RESUMO
Introdução: Avaliamos os fatores associados à orientação política no Brasil levando em consideração os espectros políticos de esquerda, centro e direita, bem como um conjunto de valores baseados na Teoria de Schwartz. Essa teoria permite entender como os valores pessoais afetam as escolhas e comportamentos dos indivíduos em diferentes contextos, inclusive em relação à orientação política.
Materiais de métodos: Utilizamos a base de dados da sexta onda de pesquisa da World Value Survey, com 1.146 entrevistados para o Brasil no ano de 2014. A análise fatorial confirmatória permitiu validar o questionário de Schwartz e, com isso, elaborar quatro indicadores para os seguintes valores: conservadorismo, abertura à mudança, autopromoção e autotranscendência. Além dessas variáveis, controlamos a análise dos resultados através de um modelo multinomial por um conjunto de variáveis sociodemográficas para avaliar os determinantes do autoposicionamento político.
Resultados: Os indicadores de conservadorismo e a abertura à mudança foram significativos para explicar a diferença entre esquerda e direita. A autotranscendência, por sua vez, é um valor que está associado mais aos cidadãos que se identificaram como de direita do que de centro.
Discussão: Além da importância dos valores para explicar a orientação política no Brasil, as identidades de grupo, isto é, as características sociodemográficas, também são relevantes. Isto é ilustrado pela significância estatística dos parâmetros das seguintes variáveis demográficas: gênero, idade, percepção do nível de renda e nível de escolaridade.
Palavras-chave teoria dos valores humanos; orientação política; conservadorismo político; cultura política; modelo multinomial
ABSTRACT
Introduction: We evaluated a set of factors associated with political orientation in Brazil considering the left, center, and right political spectrums, as well as a group of values based on Schwartz's Theory. This theory enables us to understand how personal values affect individual choices and behavior across different contexts, among which political orientation.
Materials and method: Our source database was the sixth research wave of the World Values Survey, which included 1,146 respondents for Brazil in 2014. The confirmatory factor analysis allowed us to validate the Schwartz questionnaire and, subsequently, devise four indicators for the following values: conservation, openness to change, self-enhancement, and self-transcendence. In addition to these variables, we controlled the analysis of results using a multinomial model with a range of sociodemographic variables to assess the determinants of political self-positioning.
Results: Conservation and openness to change were significant indicators to explain the difference between left and right. Self-transcendence, in turn, was a value more closely associated with citizens who identify as right-wing rather than center.
Discussion: Political orientation in Brazil is heavily reliant on both values and group identities, i.e., sociodemographic characteristics. This is illustrated by the statistical significance of the following demographic variables: gender, age, perceived income level, and education level.
Keywords theory of basic human values; political orientation; political conservatism; political culture; multinomial model
I. Introdução1
Ao longo do tempo, vários estudos têm apontado que construções psicológicas como personalidade, fundamentos morais, e, principalmente, valores pessoais estão associados a diferentes aspectos da cognição e comportamento político dos cidadãos. Em particular, os valores relacionados ao conservadorismo, tais como i) tradição - que significa respeito, compromisso e aceitação das ideias e dos costumes tradicionais da cultura ou da religião; ii) conformidade - que implica na restrição de ações, atitudes e os desejos para se aceitarem as expectativas e as normas sociais; e iii) segurança - que está associada à preferência pela segurança, a harmonia e a estabilidade da sociedade -, têm uma relação importante com o voto (Barnea & Schwartz, 1998; Caprara et al., 2006; Schwartz et al., 2010; Caprara et al., 2017). Esses valores estão associados com a preferência por posições políticas de direita (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Piurko et al., 2011; Caprara et al., 2017) e com as atitudes políticas favoráveis à ordem e à segurança social (Schwartz et al., 2010; Stubager, 2008).
Os resultados desses trabalhos são consistentes com alguns estudos que indicam que o conservadorismo político está relacionado com a resistência à mudança, à aceitação da desigualdade econômica e à ideologia de direita (Jost et al., 2003; Thorisdottir et al., 2007; Van der Toorn et al., 2017). Essa evidência mostrou-se robusta em países de língua inglesa e da Europa Ocidental (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Piurko et al., 2011; Caprara et al., 2017), os quais são normalmente denominados em diversos estudos psicológicos como países culturalmente ocidentais (Gattario et al., 2015; Gestsdottir et al., 2015).
No entanto, os valores conservadores têm mostrado limitações para explicar a orientação política em países não ocidentais (Caprara et al., 2017; Hadarics, 2017). Isto é observado em trabalhos com amostras de países europeus pós-comunistas ou da Europa Oriental (Hadarics, 2017; Barni et al., 2016; Piurko et al., 2011; Hadarics, 2017), bem como em amostras com países latino-americanos (Schwartz & Barnea, 1995; Solano et al., 2015). Esses resultados seriam decorrentes das diferenças culturais, políticas e econômicas de cada sociedade (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016) uma vez que, devido aos próprios processos históricos, cada um deles pode dar um significado diferente à dimensão política da esquerda-direita. Por essa razão, é importante observar empiricamente esses processos no contexto específico da realidade do Brasil.
Em resumo, o presente estudo pretende identificar se as quatro dimensões de valores da proposta de Schwartz (1992), relacionados ao conservadorismo, à abertura à mudança, autopromoção e autotranscendência, estão associados com a orientação política, operacionalizada por meio de posicionamentos políticos de esquerda/centro/direita em uma amostra representativa do Brasil. Nesta pesquisa, foram apresentados onze itens sobre os valores propostos de Schwartz.
Vale registrar que a Teoria dos Valores de Schwartz está, em alguma medida, associada com os modelos que estudam os fatores globais de personalidade, conhecidos como Big Five2. Este último é bastante utilizado em pesquisa psicológica e em testes de personalidade, mas não será diretamente analisado no texto. Embora a teoria dos valores de Schwartz e o modelo Big Five sejam abordagens diferentes, eles estão relacionados porque existem algumas sobreposições entre os valores e as características da personalidade. Assim, as duas ideias ajudam a compreender a personalidade humana, e oferecem importantes insights sobre como as pessoas pensam, sentem e se comportam.
Após a criação da Escala de Valores Básicos de Schwartz (1992), a World Values Survey (WVS) incluiu as perguntas a ela relacionadas em seus questionários a partir da quinta onda de pesquisas, realizada entre 2005 e 2007. Isso permitiu que vários estudos sobre essa temática fossem desenvolvidos, aos quais se acrescentaram diversos refinamentos ao longo do tempo. Por exemplo, o Inventários de Valores de Schwartz - SVS (Schwartz, 1992) foi aprimorado no Questionário de Perfis de Valores (PQV) (Schwartz et al., 2001). Posteriormente, Schwartz et al. (2012) propuseram um refinamento da teoria dos valores individuais básicos que analisa e discrimina 19 valores. De todo modo, as quatro dimensões de valores da proposta de Schwartz (1992) são verificadas em todas as variações dos questionários.
