidos as decodificam no seu dia a dia.
alimentação escolar; hábitos alimentares; segurança alimentar e nutricional
OBJECTIVE To identify teaching managers' perceptions regarding the relationship of school feeding and the promotion of healthy eating habits among students.
METHODS A descriptive study with a qualitative approach was developed in the city of Guarulhos (Southeast Brazil). Key informants from municipal public schools were interviewed. Public schools were selected (n=13) and classified as to the level of social exclusion, size and economic activity of the region where the school was located. Pedagogic coordinators and school principals were individually interviewed with semi-structured questions.
RESULTS From school principals and pedagogical coordinators' perceptions, three categories were identified: Food in the school context; School feeding program's role and the Concept of food and nutrition security, which indicate that they considered meals as part of school routine in order to attain physiological needs of energy and nutrients. Their answers also indicated that they did not consider school meals as a pedagogical action related to their specific responsibilities.
CONCLUSIONS The relationship between the school feeding and the formation of eating habits is not a topic usually discussed between the different professionals involved with health and education. The implementation of health promoting policies will only be possible after a debate about how schools and their pedagogical team adopt the program guidelines and how the professionals decode these strategies in daily activities.
school feeding; food habits; food security
OBJETIVO Identificar las percepciones de los gestores pedagógicos respecto a la relación de la alimentación en la escuela y la promoción de los hábitos alimentares entre escolares.
MÉTODOS Estudio de tipo descriptivo, con acercamiento cualitativo, desarrollado en el municipio de Guarulhos (SP, Brasil), mediante entrevistas con informantes clave de escuelas públicas municipales. Se seleccionaron escuelas públicas (n=13), clasificadas respecto al nivel de exclusión social, tamaño y actividad económica de la región donde se ubica la escuela. Se entrevistaron coordinadores y directores individualmente, a partir de un guión de preguntas semiestructuradas.
RESULTADOS Se observaron tres categorías temáticas relacionadas a la percepción de los directores y coordinadores pedagógicos: Alimentación en el contexto escolar; rol de la alimentación en la escuela y el Concepto de Seguridad Alimentar y Nutricional, evidenciando la alimentación escolar como parte de la rutina de la escuela para atender a las necesidades fisiológicas de energía y nutrientes. Sin embargo, la alimentación en la escuela no fue percibida por los entrevistados como una acción pedagógica bajo su responsabilidad.
CONCLUSIONES La relación entre alimentación escolar y la formación de hábitos alimentares no es un tema usualmente discutido entre los distintos actores sociales implicados. La ejecución de políticas promotoras de salud en su plenitud solamente será posible con amplio debate sobre cómo cada escuela y su equipo pedagógico realizan efectivamente las directrices del programa y cómo los actores implicados las descodifican en su día a día.
alimentación escolar; hábitos alimentares; seguridad alimentar y nutricional
Introdução
As diretrizes para a promoção de alimentação saudável nas escolas foram recentemente instituídas como um elemento a ser contemplado no projeto político pedagógico das unidades escolares( 1 ). A construção desse projeto implica na participação dos profissionais da educação e da comunidade escolar e local visando à articulação entre escola e comunidade para uma gestão democrática( 2 ).
Nesse sentido, o Ministério da Saúde e o da Educação são corresponsáveis por assegurar a implantação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição(3) e, consequentemente, de parte da Política Nacional de Promoção de Saúde( 4 ) nas escolas, em consonância com os critérios de execução do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Este último, por sua vez, tem como objetivos atender as necessidades nutricionais do aluno no período escolar e, nesse contexto, promover hábitos alimentares saudáveis( 4 ).
Ademais, a Alimentação Escolar disciplinada pela lei nº 11.947/2009 inclui a educação alimentar e nutricional no processo de ensino e aprendizagem que perpassa pelo currículo escolar, abordando o tema alimentação e nutrição e o desenvolvimento de práticas saudáveis de vida, na perspectiva da segurança alimentar e nutricional( 5 ).
