Resumo
A violência doméstica é uma problemática que tem suas raízes firmadas nas desigualdades de gênero e na concentração de poder. Com a pandemia do novo coronavírus (covid-19), essas desigualdades se tornaram ainda mais evidentes. Partindo disso, neste artigo discute-se o aumento da violência doméstica na Vila dos Pescadores durante esse período e as formas de enfrentamento encontradas pela comunidade. A pesquisa se dividiu em duas fases: análise documental e trabalho de campo. A análise documental teve como base artigos, textos e dados sobre violência doméstica e a pandemia da covid-19, inclusive no território estudado. Por sua vez, a etapa do trabalho de campo consistiu na realização de entrevistas semiestruturadas e roda de conversa. Os resultados foram analisados baseados na Hermenêutica de Profundidade, proposta por Thompson, e apontaram que, não obstante a ineficiência de atenção e cuidado dado pelo Estado, as instituições de base comunitária presentes no bairro desempenharam um importante papel no enfrentamento de situações de vivências dramáticas de angústia e abandono das mulheres em situação de vulnerabilidade. Tal fato se deu por meio do estabelecimento da associação de base comunitária, espaço para escuta sensível e acolhimento, e de outros encaminhamentos, como serviços de proteção de saúde e justiça.
Palavras-Chave:
Violência Doméstica; Vulnerabilidade Social; covid-19; Comunidade.
Abstract
Domestic violence has its roots in gender inequalities and the concentration of power, which became even more evident with the pandemic of the new coronavirus (covid-19). Given this scenario, this paper discusses the increase in domestic violence in Vila dos Pescadores during the pandemic and the coping mechanisms employed by the community. The research comprised two phases: 1) a documentary analysis based on articles, texts and data on domestic violence and the covid-19 pandemic, including the territory studied; 2) a fieldwork in which semi-structured interviews and conversation circles were conducted. Data were analyzed based on Depth Hermeneutics, proposed by Thompson. Results showed that, despite the inefficiency of attention and care provided by the State, community-based institutions present in the neighborhood played an important role in confronting dramatic experiences of distress and abandonment of women in vulnerable situations. This was achieved by the implementation of a community-based association, a space for sensitive listening and user embracement, and other referrals, such as health protection and justice services.
Keywords:
Domestic Violence; Social Vulnerability; covid-19; Community.
Introdução
A crise econômica e sanitária provocada pela pandemia da covid-19 tem acentuado ainda mais as desigualdades sociais. Enquanto a classe trabalhadora tem sofrido não só com a letalidade do vírus, mas com a perda de renda, o desemprego e a violência, a burguesia tem ficado ainda mais rica. De acordo com a Oxfam Brasil (2022), desde março de 2020, quando a pandemia foi declarada, o país ganhou dez novos bilionários. O aumento da riqueza deles, nesse período, foi de 30% (US$ 39,6 bilhões), enquanto 90% da população teve uma redução de 0,2% entre 2019 e 2021. Os 20 maiores bilionários do país têm mais riqueza (US$ 121 bilhões) do que 128 milhões de brasileiros (60% da população). Com isso, percebe-se que apenas uma parcela da população é afetada de forma direta pela crise estrutural do capital, que tem como consequência o fortalecimento e a intensificação do sistema neoliberal, o que leva ao enfraquecimento das políticas públicas e a perda de direitos da classe trabalhadora.
Para minimizar a propagação do vírus e a intensificação da pandemia, o Estado adotou como uma das medidas o isolamento social. Um efeito colateral dessa atitude foi o aumento da violência doméstica, visto que as vítimas se encontravam em maior tempo de convivência com seu agressor. Garcia, Maciel e Vieira (2020VIEIRA, P. R.; GARCIA, L. P.; MACIEL, E. L. N. Isolamento social e o aumento da violência doméstica: o que isso nos revela? Revista Brasileira de Epidemiologia, São Paulo, v. 23, E200033, 2020. DOI:10.1590/1980-549720200033
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) ressaltam que a coexistência forçada entre casais no contexto do isolamento, o estresse econômico crescente e o medo de adoecer pela covid-19 acabam se tornando gatilhos para a violência.