Assim, num primeiro momento, este artigo vai investigar se as perguntas associadas à teoria dos valores básicos, no caso brasileiro, também se relacionam com as dimensões propostas pelo autor através de uma análise fatorial confirmatória. Em seguida, serão realizadas as respectivas análises dessas dimensões e suas relações com a orientação política através dos dados da sexta rodada de questionários da World Values Survey (WVS). Assim, este artigo está estruturado da seguinte forma: inicia com esta introdução, seguida do referencial teórico, onde são discutidos os conceitos da teoria dos valores humanos e suas dimensões. Depois, é apresentada a metodologia da pesquisa e os dados para, em seguida, apresentar e discutir os resultados. Por fim, seguem as considerações finais.
II. Referencial teórico
Segundo Caprara et al. (2006), nas democracias ocidentais, as escolhas políticas dos eleitores estão mais associadas às suas preferências pessoais do que às próprias características sociais. Todavia, nem sempre foi assim. Durante muito tempo o debate econômico foi central para diferenciar as escalas ideológicas. Uma das razões que explicam a mudança de perspectiva é que os partidos políticos - especialmente os de esquerda e de direita - ficaram cada vez mais parecidos no debate econômico visando atrair os votos do centro político. Assim, a diferenciação entre tais partidos mudou de foco, especialmente num contexto em que o eleitorado passou a se preocupar mais com as relações sociais. Conforme alertou Mitchell et al., “disagreements between liberals and conservatives are rooted not just in different assumptions about how to promote economic growth or in different conceptions of their self-interest but in fundamental values” (1993, p. 637).
Nesse sentido, diversos teóricos identificaram uma série de valores básicos sob os quais os indivíduos atribuem importância enquanto princípios que guiam suas vidas, tais como: tradição, benevolência e hedonismo. Esses valores são a base da ideologia (Caprara et al., 2006). No campo da ciência política, é possível identificar como os valores influenciam a orientação política. Isso acontece porque eles “são construtos importantes no conjunto dos conceitos psicossociais considerados centrais para a predição de atitudes e comportamentos” (Torres et al., 2016, p. 342). Ou seja, as pessoas expressam seus valores por meio dos seus comportamentos.
Valores são representações cognitivas de desejos, objetivos transituacionais que servem como um guia de princípios da vida das pessoas (Schwartz, 1992). Eles podem afetar os traços, os quais são definidos como dimensões de diferenças individuais em tendências para mostrar padrões consistentes de pensamento, sentimento e ação (McCrae & Costa, 1990). Enquanto os traços descrevem como as pessoas são, os valores referem-se ao que elas acham importante. Os traços podem ser negativos ou positivos, mas os valores de um indivíduo são fundamentais para justificar escolhas ou ações consideradas legítimas ou valorosas.
De acordo com Rokeach, valores são crenças duradouras “that a specific mode of conduct or end-state of existence is personally or socially preferable to an opposite or converse mode of conduct or end-state of existence” (1973, p. 5). Já para Schwartz (1992), valores são i) conceitos ou crenças que ii) transcendem situações específicas; iii) referem-se a estados finais ou comportamentos desejáveis, iv) guiam a seleção ou avaliação dos comportamentos e eventos, e v) são ordenadas por importância relativa. Assim, os valores diferem das atitudes em sua generalidade (item ii) e em sua ordem hierárquica de importância (item v). Portanto, as atitudes referem-se a avaliações de objetos específicos, ao passo que os valores são padrões gerais utilizados como base para numerosas avaliações situacionais.
Segundo Allison et al. (2021), podemos dizer que os valores são crenças fundamentais que orientam as atitudes e comportamentos das pessoas em relação ao sistema político. Eles estão relacionados às crenças mais profundas que as pessoas têm sobre a política e a sociedade, enquanto as atitudes são mais específicas e direcionadas a questões ou políticas específicas. Os traços também podem influenciar o comportamento político, mas são mais relacionados às características individuais duradouras de uma pessoa.
Na literatura de cultura política, os valores são entendidos como crenças ou princípios fundamentais que guiam as atitudes e comportamentos dos indivíduos em relação à política e ao sistema político. Esses valores ajudam a explicar por que as pessoas se envolvem (ou não) na política, por que elas escolhem apoiar ou rejeitar certas políticas ou candidatos e como elas se comportam em situações políticas. Os valores podem ser entendidos como um tipo de crença mais profunda do que uma atitude ou opinião. Eles são mais persistentes e mais amplamente aplicáveis do que uma opinião, e menos específicos do que uma atitude. Os valores também têm uma relação mais direta com o sistema político em geral, enquanto as atitudes podem ser mais direcionadas a questões ou políticas específicas.
Existem diferentes tipos de valores políticos, incluindo valores democráticos, valores autoritários, valores de direitos individuais e valores de igualdade, os quais podem estar em conflito uns com os outros, bem como variar em importância para diferentes pessoas. Além dos valores, os traços também podem influenciar o comportamento político das pessoas. Traços são características psicológicas duradouras de um indivíduo que afetam sua maneira de pensar, sentir e agir (Muller, 2001). Algumas características de personalidade, como a disposição para assumir riscos ou a necessidade de segurança, podem influenciar a maneira como as pessoas se comportam em situações políticas.
Nessa perspectiva, a Teoria dos Valores Básicos de Schwartz ocupa lugar de destaque na literatura sobre o tema. O autor faz uma reformulação da Teoria dos Valores Humanos Básicos desenvolvida por Rokeach (1973). A Teoria de Schwartz apresenta dez valores básicos universais: poder, conquista (ou realização), hedonismo, encorajamento, autodireção (ou pensamento independente), universalismo, benevolência, tradição, conformidade e segurança, conforme ilustrado na Figura 1.
Note que o encorajamento (estimulação) e a autodireção (autocentração) estimulam a independência de pensamento, sentimento, ação e a recepção às mudanças. Esses valores conflitam com os valores conservadores (conservadorismo), tais como conformismo, tradição e segurança. Existem, ainda, os valores de autotranscendência, que são marcados pela ênfase na aceitação dos outros como iguais e pelo seu bem-estar [universalismo e benevolência]. Esses últimos, por sua vez, conflitam com o que se chama autopromoção, que engloba os valores de poder e realização.
