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O assédio sexual laboral durante a pandemia de covid-19: reflexões acerca das desigualdades de gênero no trabalho a partir do paradigma da justiça relacional1 1 Trabalho de investigação fruto de estágio de pós-doutoramento junto à Faculdad de Derecho de la Universidad de Málaga - Espanha, sob a orientação do Dr. Antonio Marquez Prieto e com financiamento integral pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no período compreendido entre fevereiro/julho de 2022.

Sexual harassment in the workplace in the context of the covid-19 pandemic: reflections on gender inequalities at work from the paradigm of relational justice

Resumo

A presente investigação tem como objetivo geral identificar quais os motivos ou as razões que permitiram o aumento vertiginoso dos casos de assédio sexual laboral contra as trabalhadoras a partir da deflagração da pandemia da COVID-19. Como hipótese provisória indica-se que no âmbito das relações trabalhistas nas quais a mulher figura como empregada hierarquicamente subordinada a homens ou grupo de homens, houve um aumento alarmante dos casos de violência de assédio sexual, principalmente porque a pandemia do Coronavírus evidenciou as situações violência já existentes na sociedade brasileira, gerando uma espécie de pandemia sistêmica, cuja ocorrência se dá quando uma pandemia virótica interage diretamente com outras doenças e/ou problemas sociais. Os objetivos específicos são apresentar o instituto do assédio sexual laboral, apresentar a relação entre a pandemia de COVID-19 e o aumento do número de casos de assédio sexual nas relações trabalhistas praticado contra as mulheres e propor uma reflexão acerca desse fenômeno sociojurídico a partir do paradigma relacional de Pierpaolo Donati e da Justiça Relacional de Antonio Márquez Prieto. O método de abordagem utilizado foi o dedutivo; a técnica de pesquisa foi a documental e o método de procedimento o monográfico. Concluiu-se que a única forma de acabar com a hierarquia da desigualdade de gênero no trabalho é a partir da vinculação coletiva à reciprocidade e à boa-fé, no âmbito da cultura jurídica.

Palavras-chave:
Assédio sexual laboral; Pandemia da COVID-19; Desigualdade de gênero; Justiça Relacional

Abstract

The general objective of this research is to identify the reasons or motives that have led to the vertiginous increase in cases of sexual harassment in the workplace against female workers since the outbreak of the COVID-19 pandemic. The provisional hypothesis is that in the context of labor relations in which women are employees hierarchically subordinate to men or groups of men, there has been an alarming increase in cases of sexual harassment violence, mainly because the Coronavirus pandemic has highlighted the situations of violence that already exist in Brazilian society, generating a kind of systemic pandemic, which occurs when a viral pandemic interacts directly with other diseases and/or social problems. The specific objectives are to present the institute of sexual harassment at work, to present the relationship between the COVID-19 pandemic and the increase in the number of cases of sexual harassment in labor relations practiced against women and to propose a reflection on this socio-legal phenomenon based on Pierpaolo Donati’s relational paradigm and Antonio Márquez Prieto’s Relational Justice. The approach used was deductive; the research technique was documental and the method of procedure was monographic. It was concluded that the only way to put an end to the hierarchy of gender inequality at work is through a collective commitment to reciprocity and good faith within the legal culture.

Keywords:
Sexual harassment in the workplace; COVID-19 pandemic; Gender inequality; Relational justice

1. Introdução

A pandemia causada pela COVID-19 transformou de modo indelével as relações de trabalho no Brasil e no Mundo. Com a deflagração de medidas de saúde pública, dentre as quais pode-se citar o confinamento obrigatório da população - com o objetivo de combater a transmissão do vírus, os casos de hospitalização e o número crescente de mortes - no mundo e no Brasil em especial, as atividades laborais em sua maioria foram transferidas quase que de modo instantâneo para o ambiente íntimo e pessoal dos/as trabalhadoras, fazendo com que os lares passassem a compartilhar espaço com as atividades profissionais. Diante desse cenário e considerando a forma como as violências sexuais ocorriam no âmbito das relações de trabalho até 2019, poder-se-ia cogitar que ante a diminuição do contato presencial e físico entre colaboradoras e seus superiores hierárquicos, os números de casos de assédio sexual laboral iriam também diminuir. Contudo, o que se viu durante os dois primeiros anos da referida emergência de saúde pública (2020/2022) foi o aumento vertiginoso de casos de assédio sexual perpetrados contra trabalhadoras, mesmo estando a maioria delas trabalhando desde seu ambiente doméstico e familiar, conforme se verá mais adiante.

O assédio sexual no ordenamento jurídico pátrio é caracterizado pela conduta de constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Essa conduta é considerada crime pelo art. 216-A, do Código Penal, único dispositivo da legislação brasileira que trata da conduta de assédio sexual. Na gênese da criação desse tipo penal, conforme se depreende da exposição de motivos contidos no Código Material, consta que a referida figura típica foi criada com o fim de proteger a liberdade sexual da mulher, seja na vida privada ou na relação trabalhista.

Tal configuração de gênero se apresenta desta forma desde a origem do desenvolvimento da figura jurídica do assédio sexual, e isso se dá porque na esmagadora maioria dos casos noticiados, senão em sua totalidade, o sujeito ativo da conduta que configura assédio sexual é homem e as assediadas são mulheres. Nesse sentido, o objetivo geral que direcionará a presente investigação será responder ao seguinte questionamento: é possível identificar quais os motivos ou as razões que permitiram o aumento vertiginoso dos casos de assédio sexual laboral contra as trabalhadoras a partir da deflagração da pandemia da COVID-19?

Como hipótese provisória indica-se que em relações trabalhistas nas quais a mulher figura como empregada hierarquicamente subordinada a homens ou grupo de homens, houve um aumento alarmante dos casos de violência de assédio sexual, principalmente porque a pandemia do Coronavírus evidenciou as situações violência já existentes na sociedade brasileira, gerando uma espécie de pandemia sistêmica, cuja ocorrência se dá quando uma pandemia virótica interage diretamente com outras doenças e/ou problemas sociais. Também chamada de sindemia, essa interação entre doenças e problemas sociais muito mais do que expor os efeitos dessa combustão mortífera revela a necessidade de se estudar não somente as formas de combater os fenômenos resultantes dessa interação, mas também compreender e refletir sobre os sintomas que colaboraram para o evento. É dizer, para compreender o estado de coisas a que chegamos nessa terceira década do século XXI no âmbito das relações de gênero no trabalho, mostra-se substancial e impreterível que, com o auxílio de outros aportes epistemológicos verificados nos estudos de outras Ciências Sociais, se possa desvendar (ou desmistificar) o fenômeno do patriarcado2 2 Para a economista feminista Heidi Hartmann, “o patriarcado constitui um sistema de interrelações masculinas que, apensar de uma base material hierárquica, estabelece ou cria interdependência e solidariedade entre os homens, o que os habilita a dominar as mulheres”. , cuja organização estrutural assenta-se, sobretudo, numa espécie de medo não apenas da mulher, mas sim de todos os corpos que expressam e produzem feminilidades, aplicando-lhes todas as formas de violência humana, em especial a física e a psicológica.

Nesse caminho metodológico, os objetivos específicos a serem percorridos a fim de verificar a hipótese levantada são: i) caracterizar o assédio sexual laboral; ii) apresentar a relação entre a pandemia de COVID-19 e o aumento do número de casos de assédio sexual nas relações trabalhistas praticado contra as mulheres e iii) apresentar as concepções gerais do paradigma relacional de Pierpaolo Donati e da Justiça Relacional de António Márquez Prieto com a finalidade de compreender a problemática do assédio sexual laboral contra as mulheres como um vazio de justiça.

O método de abordagem a ser utilizado para discutir o problema será o indutivo, com auxílio do método monográfico (método de procedimento). Como técnica de pesquisa elegeu-se a documentação indireta (com uso de documentos públicos e privados, fontes estatísticas e pesquisas bibliográficas já produzidas sobre os temas abordados).

Ao final espera-se contribuir para a criação de caminhos que visem o fim da desigualdade de gênero, em especial no mercado de trabalho, alinhando-se a presente reflexão aos objetivos da Agenda 30 da Organização das Nações Unidas, no âmbito do Desenvolvimento Sustentável, programa no qual busca-se promover sociedades pacíficas e inclusivas até 20303 3 Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Estes são os objetivos para os quais as Nações Unidas estão contribuindo a fim de que possamos atingir a Agenda 2030 no Brasil. Mais especificamente, trata-se de um documento que orienta ações de governos e demais atores sociais para lidar com os tantos desafios enfrentados pelo mundo, desde reduzir desigualdades sociais e garantir a manutenção da paz, até lidar com as mudanças climáticas e evitar a degradação ambiental. A Agenda torna esses desafios menos abstratos, estabelecendo metas concretas e definindo prazos para o atingimento dos resultados. Cita-se como alguns objetivos: igualdade de gênero, trabalho digno e crescimento econômico e reduzir as desigualdades. .

2. O assédio sexual laboral

No Direito brasileiro, configura-se assédio sexual a conduta de “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função” (Brasil, 1940). Essa definição está contida no caput do artigo 216-A do Código Penal, sendo esse dispositivo legal o único comando inserido na legislação nacional a definir essa conduta, o que já demonstra como essa realidade precisa ser analisada sobre outros vieses, justamente por se tratar de uma questão atravessada por complexidades, ou seja, perpassada por diversas questões sensíveis a exemplo da raça, da classe social e sobremaneira, do gênero e da identidade de gênero das assediadas, como se verá mais adiante.

O assédio sexual é conceituado como sendo o comportamento ou “toda conduta de natureza sexual não desejada que, embora repelida pelo destinatário, é continuadamente reiterada, cerceando-lhe a liberdade sexual”. Depreende-se a partir desse conceito que o bem jurídico tutelado pelo dispositivo que pune a conduta de assédio sexual é a liberdade sexual, na medida em que o assédio sexual constitui uma violação a tal liberdade (Pamplona Filho, 2001PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O assédio sexual na relação de emprego. São Paulo: LTr , 2001. 254 p., p. 37).