Considerando-se a gestão descentralizada da educação, os municípios passam a elaborar planos e projetos governamentais para traduzir em ações as normatizações que ainda são centralizadas( 2 ). Nesse processo, são muitos os mediadores que conduzem as ações até que estas cheguem aos espaços escolares e, considerando-se a complexidade dessas ações, muitos atores ainda não usam plenamente as possibilidades e oportunidades.
O objetivo deste trabalho foi identificar as percepções dos gestores pedagógicos quanto à relação da alimentação na escola e à promoção dos hábitos alimentares de escolares.
Método
O estudo, do tipo descritivo, com abordagem qualitativa, foi desenvolvido no município de Guarulhos por meio de entrevistas com informantes-chave de escolas públicas municipais. Selecionaram-se 20% das escolas municipais a partir da combinação de indicadores relacionados a questões socioeconômicas, à urbanização e ao tamanho da escola, obedecendo a critérios estratégicos para garantir a proporcionalidade dos indicadores. A partir da combinação desses três indicadores, selecionaram-se 13 escolas, cada uma atendendo aos três critérios combinados, conforme Tabela 1.
Os informantes-chave, doravante nomeados gestores pedagógicos, foram os coordenadores pedagógicos e os diretores das escolas. A definição dos informantes seguiu os critérios propostos por Minayo( 6 ) e Nogueira-Martins e Bógus( 7 ). Foram entrevistados 26 gestores pedagógicos, sendo um diretor e um coordenador pedagógico de cada escola selecionada. Utilizou-se a entrevista individual em profundidade, técnica que permite o conhecimento de fatos de interesse relatados pelos sujeitos pesquisados, da maneira como são vivenciados em seu cotidiano( 6 , 8 ). O instrumento de coleta de dados constituiu-se de um roteiro semiestruturado, pré-testado em escolas não incluídas na amostra.
As entrevistas, agendadas e realizadas na própria escola por entrevistadores treinados, foram gravadas e transcritas. Para garantir o anonimato e as identidades dos entrevistados, identificou-se a escola de 1 a 13, o coordenador (C) e o diretor (D). Após pré-análise dos depoimentos, orientada pelos pressupostos e objetivos do estudo, realizou-se leitura flutuante e exaustiva do material coletado durante as entrevistas. Depois, com os depoimentos na íntegra, buscou-se uma forma de proceder aos recortes, à categorização e à codificação, à medida que a recorrência dos conteúdos surgia( 6 ).
O projeto de pesquisa vinculado aos dados apresentados foi encaminhado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
Resultados
Todos os informantes-chave das 13 escolas sorteadas foram entrevistados e seus depoimentos foram classificados em três temáticas: Alimentação no contexto escolar, Papel da alimentação na escola e o Conceito de Segurança Alimentar e Nutricional.
A primeira temática, Alimentação no contexto escolar, está diretamente relacionada ao cardápio da alimentação oferecida na escola. Esse cardápio, segundo os entrevistados, tem mudado ao longo dos anos pela composição das refeições oferecidas: "Em outros tempos, a alimentação era muito precária. Hoje, a alimentação realmente é elaborada com carinho, com capricho" (7D). "Eu estou aqui há muito tempo e aqueles bolinhos vinham com muita gordura, muito conservante, produto químico; e agora não, é tudo fresquinho" (10D).
Os depoimentos dos gestores confirmam essas mudanças: "A merenda escolar e a saúde tem tudo a ver, porque a merenda escolar, uma vez que é mais colorido, é mais chamativo, comendo junto com os outros amiguinhos" (7C). "A merenda é maravilhosa, não tem melhor, pelo menos a da minha escola..." (7C).
Por outro lado, alguns aspectos podem ser melhorados: "... de repente, naquela semana, é todo dia arroz e salsicha, por exemplo, né, uma repetição, porque não veio o ingrediente..." (5D). "A realidade do cardápio é uma e a realidade da escola é outra. Acho que ainda está um pouco longe do que deveria realmente ser pra criança, entendeu?" (8C).