O art. 5º da Lei Maria da Penha (Brasil, 2006BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 ago. 2006.) define violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, além de dano moral ou patrimonial. A violência atinge mulheres independentemente da idade, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual ou escolaridade. No entanto, as experiências mudam conforme a condição social e a desigualdade no acesso à justiça e aos serviços de saúde (Curia et al., 2020CURIA, B. G. et al. Produções Científicas Brasileiras em Psicologia sobre Violência contra a Mulher por Parceiro Íntimo. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, DF, v. 40, e189184, p. 1-19, 2020. DOI:10.1590/1982-3703003189184
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). Em uma sociedade capitalista, machista e racista, todas as mulheres acabam sendo afetadas de forma direta pelo seu gênero, classe e raça (Nascimento, 2018NASCIMENTO, M. B. Sistemas Sociais alternativos organizados pelos negros: dos quilombos as favelas. In: NASCIMENTO, M. B. Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidades nos dias de destruição. (S. I.): Filhos da África, 2018. p. 211-225.; Gonzalez, 1982GONZALEZ, L. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje, São Paulo, p. 223-244, 1984.). Quando se considera isso, evidencia-se que as mulheres pobres e pretas são as principais vítimas da violência doméstica. De acordo com o Atlas da Violência (Brasil, 2020BRASIL. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Atlas da Violência 2020. Brasília, DF: IPEA, 2020.), a taxa de homicídios é maior entre as mulheres negras do que entre as não negras, chegando a ser de 5,2 por 100 mil no último ano, enquanto para as não negras foi de 2,8 por 100 mil. Em 2018, por exemplo, 68% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras.
Os dados sobre a violência doméstica durante a pandemia ainda são escassos e limitados, visto todos os empecilhos que as vítimas têm encontrado para realizar as denúncias, mas mesmo não representando a real magnitude da problemática, chamam atenção. Segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), uma em cada quatro mulheres brasileiras acima de 16 anos (24,4%), ou seja, cerca de 17 milhões de mulheres, afirmaram ter sofrido algum tipo de violência durante a pandemia da covid-19. Quando se traça um perfil dessas vítimas, observa-se que mulheres pretas experimentaram níveis mais elevados de violência (28,3%) do que as pardas (24,6%) e as brancas (23,5%). No que se refere à faixa etária, quanto mais jovem, maior a prevalência, sendo que 35,2% das mulheres de 16 a 24 anos relataram ter vivenciado algum tipo de violência, 28,6% das mulheres de 35 a 34 anos, 24,4% das mulheres de 35 a 44 anos, 19,8% das mulheres de 45 a 59 anos e 14,1% das mulheres com 60 anos ou mais. Tal violência é cometida, predominantemente, por conhecidos das vítimas (72,8%), com destaque para os cônjuges/companheiros/namorados (25,4%) e ex-cônjuges/ex-companheiros/ex-namorados (18,1%).
No que tange às denúncias, 28,5% das mulheres procuraram algum canal de denúncia, 11,8% denunciaram em uma delegacia da mulher, 7,5% em uma delegacia comum, 7,1% das mulheres procuraram a Polícia Militar (190) e 2,1% ligaram para a Central de Atendimento à Mulher (180). Porém, 44,9% das mulheres não fizeram nada em relação à agressão mais grave sofrida, seja pelas dificuldades encontradas na hora de denunciar, ou por medo do agressor.
Visando facilitar o acesso das vítimas aos canais de denúncias e aos serviços de proteção, o governo optou por expandi-los, por meio do Telegram, WhatsApp e pelo aplicativo Direitos Humanos Brasil. Além disso, foi sancionada a Lei n° 14.022/2020, que permite a solicitação de medidas protetivas de urgência possam por meio de atendimento online, além da prorrogação de ações durante todo o período de calamidade pública em território nacional. Essas são iniciativas importantes, mas não são saídas concretas e imediatas à situação, levando-se em conta principalmente
[…] o perfil da maior parte das mulheres vítimas de violência doméstica, em sua maior parte negras e pobres, apontam para a limitação do uso e acesso a recursos materiais, como celulares e internet, e maior dependência de serviços públicos, que deveriam ter sido mais priorizados neste período. (Bueno; Lima, 2020BUENO, S.; LIMA, R. S. (coord.). Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020., p. 40).
