RESUMO
OBJETIVO
Descrever o processo de adaptação transcultural para o uso no Brasil das escalas de discriminação no dia a dia (EDD) e vigilância intensificada (EVI), aplicadas no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil).
MÉTODOS
Foram realizadas análises das equivalências conceitual, de itens e semântica conduzidas por um grupo de quatro epidemiologistas; avaliação da equivalência de mensuração (análise fatorial das estruturas configural, métrica e escalares, segundo características sociodemográficas) e a confiabilidade. Responderam à escala de discriminação 11.987 participantes e uma subamostra de 260 pessoas participaram do estudo teste-reteste. No caso da EVI, 8.916 pessoas responderam e 149 indivíduos no estudo teste-reteste.
RESULTADOS
As escalas apresentaram equivalências conceitual, de itens e semântica pertinentes no contexto brasileiro, além de adequada correspondência de significado referencial/denotativa de termos e também da geral/conotativa dos itens. A análise fatorial confirmatória da EDD revelou estrutura unidimensional, com correlações residuais entre dois pares de itens, apresentando invariância configural e métrica entre os quatro subgrupos avaliados. Identificou-se invariância escalar segundo sexo e faixa etária, mas não foi observada para recortes de raça/cor e escolaridade. A vigilância intensificada apresentou cargas baixas e resíduos altos, com indicadores de ajuste inadequados. Para os itens da escala de discriminação o coeficiente de concordância kappa ponderado (Kp) variou de 0,44 a 0,78, e o coeficiente de correlação intraclasse (CCI) foi 0,87. Para os itens da EVI, o Kp variou de 0,47 a 0,59 e o CCI foi 0,83.
CONCLUSÕES
Embora haja itens correlacionados, concluiu-se que a EDD é uma escala promissora para avaliar experiências de discriminação percebidas no cotidiano brasileiro. Entretanto, a EVI não apresentou equivalência de mensuração no formato atual.
Discriminação Social, classificação; Psicometria; Tradução; Reprodutibilidade dos Testes; Estudo de Validação
ABSTRACT
OBJECTIVE
To describe the process of cross-cultural adaptation for the use in Brazil of the everyday discrimination scale (EDS) and the heightened vigilance scale (HVS) applied in the Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil).
METHODS
Conceptual, item and semantic equivalence analyses were conducted by a group of four epidemiologists; evaluation of measurement equivalence (factorial analysis of configural, metric and scalar structures, according to sociodemographic characteristics) and reliability. A total of 11,987 participants responded to the discrimination scale, and a subsample of 260 people participated in the test-retest study. In the case of HVS, 8,916 people responded, while 149 individuals did so in the test-retest study.
RESULTS
The scales presented conceptual, item and semantic equivalence pertinent in the Brazilian context, in addition to adequate correspondence of referential/denotative meaning of terms and also of the general/connotative of the items. The confirmatory factor analysis of EDS revealed a unidimensional structure, with residual correlations between two pairs of items, presenting configural and metric invariance among the four subgroups evaluated. Scalar invariance was identified according to sex and age group, but it was not observed for race/color and education. Heightened vigilance showed low loads and high residuals, with inadequate adjustment indicators. For the items of the discrimination scale the weighted kappa coefficient (Kp) ranged from 0.44 to 0.78, and the intraclass correlation coefficient (ICC) was 0.87. For HVS items, the Kp ranged from 0.47 to 0.59 and the ICC was 0.83.
CONCLUSIONS
Although there are correlated items, it was concluded that the EDS is a promising scale to evaluate experiences of perceived discrimination in Brazilian daily life. However, the heightened vigilance scale did not present equivalence of measurement in the current format.
Social Discrimination, classification; Psychometrics; Translating; Reproducibility of Results; Validation Study
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, estudos que avaliaram a associação entre discriminação e saúde aumentaram consideravelmente11. Krieger N, Smith K, Naishadham D, Hartman C, Barbeau EM. Experiences of discrimination: validity and reliability of a self-report measure for population health research on racism and health. Soc Sci Med. 2005;61(7):1576-96. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2005.03.006
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,22. Lewis TT, Cogburn CD, Williams DR. Self-reported experiences of discrimination and health: scientific advances, ongoing controversies, and emerging issues. Annu Rev Clin Psychol. 2015;11:407-40. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032814-112728
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. Seus resultados integram parte da documentação de disparidades em saúde nos Estados Unidos (EUA), devido às relações estabelecidas entre experiências de discriminação e piores indicadores de saúde mental e física33. Pascoe EA, Richman LS. Perceived discrimination and health: a meta-analytic review. Psychol Bull. 2009;135(4):531-54. https://doi.org/10.1037/a0016059
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,44. Williams DR, Mohammed SA. Discrimination and racial disparities in health: evidence and needed research. J Behav Med. 2009;32(1):20-47. https://doi.org/10.1007/s10865-008-9185-0
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. Parte dessas evidências emerge dos estudos de discriminação interpessoal, na qual experiências de eventos de hostilidade na vida cotidiana receberam maior ênfase55. Williams DR, Lawrence JA, Davis BA. Racism and health: evidence and needed research. Annu Rev Public Health. 2019;40:105-25. https://doi.org/10.1146/annurev-publhealth-040218-043750
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, por ser uma medida de exposição crônica a estressores psicossociais33. Pascoe EA, Richman LS. Perceived discrimination and health: a meta-analytic review. Psychol Bull. 2009;135(4):531-54. https://doi.org/10.1037/a0016059
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,66. Essed P. Understanding everyday racism: an interdisciplinary theory. Thousand Oaks, CA: Sage; 1991..