A aceitabilidade dos cardápios entre os alunos aparece nos depoimentos dos entrevistados: "Tem alimentos que as crianças não comem de jeito nenhum, acho que pela falta de contato com esses alimentos em casa" (1D); "...Eles pedem para repetir café e nem querem provar o almoço" (4C). "Uma maçã e as crianças não comem, a gente percebe que tá no lixo, se jogou, entendeu, aí a gente passa de sala em sala falando" (9C). "Na verdade, a professora não obriga a criança a comer; a mãe vem ‘meu filho não tá querendo vir para escola porque tá sendo obrigado a comer'. Na verdade, não tá sendo nada disso, há o incentivo sim" (8C).
Na discussão da aceitabilidade do cardápio oferecido, aparece claramente o papel do professor como aquele que incentiva, orienta e que está ao lado no momento da refeição para motivar. Esse apoio pode ser contraditório quando os professores fazem a refeição na escola: "E quase todos [professores] comem na escola" (9C). "Só não é boa quando tem aquele PTS, que eu descobri essa semana o que é proteína de soja!... a carne não é boa, não" (12C).
Segundo os entrevistados, as crianças não aceitam os alimentos por falta de contato e pelos horários diferenciados estabelecidos pela escola. As professoras, por sua vez, incentivam, comendo junto com as crianças, ficando ao lado, olhando e organizando. Se existe muito desperdício, elas passam de sala em sala explicando a importância de consumir os alimentos. Já os coordenadores comem sempre que podem, pois, segundo eles, "dá água na boca". No entanto, para eles, a alimentação ainda precisa ser melhorada, já que existe o desperdício de alimentos tão variados.
Aprofundando a discussão sobre a alimentação no contexto escolar, pôde-se identificar as diferenças de atribuições e como ocorre o processo de comunicação entre os diferentes atores envolvidos: "Como eu te falei, o cardápio... não dá pra trabalhar o cardápio, seguir à risca, tá ali escrito uma coisa e, às vezes, não tem e as meninas [cozinheiras] fazem outra" (8C). "E, às vezes, os professores comentam muito que eles precisariam de mais tempo pra se dedicar à aula e tudo mais e têm que parar, porque têm a obrigação de dar a merenda" (9D).
Observa-se que a comunicação entre os profissionais da escola e os que trabalham na alimentação escolar nem sempre é efetiva. Nesse ambiente, o serviço é rotineiro, fazendo-se o que é pedido ou o que se tem disponível no momento. A alimentação escolar é vista, também, como uma obrigação da escola para com o aluno e isso não auxilia no desenvolvimento dos aspectos pedagógicos da merenda.
Destaca-se, pois, a importância da comunicação entre os atores sociais envolvidos no processo para facilitar a aceitabilidade do cardápio, oferecendo sugestões e aproximando o alimento fornecido na escola das atividades de sala de aula, dado o potencial deste como elemento pedagógico.
A segunda temática identificada foi o Papel da alimentação na escola, o qual abrange os aspectos nutricionais. A merenda tem o papel de contribuir com as necessidades fisiológicas de uma comunidade considerada carente: "Visto que é uma comunidade carente, certamente a merenda tá contribuindo com as necessidades diárias da criança" (2D). "Nós ainda temos um número alto de alunos que falta comida em casa" (6D). "E uma criança mal alimentada não consegue estudar" (6C).
O papel social da alimentação é percebido, pois proporciona o acesso aos alimentos e favorece a integração entre os alunos: "Muitas crianças nós sabemos que vêm aqui primeiro pra comer e depois pra estudar" (6C). "As meninas da cozinha fazem carinho nas crianças, a criança come pra alegrar a cozinheira, é bem legal" (8C). "O envolvimento das crianças com a merenda, com os coleguinhas... o afetivo, o emocional da criança também" (10D). "O estímulo do professor é fundamental, porque não tem essa referência e a escola está abrangendo cada ano um pouco mais, né" (13D).
