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Acesso a medicamentos, o Sistema Único de Saúde e as injustiças interseccionais

RESUMO

OBJETIVO

Estimar as prevalências de acesso geral e público a medicamentos prescritos na população brasileira com 15 anos ou mais de idade em 2019 e identificar iniquidades de acesso, conforme intersecções de gênero, cor/raça, nível socioeconômico e território.

MÉTODOS

Foram analisados dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 com respondentes de 15 anos ou mais que tiveram prescrição de algum medicamento em atendimento de saúde realizado nas duas semanas anteriores à entrevista (n = 19.819). A variável de desfecho foi o acesso a medicamentos, subdividido em acesso geral (público, privado e misto), acesso público (via Sistema Único de Saúde – SUS) dos atendidos no SUS e acesso público (via SUS) dos não atendidos no SUS. As variáveis independentes do estudo foram utilizadas para representar eixos de marginalização: gênero, cor/raça, nível socioeconômico e território. Foram calculadas as prevalências de acesso geral e acesso público nos diferentes grupos analisados e a associação dos desfechos com os eixos mencionados foi estimada com odds ratios (OR) por meio de modelos de regressão logística.

RESULTADOS

Foi observada alta prevalência de acesso geral (84,9%), quando consideradas todas as fontes de obtenção, favorecendo segmentos populacionais de maior privilégio, como homens, brancos e de alto nível socioeconômico. Quando considerada apenas a obtenção no SUS dos medicamentos prescritos no próprio sistema, verificou-se uma baixa prevalência (30,4% de acesso), invertendo o acesso em benefício dos segmentos populacionais multiplamente marginalizados, como mulheres negras de baixo nível socioeconômico.

CONCLUSÕES

O acesso a medicamentos por meio do SUS demonstra ser um instrumento de combate às iniquidades interseccionais, evidenciando que o SUS é uma política pública eficiente na promoção da justiça social.

Acessibilidade aos Serviços de Saúde; Sistema Único de Saúde; Enquadramento Interseccional

ABSTRACT

OBJECTIVE

To estimate the prevalence of general and public access to prescription drugs in the Brazilian population aged 15 or older in 2019, and to identify inequities in access, according to intersections of gender, color/race, socioeconomic level, and territory.

METHODS

We analyzed data from the 2019 National Health Survey with respondents aged 15 years or older who had been prescribed a medication in a healthcare service in the two weeks prior to the interview (n = 19,819). The outcome variable was access to medicines, subdivided into general access (public, private and mixed), public access (via the Unified Health System - SUS) for those treated by the SUS, and public access (via the SUS) for those not treated by the SUS. The study’s independent variables were used to represent axes of marginalization: gender, color/race, socioeconomic level, and territory. The prevalence of general and public access in the different groups analyzed was calculated and the association of the outcomes with the aforementioned axes was estimated with odds ratios (OR) using logistic regression models.

RESULTS

There was a high prevalence of general access (84.9%), when all sources of access were considered, favoring more privileged segments of the population, such as men, white, and those of high socioeconomic status. When only the medicines prescribed in the SUS were considered, there was a low prevalence (30.4% access) that otherwise benefited marginalized population segments, such as women, black, and people from low socioeconomic backgrounds.

CONCLUSIONS

Access to medicines through the SUS proves to be an instrument for combating intersectional inequities, lending credence to the idea that the SUS is an efficient public policy for promoting social justice.

Accessibility to Health Services; Unified Health System; Intersectional Framework

INTRODUÇÃO

O acesso a medicamentos é fundamental para a garantia do direito à saúde e tem sido reconhecido como um direito humano essencial. Esse princípio foi incluído nas metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e permanece um elemento central na Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU)11. Organização das Nações Unidas. Objetivos de desenvolvimento do milênio. New York: Organização das Nações Unidas; 2000 [cited 2024 Mar 25]. Available from: https://www.un.org/millenniumgoals/bkgd.shtml
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. No cenário mundial, as injustiças no acesso a medicamentos continuam a ser evidentes. Apesar dos esforços da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o alcance da meta da cobertura universal de saúde, ainda se observam variações expressivas no acesso a medicamentos entre os países. Em aproximadamente 30% de 25 países pesquisados pela OMS, os medicamentos estão completamente ausentes no âmbito da atenção primária44. Organização Mundial da Saúde. World health statistics 2021: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. Geneva: World Health Organization, 2021 [cited 2024 Mar 25]. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/342703
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.