A percepção de discriminação cotidiana envolve práticas injustas e recorrentes nas interações interpessoais em diferentes contextos e ambientes, incluindo manifestações de tratamento desrespeitoso, menosprezo e oferta de pior atendimento ou serviço66. Essed P. Understanding everyday racism: an interdisciplinary theory. Thousand Oaks, CA: Sage; 1991.. A everyday discrimination scale (escala de discriminação no dia a dia – EDD)77. Williams DR, Yu Y, Jackson JS, Anderson NB. Racial differences in physical and mental health: socio-economic status, stress and discrimination. J Health Psychol. 1997;2(3):335-51. https://doi.org/10.1177/135910539700200305
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está entre os instrumentos mais utilizados para avaliar a discriminação racial/étnica, sobretudo nos EUA, mas também em países europeus, no Canadá e na África do Sul88. Bourabain D, Verhaeghe PP. The conceptualization of everyday racism in research on the mental and physical health of ethnic and racial groups: a systematic review. J Racial Ethn Health Disparities. 2021;8(3):648-60. https://doi.org/10.1007/s40615-020-00824-5
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. Originalmente proposta para o contexto do Detroit Area Study, para avaliar experiências e frequência de discriminação autorreferida de grupos raciais/étnicos e seu impacto na saúde77. Williams DR, Yu Y, Jackson JS, Anderson NB. Racial differences in physical and mental health: socio-economic status, stress and discrimination. J Health Psychol. 1997;2(3):335-51. https://doi.org/10.1177/135910539700200305
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, a escala tenta capturar aspectos crônicos ou episódicos mais sutis da discriminação interpessoal22. Lewis TT, Cogburn CD, Williams DR. Self-reported experiences of discrimination and health: scientific advances, ongoing controversies, and emerging issues. Annu Rev Clin Psychol. 2015;11:407-40. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032814-112728
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,44. Williams DR, Mohammed SA. Discrimination and racial disparities in health: evidence and needed research. J Behav Med. 2009;32(1):20-47. https://doi.org/10.1007/s10865-008-9185-0
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.
A difusão da EDD foi favorecida por sua brevidade e qualidades psicométricas descritas em sua primeira década de uso11. Krieger N, Smith K, Naishadham D, Hartman C, Barbeau EM. Experiences of discrimination: validity and reliability of a self-report measure for population health research on racism and health. Soc Sci Med. 2005;61(7):1576-96. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2005.03.006
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,22. Lewis TT, Cogburn CD, Williams DR. Self-reported experiences of discrimination and health: scientific advances, ongoing controversies, and emerging issues. Annu Rev Clin Psychol. 2015;11:407-40. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032814-112728
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,77. Williams DR, Yu Y, Jackson JS, Anderson NB. Racial differences in physical and mental health: socio-economic status, stress and discrimination. J Health Psychol. 1997;2(3):335-51. https://doi.org/10.1177/135910539700200305
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,99. Taylor TR, Kamarck TW, Shiffman S. Validation of the Detroit Area Study Discrimination Scale in a community sample of older African American adults: the Pittsburgh healthy heart project. Int J Behav Med. 2004;11(2):88-94. https://doi.org/10.1207/s15327558ijbm1102_4
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, concentradas prioritariamente em seu desempenho em diferentes grupos raciais/étnicos, como afro-americanos99. Taylor TR, Kamarck TW, Shiffman S. Validation of the Detroit Area Study Discrimination Scale in a community sample of older African American adults: the Pittsburgh healthy heart project. Int J Behav Med. 2004;11(2):88-94. https://doi.org/10.1207/s15327558ijbm1102_4
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e latinos nos EUA1010. Pérez DJ, Fortuna L, Alegria M. Prevalence and correlates of everyday discrimination among U.S. Latinos. J Community Psychol. 2008;1;36(4):421-33. https://doi.org/10.1002/jcop.20221
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, e entre mulheres1111. Lewis TT, Yang FM, Jacobs EA, Fitchett G. Racial/ethnic differences in responses to the Everyday Discrimination Scale: a differential item functioning analysis. Am J Epidemiol. 2012;175(5):391-401. https://doi.org/10.1093/aje/kwr287
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. Esses estudos sugerem bom desempenho psicométrico, mas recomendam que seja avaliado entre grupos sociais heterogêneos, que incluam diversidade racial, de identidade de gênero e classe social. Além disso, questionam se a escala deveria ser usada para avaliar a percepção geral de discriminação, além da discriminação racial em que se mostrou mais adequada1212. Bastos JL, Harnois CE. Does the Everyday Discrimination Scale generate meaningful cross-group estimates? A psychometric evaluation. Soc Sci Med. 2020;265:113321. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2020.113321
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.