A merenda escolar auxilia no desenvolvimento dos hábitos alimentares das crianças e estas, por sua vez, podem se tornar multiplicadoras em suas casas, de modo a incentivar os pais a consumirem alimentos diferentes dos usuais: "À medida que a merenda influi nos hábitos alimentares das crianças, ele pode estar também em casa" (3D). "É difícil você mudar hábitos dos pais, mudar na criança é mais fácil do que mudar no adulto" (8C).
A terceira temática identificada durante a análise dos depoimentos dos entrevistados foi o Conceito de Segurança Alimentar e Nutricional, tanto do ponto de vista do alimento seguro quanto da qualidade nutricional desse alimento.
Uma das funções atribuídas aos entrevistados foi controlar a qualidade do alimento oferecido às crianças. Nesse sentido, uma preocupação que surgiu na maioria dos depoimentos referiu-se à questão do alimento seguro, ou seja, Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) focada na possibilidade de o alimento estar contaminado física, química ou biologicamente: "Na horta, a gente só usa adubação orgânica, não tem nada de agrotóxico, nada de veneno" (2C). "Se tem uma baratinha na cozinha, se tem um ratinho, se a cozinheira tá lavando bem aquele alimento" (6D). "Às vezes, a gente acaba comendo carne branca ou vermelha e você está se intoxicando muito..." (8D).
A garantia de que a criança possa se alimentar com produtos de qualidade é responsabilidade da escola e de seus dirigentes: "No sentido de ser uma comida bem higienizada, de ter as condições certas de armazenamento e de estar adequada à faixa etária das crianças, em relação a conservantes ou não conservantes" (11C).
Fica claro nos depoimentos que a SAN está diretamente relacionada não só ao alimento seguro, mas também aos aspectos de qualidade nutricional dos alimentos e das refeições. Sendo assim, pôde-se verificar que segurança alimentar relaciona-se às ideias de: "... que esse alimento vá trazer bem-estar pra ela" (2D). "É o que contém um alimento em termos de vitaminas, sais minerais, estes tipos de coisas" (7C). "...É a criança se alimentar de maneira a promover sua saúde e seu bem-estar, né?" (13D).
Discussão
É possível verificar, assim, que a alimentação escolar mudou. Hoje, os alimentos distribuídos para as escolas são in natura e com grande diversidade, como ocorre em nível nacional, visto que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) determinou, em 2006, que 70% dos recursos do PNAE devem ser utilizados na aquisição de produtos básicos( 4 ), aumentando a quantidade de alimentos como arroz, feijão, verduras e legumes.
Na modalidade de descentralização de autonomização, prevista pelo FNDE( 4 ), na qual a escola é a unidade executora do Programa de Alimentação Escolar, a responsabilidade pelo recebimento e utilização de recursos financeiros é dos gestores locais. Entretanto, no município de Guarulhos, é a prefeitura, por meio do Departamento de Alimentação Escolar (DAE) da Secretaria de Educação, que planeja e administra o cardápio oferecido aos alunos. É interessante observar que essa opção para as políticas locais talvez não esteja muito clara àqueles que estão nas unidades escolares, dando a falsa impressão de que não participam do processo e cabendo à escola apenas acompanhar a aceitabilidade do cardápio oferecido.
A aceitabilidade dos alimentos é influenciada por vários fatores, como a questão da familiaridade com o alimento, que resulta das experiências da criança com o mesmo, sendo necessário expô-la ao alimento rejeitado várias vezes( 9 ). Sullivan e Birch( 10 ) mostraram que a aceitação de novos alimentos aumenta por meio de exposições repetidas, podendo requerer de 8 a 15 exposições para crianças de quatro a cinco anos de idade, antes de haver modificações definitivas na sua alimentação. O PNAE destaca que o índice de aceitabilidade dos cardápios entre os alunos deve ser superior a 85%( 4 ), ou seja, trata-se de um aspecto a se considerar e que aparece nos depoimentos dos entrevistados.