No contexto brasileiro, com o movimento da Reforma Sanitária Brasileira e a consequente criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o acesso a medicamentos passou de uma perspectiva limitada à disponibilidade do produto para um enfoque estratégico dentro da Política Nacional de Saúde na perspectiva da integralidade. A Política Nacional de Medicamentos (PNM) foi aprovada a partir da necessidade de garantir a Assistência Farmacêutica (AF) como política norteadora para formulação de políticas setoriais. Encaminhamentos da 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica de 2003 resultaram na aprovação da Política Nacional de Assistência Farmacêutica (Pnaf), por meio de uma resolução do Conselho Nacional de Saúde. Essas políticas estabeleceram o acesso gratuito a medicamentos essenciais como direito dos cidadãos brasileiros e efetivaram a AF como política pública de saúde55. Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 3.916, de 30 de outubro de 1998. Aprova a Política Nacional de Medicamentos. 1998 [cited 2024 Mar 25]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/1998/prt3916_30_10_1998.html
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. Contudo, ainda existem diferentes formas de organização e financiamento para o acesso a medicamentos no país: fornecimento pela rede pública de saúde (por meio do SUS), pelo setor privado, através dos planos de saúde ou por pagamento direto e financiamento misto por meio do Programa Farmácia Popular88. Oliveira MA, Bermudez JA, Osório-de-Castro CG. Assistência farmacêutica e acesso a medicamentos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ; 2007.. Em outros sistemas universais de saúde, como os do Reino Unido, da Austrália e do Canadá, o copagamento é adotado como principal forma de acesso a medicamentos, em que parte do custo é subsidiado pelo sistema de saúde e a outra parte advém do desembolso direto do usuário. O acesso gratuito ocorre apenas em situações específicas e varia conforme a idade e a renda ou é baseado em necessidades de saúde específicas99. Oliveira LC, Nascimento MA, Lima IM. O acesso a medicamentos em sistemas universais de saúde - perspectivas e desafios. Saude Debate. 2019;43(spe5):286-98. https://doi.org/10.1590/0103-11042019s523
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.

Estudos brasileiros, realizados a partir dos anos 2000, evidenciaram um aumento na prevalência de acesso a medicamentos, quando consideradas todas as fontes de acesso. No entanto, ainda são identificadas importantes iniquidades de acesso entre segmentos da população, conforme condição socioeconômica e região de residência, além de outros eixos de marginalização1010. Paniz VM, Fassa AG, Facchini LA, Bertoldi AD, Piccini RX, Tomasi E, et al. Acesso a medicamentos de uso contínuo em adultos e idosos nas regiões Sul e Nordeste do Brasil. Cad Saude Publica. 2008 Feb;24(2):267-80. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000200005
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. Os estudos até então realizados evidenciam que o acesso a medicamentos de forma gratuita favorece pessoas mais pobres1313. Tavares NU, Luiza VL, Oliveira MA, Costa KS, Mengue SS, Arrais PS, et al. Free access to medicines for the treatment of chronic diseases in Brazil. Rev Saude Publica. 2016;50(suppl 2). https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006118
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, de menor escolaridade e de cor/raça preta1212. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NU, Mengue SS, Arrais PS, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saude Publica. 2016 Dec 12;50. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161
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. Ademais, observam-se estudos que buscaram avaliar populações específicas, limitando-se à análise de um único eixo de marginalização e desconsiderando a inter-relação entre múltiplos sistemas de opressão1717. Katrein F, Tejada CA, Restrepo-Méndez MC, Bertoldi AD. Desigualdade no acesso a medicamentos para doenças crônicas em mulheres brasileiras. Cad Saude Publica. 2015 Jul;31(7):1416-26. https://doi.org/10.1590/0102-311X00083614
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,1818. Fernandes CS, Lima MG, Barros MB. Problemas emocionais e uso de medicamentos psicotrópicos: uma abordagem da desigualdade racial. Cien Saude Colet. 2020 May;25(5):1677-88. https://doi.org/10.1590/1413-81232020255.33362019
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. Em pesquisas sobre iniquidades em saúde, tem-se destacado a abordagem da interseccionalidade. Concebida principalmente no bojo do movimento feminista negro dos anos 1980 nos Estados Unidos, a interseccionalidade tem sido acionada para explicar como as experiências de indivíduos e grupos são moldadas pelo entrelaçamento e pela sobreposição de múltiplos eixos de marginalização e opressão, como gênero, raça e classe, produzindo formas complexas de opressão para uns e de privilégio para outros1919. Crenshaw K. Demarginalizing the intersection of race and sex: a black feminist critique of antidiscrimination doctrine, feminist theory and antiracist politics. Univ Chic Leg Forum. 1989 [cited 2024 Mar 25]; 1989(1):139-67. Available from: https://chicagounbound.uchicago.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1052&context=uclf
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.