A vigilância relacionada à discriminação tem sido enfatizada como um componente importante da associação entre experiências de discriminação e eventos de saúde1515. Clark R, Benkert RA, Flack JM. Large arterial elasticity varies as a function of gender and racism-related vigilance in black youth. J Adolesc Health. 2006;39(4):562-9. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2006.02.012
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. Trata-se de um mecanismo de enfrentamento que se caracteriza pela preparação física e mental do indivíduo, com monitoramento contínuo do ambiente e do que acontece ao redor, e constante readaptação, a fim de se proteger ou evitar uma experiência de discriminação1515. Clark R, Benkert RA, Flack JM. Large arterial elasticity varies as a function of gender and racism-related vigilance in black youth. J Adolesc Health. 2006;39(4):562-9. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2006.02.012
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,1616. Hicken MT, Lee H, Ailshire J, Burgard SA, Williams DR. “Every shut eye, ain’t sleep”: the role of racism-related vigilance in racial/ethnic disparities in sleep difficulty. Race Soc Probl. 2013;5(2):100-12. https://doi.org/10.1007/s12552-013-9095-9
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. Para avaliar esse componente da discriminação, a heightened vigilance scale (escala de vigilância intensificada – EVI) foi proposta também para o Detroit Area Study para ser utilizada em sequência à EDD, aplicada àqueles que responderam terem vivenciado experiências prévias de discriminação1515. Clark R, Benkert RA, Flack JM. Large arterial elasticity varies as a function of gender and racism-related vigilance in black youth. J Adolesc Health. 2006;39(4):562-9. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2006.02.012
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.
O enfrentamento avaliado pela EVI foi associado a problemas de saúde nos EUA1515. Clark R, Benkert RA, Flack JM. Large arterial elasticity varies as a function of gender and racism-related vigilance in black youth. J Adolesc Health. 2006;39(4):562-9. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2006.02.012
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,1717. LaVeist TA, Thorpe RJ Jr, Pierre G, Mance GA, Williams DR. The relationships among vigilant coping style, race, and depression. J Soc Issues. 2014;70(2):241-55. https://doi.org/10.1111/josi.12058
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, como o estresse1818. Himmelstein MS, Young DM, Sanchez DT, Jackson JS. Vigilance in the discrimination-stress model for Black Americans. Psychol Health. 2015;30(3):253-67. https://doi.org/10.1080/08870446.2014.966104
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. Além disso, foi considerado também um mediador potencial no modelo teórico que relaciona raça/etnia e desfechos adversos de saúde1616. Hicken MT, Lee H, Ailshire J, Burgard SA, Williams DR. “Every shut eye, ain’t sleep”: the role of racism-related vigilance in racial/ethnic disparities in sleep difficulty. Race Soc Probl. 2013;5(2):100-12. https://doi.org/10.1007/s12552-013-9095-9
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. Entretanto, o conhecimento sobre suas propriedades psicométricas é limitado, já que a mensuração e a análise da estrutura de seu constructo ainda foram pouco exploradas1919. Bauerband LA, Teti M, Velicer WF. Measuring minority stress: invariance of a discrimination and vigilance scale across transgender and cisgender LGBQ individuals. Psychol Sexual. 2019;10(1):17-30. https://doi.org/10.1080/19419899.2018.1520143
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.
Com o intuito de estudar os efeitos da discriminação racial sobre a saúde, ambas as escalas foram incluídas no questionário da terceira etapa (onda 3) de seguimento do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil). O presente artigo pretende descrever o processo de adaptação transcultural para o uso no Brasil das escalas EDD e EVI.
MÉTODOS
Equivalências Conceitual, de Itens e Semântica
Após a autorização dos autores das escalas, partiu-se para as etapas da adaptação transcultural com base nas recomendações da literatura2020. Reichenheim ME, Moraes CL. Operacionalização de adaptação transcultural de instrumentos de aferição usados em epidemiologia. Rev Saude Publica. 2007;41(4):665-73. https://doi.org/10.1590/s0034-89102006005000035
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.
As equivalências conceitual e de itens foram avaliadas por um grupo de quatro pesquisadores epidemiologistas com experiência prévia no uso de escalas e/ou com tema da discriminação racial. O processo envolveu ampla revisão bibliográfica do uso dos instrumentos, do desempenho psicométrico prévio e da pertinência das escalas para o contexto brasileiro.
A equivalência semântica envolveu quatro etapas: 1) tradução do instrumento original em inglês para a língua portuguesa de variante brasileira, de forma independente, por dois pesquisadores experientes e fluentes em inglês. Os tradutores utilizaram um formulário padronizado atribuindo uma nota (entre 0 e 10) ao grau de dificuldade encontrada na tradução. As traduções geraram uma versão de consenso em português, feita pela equipe de pesquisadores, com a presença dos tradutores; 2) retrotradução da versão de consenso em português, realizada por um tradutor nativo na língua inglesa, que registrou comentários e avaliou o grau de dificuldade na retrotradução em notas, também com variação entre zero e dez; 3) comparação da versão original da escala com aquela elaborada após a retrotradução, avaliando-se a equivalência semântica das duas versões (original e retrotraduzida), com o intuito de garantir a transferência dos significados das palavras nos dois idiomas. Após ajustes e adaptações, versões corrigidas do instrumento foram elaboradas para a realização de pré-testes; 4) pré-testes e estudo piloto das versões propostas (50 e 18 voluntários, respectivamente, com características semelhantes à população de estudo).