Nesse raciocínio, mostra-se importante compreender quais são os elementos que compõe a figura típica que descreve o tipo penal em estudo:

a) Sujeitos: agente (assediador) e destinatário (assediada) - O sujeito ativo do assédio sexual é, via de regra, o próprio empregador. Não obstante, pode ser também aquele que desempenha funções superiormente hierárquicas à assediada. O sujeito passivo, por seu turno, será sempre uma empregada, em qualquer um dos dois tipos de assédio sexual que serão diferenciados a seguir. Tal configuração de gênero do assediador e assediada se apresenta desta forma desde a origem do desenvolvimento da figura jurídica do assédio sexual (Vivot, 2002VIVOT, Julio J. Martínez. Acoso sexual en las relaciones laborales. Buenos Aires: Astrea, 1996. 141 p., p. 27-28).

O presente trabalho, portanto, referir-se-á aos sujeitos utilizando as expressões assediada e assediador, sendo certo que ao estabelecer essa questão semântica o trabalho também utilizará a palavra feminilidades como sinônimo de mulheres, já que, como se verá no decorrer da investigação, a caracterização do assédio sexual laboral como uma espécie de violência de gênero, possibilita com que a utilização da referida expressão possa abarcar todos os sujeitos que reivindicam, seja através do gênero ou da identidade de gênero, o status de mulher. É especialmente por essa razão que este trabalho se orientará pela premissa de que os assediadores são majoritariamente homens cis-heteronormativos e as assediadas, majoritariamente mulheres e demais feminilidades, pois assim como outras violências de gênero, o assédio sexual encontra sua pseudo sustentação no trinômio poder-sexualidade-violência e guarda estreita relação com as desigualdades de gênero, sendo indiscutível que as relações sociais de gênero e seus efeitos e produções são determinantes na configuração desse ilícito violador de diversos direitos individuais e sociais.

Para além desse ponto de partida, há de registrar-se ainda que o assédio sexual no trabalho também se apresenta como expressão da dominação dos homens (do masculino) sobre as feminilidades, exercida diretamente sobre o corpo das afetadas, configurando-se uma violência que extrapola a relação trabalhista, causando efeitos danosos na vida privada e na saúde mental da mulher, o que deixa clara a necessidade de analisar os contratos que regulam as relações de trabalho, não apenas sob uma perspectiva civil e individual, mas sobretudo como um acordo de vontades com características relacionais e efeitos sócio coletivos.

É por isso que autoras como a Lígia Sánchez Tovar indicam que as trabalhadoras, em seu ambiente de trabalho, podem estar sujeitas a dois tipos de perseguição já que enquanto mulheres ou pertencentes a algum grupo de feminilidades, essas pessoas estão sujeitas a uma dupla subordinação: a de gênero, profundamente influenciada pela masculinidade em crise, da qual trataremos a seguir; e pela laboral, uma das áreas mais afetadas pela pandemia de COVID-19 (2010TOVAR, Ligia Sánchez et al. Consideraciones psicosociales sobre el acoso sexual en el trabajo. In: PORTERO, Maria Teresa Velasco (Org.). Mobbing, acoso laboral y acoso por razón de sexo: guía para la empresa y las personas trabajadoras. Madrid: Tecnos, 2010. Cap. 2. p. 43-59., p. 43 e ss).

b) Conduta de natureza sexual - Caracteriza-se como “comportamento sexual desviado”, a conduta que objetivando satisfação sexual utiliza-se de ameaça, ilude a assediada com promessa que sabe de antemão que não será cumprida, ou age de modo astucioso, destruindo a possibilidade de resistência da vítima (Pamplona Filho, 2001PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O assédio sexual na relação de emprego. São Paulo: LTr , 2001. 254 p., p. 42).

c) Rejeição à conduta do agente

A conduta perpetrada pelo agente deve ser repelida pela destinatária, uma vez que o assédio sexual se vincula a condutas que são desagradáveis para a assediada, ou seja, que lhe são impostas (Pamplona Filho, 2001PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O assédio sexual na relação de emprego. São Paulo: LTr , 2001. 254 p., p. 43).

d) Reiteração da conduta

Para autoras como Leiria (2012LEIRIA, Maria de Lourdes. Assédio sexual laboral, agente causador de doenças do trabalho: reflexos na saúde do trabalhador. São Paulo: LTr, 2012. 214 p., p. 30) e Vivot (2002VIVOT, Julio J. Martínez. Acoso sexual en las relaciones laborales. Buenos Aires: Astrea, 1996. 141 p., p. 35) a reiteração da conduta não é imprescindível para caracterização do assédio sexual, tendo em vista que um único ato pode ser grave o suficiente para macular a honra, a dignidade e a moral da vítima, causando humilhação e, na particularidade do assédio sexual na relação de emprego, tornando seu ambiente de trabalho nocivo e hostil. Os autores Sérgio Antônio dos Santos Damian e Joabe Teixeira de Oliveira (1999DAMIAN, Sérgio Antônio dos Santos; OLIVEIRA, Joabe Teixeira de. Assédio sexual: dano e indenização. [s.l.]: CL Edijur, 1999. 406 p., p. 11) destacam que a conduta é composta por dois aspectos relevantes, quais sejam: que uma das partes sinta-se detentora de uma força capaz de subjugar a outra, que é mais fraca no contexto da relação social em que ambas se encontram inseridas; e que haja intenção de atingir em maior ou em menor grau um relacionamento carnal por parte do agente, a qual difere do simples flerte.

O assédio sexual laboral, especificamente, situa-se no ambiente de trabalho da vítima e do agente que pratica a conduta e, nesse contexto, é configurado através de uma intimidação da subordinada por parte do seu superior hierárquico, o que não raramente ocorre sob a ameaça de demissão ou de obstaculizar a carreira da vítima (Damian; Oliveira, 1999DAMIAN, Sérgio Antônio dos Santos; OLIVEIRA, Joabe Teixeira de. Assédio sexual: dano e indenização. [s.l.]: CL Edijur, 1999. 406 p., p. 12-13).

A característica de subordinação da assediada ao assediador trata-se de elemento restritivo da conduta de assédio sexual, deixando de contemplar o denominado assédio sexual ambiental, praticado por colega de trabalho, cliente do empregador ou por qualquer outra pessoa que não seja superior hierárquico da vítima; esse tipo de assédio não se opera a partir de uma manifestação de poder - trata-se de incitações sexuais inoportunas, como manifestações verbais ou físicas, de natureza sexual, com a finalidade de restringir a atuação laboral da vítima ou de criar um ambiente de trabalho ofensivo, hostil, de intimidação ou de abuso, comumente visando que a vítima abandone seu posto de trabalho. Nessa modalidade de assédio sexual, o assediador persegue apenas os fins apontados e a conduta não chega a representar um ato de ameaça ou pressão para obtenção de favores sexuais (Vivot, 2002VIVOT, Julio J. Martínez. Acoso sexual en las relaciones laborales. Buenos Aires: Astrea, 1996. 141 p., p. 23).

Ernesto Lippmann (2004LIPPMANN, Ernesto. Assédio sexual nas relações de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr , 2004. 149 p., p. 22) acrescenta que o assédio sexual laboral também pode ser praticado contra quem presta serviços sem carteira assinada, hipótese na qual a vítima encontra-se ainda mais vulnerável, tendo em vista que uma tentativa não correspondida pode significar sua não convocação para prestar serviços no futuro. Dessa forma, percebe-se que o assédio sexual na relação de emprego não só permeia o ambiente de trabalho de mulheres com seus postos de trabalho constituídos e suas carteiras de trabalho assinadas como atinge de maneira ainda mais contundente trabalhadoras sem carteira assinada e aspirantes a uma vaga de trabalho, uma vez que tais mulheres se encontram em situação de maior vulnerabilidade. Talvez por isso, durante o período da pandemia da COVID-19 houve espaço amplo para a configuração desse fenômeno, seja por conta das atividades remotas que de certa forma contribuíram para a facilitação do assédio, em razão da suposta proteção ofertada pela internet, seja porque o mercado de trabalho se abriu como nunca a atividades que possibilitavam contratações e o exercício de atividades de maneira remota e ao trabalho informal (este vitimando muito mais as mulheres pretas e pardas).

A partir dessas reflexões iniciais pode-se compreender que o assédio sexual laboral extrapola a área penal para desembocar num ambiente permeado por interseccionalidades, por se tratar de um fenômeno jurídico em que causa e efeito sofrem reflexos do padrão cultural vigente, sobremaneira em relação à posição real que as mulheres e as demais feminilidades ocupam na sociedade brasileira, em especial. A subjugação das feminilidades à masculinidade hegemônica encontrou no Brasil terreno fértil para se alargar durante a pandemia da COVID-19, isso porque numa sociedade gravemente enferma, com problemas seculares e estruturais que não são discutidos com a seriedade que os temas demandam, quando uma pandemia virótica interage com outras doenças e problemas sociais, as consequências podem ser devastadoras, como se verá no capítulo seguinte deste trabalho.

3. O aumento dos casos de assédio sexual laboral durante a pandemia da covid-19: uma sindemia anunciada

Inicialmente, faz-se importante registrar que o Brasil não possui uma estatística nacional acerca dos casos de assédio sexual praticado contra mulheres. À inexistência de um banco de dados para catalogar as denúncias deve-se somar o fato de que, semelhante ao que acontece em relação a outras formas de violência de gênero, em especial a violência doméstica e familiar, entre o evento e a denúncia aos órgãos de controle há uma cifra oculta representada pelo medo imposto a essas feminilidades por parte dos agressores, sobremaneira quando o assédio se dá no âmbito de uma relação de trabalho.