Estudos de base populacional sobre iniquidades no acesso a medicamentos ainda são escassos no Brasil1111. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013 Apr;29(4):691-701. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000800007
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,1414. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol. 2018;21(0):e180007. https://doi.org/10.1590/1980-549720180007
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. Isso se torna ainda mais preocupante ao se considerar o contexto do país após 2016, com a adoção de medidas de austeridade fiscal e a consequente intensificação do subfinanciamento das políticas de saúde, que tem como implicações o agravamento das injustiças sociais e a piora de indicadores de saúde2222. Vieira FS, Benevides RP. Os impactos do novo regime fiscal para o financiamento do Sistema Único de Saúde e para a efetivação do direito à saúde no Brasil. Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2016. (Nota técnica v. 28).. Nesse cenário, uma perspectiva interseccional pode ser valiosa para identificar segmentos populacionais que são multiplamente marginalizados2525. Bauer GR, Churchill SM, Mahendran M, Walwyn C, Lizotte D, Villa-Rueda AA. Intersectionality in quantitative research: a systematic review of its emergence and applications of theory and methods. SSM Popul Health. 2021 Apr;14:100798. https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2021.100798
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,2626. Harari L, Lee C. Intersectionality in quantitative health disparities research: A systematic review of challenges and limitations in empirical studies. Soc Sci Med. 2021 May;277:113876. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2021.113876
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e para ampliar o conhecimento acerca das iniquidades no acesso aos medicamentos no Brasil. Além disso, destaca-se a ausência de estudos populacionais sobre o tema, tanto nacionais quanto internacionais, utilizando uma perspectiva interseccional. Com isso, o objetivo deste estudo foi de estimar as prevalências de acesso geral e acesso público a medicamentos prescritos na população brasileira com 15 anos ou mais de idade em 2019 e identificar iniquidades no acesso, conforme as intersecções de gênero, cor/raça, nível socioeconômico e território.

MÉTODOS

No presente estudo, foram analisados dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde (MS). O plano amostral empregado foi por conglomerado, em três estágios de seleção: unidade primária de amostragem, representada pelos setores censitários ou conjunto de setores, obtida da Amostra Mestra do IBGE; domicílio, selecionado por amostragem aleatória simples; e morador com 15 anos ou mais de idade, selecionado por amostragem aleatória simples, com base na lista de moradores obtida no momento da entrevista2727. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.,2828. Stopa SR, Szwarcwald CL, Oliveira MM, Gouvea EC, Vieira ML, Freitas MP, et al. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: histórico, métodos e perspectivas. Epidemiol Serv Saude. 2020 Oct;29(5):e2020315. https://doi.org/10.1590/s1679-49742020000500004
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. Ao todo, os agentes de coleta da PNS visitaram 108.525 domicílios em todo o território brasileiro, tendo realizado 94.114 entrevistas, com taxa de não resposta de 6,4%. O questionário foi composto por 26 módulos, divididos em três seções: domiciliar, de todos os moradores e do morador selecionado. As duas primeiras seções foram respondidas por um morador de idade igual ou superior a 18 anos, que sabia informar sobre a situação socioeconômica e de saúde dos demais coabitantes. A coleta de dados ocorreu entre agosto de 2019 e março de 2020. Os dados obtidos na PNS 2019 são de domínio público, disponibilizados no website do IBGE. A PNS 2019 foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), sob parecer nº 3.529.3762727. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.,2828. Stopa SR, Szwarcwald CL, Oliveira MM, Gouvea EC, Vieira ML, Freitas MP, et al. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: histórico, métodos e perspectivas. Epidemiol Serv Saude. 2020 Oct;29(5):e2020315. https://doi.org/10.1590/s1679-49742020000500004
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.

Na análise, foram incluídos apenas os respondentes de 15 anos ou mais, residentes em domicílios particulares do território brasileiro, que procuraram atendimento de saúde e foram atendidos nas duas semanas anteriores à entrevista, com a prescrição de algum medicamento nesse atendimento. A variável de desfecho deste estudo foi o acesso a medicamentos, considerando-se a obtenção dos medicamentos como medida de acesso. Foram avaliados três desfechos de acordo com a fonte de obtenção do medicamento e a origem do atendimento, que resultou na prescrição do medicamento: acesso geral, em que se considerou todas as fontes de obtenção (público, privado e misto) e origens do atendimento (rede privada e SUS); acesso público, na qual se considerou apenas a rede pública como fonte de obtenção do medicamento, subdivido entre aqueles que tiveram o atendimento realizado no SUS e os que não foram atendidos no SUS.