Diversos trabalhos sugerem que os eleitores votam em partidos que prometem manter ou preservar os seus valores pessoais. Em grandes linhas, observa-se que partidos mais à direita enfatizam a defesa da economia de mercado e dos empresários como meio de gerar riqueza; eles também enfatizam a segurança, os limites do tamanho do governo, a família e valores nacionais. Em contraste, a centro-esquerda defende o mérito do estado de bem-estar social, expressa forte preocupação com a justiça social, ao passo em que enfatiza o pluralismo e a igualdade (Bobbio, 1996).
Contudo, em 2012 houve uma reformulação, feita pelo próprio Schwartz, da sua Teoria. Schwartz et al. (2012) identificaram 19 valores potenciais: Autodireção de Pensamento e de Ação; Estimulação; Hedonismo; Realização; Poder de Domínio e Poder sobre Recursos; Segurança Pessoal e Social; Tradição; Conformidade com Regras e Conformidade Interpessoal; Benevolência Dependência e Cuidado; Compromisso; Universalismo Natureza e Universalismo Tolerância; Face; e Humildade. A Figura 2 é uma representação gráfica elaborada por Torres et al. (2016) para ilustrar essa nova reformulação.
Com base nessas ideias, Thorisdottir et al. (2007) examinaram os eleitores de 19 países da Europa a fim de verificar as motivações das suas orientações políticas. Os autores usaram como fonte de dados a European Social Survey (ESS) e levaram em conta os elementos contidos na teoria de Schwartz et al. (2001). Em linhas gerais, a ideia foi verificar se valores como tradicionalismo, complacência com a desigualdade, necessidade de lei e ordem, segurança e abertura a novas experiências estão ligados aos eleitores de direita. Os resultados apontaram que tradicionalismo e aceitação da desigualdade predizem a orientação política de direita nos países da Europa Ocidental, ao passo que o tradicionalismo melhor prevê a orientação de direita nos países do leste europeu. A necessidade de regras é um valor mais compartilhado na Europa Ocidental que no Leste europeu. Interessante notar que a necessidade de segurança, bem como a abertura à novas experiências são valores da esquerda nos países no leste europeu e de direita na Europa Ocidental.
Os resultados empíricos dos estudos que usaram a estrutura de valores de Schwartz para conhecer a orientação política apontam para uma forte relação entre valores conservadores e preferência por uma orientação política de direita. O debate sobre valores conservadores pode estar vinculado a uma orientação política de extrema-direita devido ao fato de que muitos deles são compartilhados por tais grupos, como a defesa da tradição, da ordem e da autoridade, a resistência às mudanças sociais e à diversidade cultural, além da ênfase na segurança e na identidade nacional.
Norris & Inglehart (2019), argumentam que o populismo autoritário está relacionado a um conjunto de valores culturais que se tornaram mais salientes nos últimos anos, em particular, a oposição às mudanças sociais e culturais, a ênfase na segurança e na ordem, bem como numa visão do mundo em que a sociedade é dividida entre “nós” e “eles”. Esses valores estão associados a uma postura de extrema-direita, que muitas vezes é populista e autoritária. O populismo autoritário é uma forma de política que se baseia em líderes carismáticos que se apresentam como representantes do “povo” e que criticam as elites políticas e econômicas. Eles frequentemente defendem a ideia de que a democracia é frágil e que é necessário tomar medidas drásticas para proteger a ordem e a segurança nacionais. O populismo autoritário é muitas vezes acompanhado por um forte nacionalismo e uma hostilidade em relação a grupos minoritários e estrangeiros.
Isso coaduna com o que foi observado para o caso brasileiro nas eleições de 2018. O discurso político do presidente eleito naquele ano, Jair Bolsonaro, foi caracterizado por uma retórica nacionalista, conservadora e populista que atraiu uma base de apoio significativa entre a classe média e a população rural do Brasil. A ascensão de Bolsonaro está ligada a mudanças sociais, políticas e econômicas que ocorreram no país nas últimas décadas, mas pode estar associada, também, aos valores conservadores já presentes em parte da população e que ganhou espaço entre aqueles cuja orientação política estava mais ao “centro”. Este movimento talvez tenha ganhado tração após 2014 com a onda de protestos sociais que aconteceram no Brasil, bem como no período subsequente marcado pela crise política e econômica que desencadeou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016.
Em resumo, o debate sobre valores conservadores pode estar vinculado a uma orientação política de extrema-direita quando esses valores são utilizados para justificar uma postura autoritária, populista e nacionalista. É importante ressaltar que nem todos os defensores de valores conservadores são de extrema-direita, mas a associação entre esses valores e essa orientação política é uma tendência histórica e política relevante.
Ao comparar a primeira e a segunda versões da Teoria dos Valores Básicos de Schwartz, é possível identificar que quatro valores estão presentes em ambas: Autotranscendência, Abertura à Mudança, Autopromoção e Conservadorismo. Dessa forma, o presente trabalho tentou explorar a orientação política no Brasil com esses quatro valores principais.
O estudo sobre a relação entre os valores e a orientação política no Brasil pode servir de subsídio para melhor compreender a ascensão da direita radical no país a partir das eleições de 2018. Vários trabalhos (Amaral et al., 2020; Setzler, 2021; Fuks et al., 2021) sugerem que a ideologia exerceu relevante influência na eleição de Jair Bolsonaro naquele ano. Assim, sob essa ótica, a crescente expansão dos valores associados à direita teria contribuído para a vitória do ex-presidente.
É importante salientar que o estudo aqui proposto utiliza dados de 2014, pois essa é a data mais recente em que as questões relacionadas aos valores de Schwartz estão disponíveis na World Values Survey (WVS). Este foi um período relevante na política brasileira, marcado por eventos como: i) uma eleição presidencial acirrada e polarizada; ii) o início da Operação Lava Jato, que investigou esquemas de corrupção; iii) manifestações em diversas cidades brasileiras contra a Copa do Mundo e a classe política tradicional; iv) surgimento de movimentos ditos apartidários que, posteriormente, se aliaram com a direita e foram ativos na luta pelo impeachment da presidente Dilma em 2016.
Esse contexto pode ter criado um ambiente de acirramento da polarização, ainda que assimétrica (Fuks & Marques, 2023), e talvez tenha favorecido o surgimento de políticos radicais que conseguiram chamar atenção dos eleitores cujos valores latentes tinham alguma sintonia com a direita democrática. Não se deve perder de vista, no entanto, que a ascensão da direita radical brasileira pode ter sido consequência da eleição do ex-presidente Jair Bolsonaro, tal como sinalizam Russo et al. (2022).