Para serem diagnosticados, os casos de assédio sexual no ambiente laboral contam com duas possibilidades: denúncias individuais em redes sociais, que são inseridas em pesquisas realizadas por organizações privadas, cujos resultados são amplamente divulgados em veículos de mídia digital; e estatísticas disponibilizadas pelo Tribunal Superior do Trabalho, obtidas a partir da inserção da matéria de pesquisa “assédio sexual”. Os números específicos de casos e de condenações pela violação do art.216-A do Código Penal não fazem parte das estatísticas nacionais do Estado, sobremaneira porque o combate a essa espécie de violência contra a mulher não integra nenhuma espécie de política pública, seja para prevenir, seja para tratar ou reprimir essa violação à dignidade do exercício do labor, o que por si só viola tanto a ordem individual da pessoa (art. 6º e 7º da Constituição Federal), quanto a ordem social coletiva prevista no art. 196 do mesmo diploma legal.

Contudo, antes de buscar respostas para essa problemática, mostra-se sensato compreender como se desenvolveu o processo de dominação perpetrado contra as mulheres no decorrer dos séculos, assim como analisar as práticas hegemônicas masculinas postas em xeque a partir das políticas identitárias e dos movimentos feministas que tiveram grande expressividade no século XX.

“On ne naît pas Femme: on le devient”. Essa clássica proposição da autora feminista Simone de Beauvoir, inscrita na abertura do seu livro O segundo sexo, embasou a força de suas reflexões para a construção do pensamento feminista. Pela primeira vez no mundo ocidental uma obra analisou as estratégias com que a masculinidade organizava a construção e o controle das feminilidades (Beauvoir, 1967, p. 6). Assim, a frase “não se nasce mulher: torna-se” descortinou que o processo de tornar-se mulher obedece a uma prescrição imposta de fora para dentro pela masculinidade hegemônica; tornar-se homem, ao revés, obedece a um imperativo interno do próprio dominador. É que no primeiro caso, para garantir sua hegemonia sobre um elemento estranho a ser dominado, o sistema patriarcal determina uma definição exterior à mulher; no segundo, o sistema patriarcal determina o reconhecimento de um elemento familiar a si mesmo, no sentido de enfatizar uma definição de macho capaz de reforçar a espinha dorsal da sua organização hegemônica e controlar os corpos que não sejam masculinos (Trevisan, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: a crise do masculino. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Objetiva, 2021., p. 57).

De comum em ambos os casos é que, apesar de serem fatores de dominação de naturezas diversas, há entre eles uma única força social e ideologicamente dominante a criar as definições adequadas à sua perpetuação: o patriarcado e todo seu legado. De um lado testemunhou-se a instauração histórica da desigualdade de gênero, vitimando as mulheres, e do outro lado, o mesmo sistema patriarcal impôs “uma camisa de força ao masculino, num processo de autoimolação que cobra altos juros para ser homem” (Trevisan, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: a crise do masculino. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Objetiva, 2021., p. 57).

Nesse sentido, a desigualdade de gênero reflete a forma como o sistema patriarcal se organiza: “sobre formas diversas de tráfico de mulheres”. Vale dizer, esse sistema instaurou o uso da mulher enquanto propriedade intercambiável - e simbólica - com o fim de fortalecer os laços de homens com homens. Essa conclusão a que chegaram Gayle Rubin e Judith Butler estão baseadas nas observações etnográficas de Lévi-Strauss (para quem o casamento constituiria uma relação de troca estabelecida não entre um homem e uma mulher, mas entre dois grupos de homens, de modo que a mulher aparece apenas como um dos objetos trocados e não como um dos parceiros da troca). É objetivamente por isso que as mulheres têm sido o objeto preferencial da violência masculina nos últimos séculos, havendo suficientes evidências de que com raras exceções, a violência masculina é universal e ocorre em todas as épocas, desde as culturas mais arcaicas de que se tem notícia, até as metrópoles modernas (Trevisan, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: a crise do masculino. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Objetiva, 2021., p. 32).

No período das civilizações antigas, os celtas consideravam as mulheres e os escravos insanos ou irresponsáveis, lhes sendo vedado realizar contratos, compras e vendas (Spencer, 1996SPENCER, Colin. Homossexualidade: Uma história. Rio de Janeiro: Record, 1996., p. 92-95). Na Grécia clássica, a soberania masculina se exercia não apenas sobre a mulher (que não recebia instrução formal nem podia ser vista sozinha em público), mas também na relação pederástica em que o adolescente (eromenos), próximo do padrão feminino, era sexualmente desposado por um homem mais velho (erastes) “a quem devia se manter fiel e dedicado, tal qual uma donzela comportada” (Trevisan, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: a crise do masculino. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Objetiva, 2021., p. 34).

SPENCER explica que entre os árabes, o papel passivo atrelado às feminilidades era tão desprezado, que certos textos clássicos chegam a lamentar o nascimento de uma mulher (1996, p. 101). Nas américas pré-colonial, entre os Astecas, os pais aconselhavam os filhos a não se relacionarem muito cedo com as mulheres, pois elas eram consideradas seres inferiores. Para tanto, os próprios meninos eram vestidos com indumentária feminina, com o propósito de servirem aos desejos sexuais dos machos (Spencer, 1996SPENCER, Colin. Homossexualidade: Uma história. Rio de Janeiro: Record, 1996., p. 135).

Em diversas culturas antigas construídas à base do patriarcado, a força da sexualidade feminina sempre foi temida, justificando-se a necessidade de dominá-la com mais extremo rigor. Nos lares judeus, por exemplo, era proibido ter escravos e cachorros, por conta da crença de que a mulher poderia se descontrolar; entre os Romanos, as senhoras patrícias eram obrigadas a abandonar os banquetes após a “segunda mesa”, quando a etiqueta mandava oferecer vinho aos convidados “para evitar que se embebedassem e perdessem as estribeiras”. No século XV, no âmbito da inquisição europeia matavam-se bruxas e sodomitas (homossexuais) em nome da fé cristã, pois acreditava-se que estes últimos eram fruto de uniões ilegítimas entre bruxas e o demônio (Spencer, 1996SPENCER, Colin. Homossexualidade: Uma história. Rio de Janeiro: Record, 1996., p. 56-69).

Esses exemplos que comprovam a desigualdade de gênero entre a masculinidade e as feminilidades não estão presentes somente no passado remoto ou na antiguidade. Após a Revolução Americana (1775-1783), Thomas Jeferson e os demais revolucionários empreenderam esforços para reformar as leis monárquicas britânicas que vigoravam no território recém declarado autônomo, isso porque com a criação de uma república constitucional seria adequado ajustá-las ao ponto de vista republicano. Com esse objetivo, a pena de morte foi revogada para vários crimes, inclusive para o crime de adultério. Pela nova legislação de “caráter liberal”, a mulher condenada por este delito seria então punida não mais com a morte, mas sim “com a abertura, na cartilagem do nariz, de um buraco de pelo menos um centímetro de diâmetro”. A morte da mulher não seria mais a biológica, mas sim a morte social, visto que com essa mutilação ficaria estigmatizada para sempre em todo o país (Spencer, 1996SPENCER, Colin. Homossexualidade: Uma história. Rio de Janeiro: Record, 1996., p. 220).

No decorrer do século XVIII a medicina psiquiátrica criou o conceito de histeria feminina, por meio de um processo que tornou esse corpo “integralmente saturado de sexualidade” promovendo o que Michel Foucault chamou de “histerização do corpo da mulher” (Foucault, 1977FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade. Rio de Janeiro: Graal, 1977. v. 1: A vontade do saber., p. 98-99). Esse conceito, todavia, somente ganhou maiores contornos durante o século XIX, quando a Psiquiatria se consolidou como ciência; isso se deu sobremaneira a partir da definição de seu objeto referencial principal: a mulher e seu corpo.

Completamente masculino, o ambiente da medicina psiquiátrica sustentou que o foco das doenças mentais das mulheres poderia ser encontrado no próprio aparelho genital feminino “daí as histerias serem inicialmente encaminhadas para os serviços de ginecologia”. Na segunda metade do século XIX somou-se a essa proposição a ideia de que o cérebro também influenciaria na consecução da natureza das mulheres: a histeria seria resultado do excesso de sensibilidade e de sentimentos. Foi isso que apresentou o historiador Alain Corbin (1990CORBIN, Alain. Os bastidores: gritos e murmurios. In.: PERROT, Michelle (Org.). História da Vida Privada: da revolução à grande guerra. Porto: Afrontamento, 1990., p. 571-572) em artigo publicado na obra História da vida privada: da revolução à Grande Guerra. Nesse texto ele registra como o médico e psiquiatra francês Paul Briquet, em 1859, explicava a origem da histeria feminina: “A mulher tem a ver com esta doença específica devido a todo o seu ser: ela paga um pesado tributo à doença pelas mesmas qualidades que fazem dela uma boa esposa e uma boa mãe”.

Essa tentativa de buscar nas próprias características biológicas o sinônimo da subjugação feminina também ocorreu em território brasileiro. No ano de 1838 o médico psiquiatra Rodrigo José Maurício Júnior defendeu uma tese junto à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, na qual afirmava que a histeria era “como uma moléstia de que o útero é a sede”. Para ele, destinadas com exclusividade à maternidade, as mulheres seriam insensíveis do ponto de vista erótico e, portanto, condenadas a serem assexuadas por natureza e incapazes de sentir prazer sexual (Engel, 1997ENGEL, Magali. Psiquiatria e Feminilidade. In: DEL PRIORE, Mary (org.) & BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto /Ed. UNESP, 1997, 678 p.).