Para mensurar o acesso geral, foi utilizada a pergunta: “Conseguiu obter os medicamentos receitados?”. As possíveis respostas eram: “Sim, todos”; “Sim, alguns”; e “Não, nenhum”. Caracterizou-se o acesso a medicamentos como uma variável dicotômica, sendo a primeira opção de resposta considerada como acesso total e as demais, ausência de acesso total. O acesso público daqueles atendidos ou não no SUS foi estimado por meio da pergunta: “Algum dos medicamentos foi obtido em serviço público de saúde?”. Da mesma forma, a resposta “Sim, todos” foi considerada como acesso total e as respostas “Sim, alguns” e “Não, nenhum”, ausência de acesso. Para diferenciar a origem do atendimento realizado, foram utilizadas as respostas à pergunta: “O atendimento foi feito pelo SUS?”, cujas respostas eram “Sim”, “Não” e “Não sabe/Não lembra”.

As variáveis independentes foram utilizadas para representar eixos de marginalização específicos. Gênero, categorizado de forma dicotômica em “Homem” ou “Mulher”; cor/raça, coletada de acordo com as categorias padronizadas pelo IBGE, sendo dicotomizada em “Branca” e “Negra”, com as categorias “Preta” e “Parda” incluídas nessa última. Devido ao pequeno tamanho amostral, as categorias “Amarela” e “Indígena” não foram consideradas neste estudo; nível socioeconômico, operacionalizado pela escolaridade, classificado em “Baixo” (oito anos de estudo ou menos) e “Alto” (mais de oito anos de estudo); e território, operacionalizado pela macrorregião de residência no país (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste). Foram analisados oito grupos formados pelas intersecções de gênero, cor/raça e nível socioeconômico: homens brancos de alto nível socioeconômico; homens brancos de baixo nível socioeconômico; homens negros de alto nível socioeconômico; homens negros de baixo nível socioeconômico; mulheres brancas de alto nível socioeconômico; mulheres brancas de baixo nível socioeconômico; mulheres negras de alto nível socioeconômico; e mulheres negras de baixo nível socioeconômico. Posteriormente, cada grupo interseccional foi analisado segundo a macrorregião da residência.

Foi realizada a análise descritiva da amostra, tendo sido apresentadas as frequências relativas dos desfechos, acompanhadas de seus intervalos de confiança de 95% (IC95%), nas diferentes categorias dos eixos de marginalização e nos grupos interseccionais. Para testar a associação dos desfechos com as demais variáveis, foram analisados três modelos de regressão logística. No Modelo 1, foi estimado o efeito de cada uma das variáveis explicativas sobre os desfechos. O Modelo 2 incluiu o ajuste entre as variáveis gênero, cor/raça, nível socioeconômico e território. O Modelo 3 foi ajustado para os grupos interseccionais e o território. As estimativas dos coeficientes de regressão, representadas como odds ratio (OR), também foram calculadas com seus IC95%. As análises estatísticas foram realizadas no software Stata, versão 15.1, considerando os pesos e a estrutura amostral complexa.

RESULTADOS

Foram considerados 19.819 entrevistados com idade maior ou igual a 15 anos. Para análise do acesso geral, as respostas de todos esses respondentes foram apreciadas. Do total, mais da metade teve atendimento realizado pelo SUS, sendo que, desses, cerca de 80% apresentaram informação válida quanto ao desfecho. Por sua vez, menos da metade dos respondentes não realizaram atendimento pelo SUS e, desses, mais de 80% apresentaram informação válida sobre o acesso a medicamentos. Ou seja, para os dois últimos desfechos, houve aproximadamente 20% e 14%, respectivamente, de entrevistados que responderam à pergunta sobre se conseguiram obter os medicamentos receitados, mas não responderam se algum deles foi obtido em serviço público de saúde.

A Tabela 1 apresenta a descrição da amostra para os três desfechos, que foi composta majoritariamente por mulheres residentes da região Sudeste. Para o desfecho de acesso geral, participantes de cor/raça negra, de alto nível socioeconômico e, do grupo interseccional, mulheres brancas de alto nível socioeconômico representaram a maioria dos participantes. No caso do acesso público dos atendidos no SUS, a maioria dos respondentes foi composta por pessoas de cor/raça negra, de baixo nível socioeconômico e do grupo interseccional de mulheres negras de baixo nível socioeconômico. Para o acesso público dos não atendidos no SUS, a maioria dos respondentes foi de pessoas de cor/raça branca, de alto nível socioeconômico e, do grupo interseccional, de mulheres brancas de alto nível socioeconômico.

Tabela 1
Descrição da amostra de acordo com gênero, cor/raça, nível socioeconômico, território, grupo interseccional e acesso aos medicamentos prescritos. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2019.