Equivalência de Mensuração
Após a aplicação das escalas na onda 3 do ELSA-Brasil procedeu-se a avaliação da estrutura dimensional – via análise fatorial exploratória (AFE) e análise fatorial confirmatória (AFC) – e avaliação de adequação da estrutura interna, com exame de invariância das estruturas configural, métrica e escalar entre subgrupos de raça/cor da pele autorreferida, sexo, faixa etária e escolaridade.
O ELSA-Brasil é uma coorte prospectiva que, na sua linha de base (2008–2010), arrolou 15.105 participantes com idade entre 35 e 74 anos de ambos os sexos, servidores ativos e aposentados de seis instituições brasileiras de ensino e pesquisa, para acompanhamento de desfechos crônicos de saúde2121. Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan BB, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2012;175(4):315-24. https://doi.org/10.1093/aje/kwr294
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. A onda 3 do ELSA-Brasil ocorreu entre 2017 e 2019, aplicando entrevistas face a face a 12.636 participantes. Participaram das análises 11.987 indivíduos que responderam à escala de discriminação, desses, 9.916 relataram experiências de discriminação e responderam à EVI.
O ELSA-Brasil foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de cada uma das instituições envolvidas, pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP 976/2006) e todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
Estrutura Dimensional e Invariância entre Subgrupos
A existência de modelos prévios sobre a dimensionalidade da escala de discriminação22. Lewis TT, Cogburn CD, Williams DR. Self-reported experiences of discrimination and health: scientific advances, ongoing controversies, and emerging issues. Annu Rev Clin Psychol. 2015;11:407-40. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032814-112728
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,2222. Stucky BD, Gottfredson NC, Panter AT, Daye CE, Allen WR, Wightman LF. An item factor analysis and item response theory-based revision of the Everyday Discrimination Scale. Cultur Divers Ethnic Minor Psychol. 2011;17(2):175-85. https://doi.org/10.1037/a0023356
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guiou a avaliação psicométrica desse instrumento a partir da AFC. Dado o conhecimento limitado sobre as propriedades psicométricas da escala de vigilância, a AFE foi iniciada, seguida pela AFC. Os testes de índice de KMO e de esfericidade de Bartlett foram utilizados na verificação da adequação dos dados e análises paralelas como critério para verificar a retenção de fatores. A estimação dos parâmetros foi realizada por Weighted Least Squares Mean and Variance Adjusted (WLSMV), com implementação de uma matriz policórica2323. Muthén LK, Muthén BO. Mplus user’s guide. 8. ed. Los Angeles, CA: Muthén & Muthén; 1998-2017.. O critério mínimo adotado para a carga padronizada dos itens foi de 0,50 e cargas ≥ 0,70 foram consideradas ideais2424. Hair JF Jr, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6. Porto Alegre: Bookman; 2009. Além disso, a avaliação das correlações residuais entre os itens, os índices de modificação e os valores de mudanças esperadas de parâmetros foram explorados.
Para avaliar a adequação do modelo, três índices foram considerados: o de ajuste comparativo (CFI – Comparative Fit Index), o de Tucker-Lewis (TLI – Tucker Lewis Index) e a raiz do erro quadrático médio de aproximação (RMSEA – root mean square error of approximation). Valores de RMSEA inferiores a 0,06 são preferíveis, mas até 0,08 são aceitáveis. Considerou-se ainda seu intervalo de 95% de confiança (IC95%) como avaliação adicional, com o limite superior não ultrapassando 0,08. Modelos com bom ajuste têm CFI e TLI aproximadamente de 1 (um): índices ≥ 0,90 são aceitáveis e ≥ 0,95 são preferíveis2424. Hair JF Jr, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6. Porto Alegre: Bookman; 2009. A validade convergente foi avaliada pela variância média extraída (VME) e a consistência interna pela confiabilidade composta (CC), sendo considerados valores aceitáveis quando VME ≥ 0,50 e CC ≥ 0,602424. Hair JF Jr, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6. Porto Alegre: Bookman; 2009.
No caso da discriminação no dia a dia, foi conduzida AFC de múltiplos grupos para raça/cor da pele autorreferida, sexo, faixas etárias e escolaridade para avaliarmos se em cada subgrupo se configura a mesma estrutura identificada na AFC sem estratificação. Para comparação de invariância com brancos, indígenas (n = 98) e amarelos (n = 308) foram excluídos devido à baixa proporção entre os participantes, enquanto as categorias de pretos e pardos foram unidas, pois apresentaram parâmetros de ajuste semelhantes nos modelos configurais por subgrupos raciais.
Os resultados dos modelos configurais, por subgrupo, com ajustes aceitáveis permitiram prosseguir com os testes para equivalência de mensuração. Essa etapa consiste em comparar os subgrupos, a partir de três modelos sequenciais e interdependentes: 1) o modelo de referência: menos restrito e possibilita avaliar a invariância configural, ou seja, a equivalência da estrutura fatorial, se o número de fatores e a distribuição dos itens entre eles se mantêm entre os subgrupos de raça/cor da pele, sexo, faixa etária e escolaridade; 2) invariância métrica: avalia a equivalência do padrão das cargas fatoriais entre os subgrupos, adicionando dessa forma uma restrição ao primeiro modelo: cargas fatoriais iguais entre subgrupos; e 3) invariância escalar: avalia a equivalência de interceptos, isso é, se indivíduos com escore igual no construto latente obteriam escore semelhante na variável observada, independentemente do subgrupo do qual faz parte. Esse modelo restringe não apenas as cargas fatoriais, mas as variâncias para serem iguais entre grupos2424. Hair JF Jr, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6. Porto Alegre: Bookman; 2009,2525. Milfont TL, Fischer R. Testing measurement invariance across groups: applications in cross-cultural research. Int J Psychol Res. 2010;3(1):111-30. https://doi.org/10.21500/20112084.857
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.