Magali Engel (1997ENGEL, Magali. Psiquiatria e Feminilidade. In: DEL PRIORE, Mary (org.) & BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto /Ed. UNESP, 1997, 678 p., p. 339 e ss) em artigo publicado na obra História das Mulheres no Brasil, organizada pela historiadora Mary del Priori, explica que a manifestação do desejo sexual feminino fazia com que as mulheres fossem consideradas mentalmente comprometidas, pois segundo o pensamento da época elas seriam portadoras de neuroses típicas “dos genitais femininos”. Desse modo, para manter controle sobre tais “doenças da sexualidade feminina”, praticava-se intervenções que perpassavam pela extirpação do clitóris e pela inserção de gelo na vagina, chegando a cirurgias ginecológicas “numa tentativa de corrigir sobretudo as anomalias acarretadas pela menstruarão”.

A doutora Joana Maria Pedro, professora titular em História Social do Departamento de História da Universidade Federal de Santa, ao analisar a construção identitária das mulheres do Sul, concluiu que já na penúltima década do século XIX era bastante natural que o controle sobre o corpo e a sexualidade feminina criasse verdadeiras “orientações precisas de comportamento, assegurando sua dominação”. Como exemplo dessa conclusão indica anúncios e textos publicados em periódicos locais, com especial destaque para um artigo publicado pelo Jornal do “Commercio” de 1888, na antiga Desterro, hoje denominada Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina. Os dez mandamentos da mulher determinavam:

1° - Amai a vosso marido sobre todas as coisas. 2° - Não lhe jureis falso. 3° - Preparai-lhe dias de festa. 4° - Amai-o mais do que a vosso pai e a vossa mãe. 5° - Não o atormenteis com exigências, caprichos e amuos. 6° - Não o enganeis. 7° - Não lhe subtraiais dinheiro, nem gasteis este com futilidades. 8° - Não resmungueis, nem finjais ataques nervosos. 9° - Não desejeis mais do que um próximo e que este seja o teu marido. 10° - Não exijais luxo e não vos detenhais diante das vitrines (Pedro, 1997PEDRO, Joana Maria. Mulheres do Sul. In: DEL PRIORE, Mary (org.) & BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto /Ed. UNESP, 1997, 678 p., p.237-238).

Explica a autora que várias notas como essas eram divulgadas nos jornais brasileiros já desde a segunda metade do século XIX; contudo, foi a partir da década de 80 que se tornaram mais frequentes. Os jornais da época, portanto, colaboravam para esse processo divulgando imagens, como na nota de 1886 do Jornal do “Commercio”, em que a “mulher boa” é identificada com a felicidade familiar:

A mulher boa, meiga, mas ignorante, pode - ainda assim - tornar o lar doméstico um asilo casto, uma enseada tranquila. A mulher doce, carinhosa, mas instruída, de talento, com a dupla chama imaterial do amor e da inteligência a flamejar-lhe no coração e no cérebro, essa tornará o recinto da família prestigioso como um templo invencível como as mais roqueiras cidadelas (Pedro, 1997PEDRO, Joana Maria. Mulheres do Sul. In: DEL PRIORE, Mary (org.) & BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto /Ed. UNESP, 1997, 678 p., p 238).

O rigor para com as regras disciplinadoras das condutas sexuais e sociais das mulheres era tanto, que ao final dos dez mandamentos da mulher, o jornal fez constar uma observação de que “Estes dez mandamentos devem ser lidos pelas mulheres doze vezes por dia, e depois ser bem guardados na caixinha da toillete” (Pedro, 1997PEDRO, Joana Maria. Mulheres do Sul. In: DEL PRIORE, Mary (org.) & BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto /Ed. UNESP, 1997, 678 p., p. 238).

A Proclamação da República em 1889 pode ser vista como o momento a partir do qual os novos modelos femininos passaram a ser mais reforçados. Esse período promoveu intensas transformações e remanejamentos nas elites que vinham se configurando no decorrer do século XIX. Na chegada do século XX a edição do Código Civil que passou a vigorar em 1917 legalizou permanentemente a desigualdade de gênero, colocando a mulher e seu corpo sob a constante vigilância do Estado e da sociedade. Sua incapacidade relativa para a prática dos atos da vida civil e a manutenção do art. 279 do Código Penal de 1890, que punia severamente o adultério cometido pela mulher4 4 “Historicamente a prática de Adultério costumava ser punida com mais severidade quando praticado pela mulher do que quando praticado pelo homem. Um bom exemplo disso é o artigo 279 do Código Penal Brasileiro de 1890, que punia a mulher adúltera com a pena de prisão celular de um até três anos, a mesma pena somente se aplicava ao marido adúltero se este mantivesse uma concubina “teúda e manteúda”, ou seja, caso sustentasse uma amante. Quando o homem mantinha uma simples relação sexual fortuita fora do casamento não havia crime”. ICIZUKA, Atilio de Castro; ABDALLAH, Rhamice Ibrahim Ali Ahmad. A trajetória da descriminalização do adultério no direito brasileiro: uma análise à luz das transformações sociais e da política jurídica. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v.2, n.3, 3º quadrimestre de 2007. Disponível em: <www.univali.br/direitoepolitica> - ISSN 1980-7791. Acesso em 31 mar. 22. , deram o tom do caminho tortuoso a ser percorrido pelas feminilidades durante o centenário que se seguiria.

A proporção que as mulheres iam ganhando espaço na discussão política, sobremaneira a partir do reconhecimento paulatino de seu direito ao sufrágio universal, bem como pela autonomia conjugal reconhecida pela Lei do Divórcio na década de 1970 e pela igualdade formal prescrita pela Constituição de 1988, a violência se apresentava como mais uma faceta da desigualdade de gênero implantada no decorrer dos séculos. A violência física contra as feminilidades foi se institucionalizando, tornando-se um fenômeno tão corrente que em 6 de agosto de 1985, o então governador do Estado de São Paulo André Franco Montoro, inaugurou a primeira delegacia da mulher do país. A partir daí, o que se aventava ser fruto apenas de um processo discriminatório (criar delegacias especiais apenas para as mulheres) se tornou um imperativo nacional diante da realidade que batia à porta.

Em comum a todas essas condutas tem-se que, além do fato de serem produzidas por homens, elas revelam que a violência é algo que permanece latente no seio da família e da sociedade patriarcal, bastando que circunstâncias especiais abalem suas estruturas para que o “denominador comum” expresse sua inconformidade através das mais diversas formas de violência. Foi o que aconteceu durante o período da emergência de saúde pública causa pela COVID-19, evento que contribuiu para o afastamento das mulheres de suas respectivas famílias naturais e do convívio social, aproximando-as ainda mais dos agressores.

Além aumento expressivo dos casos de assédio sexual no âmbito do exercício da atividade laboral em todo país, objeto desse estudo, constata-se que apenas na cidade de São Paulo houve um aumento de quase 20% nos pedidos de socorro emitidos de dentro de casa, no período entre 20 de março a 13 de abril de 2020, totalizando 7.933 casos. Para que se tenha uma ideia desse aumento exponencial, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo havia contabilizado nesse mesmo período em 2019 um total de 6.6245 5 Informação colhida nas reportagens de Rogério Pagnan: “Ocorrências de violência doméstica saltam 20% em SP na quarentena. Folha de São Paulo. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/ocorrencias-de-violencia-domestica-saltam-20-em-sp-na-quarentena.shtml#:~:text=Ocorr%C3%AAncias%20de%20viol%C3%AAncia%20dom%C3%A9stica%20saltam,04%2F2020%20%2D%20Cotidiano%20%2D%20Folha>; e Thayza Pauluze: “Cai total de medidas protetivas contra violência doméstica. Jornal Folha de São Paulo, São Paulo. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/numero-de-medidas-protetivas-contra-violencia-domestica-cai-na-quarentena.shtml>. Ambas acessadas em 17 abr. 2022. .

A situação calamitosa criada pela pandemia parece ter aflorado no seio da sociedade ocidental as tensões domésticas já existentes, as quais se exacerbam pelo uso e consumo do álcool e outras drogas, pela ansiedade e pelo estresse socioeconômico, sobretudo. Esse fenômeno não se restringiu apenas aos países subdesenvolvidos, onde a sociedade patriarcal manifesta seu controle social com maior veemência, ante as interseccionalidades que atravessam com mais força a identidade feminina desses locais (raça, gênero e classe social).

Na Itália, na França, nos Estados Unidos e na Espanha, por exemplo, com o aumento das denúncias em mais de 1/3, os governos locais se viram obrigados a criar quase que instantaneamente novas vagas em centros de acolhimento para mulheres violentadas6 6 Informação colhida da reportagem de Ana Estela de Souza Pinto: “Pandemia eleva denúncias de violência doméstica na Europa”. Folha de São Paulo, São Paulo, 17 abr. 2020. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/04/europa-adota-remedios-de-emergencia-para-epidemia-de-violencia-domestica.shtml> Acesso em 03 abr. 2022. . No caso da Itália, primeiro país europeu a adotar a quarentena total, foram contabilizados pelo órgão estatístico local um total de 2013 vítimas femininas de violência e de perseguição no âmbito doméstico, somente nos primeiros dois meses da pandemia. Comparando-se essa estatística com o mesmo período do ano de 2019, verifica-se que ocorreu um aumento de 59% na quantidade de telefonemas pedindo socorro (825 em 2019).

Um dado curioso dessa pesquisa é que em cerca de 75% dos casos de pedido de socorro as vítimas femininas relataram que as agressões reportadas se repetiam há anos7 7 Informação colhida da reportagem de Michele Oliveira: “Denúncias de violência doméstica crescem novamente na Itália”. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 mai. 2020. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/05/denuncias-de-violencia-domestica-voltam-a-subir-e-crescem-73-na-italia.shtml>. Acesso em 03 abr. 2022. , o que pode indicar a confirmação da hipótese levantada no presente artigo, no sentido de que o Coronavírus deu mais evidência às situações de violência contra as feminilidades já existentes na sociedade. Na Espanha o disque-denúncia criado para o combate às violências de gênero durante o período pandêmico, registrou um aumento de 12,4% de chamadas em relação ao mesmo período do ano de 2019. Os demais serviços disponibilizados na plataforma “on line” do governo, como por exemplo pedido de auxílios e de moradia provisória, cresceram cerca de 270% em relação ao ano de 20198 8 Informação colhida da reportagem de Clara-Laeila Laudette, Ingrid Melander e Belén Carreño: “Violência de gênero dispara na Espanha durante quarentena”. Agência Reuters Internacional. Disponível em: < https://noticias.r7.com/internacional/violencia-de-genero-dispara-na-espanha-durante-quarentena-01042020>. Acesso em 03 abr. 2022. .