Em territórios de alta vulnerabilidade, a violência é ainda mais recorrente. A falta de investimentos e políticas públicas é fator determinante para o mau funcionamento e sucateamento dos serviços de proteção e saúde, o que contribui para a perpetuação e intensificação dos casos de violência. Tais situações são vivenciadas no cotidiano e expressas na precarização da qualidade dos vínculos afetivos e sociais. Dessa forma, a intersubjetividade pode contribuir para a compreensão da complexidade do fenômeno da violência doméstica (Martín-Baró, 2017MARTÍN-BARÓ, I. Crítica e libertação na psicologia: estudos psicossociais. Petrópolis: Vozes, 2017.). Com o intuito de se entender como a violência se faz presente no bairro onde o estudo foi realizado, é preciso compreender as condições sócio-históricas e culturais que, dialeticamente, produzem diferentes subjetividades e formas de pensar e agir das pessoas, grupos e comunidades. Como afirmam Bock et al.,
O objetivo [desta psicologia social] era compreender o indivíduo em relação dialética com a sociedade; a constituição histórica e social do indivíduo e os elementos que explicam os processos de consciência e alienação; e as possibilidades de ação dos indivíduos frente às determinações sociais. (Bock et al., 2007BOCK, A. M. B. et al. Sílvia Lane e o projeto do “Compromisso Social da Psicologia”. Psicologia & Sociedade, Recife, v. 19, n. especial 2, p. 46-56, 2007. DOI:10.1590/S0102-71822007000500018
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Assim, evidencia-se que a pandemia da covid-19 afetou diversos setores da vida de todos os brasileiros, seja pelo desemprego, perda de renda, adoecimento ou violência, esta última que atinge principalmente as mulheres. As medidas tomadas pelo Estado se mostram limitadas e pouco efetivas. Buscando compreender os efeitos de tal problemática, neste estudo, visou-se analisar e discutir os impactos da pandemia da covid-19 e o isolamento social nos casos de violência doméstica em território vulnerável, além de quais foram as ações de enfrentamento encontradas pelas organizações de base comunitária para essa situação.
Percurso metodológico e instrumentos de pesquisa
Trata-se de uma pesquisa qualitativa (Minayo, 1994MINAYO, M. C. S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes , 1994.) que se aprofunda no mundo dos significados, buscando compreender o sujeito e a realidade em que está inserido. O estudo foi realizado na região da Vila dos Pescadores, bairro localizado no município de Cubatão, especificamente no Instituto Socioambiental e Cultural (ISAC), mediante autorização dos responsáveis pela instituição. A Vila dos Pescadores é um território de extrema vulnerabilidade social, que, além de sofrer com problemas ambientais, padece, também, com a ausência de políticas públicas e atenção do Estado, o que se reflete no bem-estar, na saúde e na qualidade de vida da população.
Para a realização do trabalho, contou-se com a participação de seis mulheres. Foram utilizados como critérios de inclusão: residir na Vila dos Pescadores, participar de atividades no ISAC e se referir a algum episódio de violência doméstica antes e/ou durante a pandemia da covid-19. Como critério de exclusão, foram desconsideradas as participantes menores de 18 anos.
A pesquisa foi realizada em duas etapas, sendo a primeira uma análise documental e a segunda o trabalho de campo. A análise documental teve como base artigos, textos e dados sobre violência doméstica, pandemia de covid-19 e a Vila dos Pescadores, o que contribuiu para aprimorar o conhecimento sobre a problemática e os desafios e potencialidades do território estudado. A etapa do trabalho de campo consistiu na realização de entrevistas semiestruturadas, guiadas por um roteiro previamente elaborado; que se mostraram ferramentas de grande potencial para compreender as vivências e singularidades de cada sujeito. Polkinghorne (2007POLKINGHORNE, D. E. Validity issues in narrative research. Qualitative Inquiry, Thousand Oaks, v. 13, n. 4, p. 471-486, 2007. DOI:10.1177%2F1077800406297670
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) afirma que as pesquisas propõem a produção de conhecimentos que não estão ao alcance dos métodos tradicionais de investigação científica quando utilizam narrativas, como os significados que as pessoas dão às vivências, às situações e às ações das vidas delas, inseridas no grupo e na coletividade.
Primeiramente, foram realizadas duas entrevistas com a informante-chave, uma líder comunitária responsável pelo ISAC, que mora no bairro há anos e conhece o histórico da questão da violência contra a mulher no território, norteando as principais demandas e facilitando o acesso e cuidado com as participantes. Posteriormente, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com as participantes, que foram guiadas por um roteiro previamente elaborado. Por fim, foi realizada uma roda de conversa com todas as participantes, em que se debateu, principalmente, como elas enxergavam a violência na Vila. Devido ao estado de pandemia da covid-19, todas as entrevistas foram realizadas de forma remota, por meio do Google Meet, tendo duração média de 1 hora. As entrevistas foram gravadas e transcritas, mediante autorização prévia. Todos os procedimentos éticos foram seguidos para garantir o sigilo e a segurança das participantes.