II.1. Conservadorismo político, valores pessoais e orientação política
Os principais autores apontam que o conservadorismo político de direita é caracterizado por duas dimensões: resistência à mudança e aceitação da desigualdade (Bobbio, 1996; Jos & Kruglanski et al., 2003; Muller, 2001). A primeira dimensão apela à tendência das pessoas conservadoras em preferirem o que é seguro e de se comportarem de acordo com as formas tradicionais (Wilson, 1973). Nessa linha, as evidências indicam que indivíduos com esses valores tendem a rejeitar a imigração, bem como têm atitudes positivas em relação à moralidade tradicional e à manutenção da Lei e da Ordem (Schwartz et al., 2010). A segunda dimensão baseia-se na noção de que os conservadores observam a sociedade de forma hierárquica, enquanto as pessoas de orientação política liberal idealizam o valor da igualdade (Bobbio, 1996; Jost et al., 2003). Evidências empíricas validam essas últimas afirmações e mostram que a avaliação da igualdade varia entre aqueles que pertencem à direita ou à esquerda política (Barnea & Schwartz, 1998; Caprara et al., 2017; Rokeach, 1973; Schwartz et al., 2010).
As dimensões do conservadorismo político foram usualmente medidas através de duas maneiras: a) via aplicação em conjunto das escalas de Autoritarismo da Ala Direita (RWA) e Orientação de Domínio Social (SDO) (Jost et al., 2003); e b) por meio dos Valores Pessoais de Schwartz (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Thorisdottir et al., 2007). As escalas RWA (Altemeyer, 1998) e SDO (Sidanius & Pratto, 1999) analisam uma série de atitudes sociais que estariam na base da ideologia conservadora: coesão social e segurança coletiva (no caso do RWA), e a superioridade com base na afiliação do grupo (no caso de SDO). Por outro lado, Schwartz desenvolveu uma teoria onde identifica 10 tipos de valores motivacionais diferentes, os quais teriam uma estrutura quase circular com duas dimensões contrapostas as quais contemplam os 4 altos valores, como se observa na Figura 2 (Schwartz & Boehnke, 2004):
Os valores de conservadorismo representam segurança, tradição e conformidade, valores que enfatizam a autodisciplina, preservação das práticas tradicionais e estabilidade; os valores associados à abertura à mudança refletem autodireção e estimulação, valores que enfatizam a independência pessoal e uma posição favorável à mudança; Os valores de autotranscedência buscam captar características como universalismo e benevolência, valores que enfatizam a aceitação dos outros como iguais e a preocupação com o seu bem-estar; por fim, valores de autopromoção representam poder e realização, valores que enfatizam o sucesso pessoal e o controle sobre os outros. Vale destacar que o hedonismo situa-se no meio dos valores de Autopromoção e de Abertura à mudança (Schwartz & Boehnke, 2004).
Recentes estudos apontaram que os valores de conservadorismo estão relacionados ao RWA, enquanto os valores de Autopromoção estariam relacionados ao SDO (Cohrs et al., 2007; McKee & Feather, 2008; Livi et al., 2014; Duckitt & Sibley, 2017). Portanto, ambas as formas de medida estariam apontando para as mesmas dimensões do conservadorismo político (Aspelund et al., 2013). No entanto, uma vantagem importante da proposta de valores pessoais de Schwartz é que esse modelo teve ampla validação em diversas amostras representativas de diferentes países e culturas (Fontaine et al., 2008; Schwartz, 1992). Além do mais, autores têm mostrado a utilidade das diferentes versões da escala de valores de Schwartz e de seus itens para o estudo de cognição e comportamento político em contextos ocidentais e não ocidentais (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Caprara et al., 2017; Piurko et al., 2011; Thorisdottir et al., 2007).
Os estudos que usaram a estrutura de valores de Schwartz para se conhecer a orientação política de forma transcultural, apontaram para uma forte relação entre valores conservadores e uma preferência por uma orientação política de direita (Aspelund et al., 2013; Piurko et al., 2011; Thorisdottir et al., 2007). Esses resultados ocorreram principalmente em países da Europa Ocidental e países Anglofalantes, cuja literatura das ciências cognitivas e do comportamento foi identificada como “países ou culturas ocidentais” (Gattario et al., 2015; Gestsdottir et al., 2015; Schwartz, 2006). Segundo Inglehart & Welzel (2005), esses países caracterizam-se por terem economias desenvolvidas e industrializadas, uma herança cultural judaico-cristã; democracias consolidadas; e valores orientados para a autoexpressão. De acordo com os principais autores, esses países caracterizam-se pela própria marca da orientação cultural para o individualismo, ao contrário de outros grupos culturais (Hofstede, 1980; Schwartz, 2006).
Por outro lado, a relação entre valores conservadores e orientação política não tem sido consistente em estudos realizados com amostras de culturas ou países não ocidentais. (Caprara et al., 2017), como em nações pós-comunistas (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Piurko et al., 2011; Thorisdottir et al., 2007). Nos países da América Latina, há evidências muito limitadas sobre as relações entre valores e a orientação política. A maioria desses estudos foi realizada em amostras não representativas e de estudantes universitários (Brussino et al., 2013; Zubieta et al., 2008); e, em alguns casos, com resultados pouco consistentes (Schwartz & Barnea, 1995). Portanto, é relevante se estudar se os valores relacionados à resistência à mudança (conservadorismo) ou aceitação da desigualdade (autopromoção) permitem uma melhor compreensão da orientação política no contexto de países latino-americanos, tal como o caso brasileiro aqui analisado. De acordo com Inglehart & Carballo (1997), e Schwartz (2006), a América Latina é um grupo cultural diferente do Ocidente, relativamente homogêneo e com uma herança cultural da própria história colonial ibérica e católica. Schwartz (2006) e Hofstede (1980) indicam que essa região se caracteriza pelos próprios valores coletivistas, com certas diferenças entre os países que o compõem nos níveis de individualismo (Imhoff & Brussino, 2013).
Finalmente, Barni et al. (2016) apontam que uma das limitações da maioria dos estudos da psicologia sobre orientação política é que eles se concentraram apenas em observar o posicionamento dos indivíduos no espectro esquerda-direita. Como esses autores mencionam, não há um consenso claro sobre os significados das posições esquerda e direita; significados que, além disso, podem variar ao longo do tempo e no contexto de cada país. Na pesquisa realizada por esses autores em 20 países da Europa Ocidental e pós-comunistas, eles identificaram que os valores conservadores estavam positivamente associados à direita política no Ocidente; no entanto, nos países pós-comunistas, esses valores foram positivamente associados a atitudes em relação à igualdade econômica.