A dominação existencial dos corpos femininos, por ser estrutural à forma como a sociedade se organiza e divide o trabalho social e sexual, também acompanhou a migração paulatina do corpo da mulher para os ambientes públicos, ou seja, para fora do lar doméstico (Trevisan, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: a crise do masculino. 2ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Objetiva, 2021., p. 49). No âmbito do trabalho a desigualdade de gênero também ganhou terreno fértil para se instalar, tendo em vista que também nesse espaço a masculinidade hegemônica controla quase que com exclusividade o acesso e a permanência dos corpos nessa atividade humana. O assédio sexual laboral, ao seu turno, como expressão violenta dessa desigualdade de gênero também ganhou maiores contornos durante o período pandêmico, ultrapassando a barreira imposta pelo distanciamento social. As reuniões a distância tornaram-se uma realidade para grupos mais privilegiados, cujos assediadores são encorajados pela sensação de proteção que a tela do computador lhes dá, revelando que o assédio sexual atinge as mulheres de maneira desigual.

Uma pesquisa realizada pelo jornal Estadão e publicado em seu portal de notícias descortina a problemática social que envolve o assédio sexual laboral, ao indicar que entre janeiro de 2015 e julho de 2021 as varas do trabalho do país registraram mais de 27 mil e 300 ações tendo como causa de pedir situações configuradoras de assédio sexual. Só no primeiro semestre de 2021 (um ano após a deflagração da pandemia de coronavírus) o TST registrou um aumento de 21% em relação às ações protocoladas no mesmo período do ano anterior, 20209 9 Para maiores informações acessar: https://delas.ig.com.br/2021-08-17/cresce-numero-processos-assedio-sexual.html. Acesso em 19 mai. 2022. .

O ano de 2020 pode ser considerado um ano bastante particular em relação aos casos de assédio sexual no ambiente de trabalho. Os números referentes à propositura de ações na Justiça do Trabalho sofreram uma queda vertiginosa, de um lado por conta das limitações processuais ao direito de ação impostas aos trabalhadores e trabalhadoras pela Reforma Trabalhista10 10 Para maior aprofundamento sobre os efeitos da reforma trabalhista na questão das ações judiciais que discutem a figura do assédio sexual: < https://www.conjur.com.br/2021-ago-28/reforma-trabalhista-acoes-assedio-sexual-chegam-cair-68>. Acesso em 30 mar. 22. de 2017, e de outro lado em razão do isolamento social imposto à população durante a crise inicial da COVID-19, o que fez com que o acesso à justiça fosse ainda mais dificultado. Assim, depois de uma queda no registro de casos de assédio sexual laboral durante o início da pandemia, os números de ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho voltaram a crescer no Brasil em 2021, sendo computados 3.049 processos de assédio sexual no país.

Essa mesma matéria divulgou o resultado de uma pesquisa11 11 Para maiores informações sobre o tema: https://noticias.r7.com/brasil/processos-de-assedio-sexual-sobem-21-no-1-semestre-de-2021-diz-tst-21082021. Acesso em 28 mar. 22. feita com 347 empresas em todo território nacional, as quais foram ouvidas no primeiro semestre de 2021. Coletou-se que a despeito do número de ações trabalhistas apresentadas no período, foram registradas mais de 31.000 (trinta e uma mil) denúncias de assédio sexual laboral. Para efeito de comparação, 2019 e 2020 tiveram, ao longo de todo o ano 12.349 e 12.529 casos respectivamente. Essa informação aprofunda ainda mais a relevância da problemática levantada na presente investigação, pois demonstra claramente a existência de um hiato entre os casos de assédio apresentados à Justiça do Trabalho e as denúncias individuais apresentadas pelas trabalhadoras de forma administrativa, perante a própria organização hierárquica da empresa, o que denuncia a existência de um costume coletivo que persiste em manter a existência das feminilidades sob as mais diversas formas de violências, no ambiente privado doméstico e com maior destaque no ambiente da relação laboral, fazendo com que o sofrimento psíquico seja uma constante na vida de todas as mulheres.

Nessa mesma linha, outra pesquisa realizada em 2021, dessa vez pela Think Eva em parceria com o Linkedin, revelou que 47% das mulheres entrevistadas já sofreram assédio sexual no local de trabalho12 12 A Think Eva e a Think Olga são duas organizações irmãs que compartilham uma mesma missão: Sensibilizar a sociedade para as questões de gênero e intersecções, além de educar e instrumentalizar pessoas que se identifiquem como agentes de mudança na vida das mulheres. Chamada de O Ciclo do Assédio Sexual no ambiente de trabalho (2020), a pesquisa feita pela Think Eva entrevistou mulheres ao redor do Brasil e constatou que, para a maioria delas, o assunto é recorrente e um velho conhecido. Com um índice de confiabilidade de 99%, o questionário online recebeu 414 respostas. Conscientes da diversidade brasileira - e de como alguns contextos podem tornar determinados grupos sociais mais ou menos suscetíveis a violências -, a mostra, que teve o recrutamento via Instituto Netquest, é representativa da população brasileira em relação à raça, região, idade e renda, considerando o público presente na internet. Disponível em: < https://thinkeva.com.br/pesquisas/assedio-no-contexto-do-mundo-corporativo/> Acesso em 01 mar 2022. . Neste universo, mais da metade das mulheres entrevistadas se autodenominou negra (52%); em relação à renda das entrevistadas, registrou-se que a metade delas (49%) recebem entre dois e seis salários-mínimos. Além disso, o Norte (63%) e Centro-Oeste (55%) têm uma concentração de relatos superior às demais regiões.

Ao lançar-se os olhos para os rendimentos individuais das entrevistadas que narraram ter sofrido assédio sexual tem-se que 30,2% têm uma remuneração variável entre dois e quatro salários-mínimos. Aquelas que possuíam rendimentos entre quatro e seis salários eram 20,5% e entre um e dois salários eram 20,2%. O perfil financeiro que menos aparece nesse recorte é aquele das mulheres que ganham os salários mais autos; nesses casos apenas 8,1% das mulheres indicaram ter sido vítima de assédio sexual em alguma de suas modalidades. Esses dados descortinam que o assédio sexual atinge as mulheres de maneira desigual, uma vez que aquelas auto identificadas como negras e pardas e que possuem os menores rendimentos são as principais vítimas.

Esses dados salariais parecem coerentes quando cotejados com os perfis profissionais que mais aparecem na pesquisa. Nesse sentido, observou-se que a maioria das mulheres assediadas ocupa cargos de assistente (32,5%), posição plena ou sênior (18,6%), posição júnior (13,4%) e cargos de direção (2,4%); esses dados demonstram que, mesmo nos casos em que mulheres ocupam posições hierárquicas superiores, o assédio sexual não deixa de ser uma realidade, isso porque entre as entrevistadas que indicaram desempenhar funções de gerência, pelo menos 60% delas alegam terem sido vítimas dessa conduta; 55% daquelas que possuíam cargo de diretoras também declararam ter sido vítima.

Diante desse contexto é que se verifica que o Brasil vive uma espécie de sindemia, gerada a partir do cotejo entre os efeitos de uma grande crise de saúde pública (COVID-19) e da violência institucional a que são submetidas as feminilidades, sobretudo no âmbito das relações trabalhistas, um ambiente essencial para a promoção da igualdade entre os gêneros, pois possibilita o acesso das mulheres ao mercado de trabalho e fortalece sua autonomia em diversos âmbitos da vida.

Como o assédio sexual não atinge todas as mulheres da mesma forma, olhar para o mercado de trabalho feminino com uma lupa interseccional mostra-se fundamental para compreender como esse fenômeno se manifesta na sociedade brasileira. Dados do IBGE13 13 IBGE - Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. “O presente informativo apresenta uma análise focalizada nas desigualdades sociais por cor ou raça, a partir da construção de um quadro composto por temas essenciais à reprodução das condições de vida da população brasileira, como mercado de trabalho, distribuição de rendimento e condições de moradia, e educação. São analisados, da mesma forma, indicadores relativos à violência e à representação política. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf. Acesso em 17 mar. 2022. colhidos em 2019 dão conta de que 32,9% das pessoas pretas e pardas estão abaixo da linha da pobreza no Brasil; as pessoas brancas na mesma condição correspondem a 15,4%. Em relação ao trabalho informal14 14 Para fins de análise dos indicadores construídos nesta publicação, será mantido o conceito de ocupação informal, utilizado como proxy da definição apresentada na 17ª Conferência Internacional de Estadísticos del Trabajo - CIET, realizada, em Genebra, pela Organização Internacional do Trabalho - OIT (INTERNATIONAL CONFERENCE OF LABOUR STATISTICIANS, 2003). Essa conceituação, também utilizada em edições da Síntese de indicadores sociais, compreende: empregados do setor privado e trabalhadores domésticos sem carteira de trabalho assinada, trabalhadores por conta própria, empregadores que não contribuem para a previdência social, e trabalhadores familiares auxiliares (PERFIL..., 2009; PERFIL..., 2012). , coletou-se que as mulheres pretas representam 47,8% das que ocupam essa posição, enquanto as mulheres brancas eram 34,7%15 15 “Assim como no total da população brasileira, as pessoas de cor ou raça preta ou parda constituem, também, a maior parte da força de trabalho no País. Em 2018, tal contingente correspondeu a 57,7 milhões de pessoas, ou seja, 25,2% a mais do que a população de cor ou raça branca na força de trabalho, que totalizava 46,1 milhões. Entretanto, em relação à população desocupada e à população subutilizada, que inclui, além dos desocupados, os subocupados e a força de trabalho potencial, as pessoas pretas ou pardas são substancialmente mais representadas - apesar de serem pouco mais da metade da força de trabalho (54,9%), elas formavam cerca de ⅔ dos desocupados (64,2%) e dos subutilizados (66,1%) na força de trabalho em 2018”. (IBGE, 2019, p. 2) .