A prevalência de acesso geral encontrada neste estudo foi de 84,9% (Tabela 2). Quando se considerou apenas o acesso a medicamentos no SUS com prescrições originadas no próprio sistema, a prevalência observada foi de 30,4%. Já a prevalência de acesso público entre aqueles que tiveram prescrições originadas fora do SUS foi de 3,0%. Homens, participantes que referiram cor/raça branca, de alto nível socioeconômico e residentes da região Sul tiveram maiores prevalências de acesso geral. Quando analisado o acesso a medicamentos no setor público de prescrições originadas no SUS, maiores prevalências foram observadas em homens, respondentes de cor/raça negra, entrevistados de baixo nível socioeconômico e residentes da região Sudeste. No acesso público a medicamentos de prescrições originadas fora do SUS, a prevalência do desfecho entre homens e mulheres foi a mesma, enquanto maiores prevalências foram observadas em respondentes de cor/raça negra, entrevistados de baixo nível socioeconômico e residentes da região Nordeste.

Tabela 2
Prevalências observadas de acesso geral (público, privado e misto) e acesso público (via SUS) a medicamentos prescritos de respondentes atendidos ou não no SUS, de acordo com gênero, cor/raça, nível socioeconômico, território e grupo interseccional. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2019.

Homens brancos de alto nível socioeconômico tiveram a maior prevalência de acesso geral, enquanto mulheres negras de baixo nível socioeconômico tiveram a maior prevalência de acesso público dos atendidos no SUS. A maior prevalência de acesso público dos atendidos fora do SUS foi observada entre as mulheres brancas de baixo nível socioeconômico. A análise das prevalências dos desfechos de cada grupo interseccional, estratificado por macrorregião, também foi realizada. No entanto, as estimativas encontradas foram acompanhadas de baixa precisão, observada pelos amplos intervalos de confiançaa a Material Suplementar disponível em: https://doi.org/10.7910/DVN/I0CL2L .

A partir das análises nos modelos de regressão logística, observa-se na Tabela 3 que o OR de prevalência de acesso geral foi menor para as mulheres, respondentes de cor/raça negra, para aqueles de baixo nível socioeconômico (Modelos 1 e 2) e residentes da região Norte do país (Modelos 1, 2 e 3). Ao analisar os grupos interseccionais, verificou-se que, tanto na análise bivariada (Modelo 1), quanto na análise ajustada (Modelo 3), todos os grupos interseccionais, exceto homens negros de alto nível socioeconômico, tiveram menores OR de prevalência de acesso geral em relação aos homens brancos de alto nível socioeconômico.

Tabela 3
Odds ratios estimadas nos modelos de regressão logística para o acesso geral (público, privado e misto) a medicamentos prescritos de acordo com as variáveis de exposição. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2019.

Quanto ao acesso público dos atendidos no SUS (Tabela 4), entrevistados de baixo nível socioeconômico apresentaram maior OR de prevalência do desfecho quando comparado aos de alto nível socioeconômico (Modelo 2). A análise bivariada indicou que residentes da região Nordeste tiveram menor OR de prevalência desse tipo de acesso em relação aos moradores da região Sul (Modelo 1). Na análise ajustada, observou-se menor OR desse acesso também para os moradores das regiões Centro-Oeste e Norte (Modelos 2 e 3). Com relação à análise dos grupos interseccionais, não foram observadas iniquidades interseccionais para esse desfecho em nenhum dos modelos.

Tabela 4
Odds ratios estimadas nos modelos de regressão logística para o acesso público (via SUS) a medicamentos prescritos no SUS de acordo com as variáveis de exposição. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2019.

Em relação ao acesso público dos atendidos fora do SUS (Tabela 5), maior OR de prevalência do desfecho também foi encontrado entre respondentes de baixo nível socioeconômico, quando comparado aos de alto nível socioeconômico (Modelo 1 e 2). Tanto na análise bivariada (Modelo 1), quanto na análise ajustada (Modelo 3), o grupo interseccional de mulheres brancas de baixo nível socioeconômico teve maiores OR de prevalência desse tipo de acesso em relação aos homens brancos de alto nível socioeconômico. No entanto, os achados mencionados foram acompanhados de intervalos de confiança amplos, devido ao tamanho amostral reduzido em relação aos outros desfechos. Um quarto modelo – não apresentado nas tabelas – foi estimado para testar a interação entre as variáveis território e grupos interseccionais para os três desfechos. Contudo, nenhuma interação expressiva foi identificada.

Tabela 5
Odds ratios estimadas nos modelos de regressão logística para o acesso público (via SUS) a medicamentos prescritos fora do SUS de acordo com as variáveis de exposição. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2019.