III. Dados e método
III.1. Variáveis e instrumentos
Foram analisadas as informações da Pesquisa Mundial de Valores, na sua sexta edição (WVS-6) em que participaram 86,274 pessoas em 60 países. Desses, o Brasil foi selecionado como foco do estudo. A amostra completa no Brasil foi de 1486 entrevistados em 2014, sendo a amostra válida de 1146 participantes, dos quais 53% eram mulheres e 47% homens representantes da população de mais de 15 anos (World Values Survey, 2015). Vale a pena ressaltar que o WVS é fonte de dados desde 1981 e que tem sido utilizada em trabalhos científicos nos últimos 40 anos por diversas áreas e diversos autores (Norris & Inglehart, 2019). A aplicação da pesquisa foi realizada pela UFMG e feita in situ. A Pesquisa WVS-6 usa um questionário que recolhe, em seus diferentes itens, aspectos relacionados à cognição social e política dos participantes. Com base na Teoria dos Valores Básicos, as estimativas a seguir buscaram identificar os fatores associados com a orientação política dos brasileiros no ano de 2014. A escolha deste corte temporal se justifica porque as perguntas condizentes com a Teoria de Schwartz só aparecem naquele ano na base de dados utilizada.
O primeiro passo foi construir a variável de orientação política. Seguindo o trabalho de Barni et al. (2016), a medida da orientação política foi obtida através dos itens que se referem ao auto posicionamento político de cada entrevistado numa escala de 10 categorias em que 1 = esquerda e 10 = direita. Itens similares têm tido um amplo uso no estudo da orientação política em diversas culturas (Aspelund et al., 2013; Jost et al., 2003; Piurko et al., 2011; Thorisdottir et al., 2007). Assim, a variável resposta utilizada nesse artigo é decorrente da pergunta V95 da WVS-6: “Quando se trata de política, as pessoas se referem a ‘esquerda’ e ‘direita’. Em geral, como você colocaria seus pontos de vista nesta escala?”. A escala vai de 1 a 10, quanto mais próximo de 1 maior a identificação do entrevistado com a esquerda, quanto mais próximo de 10 maior a identificação com a direita. Para aquele ano, os resultados podem ser observados no Gráfico 1.
No Quadro 1, observa-se que a distribuição da orientação política se concentrou no centro - mais de 40% da amostra citou as escalas centrais: 4, 5, 6 e 7. Por outro lado, os mais próximos da esquerda - escalas 1, 2 e 3 - representaram quase 20% da amostra. Esse percentual foi parecido com os que se identificam com a direita - escalas 8, 9 e 10. Com base nesses resultados, optou-se não apenas por investigar os fatores associados com a orientação política classicamente definida como esquerda/direita. Mas também é fundamental considerar o “centro” na análise aqui proposta. Desconsiderar esse espectro político, como muitos trabalhos fazem, não produz respostas acuradas acerca dos fatores associados à orientação política. Em outras palavras, a variável de auto posicionamento foi definida da seguinte forma: aqueles que responderam 1, 2 e 3 no questionamento V95, foram classificados como de “esquerda”; os que responderam 8, 9 e 10 foram classificados como de “direita”; os demais, 4, 5, 6 e 7 receberam o rótulo de “centro”.
Portanto, do ponto de vista metodológico, o presente trabalho considera que existem três possibilidades de orientação política - esquerda, direita e centro - e não apenas duas - esquerda e direita. Isso implica a estimação de um modelo multinomial. A orientação política mais popular é “esquerda-direita” ou “liberal-conservador”. Não se deve ignorar que essa classificação é controversa. Lipset (1960), por exemplo, argumentou que historicamente a “direita” esteve associada à aristocracia e ao conservadorismo. A esquerda, por sua vez, esteve associada à reforma social e ao igualitarismo. Porém, com as mudanças políticas, a derrota do comunismo e a emergência de novas políticas, os significados tradicionais sofreram alterações. Isso significa que a simples dimensão “direita-esquerda” pode ser insuficiente para representar a competição política (Piurko et al., 2011).
No questionário da WVS-6 (Tabela 1), foram considerados 11 itens do modelo de valores de Schwartz. Conforme observado, cada item descreve ao participante a forma de ser de uma pessoa, e o entrevistado deve indicar o quanto ele se parece com cada uma delas numa escala de 1 = “muito parecida comigo” ao 6 = “muito diferente de mim”. Para facilitar a análise, a escala foi invertida. Esses itens têm sido utilizados em outras pesquisas, mostrando a sua pertinência para os estudos psicológico-sociais (Morselli et al., 2012; Pande & Jain, 2014). Com essas informações foi possível realizar uma análise fatorial exploratória (AFE) a fim de avaliar a estrutura fatorial da escala de valores de Schwartz e obter os indicadores de dimensionalidade, confiabilidade e validade estatística das quatro escalas de medida.
A análise implementada utilizou uma matriz policórica e método de extração Robust Diagonally Weighted Least Squares (RDWLS) (Asparouhov & Muthen, 2010). A decisão sobre o número de fatores a ser retido foi realizada por meio da técnica da Análise Paralela com permutação aleatória dos dados observados (Timmerman & Lorenzo-Seva, 2011) e a rotação utilizada foi a Robust Promin (Lorenzo-Seva & Ferrando, 2019). Os testes de esfericidade de Bartlett (χ2: 1743,6; gl = 55; p < 0,01) e KMO (0,71) sugeriram interpretabilidade da matriz de correlação dos itens. A análise paralela sugeriu quatro fatores como sendo os mais representativos para os dados.
Num segundo momento, realizou-se uma Análise Fatorial Confirmatória (ACF) com o objetivo de avaliar a plausibilidade de uma estrutura unidimensional para a escala de valores de Schwartz (Schwartz, 2012) usando os itens sugeridos pela AFE. Com isso obtêm-se as cargas fatoriais para construir a escala de medida de cada um dos quatro construtos. A AFC permite corrigir ou corroborar, no caso de tê-las, as deficiências da AFE, conduzindo a um maior contraste das hipóteses especificadas (Bollen, 1989). Os índices de ajuste utilizados apresentaram os seguintes resultados: χ2: 42.915; χ2/gl = 1.26 Comparative Fit Index (CFI): 0.993; Tucker-Lewis Index (TLI): 0.989; Standardized Root Mean Residual (SRMR): 0.028 e Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA): 0.016. Valores de χ2 não devem ser significativos; a razão χ2/gl deve ser < que 5 ou, preferencialmente, < que 3; Valores de CFI e TLI devem ser > que 0,90 e, preferencialmente acima de 0,95; Valores de RMSEA devem ser < que 0,08 ou, preferencialmente < que 0,06 (Brown, 2006). O que mostra que a estrutura unidimensional apresentou resultados de ajuste bons para poder usar as cargas fatoriais na construção das quatro escalas de medida3. Os resultados dessa análise podem ser observados na Tabela 1.