O professor que incentiva e apoia o aluno em suas escolhas, sentando ao seu lado, como referido pelos entrevistados, promove a oportunidade de realizar atividades motivadoras integradas às experiências cotidianas dos estudantes. Assim, a alimentação pode integrar temas relativos ao currículo escolar, tornando-se o instrumento pedagógico proposto pelo PNAE( 4 ).
Além do professor, outros atores envolvem-se com a alimentação do estudante na escola e, nesse sentido, é importante destacar estudos realizados sobre o trabalho da equipe de alimentação escolar e seu relacionamento com a unidade escolar. A merenda interliga-se com as atividades desenvolvidas por todos os profissionais da escola, tanto no papel da alimentação em si - quando há preocupação com a saúde e com as preferências alimentares dos escolares -, como na parte pedagógica, quando é incluída entre as temáticas das aulas. Caniné e Ribeiro( 11 ), ao entrevistarem nutricionistas do Programa de Alimentação Escolar do município do Rio de Janeiro, identificaram que a atuação do nutricionista para ser parceiro da escola deve "conquistar" a confiança da direção, sensibilizando-a para a importância do programa, mas que é limitada pelo grande intervalo entre as visitas realizadas em função do número insuficiente de profissionais.
O papel da alimentação escolar é reconhecido como um programa para atendimento das necessidades nutricionais da comunidade. Essa perspectiva corresponde aos objetivos do PNAE, que, por ser uma política governamental de âmbito nacional, visa a suprir no mínimo 15% das necessidades nutricionais dos escolares durante sua permanência na escola( 4 ). Observa-se que a alimentação na escola é variada, preparada com cuidado e auxilia no desenvolvimento das crianças, dando suporte para o melhor desempenho escolar além de crescimento e o desenvolvimento saudáveis.
A merenda, além de alimentar e nutrir as crianças, também proporciona interação social entre colegas da escola e as cozinheiras. Os professores estimulam o desenvolvimento de bons hábitos alimentares e ensinam como é o sentar-se à mesa e comer adequadamente. Esses momentos também são importantes para o desenvolvimento afetivo e emocional das crianças.
Uma forte relação de afeto é desenvolvida entre as merendeiras e as crianças, fazendo com que essas profissionais desempenhem um papel de cuidadoras, o qual extrapola sua função específica de preparo e distribuição de alimentos( 11 ). Tal relação de afeto é potencializada pelo fato de os beneficiários da merenda escolar serem crianças que têm, nessa alimentação, um suporte para satisfazer suas necessidades alimentares. Assim, a merendeira é um ator-chave ao oferecer os alimentos necessários à saúde das crianças, especialmente frutas e hortaliças, revelando a importância do seu papel, já que o estímulo ao consumo desses alimentos pelos escolares é fundamental na formação de hábitos alimentares saudáveis(12).
Desse modo, fatores como escola, rede social, condições socioeconômicas e culturais são vistos como parceiros da família, de forma a contribuir na construção dos hábitos alimentares saudáveis das crianças( 9 ).
Nessa perspectiva, pode-se verificar a importância da introdução de novos alimentos - a partir do núcleo familiar -na contribuição para as mudanças do consumo alimentar. A família tem um papel determinante na formação dos hábitos alimentares saudáveis na infância, visto que a modificação de um hábito alimentar durante a fase adulta apresenta, de forma geral, alta taxa de insucesso( 9 ). Desse modo, apresenta-se o contexto familiar como um potente fator de influência na adoção de hábitos alimentares das crianças, ratificando a importância dos familiares em atividades educativas realizadas dentro da escola.
As temáticas Alimentação no contexto escolar e Papel da alimentação na escola estão intrinsicamente relacionadas ao conceito de segurança alimentar e nutricional apresentado nos depoimentos.