Quando se cruzou a variável racial com outros dados foi possível encontrar-se o tamanho real do problema. Em 2019, 66% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras (pardas e pretas). Em termos relativos, enquanto a taxa de homicídios de mulheres não negras foi de 2,5, a mesma taxa para as mulheres negras foi de 4,116 16 Os estados que apresentaram maior risco relativo de vitimização letal de mulheres negras foram Rio Grande do Norte (5,2), Amapá (4,6) e Sergipe (4,4), onde os percentuais de mulheres negras vítimas de homicídios em relação ao total de assassinatos de mulheres foram de 88%, 89% e 94%, respectivamente. Também chama atenção o caso de Alagoas, onde todas as vítimas de homicídios femininos em 2019, sem contar uma das vítimas sem identificação de cor/raça, eram negras (Atlas da Violência, 2021, p. 39). . Isso quer dizer que o risco relativo17 17 O risco relativo é calculado pela razão entre a taxa de homicídios de mulheres negras e a taxa das mulheres não negras. de uma mulher negra ser vítima de homicídio é 1,7 vezes maior do que o de uma mulher não negra, ou seja, para cada mulher não negra morta, morrem 1,7 mulheres negras. Disso tem-se que o racismo é uma variável que agrava a condição da mulher preta, seja no âmbito doméstico e familiar, seja no ambiente laboral.

ROMIO (2013ROMIO, J. A. F. Sobre o feminicídio, o direito da mulher de nomear suas experiências. Plural,[S. l.], v. 26, n. 1, p. 79-102, 2019. DOI: 10.11606/issn.2176-8099.pcso.2019.159745. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/plural/article/view/159745. Acesso em: 15 jun. 2022.
https://www.revistas.usp.br/plural/artic...
, p. 133-158) defende que a violência contra as mulheres negras (incluído aqui a violência do assédio sexual) seja compreendida a partir de suas especificidades, afirmando que elas estão desproporcionalmente expostas a outros fatores geradores de violência, como desigualdades socioeconômicas, conflitos familiares, racismo, intolerância religiosa, conflitos conjugais, entre outros.

CARNEIRO (2017CARNEIRO, Sueli. Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil. Ed. Selo Negro Edições: Rio de Janeiro, 2017., p. 19). por sua vez, defende que o racismo seja compreendido como um eixo articulador das desigualdades que impacta nas relações de gênero. Segundo ela, Raça e sexo são categorias que justificam discriminações e subalternidades, construídas historicamente e que produzem desigualdades, utilizadas como justificativas para as assimetrias sociais, que explicitam que mulheres negras estão em situação de maior vulnerabilidade em todos os âmbitos sociais. Dessa forma, o desenvolvimento de políticas públicas para o enfrentamento das altas taxas de violência, portanto, não pode prescindir de um olhar sobre o racismo e a discriminação e como estes fatores afetam desigualmente as mulheres.

4. A justiça relacional de António Márquez prieto: o binômio justiça-fraternidade e os vazios de justiça.

O paradigma relacional de Pierpaolo Donati, de onde se originam os estudos da Sociologia Relacional do Ser Humano liga-se ao mundo do Direito a partir dos estudos dirigidos pelo professor da Faculdade de Direito da Universidad de Málaga, na Andaluzia espanhola, António Márquez Prieto. Nesses estudos denominados de “Justiça Relacional”, Márquez Prieto apresenta sua contribuição ao propor um critério de análise e de orientação cujos objetivos são o de perseguir a justiça na própria relação jurídica e examinar a qualidade da relação segundo seu grau de justiça (Márquez Prieto, 2012MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Justicia Relacional y Fraternidad. In.: BAGGIO, Antonio Maria; COSSEDU, Adriana; PRIETO, Antonio Márquez. Fraternidad y Justicia. Granada: Comares, 2012, p. 55-89., p. 55). Por meio dessa categoria concreta de justiça, portanto, propõe o autor identificar a presença ou a ausência de justiça nas relações jurídicas, as quais, decorrem e são fruto das relações sociais.

Com efeito, ao identificar-se a ausência de justiça nas relações, Márquez Prieto parece intencionalmente apontar que a raiz, ou seja, o fato gerador dessa desigualdade na relação sociojurídica específica, por si só causa um desequilíbrio de caráter relacional. É esse caráter relacional, derivado da Sociologia do Ser Humano de Pierpaolo Donati e da noção econômica de reciprocidade de Luigino Bruni (Márquez Prieto, 2014MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. La justicia relacional como círculo virtuoso. RECERCA, Revista de Pensament I Namàlisi. N. 14. 2014. ISSN: 1130-6149, p. 117-134., p. 117) que propõe entender as relações jurídico-sociais como vínculo virtuoso e recíproco (Márquez Prieto, 2012MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Justicia Relacional y Fraternidad. In.: BAGGIO, Antonio Maria; COSSEDU, Adriana; PRIETO, Antonio Márquez. Fraternidad y Justicia. Granada: Comares, 2012, p. 55-89., p. 61).

A ideia de virtude a que se refere o professor espanhol, decorre da contribuição do italiano Luigino Bruni (2012BRUNI, Luigino. Le nuove virtù del marco nelléra dei beni comuni. Roma: Città Nuova, 2012., p. 29), o qual em sua obra Le nuove virtú del mercto dei beni comuni propõe uma espécie de ampliação/atualização da concepção de virtude nas relações sociais:

La virtud es uma disposición (o um rasgo) del carácter del un individuo, relativa a un específico domínio; Es algo tendencialmente estable en el tiempo;Es susceptible de ser cultivada por el individuo y por los otros con los que interacciona, y por lo tanto el individuo es responsable de la misma; Una vez cultivada, la virtud ayuda a la persona a alcanzar la excelencia en un determinado dominio [...];Lo que se obtiene por medio de la virtud (carácter, comportamiento, hábito...) debe obtener la aprobación y la simpatía de los otros, en el interior de ese determinado dominio; En fin, es la disposición el objeto de la aprobación y de la simpatía, de los otros, y no primariamente los resultados de las acciones, si bien entre los dos niveles existe una relación circular 18 18 Tradução livre: A virtude é uma disposição (ou traço) do caráter de um indivíduo, em relação a um domínio específico; É algo tendencialmente estável ao longo do tempo, passível de ser cultivado pelo indivíduo e pelos demais com quem interage e, portanto, o indivíduo é responsável por isso; Uma vez cultivada, a virtude ajuda uma pessoa a alcançar a excelência em um determinado domínio [...]; O que é obtido por meio da virtude (caráter, comportamento, hábito...). Em suma, a disposição é objeto da aprovação e simpatia dos outros, e não primariamente o resultado das ações, embora haja uma relação circular entre os dois níveis. .

É essa relação circular entre a disposição, intenção, comportamento e o resultado das ações a que Márquez Prieto denomina “círculo virtuoso” (2014MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. La justicia relacional como círculo virtuoso. RECERCA, Revista de Pensament I Namàlisi. N. 14. 2014. ISSN: 1130-6149, p. 117-134., p. 127). Nesse sentido, na medida em que Bruni apresenta a virtude como uma característica das relações, e não apenas dos indivíduos, Márquez Prieto (2014MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. La justicia relacional como círculo virtuoso. RECERCA, Revista de Pensament I Namàlisi. N. 14. 2014. ISSN: 1130-6149, p. 117-134., p. 127) apresenta a justiça relacional como uma categoria relacional de justiça, a qual estando presente na relação, corresponderá ao círculo virtuoso de justiça. Em outras palavras - e considerando-se a virtude uma dinâmica circular - se as partes direcionam seus comportamentos recíprocos na direção da justiça; e se a institucionalidade - que é de onde decorrem as obrigações e os direitos (lei e contratos) - se orienta pela mesma via, em busca da justiça, será possível emergir continuamente uma relação ou uma sociabilidade cujo fruto será “una calidad ambiental de justicia - en dicha relación - , que, a su vez, servirá de criterio e inspiración para que, de nuevo, tanto tal reciprocidad como la institucionalidad, se orienten hacia la justicia”. A falta de orientação à justiça, em razão da falta de adaptação entre a institucionalidade, reciprocidade e socialidade - elementos constituintes da justiça relacional - proporciona, ao contrário, o surgimento de um círculo vicioso, caracterizado por vazios de justiça - injustiça relacional -. É justamente desse vazio de justiça nas relações sociais que decorrem as desigualdades, entre elas, as desigualdades de gênero.

A desigualdade, portanto, é considerada uma injustiça que ocorre no âmbito da relação indivíduo-indivíduo e indivíduo-instituições (vínculos interpessoais e institucionais que orientam autoridades públicas, agentes e instituições em geral), servindo o enfoque da justiça relacional para apresentar a uma concepção de justiça social a ser virtuosamente desenvolvida no âmbito dos vínculos sociais (Márquez Prieto, 2008). Portanto, ao verificar se há presença ou ausência de justiça na dinâmica relacional em questão, será possível fornecer elementos para descortinar por exemplo, o círculo vicioso das violências de gênero na sociedade brasileira, e em especial, do assédio sexual no ambiente laboral, resultado do trabalho secular do patriarcado e da masculinidade hegemônica, ambos atualmente em crise.