Os resultados foram analisados com base na Hermenêutica de Profundidade, proposta por Thompson (2011THOMPSON, J. B. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 9. ed. Petrópolis: Vozes , 2011.), tendo três situações principais: a contextualização sócio-histórica, a análise formal e a interpretação e reinterpretação. A contextualização sócio-histórica é o momento de compreensão e a investigação do contexto social do objeto estudado; a análise formal ou discursiva é a fase de análise da construção da narrativa cronológica e não cronológica. Por fim, a interpretação e reinterpretação é, segundo Thompson (2011THOMPSON, J. B. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 9. ed. Petrópolis: Vozes , 2011.), quando se retomam os resultados obtidos nas fases anteriores, buscando a compreensão do mundo social e a construção de saberes críticos e emancipatórios (Guareschi; Veronese, 2006VERONESE, M. V.; GUARESCHI, P. A. Hermenêutica de profundidade na pesquisa social. Ciências Sociais/UNISINOS, São Leopoldo, v. 42, n. 2, p. 85-93, 2006.).
Resultados e discussões
Usou-se, como meio para obtenção de informações, entrevistas semiestruturadas, feitas individualmente e em grupo. Para a realização da análise formal, cada entrevista foi analisada separadamente. Posteriormente, foram construídas tabelas divididas em quatro colunas. A primeira contava com a Categoria de análise, em que foram organizados os diferentes pontos apresentados pelas participantes durante as entrevistas, por exemplo, serviços de atendimento, denúncias, violência doméstica na pandemia, entre outros. A segunda coluna foi nomeada Trechos, nela foram adicionadas partes das falas das mulheres sobre os respectivos tópicos apresentados anteriormente. A terceira, Impressões, contava com um breve comentário sobre o que tinha sido dito pela participante. Por fim, na coluna Interpretação preliminar, foram relacionados textos e dados acerca dos temas apresentados nas colunas anteriores.
Posteriormente à construção de cada uma das tabelas, foi realizada uma síntese sobre os principais aspectos e informações levantadas pelas participantes, relacionando a bibliografia lida e os dados obtidos. A partir disso, levantaram-se duas categorias de discussão: Violência contra mulher no território: negação de direitos e Resistências e enfrentamento comunitário. Na primeira, destacam-se as fragilidades do território estudado e a violência estrutural ali presente, ressaltando, principalmente, a violência doméstica e o impacto disso na vida das vítimas. Já na segunda categoria, abordaram-se meios e alternativas encontrados pelos sujeitos para o enfrentamento da situação, inclusive indicando a falta de equipamentos e atenção do Estado na garantia de direitos da população.
Violência contra mulher no território: negação de direitos
A violência contra a mulher é uma expressão da violência de gênero, sendo recorrente, sobretudo, no ambiente doméstico, causada por parceiro íntimo, afetando a saúde física e mental da vítima com efeitos de médio e longo prazo. Apesar de atingir diversas mulheres em diferentes graus, as principais vítimas acabam sendo as pretas e pobres, que sofrem mais com a vulnerabilidade social (Brasil, 2020BRASIL. Lei nº 14.022, de 07 de julho de 2020. Dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional. Brasília, DF, 2020.). É imprescindível destacar que o território em que as vítimas se encontram afeta de forma direta o acesso aos serviços de proteção. As cidades dividem-se entre centro e periferia e seus bens são constituídos de acordo com interesses capitalistas e privatistas, ampliando as desigualdades, a pobreza e a marginalização dos sujeitos.
O local de realização desse estudo, a Vila dos Pescadores, é um território extremamente fragilizado e vulnerável, com alto índice de violência que atinge diferentes públicos em diversas esferas. A violência doméstica é algo recorrente, sendo, principalmente, cometida pelo companheiro contra a mulher; e pode ser desencadeada pelo desemprego, uso de álcool e outras drogas, ciúmes etc. Além disso, nem sempre se limita à violência física, podendo ser, também, patrimonial, moral e psicológica (Brasil, 2006BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 ago. 2006.), manifestando-se de inúmeras formas no dia a dia das mulheres.
Apesar da naturalização da violência doméstica no local, que atua em sua invisibilização por parte da população, o ISAC atua como importante rede de apoio. As redes de enfrentamento articulam diversos setores e serviços, buscando estratégias de prevenção à violência e promoção de saúde. Apresentam-se divididas em quatro eixos norteadores: combate, prevenção, assistência e garantia de direitos (Brasil, 2011BRASIL. Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Rede de enfrentamento à violência contra as mulheres. Brasília, DF: Presidência da República, 2011.) e são fundamentais para que as vítimas consigam romper com o ciclo da violência.
Muitas são as barreiras encontradas pelas mulheres para romper com essa violência. As ameaças são constantes e se estendem aos familiares e amigos, existindo forte pressão e violência psicológica. A situação financeira, a falta de apoio da família e o medo de perder a guarda dos filhos também se tornam empecilhos.