Comparamos em cada etapa os índices de ajuste com os índices do modelo anterior, avaliando principalmente a magnitude e direção das variações nos índices incrementais: se o modelo mais restritivo apresentou redução no CFI ≥ 0,010 complementado por aumento no RMSEA ≥ 0,0152626. Chen FF. Sensitivity of goodness of fit indexes to lack of measurement invariance. Struct Equ Modeling. 2007;14(3):464-504. https://doi.org/10.1080/10705510701301834
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, então a hipótese de invariância foi rejeitada. O teste de qui-quadrado (χ2) para comparação de modelos foi utilizado, mas interpretado com cautela, devido sua sensibilidade ao tamanho amostral2525. Milfont TL, Fischer R. Testing measurement invariance across groups: applications in cross-cultural research. Int J Psychol Res. 2010;3(1):111-30. https://doi.org/10.21500/20112084.857
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. Todas as análises dessas etapas foram conduzidas no software Mplus 8.12.
Estudo de Confiabilidade Teste-reteste
Para avaliar a estabilidade temporal dos itens e dos escores, as escalas EDD e EVI foram aplicadas duas vezes com intervalo entre sete e 14 dias (média de 10 dias) em subamostra aleatória de 260 participantes, dos quais, 149 relataram experiências de discriminação e responderam também à EVI.
A reprodutibilidade intraobservador foi avaliada por meio da concordância do kappa com ponderação quadrática (Kp), interpretado de acordo com recomendações de Fleiss2727. Fleiss JL. Statistical methods for rates and proportions. 2. ed. New York, NY: Wiley; 1981. (Wiley Series in Probability and Mathematical Statistics).. O coeficiente de correlação intraclasse foi utilizado para avaliar a reprodutibilidade dos escores das escalas no teste e no reteste, e os resultados foram considerados satisfatórios quando alcançaram valores mínimos de 0,702727. Fleiss JL. Statistical methods for rates and proportions. 2. ed. New York, NY: Wiley; 1981. (Wiley Series in Probability and Mathematical Statistics).. Essas análises foram conduzidas no software R, versão 4.0.3, com nível de significância de 5%.
RESULTADOS
A revisão bibliográfica sobre o tema da discriminação e o debate entre os pesquisadores especializados na área mostraram que havia equivalência conceitual e de itens, apontando para a pertinência do instrumento original na nossa cultura.
A maioria dos itens da EDD foi considerada de pouca dificuldade para a tradução. Apenas cinco itens foram considerados de dificuldade moderada e geraram alguma inconsistência entre os tradutores ou debate entre os pesquisadores por possuírem termos e expressões incomuns em nosso contexto. Todas as decisões de mudança, descritas a seguir, foram corroboradas nas rodadas de pré-teste: (1) You receive poorer service than other people at restaurants or stores: neste caso, a expressão poorer service foi adaptada para “atendimento de pior qualidade”; (2) You are threatened or harassed: já que não encontramos um termo coloquial para assédio, optamos por “ameaçado(a) ou assediado(a)/constrangido(a)”; (3) You are followed around in stores: utilizar a expressão “ser seguido” poderia não representar bem o conteúdo semântico do item, já que no Brasil alguns vendedores são instruídos a seguir clientes como sinal de maior atenção dispensada a eles. Então, adaptamos para “tratado(a) de forma suspeita e é vigiado(a) em lugares como lojas”. Na avaliação dos tradutores e em pré-testes subsequentes, não houve dificuldades na tradução ou interpretação dos itens da EVI.
A versão original das escalas, bem como sua versão final estão apresentadas no Quadro. As escalas de discriminação e de vigilância são formadas, respectivamente, por 10 e seis situações/itens com respostas em formato Likert. Para a EDD, cada resposta foi pontuada de 1 (nunca) a 6 (quase todos os dias), com escore variando entre seis e 60 pontos; para a EVI variou de 1 (nunca) a 5 (com muita frequência), com escore total entre seis e 30 pontos. Quanto maior a pontuação, mais frequente é a experiência de discriminação e a vigilância.
Itens da escala de discriminação no dia a dia e escala de vigilância intensificada, versão original e versão final em português do Brasil.
Estrutura Dimensional e Invariância entre Subgrupos
Os participantes do estudo eram em sua maioria mulheres (56%), na faixa etária de 40 a 59 anos (53,8%), com ensino superior completo (58%) e autorreferidos como brancos (52%). Características semelhantes foram observadas entre os participantes da subamostra do estudo de confiabilidade teste-reteste.