Márquez Prieto (2008, p. 52 e ss) segue sua análise descrevendo as relações sociais como sendo uma dinâmica desenvolvida de forma binária, sob dois eixos: de um lado um eixo estrutural, geralmente representado por uma institucionalidade - o ordenamento jurídico ou um corpo normativo específico; de outro um eixo dinâmico, caraterizado pelo comportamento recíproco/reciprocidade (parte axiológica do enfoque relacional). Essa reciprocidade, segundo o autor, refere-se a uma estrutura dinâmica e ideal onde se operariam as interações sociais, nas quais mostram-se mais visíveis os vazios de justiça.No caso do assédio sexual, essas interações acontecem no ambiente laboral, onde as pessoas quase sempre passam a maior parte de suas horas úteis do dia. Se o eixo estrutural atua orientado ao bem coletivo, sob o manto do comportamento relacional - ou seja, orienta-se por valores de justiça, boa-fé e equidade - haverá maior probabilidade de se produzir justiça nessa relação; do contrário, quando o Estado se omite o círculo vicioso criado e promovido gerará mais desigualdades, influenciando a estrutura social. Do mesmo modo, se o eixo dinâmico enverga-se à reciprocidade, orientando-se pelos mesmos valores comuns, e em direção à superação das hierarquias de gênero, o circulo virtuoso de justiça estará mais perto de ser alcançado.

Dentro da dinâmica criada entre esses dois eixos é que se produz o terceiro componente do enfoque da justiça relacional: a socialidade “es decir, la relación en sí misma, en la medida en que se va continuamente haciendo, así como el conjunto o red de relaciones interconectadas”. Para o autor, a socialidade - ou a relação social - adquire importância também como critério de boa-fé e de justiça, pois funciona como um contexto social no qual tem lugar a dinâmica bilateral de interação entre a institucionalidade e a reciprocidade: “ese juego jurídico entre norma y comportamiento, que necesariamente se desarolla en un marco de relaciones jurídicas y sociales en general” (Márquez Prieto, 2014MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. La justicia relacional como círculo virtuoso. RECERCA, Revista de Pensament I Namàlisi. N. 14. 2014. ISSN: 1130-6149, p. 117-134., p. 125). Assim, a socialidade é compreendida como um espaço onde ocorrem as interações, onde se forma, desenvolve e se modifica a cultura jurídica, configurando-se tanto como elemento gerador da dinâmica da justiça relacional, quanto como resultado produzido a partir da justiça como efeito emergente da relação.

Nesse sentido, ao propor que o Direito pertence ao âmbito da Socialidade, o autor reconhece que a relação jurídica é antes de tudo uma relação social. A socialidade, refere-se diretamente à relação, não apenas entre os sujeitos ou protagonistas, mas também entre seus aspectos intrínsecos, sendo a responsável por impulsionar a reciprocidade a sair de si mesma e transformar-se em institucionalidade, no sentido de construir o círculo virtuoso de justiça.

Os espaços de socialidade onde as interações recíprocas ocorrem, a exemplo do ambiente laboral, estão afetados pelo círculo vicioso da desigualdade de gênero, o qual sempre esteve presente no âmbito das relações desenvolvidas no seio da família nuclear patriarcal, marcadas pela subordinação, dependência e dominação dos homens contra as feminilidades. O enfoque relacional diante de seu caráter emancipador e libertador propõe quebrar esse círculo vicioso, transformando-o num círculo virtuoso de justiça, capaz de promover a igualdade e a dignidade entre todos e todas através da relacionalidade. A relacionalidade, enquanto marco do enfoque da justiça relacional, “exije la inserción, la inclusión en una relación propiamente interpersonal, un ajuste (autónomo o heterónomo) de lo asimétrico con lo horizontal, de la dependencia con la interdependencia del ‘expediente de inclusión’” (Márquez Prieto, 2008MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Repensar la justicia social. Enfoque relacional, teoria de juegos y relaciones laborales en la empresa. Pamplona: Thomson-Aranzadi, en la colección The Global Law Collection, 2006., p. 52-53).

As relações de trabalho em geral, e as de emprego em específico, são espaços de socialidade em que se mostra mais evidente as assimetrias da subordinação e da dependência, como resultado da interação hierárquica entre capital e força de trabalho. A transposição dos elementos conformadores da desigualdade de gênero, criada e perpetuada pelo patriarcado, acabam por produzir exclusão, injustiças e mais desigualdade social também no âmbito do trabalho. Para exemplificar como funcionam esses vazios de justiça, importa registrar mais uma vez que, diante de uma sindemia que permite a interação entre efeitos biológicos/saúde e fatos sociais (violência de gênero/assédio sexual), causando graves problemas à coletividade e também às individualidades femininas, seria possível pelo menos duas reações distintas a serem tomadas pelas institucionalidades que comandam o poder político/econômico em um país regido pela busca do bem comum: de um lado, uma solução coletiva para essa problemática a partir de medidas que visem o bem da coletividade, a exemplo de políticas públicas de estado - e não de governo -; de outro, a adoção de ferramentas e soluções autoritárias com caráter fortemente intervencionista (Lizana, 2017, p. 39). No campo das relações interpessoais essa sindemia desencadeia dois tipos de comportamentos: o despertar do espírito de generosidade, apoio mútuo e consequentemente de uma ação fraterna; ou haverá crescimento do individualismo, da desconfiança e do medo em relação ao outros.

Para saber em qual dos comportamentos individuais ou institucionais há mais probabilidade de existência de abismos sociais, violência estrutural e descaso com a valorização das pluralidades pessoais, é necessário compreender que tanto a relação interpessoal quanto a institucional deve ter por base além da cooperação, da boa-fé e da reciprocidade - normas principiológicas que já integram o sistema jurídico - o princípio de fraternidade, entendido por MÁRQUEZ PRIETO como uma nova forma de compreender e oxigenar as relações sociais (2012MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Justicia Relacional y Fraternidad. In.: BAGGIO, Antonio Maria; COSSEDU, Adriana; PRIETO, Antonio Márquez. Fraternidad y Justicia. Granada: Comares, 2012, p. 55-89., p. 79). Na concepção desse “novo agir”, propõe o autor a criação de uma realidade social relacional, na qual o binômio justiça-fraternidade possa preencher os vazios de justiça que “também constituem vazios de fraternidade” (2012MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Justicia Relacional y Fraternidad. In.: BAGGIO, Antonio Maria; COSSEDU, Adriana; PRIETO, Antonio Márquez. Fraternidad y Justicia. Granada: Comares, 2012, p. 55-89., p. 86). Os vazios de fraternidade são percebidos com maior facilidade no âmbito das relações de subordinação e dependência, sendo certo que nas estruturas sociais onde se verifica menor déficit de igualdade e de justiça social, os vazios são histórica e estruturalmente preenchidos por relações nas quais a supremacia hierárquica hegemônica masculina dita as relações de poder (Márquez Prieto, 2012MÁRQUEZ PRIETO, Antonio. Justicia Relacional y Fraternidad. In.: BAGGIO, Antonio Maria; COSSEDU, Adriana; PRIETO, Antonio Márquez. Fraternidad y Justicia. Granada: Comares, 2012, p. 55-89.).

Quanto mais houver aumento do nível de socialidade do ambiente e, ao mesmo tempo, houver maior coesão social e territorial, diminui-se os vazios de injustiça. Nesse sentido, o princípio de fraternidade se apresenta como um direcionamento para um modelo relacional onde as ações de reciprocidade passam a produzir a socialidade essencial às relações: “a fraternidade, na medida que predispõe ânimo em direção à cooperação a serviço do bem comum, influi favoravelmente sobre o funcionamento econômico [...] assim como também favorece a redução das taxas de pobreza e de exclusão” (LIZANA, 2017, p. 42). A fraternidade enquanto princípio político, jurídico e modo de vida parte da noção de responsabilidade individual e coletiva no que tange à construção de novas realidades sociais, cabendo tanto ao Poder Público quanto às individualidades o desenvolvimento de ações de combate às desigualdades, o que a converte (a fraternidade) em um efetivo princípio participativo - de relacionamentos mútuos.

Disso decorre que a construção de práticas fraternas no âmbito da socialidade (inclusive na relação sujeito x estado) concretiza a justiça social, uma vez que ao buscar conceder nova autonomia e liberdade aos indivíduos - para que possam reconstruir suas próprias razões de vida - os torna corresponsáveis pela preservação dos direitos individuais e coletivos dos demais, em uma relação de reciprocidade - traço do enfoque da justiça relacional.

Observa-se, a partir do quanto exposto, que tanto o paradigma relacional da Sociologia do ser humano quanto o enfoque da Justiça Relacional contribuem com a análise da vulnerabilidade da mulher no ambiente laboral. Na medida quem que o agir fraterno nas relações interpessoais e institucionais, pode promover uma mudança na cultura da desigualdade de gênero, a contribuir para com a substituição das relações de hierarquia, poder e subordinação, transformando-as em relações horizontais, onde ambos, o coletivo e o individual importam. Busca-se, a partir desse enfoque epistemológico, priorizar a qualidade das relações estabelecidas, no sentido de aproximar-se de um modelo sistêmico mais justo, onde o Estado, o mercado (setor empresarial) e participação social possam reiniciar o caminho do desenvolvimento, seja preenchendo ou mesmo atenuando os vazios de justiça social, isso porque, as ações judiciais que verificam a prática do assédio sexual laboral, e que comumente servem para diagnosticar a existência dessa problemática social, configuram-se apenas como manifestações patológicas do problema, não sendo possível, a partir delas, retornar ao status que antecede a conduta.