[…] sim, mas mesmo depois disso… É que nem eu falei, é a pressão psicológica […] eu vivi mais oito… onze anos com ele, tive mais dois filhos com ele… Por causa da pressão psicológica…. Tem muita gente que fala “a mulher não sai porque não quer” não é porque não quer… É por causa de ameaça, levava sempre pro lado da minha mãe, dos meus irmãos, sempre ele falava: “É você sair e sua mãe morrer, é você sair e seus pais… Seu irmão morrer”. Então, eu preferia eu tá sofrendo do que ver alguém da minha família sofrer. E, assim, esse tempo todo que eu vivi nunca ninguém ficou sabendo… Só eu que sofria dentro de casa… (Participante 3).
Com o avanço da pandemia da covid-19, as desigualdades sociais se tornaram ainda mais acentuadas e evidentes. Milhares de brasileiros sofreram com o desemprego e a perda de renda, sendo mulheres as mais afetadas nesse quesito. A carga de trabalho doméstico e os cuidados com os filhos e familiares também aumentaram, já que espaços como escolas e creches foram fechados. Dados mostram que 50% das brasileiras passaram a cuidar de alguém na pandemia e, entre essas, 72% tiveram suas responsabilidades de monitoramento e demandas por companhia aumentadas (Bianconi; Leão; Moreno, 2020BIANCONI, G.; LEÃO, N.; MORENO, T. (coord.). Sem parar: o trabalho e a vida das mulheres na pandemia. São Paulo: Gênero e Número; Sempreviva Organização Feminista, 2020.). A violência doméstica aumentou e se agravou ainda mais, visto que as vítimas se encontram em maior tempo de convivência com seu agressor, o que também limita e dificulta o acesso aos canais de denúncia e serviços de proteção à mulher.
Na Vila, essa realidade é afetada por outros fatores. Grande parte das moradias é de palafitas e não possui saneamento básico e água potável, o que compromete os cuidados necessários contra a covid-19. Além disso, as casas são pequenas e contam com muitos moradores, o que impossibilita um isolamento adequado. O estresse gerado pela crise sanitária e econômica, além do aumento no consumo de álcool, se tornam gatilhos para a violência.
Eu acho que aumentou, aumenta porque fica todo mundo estressado sem poder sair de casa, esses maridos… Principalmente esses homens que gosta de beber de tá 24 horas num bar, aí quando os bar fecha diz assim: “Fechou os bar, não pode”. Aí, eles fica em casa, aí vem a ignorância, a mulher não pode fazer isso que a mulher é aquilo, aí sofre as ignorâncias deles e bate… (Participante 2).
Mesmo antes da pandemia, observava-se muita dificuldade na hora de fazer a denúncia. A Lei Maria da Penha (Brasil, 2006BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 ago. 2006.) representa um importante marco na garantia dos direitos das mulheres. No entanto, mesmo com sua implantação, os casos de violência doméstica aumentam a cada ano, o que mostra a dificuldade de efetivação da lei no dia a dia. As delegacias fazem parte da rota dos serviços que as vítimas de violência doméstica procuram, mas se percebe a omissão por parte do poder público com relação à aplicação dos instrumentos legais de proteção a elas.
O pouco investimento por parte do Estado contribui para o sucateamento e mau funcionamento dos serviços de proteção à mulher. Atrelado a isso, há enorme dificuldade da área da saúde em lidar com questões culturais, sociais e psicológicas; causando que a violência não seja reconhecida como violação de direito e a limitação do atendimento apenas às questões patológicas (Schraiber; D’oliveira, 2008SCHRAIBER L. B.; D’OLIVEIRA, A. F. P. L. Romper com a violência contra a mulher: como lidar desde a perspectiva do campo da saúde. Athenea Digital, Barcelona, v. 14, p. 229-236, 2008.). Esse não reconhecimento da violência atinge também outros serviços de proteção à mulher. A falta de uma equipe capacitada e preparada para lidar com tal situação é fator determinante para a perpetuação da problemática. Uma das participantes relatou uma situação que vivenciou, em que, mesmo com provas das ameaças que sofria por parte do ex-marido, teve seu pedido de medida protetiva negado pelo Estado.