Na AFC para a escala de discriminação (Tabela 1), o modelo inicial, sem correlações entre os itens, apresentou cargas entre 0,527 (item 5) e 0,865 (item 2), com índices de ajuste afastados dos limites recomendados: CFI = 0,931; TLI = 0,911; RMSEA = 0,122. Após a inserção das correlações residuais entre os itens 1 e 2, os índices de ajuste melhoraram. O resultado com fator único mostrou um ajuste razoável com melhoria dos indicadores após uma correlação adicional: entre os itens 8 e 9 da escala: CFI = 0,980; TLI = 0,973; RMSEA = 0,067. A VME (0,402) foi inferior ao limite aceitável (≥ 0,500), mas a CC (0,869) alcançou valor preferível (≥ 0,600). Esse modelo da AFC com duas correlações entre itens, serviu de base para os modelos configurais por subgrupo de características sociodemográficas e as análises de invariância na EDD.
Para a avaliação da EVI, procedeu-se à AFE, inicialmente, pelo método de extração dos eixos principais, rotação oblíqua. O índice de KMO para adequação da amostra foi de 0,75, considerado bom, indicando que a matriz era fatorável. O teste de esfericidade de Bartlett com níveis de significância p < 0,00 foi considerado adequado, indicando que a matriz correlacional não era uma matriz identidade. As análises paralelas indicaram a retenção de dois fatores. A análise fatorial exploratória com um fator apresentou cargas muito baixas para os itens 5 e 6: 0,495 e 0,363, respectivamente. Esse modelo configural também não apresentou bons indicadores de ajuste: CFI = 0,918; TLI = 0,864; RMSEA = 0,138. Os resultados da AFE com dois fatores melhoraram esses indicadores, mas apresentou cargas cruzadas nos itens 3 e 6, além de resíduos com valores altos. A AFC com solução de fator único apresentou resultados aceitáveis após inserção de correlações residuais entre os itens 1 e 2 e entre os itens 4 e 5 da escala: CFI = 0,991; TLI = 0,980; RMSEA = 0,053. No entanto, os itens 5 e 6 continuaram com cargas inferiores a 0,500. O resultado da confiabilidade composta para esse modelo (0,668) foi satisfatório, mas a validade convergente (0,258) foi inferior ao recomendado (Tabela 2). Com cargas baixas e resíduos altos na análise fatorial confirmatória da EVI, optamos por não prosseguir com os modelos configurais por subgrupo e com os testes para equivalência de mensuração dessa escala.
A avaliação da equivalência de mensuração para a EDD mostrou indicadores CFI (≥ 0,95) e RMSEA (≤ 0,080) com ajustes aceitáveis para invariância configural nas comparações dos quatro grupos. Na invariância métrica, esses indicadores de ajuste melhoraram em todas as comparações de grupos, ou seja, o RMSEA foi reduzido significativamente, sem sobreposição do IC95% com a estimativa do modelo anterior, e houve incremento no CFI que passou a ser superior a 0,990 em todos os casos. O modelo da invariância escalar indicou constância apenas para comparações nos subgrupos de sexo. Para comparação entre faixas etárias, a redução no CFI foi limítrofe passando de 0,992 no modelo de invariância métrica para 0,981 no modelo de escalar (Δ de -0,011), enquanto o aumento no RMSEA foi tolerável (Δ de 0,007). A invariância escalar não foi alcançada para comparações nos subgrupos de raça/cor da pele e de escolaridade. Em ambos os casos o incremento no RMSEA foi superior a 0,015 (0,023 e 0,016, respectivamente) e a redução no CFI foi maior que 0,010 (-0,024 e -0,018, respectivamente) (Tabela 3).
Estudo de Confiabilidade Teste-reteste
Para a EDD, os escores no teste e no reteste variaram respectivamente de 10 a 48 (média = 18,07) e de 10 a 51 (média = 17,05). Para a EVI, variou de sete a 29 (média = 19,78) no teste e de sete a 30 no reteste (média = 18,92). O Kp na EDD variou de 0,39 (item 9) a 0,78 (item 10), para a EVI variou de 0,47 (item 3) e 0,56 (item 4). Os CCI variaram de 0,87 (IC95% 0,83–0,90) para EDD e 0,83 (IC95% 0,76–0,88) para EVI (Tabela 4).
DISCUSSÃO
Seguindo as etapas recomendadas pela literatura2020. Reichenheim ME, Moraes CL. Operacionalização de adaptação transcultural de instrumentos de aferição usados em epidemiologia. Rev Saude Publica. 2007;41(4):665-73. https://doi.org/10.1590/s0034-89102006005000035
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sobre adaptação transcultural, os resultados mostraram que a versão brasileira da EDD apresenta adaptação transcultural aceitável, o que permite seu uso futuro em estudos epidemiológicos. No entanto, nossas análises não corroboram o uso da EVI relacionada à discriminação no formato atual.