Análise fatorial confirmatória dos 11 itens-valores referidos ao modelo teórico de Schwartz presentes na WVS-6
III.2. Modelo econométrico
Além do presente artigo ter como foco a investigação dos valores individuais e das características sociodemográficas associadas com a orientação política no Brasil, há uma diferença metodológica importante em relação à maioria dos estudos sobre o tema. Ao contrário do que se faz amplamente, entende-se que as categorias esquerda-direita são insuficientes para explicar a orientação política. No caso específico do Brasil, uma parte considerável da população se identifica como de “centro”, tal como se pode verificar nas seções seguintes.
Portanto, não é razoável limitar o estudo a apenas duas respostas possíveis - direita e esquerda. Nesse sentido, este trabalho considera três possibilidades de orientação política: esquerda, centro e direita. Do ponto de vista metodológico, isso implica na estimação de um modelo multinomial. Quando esse é o caso, é preciso considerar a probabilidade de ocorrência para as três categorias. Em que:
, e são, respectivamente, a probabilidade de ocorrência da categoria de referência que, nesse caso, é a orientação política de esquerda; a probabilidade de ocorrência da orientação política de centro; e a probabilidade de ocorrência da orientação política de direita.
Na forma completa, as expressões anteriores podem ser escritas como:
Genericamente, o modelo estimado pode ser representado por:
em que y = variável dependente que diz respeito ao auto posicionamento político do entrevistado; 1 se esquerda; 2 se centro; e 3 se direita; sexo = 1 se mulher e 0 se homem; raça = 1 se negro e 0 se não negro; idade = idade dos entrevistados; idade2 = idade ao quadrado; educ = nível de escolaridade do entrevistado em três categorias: 1 - até ensino fundamental completo; 2 - de ensino médio incompleto até ensino médio completo; 3 - ensino superior incompleto até ensino superior completo; renda = escala de 1 a 10 da seguinte pergunta: “Neste cartão há uma escala de renda na qual 1 indica o grupo de renda mais baixa e 10 o grupo de renda mais alta em seu país. Gostaríamos de saber em que grupo se encontra o seu agregado familiar. Por favor, especifique o número apropriado, contando todos os salários, vencimentos, pensões e outros rendimentos que entram”. O objetivo é capturar a percepção do entrevistado sobre o seu nível de renda relativo.
As variáveis acima descritas fazem parte de um conjunto de controles sobre as características sociodemográficas dos entrevistados4. As variáveis expostas a seguir, por outro lado, foram construídas a partir da análise fatorial apresentada anteriormente, e tentam captar um conjunto de valores que potencialmente estão associados com a orientação política: i) conservadorismo = indicador de conservadorismo; ii) autotranscedência = indicador da autotranscedência; iii) abertura à mudança = indicador de abertura à mudança; iv) autopromoção = indicador da autopromoção.
IV. Resultados e discussão
Antes de descrever os resultados do modelo econométrico, é importante perceber que a Tabela 2 apresentada a seguir traz três modelos distintos. A diferença entre eles está no controle por variáveis alternativas que fazem referência, de alguma forma, à renda do indivíduo. O objetivo é verificar se os demais controles possuem alguma robustez. Por exemplo: no primeiro modelo foi considerada a variável “Renda” já apresentada na seção III.1; no segundo modelo ela é substituída pelas respostas da seguinte pergunta: “Qual é o seu grau de satisfação com a situação financeira do seu agregado familiar? Se ‘1’ significa que você está completamente insatisfeito nesta escala, e ‘10’ significa que você está completamente satisfeito, onde você colocaria sua satisfação com a situação financeira de sua família?”; por fim, o terceiro modelo substitui a pergunta anterior pelo seguinte questionamento: “As pessoas às vezes se descrevem como pertencentes à classe trabalhadora, à classe média ou à classe alta ou baixa. Você se descreveria como pertencente à: i) classe alta, ii) classe média alta, iii) classe média baixa, iv) classe trabalhadora ou v) classe baixa?”. Vale destacar que as variáveis “Renda” e “Classe Social” captam muito mais a percepção do indivíduo quanto à sua posição social do que a sua posição social de fato. Para conferir os efeitos marginais, o leitor deve consultar o Anexo 1.
Conforme pôde ser observado na Tabela 2, cujos parâmetros estão na forma de odds-ratios, de modo geral os termos de idade e idade ao quadrado foram significativos para a categoria “esquerda” em relação a categoria “direita” em todos os modelos. Isso significa que os mais jovens tendem a se considerar mais de esquerda. Porém, a partir de certa idade, a probabilidade de se perceber de esquerda cai em relação a se autorreferir de direita.
A variável ‘sexo’, cuja referência é o gênero feminino, mostrou-se significativa para a orientação política de esquerda em todos os modelos. Os valores, contudo, indicam que as mulheres têm menor probabilidade que os homens de se declararem de esquerda quando comparado aos que se perceberam como de direita. Quanto à raça, não houve diferenças estatísticas entre os negros e os demais para qualquer tipo de orientação em nenhum dos três modelos.
A variável “educação” revela que quanto maior o nível de escolaridade, maior a probabilidade dos indivíduos se declararem de esquerda e de centro em relação a se perceberem de direita. Ela permaneceu significativa em todos os modelos. Por fim, a escala de renda tem maior relevância não para separar as categorias esquerda-direita, mas para diferenciar aqueles que se consideram de centro em relação aos que se classificam como de direita. Nas estimações alternativas - representadas na Tabela 2 como Modelo 2 e Modelo 3 -, percebe-se que a variável “classe social” não foi significativa, ao passo que os maiores níveis de “Satisfação com a Renda” se mostraram menos associados com a orientação de esquerda em relação à direita.
A visão dos sociólogos políticos, tais como Evans (2000) e Lipset & Rokkan (1967), indica que os eleitores tendem a escolher partidos que promovam seus interesses de classe. Assim, foi desenvolvida a hipótese de que os trabalhadores tendiam a votar em partidos de esquerda e a classe média em partidos de direita. Segundo Piurko et al. (2011), isso tornou-se uma espécie de axioma na sociologia política. Mas, ao que parece, a relação entre os eleitores e a estrutura social está em declínio. Existe, nesse caso, um efeito geracional importante: eleitores jovens mostram-se mais independentes e com uma orientação mais instrumental e individual em relação à política (Inglehart & Carballo, 1997). Para o caso brasileiro, pode-se perceber que a estrutura social ainda importa. Em certa medida, isso pode ser ilustrado pelas variáveis de renda e educação. Contudo, a renda parece diferenciar mais os eleitores de centro em relação aos de direita.