DISCUSSÃO

Ecoando outros estudos de base populacional, a prevalência de acesso geral a medicamentos prescritos encontrada foi alta, quando considerado qualquer tipo de fonte de obtenção (público, privado e misto)1212. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NU, Mengue SS, Arrais PS, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saude Publica. 2016 Dec 12;50. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161
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,1414. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol. 2018;21(0):e180007. https://doi.org/10.1590/1980-549720180007
https://doi.org/10.1590/1980-54972018000...
. Verificou-se maior prevalência de acesso geral em segmentos populacionais de maior privilégio, como homens brancos de alto nível socioeconômico. Quando se considera apenas o acesso a medicamentos no sistema público de prescrições originadas no próprio sistema, a prevalência é baixa, mas o cenário é revertido para maior prevalência de acesso entre pessoas de cor/raça negra e de baixo nível socioeconômico. Inclusive, observou-se maior prevalência de acesso público dos atendidos no SUS para mulheres negras de baixo nível socioeconômico. Isso indica que o SUS é uma importante fonte de acesso para aqueles que não conseguem obter os medicamentos fora do sistema público2929. Boing AC, Bertoldi AD, Peres KG. Desigualdades socioeconômicas nos gastos e comprometimento da renda com medicamentos no Sul do Brasil. Rev Saude Publica. 2011 Oct;45(5):897-905. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000054
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. A modalidade de copagamento, que é adotada por outros sistemas universais de saúde como principal forma de obtenção de medicamentos, é considerada um dificultador do acesso. Maiores valores de copagamento estão associados a uma redução no volume de dispensação de medicamentos, principalmente para os mais pobres, o que leva à descontinuação do tratamento, comprometendo a eficácia dos cuidados de saúde prestados99. Oliveira LC, Nascimento MA, Lima IM. O acesso a medicamentos em sistemas universais de saúde - perspectivas e desafios. Saude Debate. 2019;43(spe5):286-98. https://doi.org/10.1590/0103-11042019s523
https://doi.org/10.1590/0103-11042019s52...
. Nossos achados corroboram outros estudos que indicam que a provisão gratuita de medicamentos diminui as iniquidades de acesso1111. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013 Apr;29(4):691-701. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000800007
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201300...
,1313. Tavares NU, Luiza VL, Oliveira MA, Costa KS, Mengue SS, Arrais PS, et al. Free access to medicines for the treatment of chronic diseases in Brazil. Rev Saude Publica. 2016;50(suppl 2). https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006118
https://doi.org/10.1590/s1518-8787.20160...
,1414. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol. 2018;21(0):e180007. https://doi.org/10.1590/1980-549720180007
https://doi.org/10.1590/1980-54972018000...
,1515. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Mudanças no acesso gratuito a medicamentos prescritos no sistema público de saúde no Brasil. Cad Saude Colet. 2022 Mar;30(1):56-67. https://doi.org/10.1590/1414-462x202230010172
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,1616. Moraes RM, Santos MA, Vieira FS, Almeida RT. Cobertura de políticas públicas e acesso a medicamentos no Brasil. Rev Saude Publica. 2022 Jun;56:58. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2022056003898
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2022...
,2424. Boing AC, Andrade FB, Bertoldi AD, Peres KG A, Massuda A, Boing AF. Prevalências e desigualdades no acesso aos medicamentos por usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil em 2013 e 2019. Cad Saude Publica. 2022 Jun;38(6):e00114721. https://doi.org/10.1590/0102-311xpt114721
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, apontando ainda que o acesso a medicamentos por meio do SUS é um importante instrumento de combate às iniquidades interseccionais.

Apesar disso, a baixa prevalência de acesso identificada para a obtenção no SUS de medicamentos prescritos no próprio sistema é preocupante, principalmente pelos indicativos de queda nos últimos anos. Na análise dos dados obtidos a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008, Boing et al.1111. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013 Apr;29(4):691-701. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000800007
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identificaram prevalência de acesso público de 45,3%, enquanto que, na PNS de 2013, o percentual identificado foi de 31,6%2323. Rasella D, Basu S, Hone T, Paes-Sousa R, Ocké-Reis CO, Millett C. Child morbidity and mortality associated with alternative policy responses to the economic crisis in Brazil: a nationwide microsimulation study. PLOS Medicine. 2018 May 22;15(5):e1002570. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002570
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. Quanto ao território, representado pelas macrorregiões do país, a análise dos da PNS de 2019 evidenciou que as iniquidades regionais de acesso público a medicamentos persistem. Drummond et al.1414. Drummond ED, Simões TC, Andrade FB. Acesso da população brasileira adulta a medicamentos prescritos. Rev Bras Epidemiol. 2018;21(0):e180007. https://doi.org/10.1590/1980-549720180007
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, ao analisarem a PNS de 2013, também identificaram maiores prevalências de acesso a medicamentos prescritos nas regiões mais desenvolvidas e com maior densidade populacional. Esses achados apontam que, apesar dos avanços obtidos com a implementação de políticas de medicamentos e de AF no país, a provisão de medicamentos pelo sistema público de saúde ainda permanece como um desafio importante3030. Organização Mundial da Saúde. WHO medicines strategy 2004-2007: countries at the core. Geneva: World Health Organization; 2004 [cited 2024 Mar 25]. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/84307
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.