Em relação à EDD, nossa análise apoiou a unidimensionalidade da escala, semelhante a outros estudos22. Lewis TT, Cogburn CD, Williams DR. Self-reported experiences of discrimination and health: scientific advances, ongoing controversies, and emerging issues. Annu Rev Clin Psychol. 2015;11:407-40. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032814-112728
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,2222. Stucky BD, Gottfredson NC, Panter AT, Daye CE, Allen WR, Wightman LF. An item factor analysis and item response theory-based revision of the Everyday Discrimination Scale. Cultur Divers Ethnic Minor Psychol. 2011;17(2):175-85. https://doi.org/10.1037/a0023356
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, e foi consistente com pesquisas anteriores sobre dependência local ou alta correlação entre os itens 1 e 2 e entre os itens 8 e 91313. Harnois CE, Bastos JL, Campbell ME, Keith VM. Measuring perceived mistreatment across diverse social groups: an evaluation of the Everyday Discrimination Scale. Soc Sci Med. 2019;232:298-306. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2019.05.011
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,2222. Stucky BD, Gottfredson NC, Panter AT, Daye CE, Allen WR, Wightman LF. An item factor analysis and item response theory-based revision of the Everyday Discrimination Scale. Cultur Divers Ethnic Minor Psychol. 2011;17(2):175-85. https://doi.org/10.1037/a0023356
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,2828. Reeve BB, Willis G, Shariff-Marco SN, Breen N, Williams DR, Gee GC, et al. Comparing cognitive interviewing and psychometric methods to evaluate a racial/ethnic discrimination scale. Field Methods. 2011;23(4):397-419. https://doi.org/10.1177/1525822X11416564
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. Estudo psicométrico que também explorou qualitativamente a escala indicou que a correlação entre os itens 1 e 2 pode ser devida à redundância, uma vez que esses itens foram vistos com significado semelhante pelos entrevistados2828. Reeve BB, Willis G, Shariff-Marco SN, Breen N, Williams DR, Gee GC, et al. Comparing cognitive interviewing and psychometric methods to evaluate a racial/ethnic discrimination scale. Field Methods. 2011;23(4):397-419. https://doi.org/10.1177/1525822X11416564
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, embora isso não tenha sido captado nos pré-testes realizados no âmbito do ELSA-Brasil. Já a correlação entre os itens 8 e 9 pode ser explicada pela natureza dessas experiências, relacionadas a formas agudas de discriminação, diretamente endereçadas e mais evidentes, e se distanciando da natureza sutil ou crônica das experiências para as quais a EDD foi proposta2222. Stucky BD, Gottfredson NC, Panter AT, Daye CE, Allen WR, Wightman LF. An item factor analysis and item response theory-based revision of the Everyday Discrimination Scale. Cultur Divers Ethnic Minor Psychol. 2011;17(2):175-85. https://doi.org/10.1037/a0023356
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.
Levando em conta essas avaliações, uma versão resumida da escala de discriminação com cinco itens (α = 0,77) foi desenvolvida para o Chicago Community Adult Health Study2929. Sternthal MJ, Slopen N, Williams DR. racial disparities in health: how much does stress really matter? Du Bois Rev. 2011;8(1):95-113. https://doi.org/10.1017/S1742058X11000087
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e contempla mudanças em itens que identificamos como correlacionados: os dois primeiros itens da escala foram unidos (treated with less courtesy/respect than other people) e o item 8 foi retirado, mantendo-se apenas o item 9, acrescido do termo “constrangido”. Não foram incluídos na versão resumida os itens 6, 7 e 10. Incentivamos, portanto, que pesquisas futuras no Brasil e outros países de língua portuguesa avaliem a adequação de versões resumidas modificadas da escala.
Os modelos utilizados para avaliar a equivalência de mensuração entre grupos na escala de discriminação indicaram invariância métrica em todos os casos, fornecendo evidência de que os respondentes usam a escala de maneira semelhante entre os subgrupos, então as diferenças entre valores podem ser comparadas2424. Hair JF Jr, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6. Porto Alegre: Bookman; 2009. No entanto, a invariância escalar não foi alcançada para comparações entre grupos raciais e de diferentes níveis de escolaridade. Esses resultados confirmam as conclusões de estudos mais recentes sobre invariância de medição na EDD, que relataram, ao considerar a discriminação geral sem atribuir motivação, falta de equivalência (ou não invariância) entre grupos raciais e com base na escolaridade1212. Bastos JL, Harnois CE. Does the Everyday Discrimination Scale generate meaningful cross-group estimates? A psychometric evaluation. Soc Sci Med. 2020;265:113321. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2020.113321
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,1313. Harnois CE, Bastos JL, Campbell ME, Keith VM. Measuring perceived mistreatment across diverse social groups: an evaluation of the Everyday Discrimination Scale. Soc Sci Med. 2019;232:298-306. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2019.05.011
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. Esses estudos, entretanto, divergiram em relação à invariância entre demais subgrupos: enquanto um indicou que apenas comparações entre grupos etários das estimativas da escala de discriminação podem ser consideradas significativas1313. Harnois CE, Bastos JL, Campbell ME, Keith VM. Measuring perceived mistreatment across diverse social groups: an evaluation of the Everyday Discrimination Scale. Soc Sci Med. 2019;232:298-306. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2019.05.011
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, o outro sugeriu que comparações entre homens e mulheres são adequadas1212. Bastos JL, Harnois CE. Does the Everyday Discrimination Scale generate meaningful cross-group estimates? A psychometric evaluation. Soc Sci Med. 2020;265:113321. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2020.113321
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. Ressalta-se, no entanto, que a mudança nos valores de CFI adotada nesses estudos, com reduções ≥ 0,002, foram consideradas uma indicação de não invariância entre os grupos. Esse ponto de corte foi mais conservador do que aquele adotado em nossas análises.