A contaminação do alimento é um dos aspectos historicamente associados ao conceito de SAN desde sua origem( 13 ). Ultimamente, tal preocupação tem sido reforçada devido aos problemas ambientais( 14 ). Por outro lado, em pesquisa para diagnosticar as ações de educação em saúde e nutrição - com base na alimentação orgânica em uma escola pública estadual de Santa Catarina, envolvendo gerência da alimentação escolar, direção, professores e alunos -, observou-se que a utilização dos produtos de origem orgânica na alimentação escolar pode ser considerada um avanço em direção à melhoria da qualidade de vida de estudantes e produtores locais( 15 ). Estudos como esses despertam a necessidade de manter a formação para os professores de forma continuada e "independente" do comprometimento da direção; o papel do nutricionista é esclarecer a comunidade sobre as diretrizes e funcionamento do programa( 11 , 16 ). Nesse sentido, verifica-se a necessidade de integração entre os diferentes atores responsáveis pela execução do Programa de Alimentação Escolar.
A SAN tem sido um conceito discutido nos últimos dez anos e que, para alguns autores, ainda está em construção. Definir a percepção de atores envolvidos para garantir o direito de uma alimentação adequada é importante, pois esse entendimento pode ser decisivo no planejamento de ações em ambiente escolar( 13 ).
Durante a infância, a alimentação, ao mesmo tempo em que é importante para o crescimento e desenvolvimento, pode representar um dos principais fatores de prevenção de algumas doenças do adulto( 9 ). Agregado a isso, a SAN apresenta duas vertentes: a alimentar, relacionada à produção e à qualidade do alimento, e a nutricional, relacionada ao consumo e aos efeitos fisiológicos da alimentação( 17 ). Assim, verifica-se a complexidade da alimentação escolar e a necessidade de maior aproximação entre os atores sociais envolvidos, para realizar o direito das crianças de terem acesso à alimentação adequada( 18 ).
Em estudo realizado por Boog( 19 ), a partir de uma experiência inovadora em educação alimentar e nutricional, verificou-se que os professores oferecem resistência à incorporação do tema alimentação em suas atividades, em decorrência do fato de não terem conhecimento suficientemente amplo sobre o tema. Esse autor sugere a aproximação dos especialistas em nutrição para sensibilizá-los e apoiá-los no ensino dos temas transversais, particularmente daqueles relacionados à alimentação, incorporando atividades no cronograma escolar de maneira integrada às outras que compõem o currículo.
Os princípios relacionados ao direito social constitucionalmente instituído e ao direito humano à alimentação adequada incluem outros aspectos, como o acesso ao alimento e a sustentabilidade ambiental, social e econômica a partir da diversidade cultural( 20 ). No entanto, para os gestores locais, a alimentação escolar está pautada em questões relacionadas aos aspectos da qualidade do alimento propriamente dito, apontando a necessidade de implementação de estratégias de formação dos atores envolvidos no programa de alimentação.
Agregado a isso, a alimentação no espaço escolar pode ser importante para a promoção da saúde em função da prevalência cada vez maior da obesidade infantil( 21 ). Estudos são realizados para identificar as estratégias mais eficazes para a prevenção e controle da obesidade, verificando-se que as que incluíam atividades regulares na escola, introdução da educação nutricional no currículo de forma regular e o próprio fornecimento de frutas e hortaliças pelos serviços escolares eram as mais efetivas( 22 ).
Pode-se concluir que há desconexão entre o ambiente familiar, o escolar e a sociedade na perspectiva do direito humano à alimentação. A relação entre a alimentação escolar e a formação de hábitos alimentares não é um tema usualmente discutido entre os diferentes atores envolvidos. A execução de políticas promotoras de saúde em sua plenitude somente será possível com amplo debate sobre como cada escola realiza efetivamente as diretrizes do programa e como os sujeitos envolvidos decodificam tais diretrizes no seu dia a dia
Agradecimentos
Às Secretarias Municipais de Saúde e de Educação do município de Guarulhos, pelo apoio durante a coleta de dados.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Set 2013
Histórico
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Recebido
21 Set 2012 -
Aceito
22 Fev 2013