Em linhas gerais, o que se percebe é que no caso brasileiro as variáveis sociodemográficas são fatores associados com a orientação política. Deve-se ressaltar que os trabalhos de Piurko et al. (2011), Aspelund et al. (2013), Barni et al. (2016) e Thorisdottir et al. (2007) investigaram a orientação política controlando pelas seguintes variáveis sociodemográficas: idade, gênero, educação, quão religioso se é, quão adequada a renda da família é, se é/foi membro de sindicato. Eles perceberam que em países tradicionais tanto os valores quanto as variáveis sociodemográficas explicam a orientação, mas as últimas parecem mais fortes.
O trabalho dos autores supracitados ainda revela que nos países liberais os valores explicam duas vezes mais a variância na orientação política do que as variáveis sociodemográficas. Nos países pós-comunistas o poder de explicação dos valores é bem menor. Tal como haviam alertado, nas nações liberais avançadas os indivíduos estão menos enraizados culturalmente em relação à identidade de grupo. Porém, nos países tradicionais ambas as variáveis são relevantes. Dentre as características sociodemográficas, a religião foi a que mais consistentemente associou-se às orientações políticas, mas seu poder foi mais fraco nos países liberais. A religiosidade foi o mais consistente preditor da orientação política de direita em 18 dos 20 países analisados. Segundo os autores, a religiosidade é uma característica psicológica dos indivíduos que servem como um princípio orientador na vida. Talvez ela seja mais relevante que a própria posição social.
Os resultados para o caso brasileiro mostram que a identidade de grupo ainda é um elemento importante para compreender a orientação política, pois as variáveis sociodemográficas mostraram-se fortemente associadas com a orientação política no Brasil. Porém, os valores também são relevantes. Note, por exemplo, que os indicadores de conservadorismo e a abertura à mudança foram significativos para explicar a diferença entre esquerda e direita. Ainda que com menor significância, a autotranscedência, abertura à mudança e autopromoção servem para diferenciar o centro da direita (Aspelund et al., 2013; Barni et al., 2016; Thorisdottir et al., 2007).
Vale notar que o indicador de conservadorismo foi muito significativo para diferenciar esquerda-direita em todos os modelos. Em outras palavras, quanto mais conservador menor a probabilidade de se autorreferir de esquerda vis-à-vis de direita. Destaca-se, porém, que dentro do indicador de conservadorismo há um item que faz referência à religiosidade. Então, em alguma medida, este indicador captura essa identidade de grupo. Esse é um resultado que está de acordo com os trabalhos de Piurko et al. (2011) e Barni et al. (2016), pois segundo eles a orientação da direita está assentada em valores conservadores como a tradição e a segurança. O conservadorismo, contudo, não parece servir para diferenciar a orientação do centro em relação à direita.
Quanto maior o indicador de abertura à mudança, maior a probabilidade dos indivíduos se perceberem como de esquerda vis-à-vis de direita. Isso também foi válido nos três modelos, e é um resultado presente em vários estudos. Caprara et al. (2006), por exemplo, observaram que questões associadas à amabilidade (ou amizade) e abertura para novas experiências estão associadas com a centro-esquerda. Isso sugere que os programas de esquerda que enfatizam a solidariedade, o bem-estar coletivo, a tolerância e a diversidade tendem a atrair mais as pessoas “abertas” e “amigáveis”. Por outro lado, a ênfase da centro-direita em programas que valorizam o empreendedorismo individual e a liberdade comercial atraem pessoas mais ligadas aos traços de dominância, energia, assertividade. Os valores ligados à tradição e a conformidade que, como a segurança, endossam o status quo, correlacionam-se com os votos na centro-direita. Registra-se que os valores de segurança foram os mais fortemente ligados ao voto na centro-direita. Vale destacar que esse indicador também apresentou significância estatística quando se compara o centro com a direita. Esse é um aspecto, portanto, que no caso brasileiro aproxima os cidadãos de esquerda com os de centro.
Percebe-se uma associação entre o indicador de autotranscedência com a diferença entre centro e direita. Este foi um resultado que permaneceu em todos os modelos. Mais especificamente, quanto maior esse indicador, menor a probabilidade do entrevistado se perceber como de centro vis-à-vis de direita. Esse valor está associado com a benevolência e os resultados são, em alguma medida, diferentes daqueles mais usualmente encontrados na literatura. Piurko et al. (2011) e Schwartz & Boehnke (2004) perceberam que valores como benevolência e universalismo explicam a orientação de esquerda nos países tradicionais e liberais. No caso brasileiro, a benevolência não diferencia esquerda e direita, mas centro e direita. Além do mais, esse é um valor menos associado ao centro do que à direita. Essa diferença observada para os resultados no Brasil exige uma análise mais aprofundada em estudos posteriores. Talvez ele possa ser mais bem compreendido à luz da religião, haja vista que cresce na sociedade brasileira o número de evangélicos.
O indicador da autopromoção foi levemente significativo para diferenciar o centro da direita. Porém, ele não foi robusto. Em outras palavras, quanto mais preocupado com o dinheiro e com o sucesso, menor a probabilidade do indivíduo se auto referir como de centro em relação à direita em apenas um dos modelos. Esse é um resultado que precisa ser ponderado, pois ele está no limite da significância aceitável de 10%.
O que se observa, portanto, é que no caso brasileiro tanto os valores quanto as variáveis sociodemográficas estão associadas com a orientação política. Segundo Caprara et al. (2006), com a individualização da política, os valores podem substituir as classes e outros grupos de interesse enquanto elementos para explicar a orientação política. Isso foi observado nas eleições italianas em 2001 e 2006, pois os valores parecem ter mais relação com as votações do que as variáveis sociodemográficas. Ademais, Evans (2000) afirmou que em países cuja economia de serviços é forte, que possuem alta educação e urbanização, há maior probabilidade de ter cidadãos que fazem escolhas políticas baseadas em suas próprias compreensões. Nesses casos, eles são menos influenciados pela sua posição social. Não parece, contudo, ter sido esse o caso do Brasil em 2014. Naquela data, foi possível perceber que tanto as variáveis sociodemográficas quanto os valores estavam associados com a orientação política.
Portanto, o próximo desafio é entender se ao longo do tempo os valores tornaram-se mais relevantes na discriminação da orientação política no Brasil. Essa não é uma tarefa simples, pois os questionários da World Values Survey para os anos seguintes não são compatíveis. Dessa forma, é preciso buscar alternativas que permitam alguma aproximação dos questionários para depois examinar as associações com a orientação política no Brasil.