Em relação à EVI, observou-se indicadores não aceitáveis e, até onde foi possível avaliar, poucos estudos avaliaram as propriedades psicométricas dessa escala, o que limita comparações. Desafios semelhantes relacionados à dimensionalidade da escala têm sido relatados em outros estudos. Por exemplo, um estudo nos EUA indicou duas dimensões nas análises fatoriais exploratória e confirmatória: uma relacionada ao que os autores denominaram preparation (do item 1 ao 3) e outra relacionada ao que denominaram de caution (do item 4 ao 6)1919. Bauerband LA, Teti M, Velicer WF. Measuring minority stress: invariance of a discrimination and vigilance scale across transgender and cisgender LGBQ individuals. Psychol Sexual. 2019;10(1):17-30. https://doi.org/10.1080/19419899.2018.1520143
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. O mesmo estudo, ao utilizar um modelo de fator único, encontrou ajuste insatisfatório (CFI = 0,94 e RMSEA = 0,12) e optaram por seguir as análises com modelo de dois fatores com melhoria nos indicadores (CFI = 0,98 e RMSEA = 0,07). Informação adicional sobre a estrutura da escala vem do estudo que publicou originalmente a EVI e reportou análise por componentes principais, com um componente (autovalor = 3,42) responsável por 57% da variância padronizada (cargas > 0,69)1515. Clark R, Benkert RA, Flack JM. Large arterial elasticity varies as a function of gender and racism-related vigilance in black youth. J Adolesc Health. 2006;39(4):562-9. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2006.02.012
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.
Esses aspectos têm motivado também a revisão dessa escala e uma versão resumida com quatro itens (α = 0,72) foi aplicada no Chicago Community Adult Health Study3030. Williams DR. Measuring discrimination resource. Boston, MA: Harvard T.H. Chan School of Public Health; 2020 [cited 2021 Jun 16]. Available from: https://scholar.harvard.edu/files/davidrwilliams/files/discrimination_resource_dec._2020.pdf
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. Essa versão retira dois itens que estavam envolvidos em correlações residuais em nossa análise: os itens 1 e 5. Outro estudo utilizou uma versão ainda mais resumida da EVI com retirada também do item 4 (α = 0,66)1616. Hicken MT, Lee H, Ailshire J, Burgard SA, Williams DR. “Every shut eye, ain’t sleep”: the role of racism-related vigilance in racial/ethnic disparities in sleep difficulty. Race Soc Probl. 2013;5(2):100-12. https://doi.org/10.1007/s12552-013-9095-9
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e LaVeist et al.1717. LaVeist TA, Thorpe RJ Jr, Pierre G, Mance GA, Williams DR. The relationships among vigilant coping style, race, and depression. J Soc Issues. 2014;70(2):241-55. https://doi.org/10.1111/josi.12058
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usaram a versão original, com a retirada do item 6 (α = 0,69).
Embora a EVI de forma abreviada seja utilizada em pesquisas sobre sua associação com desfechos de saúde, avaliações psicométricas adicionais são necessárias em contextos distintos para elucidar se a escala pode ser utilizada na população e na comparação entre subgrupos. Encontramos apenas um estudo que avaliou a invariância de medição da EVI, no qual comparações entre transgênero e cisgênero e entre subgrupos de cisgênero puderam ser realizadas, pois a escala funciona de forma equivalente entre esses grupos. Por outro lado, as comparações entre subgrupos de transgêneros exigiram cautela, uma vez que foi encontrada invariância métrica parcial e invariância escalar parcial1919. Bauerband LA, Teti M, Velicer WF. Measuring minority stress: invariance of a discrimination and vigilance scale across transgender and cisgender LGBQ individuals. Psychol Sexual. 2019;10(1):17-30. https://doi.org/10.1080/19419899.2018.1520143
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.
O presente estudo apresenta como pontos fortes a qualidade do processo de obtenção dos dados, além de uma apreciação bastante ampla das avaliações que compõem as etapas de adaptação transcultural em uma amostra abrangente no país e com diferentes características sociodemográficas. No entanto, a composição da população do ELSA-Brasil – adultos e idosos, empregados ou aposentados, e com escolaridade mais elevada do que a média da população brasileira – limitam a sua representatividade.
Por fim, destacamos que a EDD obteve resultados psicométricos aceitáveis para utilização no ELSA-Brasil e em populações similares. Não foi possível identificar propriedades psicométricas aceitáveis para a escala de vigilância. No entanto, dada a importância do tema em estudos epidemiológicos na realidade brasileira, aconselha-se que as versões resumidas propostas mais recentemente sejam utilizadas em novos estudos e avaliadas sobre sua pertinência no nosso contexto.
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Financiamento: A onda 3 do ELSA-Brasil foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq - 405551/2015-0 BA, 405544/2015-4 RJ, 405552/2015-7 MG, 405543/2015-8 ES e 405545/2015-0 RS). RHG, MJMF e DC são bolsistas do CNPq e também apoiados por uma bolsa de pesquisa (Cientistas do Nosso Estado) da Fundação de Amparo à Pesquisa do do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Jan 2023 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
6 Out 2021 -
Aceito
19 Jan 2022