[…] nada aconteceu, mesmo através de mensagem SMS, ele me ameaçou várias vezes aqui em Cubatão mesmo, eu já morava aqui em Cubatão, ele mandou várias vezes me ameaçando. Fui na delegacia, fiz o Boletim de Ocorrência, levei a impressão de todas as mensagens que ele me enviou, quando eu cheguei pra fazer o B.O. o escrivão perguntou se eu não era casada, se eu não tinha marido, se meu marido não fazia nada por isso. Então, se meu marido fosse fazer alguma coisa, meu marido se tornaria o agressor e ele a vítima, então eu achei isso meio que o cúmulo, né? Fiz o B.O., representei, quando foi com 15 dias a oficial bateu na minha porta, eu fiz o pedido de medida protetiva também… Quando foi com 15 dias a oficial bateu na minha porta, falando que o Estado negou a medida protetiva porque eles falaram que não viu ameaça… (Participante 3).
Essa ineficiência por parte da justiça, na garantia de direitos e na segurança das vítimas, faz com que elas procurem outras alternativas, recorrendo a espaços de acolhimento, como igrejas, projetos e atividades comunitárias (Correa et al., 2021CORREA, M. et al. As vivências interseccionais da violência em um território vulnerável e periférico. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 30, n. 2, e210001, 2021. DOI:10.1590/S0104-12902021210001
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). Muitas vezes, as mulheres acabam levando suas denúncias para os traficantes da região, o que oferece medidas mais efetivas e imediatas. A ação por parte do chamado Tribunal do tráfico dá-se por meio dos “debates”, uma rede complexa de trocas, em que os acusadores e defensores apresentam seus pontos e a decisão final é tomada (Feltran, 2010FELTRAN, G. S. Crime e castigo na cidade: os repertórios da justiça e a questão do homicídio nas periferias de São Paulo. Caderno CRH, Salvador, v. 23, n. 58, p. 59-73, 2010. DOI:10.1590/S0103-49792010000100005
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). Essa interferência se dá, pois não desejam a polícia no bairro. “[…] o crime aqui, ele se envolve sim, mas quando ele é chamado, entendeu? E se ele se envolver sem ser chamado só se for uma situação muito grave, muito grave…” (Participante 1).
Devido à violência policial, a população também receia a entrada da polícia no bairro. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (Bueno; Lima, 2020BUENO, S.; LIMA, R. S. (coord.). Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020.), em 2020 o número de vítimas fatais de intervenções policiais foi de 6.416, sendo negras em 79,1% dos casos. A violência policial é um fenômeno marcado por preconceitos e discriminações que podem ser observados no cotidiano, quando policiais se direcionam a um público específico: população pobre, preta e periférica, perfil de grande parte dos moradores da Vila dos Pescadores, gerando medo e insegurança na população do bairro. “[…] O medo é esse, e… Quando a polícia entra, sempre mata um, dois ou três, né?” (Participante 2).
Nesse território tão marginalizado e negligenciado pelo Estado, os problemas ambientais, a falta de infraestrutura, o medo e a violência predominam. Apesar dessas fragilidades, destacam-se como potencialidades “[…] articulações coletivas, busca por equipamentos públicos, esforços para superar a exclusão social, consciência sobre direitos, interseccionalidade e políticas públicas e valorização dos próprios saberes e práticas” (Camilo et al., 2021CAMILO, C. et al. Cuidado em território de exclusão social: covid-19 expõe marcas coloniais. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 30, n. 2, e210023, 2021. DOI:10.1590/S0104-12902021210023
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, p. 8). Tudo isso parte da população, que, diariamente, busca meios e alternativas para ampliar o acesso ao cuidado e a promoção à saúde.
Resistências e enfrentamento comunitário
Para driblar a falta de serviços e equipamentos especializados, a população se organiza coletivamente. As lideranças comunitárias desempenham um importante papel de cuidado e luta, de modo que grande parte das melhorias e conquistas presentes no bairro é resultado disso. A Vila é banhada pelo Rio Casqueiro e possui uma região de mangue de onde os pescadores retiram seu sustento. No entanto, duas empresas do polo industrial de Cubatão, a VLI e a Ultrafértil, têm realizado no Canal Piaçaguera obras de dragagem e de construção de cavas subaquáticas. Com isso, resíduos e produtos tóxicos, como arsênio e nióbio, estão contaminando as águas e o meio ambiente, comprometendo uma das principais fontes de renda dos moradores e causando o adoecimento da população.
Em 2015 ocorreu um incêndio provocado pela empresa Ultracargo, que acarretou na morte de 8 mil toneladas de peixe e diversos problemas de saúde nos moradores da região. Da necessidade de se ter um órgão regulamentado e legalizado para representar e buscar os direitos dos pescadores artesanais da Vila surgiu o ISAC. Com a presença de ambientalistas, ativistas sociais, pescadores, pesquisadores, estudantes e cidadãos, o Instituto compõe o movimento Cava é Cova, que luta contra essa agressão ambiental, dando visibilidade à situação por meio de uma rede de informações (principalmente pelas redes sociais), cobrando do poder público esclarecimentos e soluções.