Além disso, a presença simultânea de um sistema público universal no Brasil e um crescente processo de privatização do acesso aos cuidados de saúde, intensificado ainda pelo subfinanciamento público da saúde, também são preocupantes3131. Vieira FS. Health financing in Brazil and the goals of the 2030 Agenda: high risk of failure. Rev Saude Publica. 2020 Dec;54:127. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054002414
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. Neste estudo, observou-se que uma parcela significativa da população que não teve suas necessidades supridas pelo SUS tentou obter os medicamentos prescritos por meio do sistema público de saúde. Para ela, a prevalência de acesso aos medicamentos prescritos foi ainda mais baixa. Além das já conhecidas fragilidades na estruturação dos serviços farmacêuticos no país, como a disponibilidade dos medicamentos nas farmácias do SUS1212. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NU, Mengue SS, Arrais PS, Farias MR, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saude Publica. 2016 Dec 12;50. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161
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, tem-se o desconhecimento dos prescritores do setor privado das relações de medicamentos essenciais, listas de referência que devem nortear a oferta, a prescrição e a dispensação de medicamentos no SUS, e a não adesão a essas listas por parte dos prescritores do setor público. Ao observar as demandas de acesso a medicamentos pela via judicial em diferentes estados brasileiros, verifica-se que a maior parte das prescrições são originadas fora do SUS e em aproximadamente 75% dos casos há alternativa terapêutica ao medicamento prescrito disponível pelo SUS3434. Vieira FS, Zucchi P. Distorções causadas pelas ações judiciais à política de medicamentos no Brazil. Rev Saude Publica. 2007 Apr;41(2):214-22. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000200007
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,3535. Oliveira YM, Braga BS, Farias AD, Pereira SP, Ferreira MA. Judicialização de medicamentos: efetivação de direitos ou ruptura das políticas públicas? Rev Saude Publica. 2020;54:130. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054002301
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.

Diferentemente do acesso geral, o acesso público não foi marcado por iniquidades interseccionais de expressiva magnitude. Nos modelos testados para o acesso público dos atendidos no SUS, não foram identificadas diferenças significativas entre os grupos interseccionais. Observa-se que a amplitude dessa medida entre os grupos interseccionais para o acesso geral (90,2% a 80,6%) é maior quando comparada ao acesso público dos atendidos no SUS (32,5% a 26,8%). Isso sugere que as diferenças de acesso observadas entre os segmentos populacionais são minimizadas quando o medicamento é prescrito e obtido no sistema público de saúde. Monteiro et al.3636. Monteiro CN, Gianini RJ, Segri NJ, Goldbaum M, Barros MB, Cesar CL. Utilização de medicamentos genéricos no município de São Paulo em 2003: estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2016;25(2):251-8. https://doi.org/10.5123/S1679-49742016000200004
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, ao avaliarem a Política de Medicamentos Genéricos, também observaram não haver diferença estatisticamente significativa na utilização de medicamentos genéricos na população da cidade de São Paulo de acordo com idade, sexo e escolaridade.

A análise interseccional empregada favoreceu a identificação de grupos populacionais mais invisibilizados. Além disso, permitiu observar que, enquanto as mulheres tiveram OR de acesso geral aproximadamente 20% menor, as mulheres brancas de alto nível socioeconômico tiveram OR 27% menor e as mulheres negras de baixo nível socioeconômico, OR 55% menor, quando comparadas aos homens brancos de alto nível socioeconômico. A pesquisa de Katrein et al.1717. Katrein F, Tejada CA, Restrepo-Méndez MC, Bertoldi AD. Desigualdade no acesso a medicamentos para doenças crônicas em mulheres brasileiras. Cad Saude Publica. 2015 Jul;31(7):1416-26. https://doi.org/10.1590/0102-311X00083614
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, ao analisar a prevalência de acesso a medicamentos para o tratamento de doenças crônicas, já havia indicado situação de maior vulnerabilidade entre as que têm maior número de doenças e as que são mais pobres.