V. Considerações finais
O presente trabalho teve por objetivo verificar os fatores associados com a orientação política no Brasil no ano de 2014. Para tanto, além de variáveis sociodemográficas, foram elaborados quatro indicadores com base na Teoria dos Valores de Schwartz, quais sejam: conservadorismo, abertura à mudança, autopromoção e autotranscendência. A base de dados foi obtida na homepage da World Values Survey e contou com a resposta de 1.146 pessoas. Deve-se ressaltar que o corte temporal está restrito à presença das questões compatíveis com os trabalhos de Schwartz.
Parte da literatura sobre o tema sugere que os valores explicam a orientação política mais fortemente que as variáveis sociodemográficas em países liberais. Nesses, a orientação de direita está expressa em valores como tradição, poder e segurança. Já a orientação de esquerda está assentada em valores como universalismo, benevolência e preocupação com o bem-estar dos outros.
Ao contrário da maior parte da literatura, este artigo reconhece a necessidade de estudar a orientação política para além da visão tradicional esquerda-direita. Nesse sentido, o modelo empírico proposto considerou avaliar também o espectro político de centro. Para o caso do Brasil, foi verificado que tanto as variáveis sociodemográficas como os valores importam. Isso sugere que a identidade de grupo ainda é um elemento importante para compreender a orientação política do brasileiro. Levar em conta aqueles que se consideram de “centro” é importante para se compreender as mudanças políticas que ocorreram no Brasil, especialmente após o ano de 2014. Conforme apresentado no artigo, esse foi um período marcado por manifestações populares, por vezes radicais, que talvez tenham favorecido a revelação mais contundente dos valores conservadores de parte da sociedade. Essas expressões ganharam ainda mais espaço após o impeachment da ex-presidente Dilma, em 2016, e culminou com a eleição de Jair Bolsonaro. Porém, os conservadores radicais dificilmente teriam maioria sem um movimento do centro.
Em suma, observou-se que os jovens se identificam mais com a esquerda do que com a direita. Porém, na medida que a idade avança há uma redução nessa probabilidade. Por outro lado, as mulheres têm menor chance de se identificar com a esquerda do que os homens em relação a orientação política de direita. Não foi possível identificar associação estatisticamente significativa entre raça e orientação política em nenhuma das estimativas. Quando se controla pela percepção quanto à própria renda, notou-se que ela tem maior relevância para separar aqueles que se consideram de centro em relação aos que se classificam como de direita. Nas estimações alternativas, a variável “classe social” não foi significativa em nenhum dos modelos, ao passo que os maiores níveis de “Satisfação com a Renda” se mostraram menos associados com a orientação de esquerda quando comparado com a direita. Por fim, maiores níveis de escolaridade aumentam a chance do indivíduo se identificar como de esquerda em relação a se identificar como de direita.
Sob esse ponto de vista, sugere-se que a identidade de grupo ainda é um elemento importante na compreensão do tema abordado. Contudo, os valores também são relevantes. Os indicadores de conservadorismo e a abertura à mudança foram significativos para explicar a diferença entre esquerda e direita. Mais especificamente, quanto mais conservador, menor a chance do indivíduo se identificar com a esquerda em relação à com a direita. Contudo, esse não é um elemento que diferencia o centro da direita. Aqui, há um importante aspecto para estudos futuros: investigar se, no caso brasileiro, os indivíduos que se identificam com o centro político são tão conservadores quanto aqueles que se identificam com a direita. Vale notar que nas três especificações, a autotranscedência - valores que enfatizam aceitação dos outros como iguais e a preocupação com o seu bem-estar - foi um valor menos associado com o centro do que com a direita. Por outro lado, o centro é mais próximo da esquerda no quesito “abertura à mudança”. Em linha com a literatura internacional, os programas de esquerda que enfatizam a solidariedade, o bem-estar coletivo, a tolerância e a diversidade tendem a atrair mais as pessoas “abertas” e “amigáveis”. Esse também parece ser o resultado observado no Brasil.
Deve-se ressaltar que, os conservadores tendem a defender um papel limitado do governo, o qual deve se concentrar em proteger a ordem e a segurança. Eles também são favoráveis à redução do gasto público e dos impostos, a fim de permitir que as pessoas e as empresas tenham mais liberdade para tomar decisões e investir em suas próprias iniciativas. Em relação às políticas sociais, os conservadores geralmente acreditam que o governo deve ter um papel limitado em garantir o bem-estar social, ao passo que devem favorecer políticas que incentivam a responsabilidade individual e a autossuficiência. Nesse sentido, eles tendem a se opor aos programas sociais que consideram excessivamente generosos ou que incentivam a dependência do governo. Além disso, os valores conservadores muitas vezes se refletem em posições firmes sobre questões de identidade e moralidade, como a defesa da família tradicional, a oposição ao aborto, o apoio à religião e a defesa da lei e da ordem. Portanto, o crescimento desses valores, quando refletidos no processo eleitoral, trarão implicações sobre a política, bem como a condução da economia brasileira.
Entende-se que o desafio para trabalhos futuros é tentar compatibilizar os questionários mais recentes com aquele proposto por Schwartz a fim de criar indicadores sobre os valores. Essa é uma tarefa desafiadora, pois as questões aplicadas pela World Values Survey são muito diferentes em cada nova onda. Porém, esse esforço é fundamental para avaliar a importância que os valores têm para explicar a orientação política no Brasil do presente. Por último, tomando em consideração a particularidade cultural do Brasil e suas diferenças internas (Torres et al., 2016), outra linha de pesquisa futura é tratar de entender se as variáveis culturais como o individualismo, a distância do poder, ou outras possam dar indicativos sobre a orientação política no Brasil.
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1
Agradecemos aos comentários e sugestões dos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e Política.
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2
O Big Five é um dos modelos mais importantes para a explicação da personalidade humana. Ele a define como uma rede hierárquica de traços, cujo segundo nível hierárquico é constituído por cinco traços: Extroversão, Socialização, Conscienciosidade, Neuroticismo e Abertura para Experiência. Para aprofundamento, ver Costa (1992), Costa & McCrae (1995), Goldberg & Digman (1994), Hutz et al. (1998) e Trentini et al. (2009).
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3
Os indicadores latentes foram construídos especificamente para gerar um escore médio ponderado de cada indicador, usando a carga fatorial como peso para cada um dos valores (McNeish & Wolf, 2020).
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4
Vale ressaltar que a estimação levou em conta a correção dos pesos amostrais.
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Outras fontes
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WVS. (2015) World Values Survey Disponível em: <https://www.worldvaluessurvey.org/wvs.jsp>. Acesso em: 12 de jan. 2023.
» https://www.worldvaluessurvey.org/wvs.jsp
Anexo
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
07 Ago 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
03 Out 2022 -
Revisado
10 Mar 2023 -
Aceito
16 Abr 2023