Além desse cuidado com as questões ambientais, o ISAC atende a outras demandas da população, tendo uma cautela especial com mulheres e crianças. Um dos principais eixos de cuidado e atenção se refere à violência doméstica. Os casos são recorrentes e comuns no dia a dia da comunidade, o que faz com que a demanda por suporte seja elevada. A atuação das lideranças comunitárias dá-se, principalmente, na forma de uma escuta atenta e cuidadosa, respeitando as singularidades e particularidades de cada caso, atuando com afeto e reconhecimento, mostrando as possibilidades em relação a serviços de proteção e justiça e buscando, assim, frear essa violência.
Ainda que a assistência prestada pelo ISAC seja importante, é necessário que outros serviços de proteção funcionem plenamente. O bairro conta com apenas uma unidade de saúde da família, que sofre com limitação e sucateamento, não atendendo de forma rápida e eficiente as reais demandas da população. Apesar disso, destaca-se a relevância da atuação do agente de saúde. o chamado Agente Comunitário de Saúde (ACS) que, associado à equipe de profissionais que compõe a Estratégia de Saúde da Família (ESF), atua como elo entre o serviço de saúde e a comunidade. Esse pertencimento ao território e o conhecimento sobre as vivências de cada sujeito é essencial para uma percepção mais sensível do processo de saúde-doença-cuidado (Castro e Silva et al., 2014CASTRO E SILVA, C. R. et al. Participação social e a potência do agente comunitário de saúde. Psicologia & Sociedade , Recife, v. 26, n. especial 2, p. 113-123, 2014. DOI:10.1590/S0102-71822014000600012
https://doi.org/10.1590/S0102-7182201400...
). Por meio dos vínculos que estabelece com as famílias, o ACS muitas vezes consegue identificar situações de risco ou de violência existentes (Fonseca et al., 2009FONSECA, R. M. G. S. et al. Violência doméstica contra a mulher na visão do agente comunitário de saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 17, n. 6, p. 974-980, 2009. DOI:10.1590/S0104-11692009000600008
https://doi.org/10.1590/S0104-1169200900...
).
[…] o papel do agente de saúde… ele é muito, mais muito importante dentro de uma sociedade como um todo e dentro de uma comunidade que tem muita vulnerabilidade como a nossa, porque o agente de saúde… Ele… Quando ele é realmente comprometido com o trabalho, assim como qualquer outro profissional, ele tem essa sensibilidade de tá ali todo dia, todo momento, tendo uma constância com a população e aquele vínculo ele cria um vínculo de confiança mútua […] principalmente nessa questão da violência, porque aí o violentado passa a desabafar com você as suas mais íntimas angústias de violência que ele não tem coragem de contar, sabe? (Participante 1).
Assim, o ACS desempenha um importante papel de escuta, algo que, segundo as participantes, falta nos serviços presentes no território. No entanto, essa é uma categoria profissional que vem sofrendo diversos ataques. A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) de 2017 propõe alterações no trabalho do agente, destinando a ele funções tecnicistas que antes eram exercidas por técnicos de enfermagem. Além disso, os equipamentos de saúde presentes na Vila dos Pescadores são administrados por uma Organização Social (OS) que prioriza metas, ou seja, o número de visitas domiciliares realizadas pelos ACS no mês, e não a qualidade do atendimento.
É desejo das lideranças comunitárias e das mulheres da comunidade, em geral, reunir profissionais capacitados e desenvolver algum grupo de escuta para casos de violência doméstica, uma vez que reconhecem a ineficiência do Estado em lidar com o assunto.
A gente tem vontade de montar uma equipe multidisciplinar pra dar atenção… Pra essa situação da violência contra mulher como outras situações… Que possa pelo menos desabafar, falar e ter a tranquilidade do que o que a pessoa desabafou ali não vai sair pra rua, nem ninguém vai tá apontando o dedo: “Olha, fulana é assim, é assada, crua, cozida. Falou isso, falou aquilo”. Que o assunto fique ali, uma coisa que a pessoa tenha essa confiança, a gente não tem, a gente não encontra aqui dentro da comunidade, nos espaços… (Participante 1).
Antes da pandemia da covid-19, um grupo de mulheres costumava se reunir na sede do ISAC para tratar de diferentes questões, incluindo a violência doméstica. Esse grupo não era orientado por nenhuma prática específica, mas tinha como principais características: o acolhimento; a troca de saberes e experiências; e o fortalecimento de vínculos e sentimento de comunidade. Para as participantes, ter um espaço para poder falar sobre a violência é essencial. “Aí, às vezes, uma palavra ajuda mais de que tudo, que, às vezes, as pessoa tá com uma angústia, o marido fez algo e você tá com aquilo trancado, mas você… Falou, o momento de falar…” (Participante 2).