Ainda que importantes desafios estejam colocados no emprego de uma perspectiva interseccional em estudos epidemiológicos3737. Bauer GR. Incorporating intersectionality theory into population health research methodology: challenges and the potential to advance health equity. Soc Sci Med. 2014 Jun;110:10-7. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2014.03.022
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, destaca-se tal abordagem como ponto forte deste estudo. Inexistem na literatura outros trabalhos na perspectiva da interseccionalidade que sejam comparáveis a este. Os estudos até então realizados, que demonstraram a existência de iniquidades no acesso a medicamentos no Brasil1717. Katrein F, Tejada CA, Restrepo-Méndez MC, Bertoldi AD. Desigualdade no acesso a medicamentos para doenças crônicas em mulheres brasileiras. Cad Saude Publica. 2015 Jul;31(7):1416-26. https://doi.org/10.1590/0102-311X00083614
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,1818. Fernandes CS, Lima MG, Barros MB. Problemas emocionais e uso de medicamentos psicotrópicos: uma abordagem da desigualdade racial. Cien Saude Colet. 2020 May;25(5):1677-88. https://doi.org/10.1590/1413-81232020255.33362019
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,2424. Boing AC, Andrade FB, Bertoldi AD, Peres KG A, Massuda A, Boing AF. Prevalências e desigualdades no acesso aos medicamentos por usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil em 2013 e 2019. Cad Saude Publica. 2022 Jun;38(6):e00114721. https://doi.org/10.1590/0102-311xpt114721
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, trabalharam as variáveis como gênero, cor/raça e escolaridade de forma independente e consideraram que cada uma delas tem um efeito isolado.

Recentes revisões demonstraram que a operacionalização das variáveis que caracterizam as posições sociais pode ocorrer de diferentes formas2525. Bauer GR, Churchill SM, Mahendran M, Walwyn C, Lizotte D, Villa-Rueda AA. Intersectionality in quantitative research: a systematic review of its emergence and applications of theory and methods. SSM Popul Health. 2021 Apr;14:100798. https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2021.100798
https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2021.100...
,2626. Harari L, Lee C. Intersectionality in quantitative health disparities research: A systematic review of challenges and limitations in empirical studies. Soc Sci Med. 2021 May;277:113876. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2021.113876
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. Neste estudo, assim como na maior parte daqueles analisados nas revisões mencionadas, operacionalizou-se a interseccionalidade utilizando-se uma abordagem exclusivamente intercategórica, a partir da combinação de categorias de interesse. No entanto, as comparações entre grupos, por si só, podem fornecer uma visão limitada das iniquidades em saúde. Além de desconsiderar a heterogeneidade intracategórica, esse tipo de análise focaliza as categorias sociais de nível individual, sem considerar o efeito de contextos sociais mais amplos3838. Homan P, Brown TH, King B. Structural Intersectionality as a new direction for health disparities research. J Health Soc Behav. 2021 Sep;62(3):350-70. https://doi.org/10.1177/00221465211032947
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.

Dentre as limitações do estudo, destaca-se também a inclusão de somente pessoas atendidas por serviço de saúde nas duas últimas semanas anteriores à entrevista. Considerando que o acesso a medicamentos prescritos está diretamente relacionado com o acesso aos cuidados em saúde, são excluídas as pessoas que não chegam aos serviços de saúde. Observou-se que pessoas negras e de baixo nível socioeconômico possuem maiores chances de relatar dificuldade de acesso aos serviços de saúde3939. Constante HM, Bastos JL. Mapping the margins in health services research: how does race intersect with gender and socioeconomic status to shape difficulty accessing healthcare among unequal Brazilian States? Int J Health Serv. 2021 Apr;51(2):155-66. https://doi.org/10.1177/0020731420979808
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. Ademais, pode-se assumir um possível viés de memória em decorrência do período recordatório e autorrelato sobre os desfechos analisados. No entanto, estudo que comparou períodos recordatórios diferentes identificou pouco viés nas prevalências observadas, recomendando-se a adoção de 14 dias como período recordatório para permitir comparações entre estudos4040. Moraes CG, Mengue SS, Pizzol TD. Agreement between different recall periods in drug utilization studies. Rev Bras Epidemiol. 2017;20(2):324-34. https://doi.org/10.1590/1980-5497201700020012
https://doi.org/10.1590/1980-54972017000...
.

Conclui-se que a prevalência de acesso geral a medicamentos prescritos é maior para os segmentos populacionais de status social mais alto, enquanto o acesso público, que ainda é muito pequeno, favorece os de status social mais baixo, inclusive, ao se considerar a intersecção de múltiplos eixos de marginalização. Evidenciou-se, portanto, que o acesso a medicamentos pelo SUS está relacionado com menores iniquidades sociais.

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  • Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq - processo 303775/2021-1 - bolsa de produtividade em pesquisa para JLB).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    27 Nov 2023
  • Aceito
    28 Fev 2024
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