Mesmo com as reuniões não acontecendo presencialmente no momento, as mulheres buscam se manter conectadas e atentas à violência que tem aumentado nesse período. Esse reconhecimento é o primeiro passo para cessar tal problemática, além de os locais e grupos de partilha e escuta serem essenciais para isso. Martín-Baró (2017MARTÍN-BARÓ, I. Crítica e libertação na psicologia: estudos psicossociais. Petrópolis: Vozes, 2017., p. 206) define grupo como “[…] uma estrutura de vínculos e relações entre pessoas que canaliza em cada circunstância suas necessidades individuais e/ou interesses coletivos”. Por meio dele, é possível chegar a uma reflexão individual e coletiva, ajudando na inserção social, no resgate da identidade e no reconhecimento de inúmeras questões, inclusive da violência.
A atuação de instituições e lideranças comunitárias é de suma importância no dia a dia. No entanto, é dever do Estado reconhecer a violência doméstica como violação de direito e garantir a segurança e o bem-estar de todos. Para isso, é preciso que medidas concretas e efetivas sejam tomadas, urge também a necessidade de um maior investimento nos serviços de proteção à mulher e em profissionais capacitados, buscando respeitar as singularidades e particularidades de cada caso.
Considerações finais
Neste estudo, buscou-se analisar e discutir como a violência doméstica se faz presente e se perpetua em território de alta vulnerabilidade social. A falta de políticas públicas e atenção do Estado na Vila dos Pescadores se reflete no sucateamento e mau funcionamento de serviços de justiça, saúde e proteção à mulher, o que impacta de forma direta a qualidade de vida e o bem-estar dessas vítimas.
O aumento da violência doméstica é um efeito colateral da pandemia, já que as vítimas se encontram em maior tempo de convivência com seu agressor. O medo de adoecer, o estresse econômico e o desemprego acabam se tornando gatilhos para essas agressões. Durante esse período, os serviços de proteção à mulher se tornaram limitados, não atendendo presencialmente ou tendo os horários de funcionamento extremamente reduzidos. O Estado criou diversos meios e canais virtuais de denúncia, no entanto, essas medidas não contemplam todas as mulheres, já que todas é necessário possuir acesso a recursos materiais, como celulares e internet.
Mesmo antes da pandemia, havia diversas barreiras e empecilhos para se acessar os canais de denúncia e proteção, que são extremamente precarizados e sucateados por parte do Estado, não oferecendo respostas rápidas e concretas às vítimas. Apesar de toda a fragilidade do território, as lideranças comunitárias, que são em sua maioria mulheres, buscam meios e alternativas para o enfrentamento dessa violência, utilizando a escuta atenta e cuidadosa e mostrando as possibilidades em relação a serviços de proteção e justiça.
Esta pesquisa foi impactada de forma direta pela pandemia da covid-19 e o isolamento social, algumas mudanças, então, precisaram ser feitas para adequá-la à nova realidade. O conhecimento do território se deu por meio da revisão bibliográfica de estudos que foram realizados no local, o que limitou o olhar e a percepção própria da pesquisadora. Além disso, as entrevistas foram realizadas de forma remota, por meio do Google Meet, o que por diversas vezes foi um empecilho, visto a falta e a baixa qualidade da internet no bairro.
Apesar de todas as limitações e dificuldades encontradas durante a trajetória para a construção desta pesquisa, destaca-se a importância e a necessidade de se reconhecer e estudar a violência doméstica. Busca-se, para isso, meios e alternativas para a prevenção e promoção da saúde, não tratando apenas o corpo que adoece, mas reconhecendo as particularidades e singularidades de cada caso e tecendo uma rede de apoio entre os serviços, familiares e vítimas. Para que isso aconteça, é necessário que o Estado invista tanto na capacitação adequada de profissionais quanto na manutenção e pleno funcionamento de equipamentos de saúde, proteção e justiça. Determinantes como raça/etnia e classe, bem como o território que as vítimas estão inseridas, precisam ser considerados em todos os casos, visando assim garantir um atendimento integral e pleno. É preciso que tal violência não seja naturalizada e banalizada, além disso, é primordial que se discuta e reconheça as diferentes formas que ela se expressa no cotidiano e quais os caminhos e meios para sanar tal problemática.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Dez 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
06 Jul 2022 -
Aceito
22 Ago 2022