5. Conclusões

Este artigo propôs identificar as razões e motivos que contribuíram para o aumento vertiginoso dos casos de assédio sexual durante a emergência de saúde deflagada pela COVID-19. Este objetivo geral, ao seu turno, foi concluído, pois, como se verificou, a situação calamitosa criada pela pandemia aflorou no seio da sociedade ocidental as tensões domésticas já existentes na vida social, as quais se exacerbam pelo uso e consumo do álcool e outras drogas ilícitas, pela ansiedade e pelo estresse socioeconômico, sobretudo. Observou-se que esse fenômeno não se restringiu apenas aos países subdesenvolvidos, onde a sociedade patriarcal manifesta seu controle social com maior veemência, ante as interseccionalidades que atravessam com mais força a identidade feminina desses locais (raça, gênero e classe social), mas também no âmbito de estados nacionais desenvolvidos, a exemplo, de países como Itália, Espanha, França, Estados Unidos e Inglaterra.

Verificou-se, também, que a dominação existencial dos corpos femininos, por ser estrutural à forma como a sociedade se organiza e divide o trabalho social e sexual, também acompanhou a migração paulatina do corpo da mulher para os ambientes públicos, ou seja, para fora do lar doméstico. No âmbito do trabalho a desigualdade de gênero também ganhou terreno fértil para se instalar, tendo em vista que também nesse espaço a masculinidade hegemônica controla quase que com exclusividade o acesso e a permanência dos corpos nessa atividade humana. O assédio sexual laboral, portanto, como expressão violenta dessa desigualdade de gênero ganhou maiores contornos durante o período pandêmico, ultrapassando a barreira imposta pelo distanciamento social, pois as reuniões a distância se tornaram-se uma realidade para grupos mais privilegiados, cujos assediadores são encorajados pela sensação de proteção que a tela do computador lhes dá, revelando que o assédio sexual atinge as mulheres de maneira desigual.

Diante desse contexto é que identifica-se que o Brasil viveu - e continua a viver - uma espécie de sindemia, gerada a partir do cotejo entre os efeitos de uma grande crise de saúde pública (COVID-19) e da violência institucional a que são submetidas as feminilidades, sobretudo no âmbito das relações trabalhistas, um ambiente essencial para a promoção da igualdade entre os gêneros, pois possibilita o acesso das mulheres ao mercado de trabalho, fortalecendo sua autonomia em diversos âmbitos da vida.

Essa violência institucional somente poderá ser mitigada a partir do fomento à reciprocidade nas relações desenvolvidas fora e dentro do ambiente laboral, pois é somente a atividade inovadora do ser humano que é capaz de transformar esse cenário de desigualdade, influenciando diretamente na conformação da cultura social e jurídica. Nesse sentido é que a proposta relacional de justiça, amparada pelo paradigma da Sociologia Relacional, parece direcionar o caminho que o eixo institucional e o eixo dinâmico da sociedade devem traçar no sentido de superar as hierarquias de gênero, que ocorrem tanto no âmbito intrafamiliar quanto e especialmente no ambiente laboral.

Portanto, a proposta que melhor direciona a superação dessa problemática é dar tratamento adequado à temática do assédio sexual laboral, que por constituir violência de gênero, não pode prescindir das discussões realizadas no âmbito dos estudos de feministas para a estruturação das políticas de enfrentamento à conduta. Tal capital teórico é o que possui o condão de conferir densidade social à temática do assédio sexual laboral a contribuir com a reciprocidade relacional, o que poderia preencher a lacuna existente no que se refere às políticas de prevenção e virar a chave no tratamento dado à conduta pela legislação brasileira atualmente, que a considera, apenas, um tipo penal.

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  • YANNOULAS, Silvia Cristina. Dossiê: Políticas públicas e relações de gênero no mercado de trabalho. Brasília: CFEMEA; FIG/CIDA, 2002. 93 p.
  • 1
    Trabalho de investigação fruto de estágio de pós-doutoramento junto à Faculdad de Derecho de la Universidad de Málaga - Espanha, sob a orientação do Dr. Antonio Marquez Prieto e com financiamento integral pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no período compreendido entre fevereiro/julho de 2022.
  • 2
    Para a economista feminista Heidi Hartmann, “o patriarcado constitui um sistema de interrelações masculinas que, apensar de uma base material hierárquica, estabelece ou cria interdependência e solidariedade entre os homens, o que os habilita a dominar as mulheres”.
  • 3
    Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Estes são os objetivos para os quais as Nações Unidas estão contribuindo a fim de que possamos atingir a Agenda 2030 no Brasil. Mais especificamente, trata-se de um documento que orienta ações de governos e demais atores sociais para lidar com os tantos desafios enfrentados pelo mundo, desde reduzir desigualdades sociais e garantir a manutenção da paz, até lidar com as mudanças climáticas e evitar a degradação ambiental. A Agenda torna esses desafios menos abstratos, estabelecendo metas concretas e definindo prazos para o atingimento dos resultados. Cita-se como alguns objetivos: igualdade de gênero, trabalho digno e crescimento econômico e reduzir as desigualdades.
  • 4
    “Historicamente a prática de Adultério costumava ser punida com mais severidade quando praticado pela mulher do que quando praticado pelo homem. Um bom exemplo disso é o artigo 279 do Código Penal Brasileiro de 1890, que punia a mulher adúltera com a pena de prisão celular de um até três anos, a mesma pena somente se aplicava ao marido adúltero se este mantivesse uma concubina “teúda e manteúda”, ou seja, caso sustentasse uma amante. Quando o homem mantinha uma simples relação sexual fortuita fora do casamento não havia crime”. ICIZUKA, Atilio de Castro; ABDALLAH, Rhamice Ibrahim Ali Ahmad. A trajetória da descriminalização do adultério no direito brasileiro: uma análise à luz das transformações sociais e da política jurídica. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v.2, n.3, 3º quadrimestre de 2007ICIZUKA, Atilio de Castro; ABDALLAH, Rhamice Ibrahim Ali Ahmad. A trajetória da descriminalização do adultério no direito brasileiro: uma análise à luz das transformações sociais e da política jurídica. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v.2, n.3, 3º quadrimestre de 2007. Disponível em: <http://www.univali.br/direitoepolitica> - ISSN 1980-7791. Acesso em 31 mar. 22
    http://www.univali.br/direitoepolitica...
    . Disponível em: <www.univali.br/direitoepolitica> - ISSN 1980-7791. Acesso em 31 mar. 22.
  • 5
    Informação colhida nas reportagens de Rogério Pagnan: “Ocorrências de violência doméstica saltam 20% em SP na quarentena. Folha de São Paulo. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/ocorrencias-de-violencia-domestica-saltam-20-em-sp-na-quarentena.shtml#:~:text=Ocorr%C3%AAncias%20de%20viol%C3%AAncia%20dom%C3%A9stica%20saltam,04%2F2020%20%2D%20Cotidiano%20%2D%20Folha>; e Thayza Pauluze: “Cai total de medidas protetivas contra violência doméstica. Jornal Folha de São Paulo, São Paulo. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/numero-de-medidas-protetivas-contra-violencia-domestica-cai-na-quarentena.shtml>. Ambas acessadas em 17 abr. 2022.
  • 6
    Informação colhida da reportagem de Ana Estela de Souza Pinto: “Pandemia eleva denúncias de violência doméstica na Europa”. Folha de São Paulo, São Paulo, 17 abr. 2020. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/04/europa-adota-remedios-de-emergencia-para-epidemia-de-violencia-domestica.shtml> Acesso em 03 abr. 2022.
  • 7
    Informação colhida da reportagem de Michele Oliveira: “Denúncias de violência doméstica crescem novamente na Itália”. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 mai. 2020. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/05/denuncias-de-violencia-domestica-voltam-a-subir-e-crescem-73-na-italia.shtml>. Acesso em 03 abr. 2022.
  • 8
    Informação colhida da reportagem de Clara-Laeila Laudette, Ingrid Melander e Belén Carreño: “Violência de gênero dispara na Espanha durante quarentena”. Agência Reuters Internacional. Disponível em: < https://noticias.r7.com/internacional/violencia-de-genero-dispara-na-espanha-durante-quarentena-01042020>. Acesso em 03 abr. 2022.
  • 9
    Para maiores informações acessar: https://delas.ig.com.br/2021-08-17/cresce-numero-processos-assedio-sexual.html. Acesso em 19 mai. 2022.
  • 10
    Para maior aprofundamento sobre os efeitos da reforma trabalhista na questão das ações judiciais que discutem a figura do assédio sexual: < https://www.conjur.com.br/2021-ago-28/reforma-trabalhista-acoes-assedio-sexual-chegam-cair-68>. Acesso em 30 mar. 22.
  • 11
    Para maiores informações sobre o tema: https://noticias.r7.com/brasil/processos-de-assedio-sexual-sobem-21-no-1-semestre-de-2021-diz-tst-21082021. Acesso em 28 mar. 22.
  • 12
    A Think Eva e a Think Olga são duas organizações irmãs que compartilham uma mesma missão: Sensibilizar a sociedade para as questões de gênero e intersecções, além de educar e instrumentalizar pessoas que se identifiquem como agentes de mudança na vida das mulheres. Chamada de O Ciclo do Assédio Sexual no ambiente de trabalho (2020), a pesquisa feita pela Think Eva entrevistou mulheres ao redor do Brasil e constatou que, para a maioria delas, o assunto é recorrente e um velho conhecido. Com um índice de confiabilidade de 99%, o questionário online recebeu 414 respostas. Conscientes da diversidade brasileira - e de como alguns contextos podem tornar determinados grupos sociais mais ou menos suscetíveis a violências -, a mostra, que teve o recrutamento via Instituto Netquest, é representativa da população brasileira em relação à raça, região, idade e renda, considerando o público presente na internet. Disponível em: < https://thinkeva.com.br/pesquisas/assedio-no-contexto-do-mundo-corporativo/> Acesso em 01 mar 2022.
  • 13
    IBGE - Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. “O presente informativo apresenta uma análise focalizada nas desigualdades sociais por cor ou raça, a partir da construção de um quadro composto por temas essenciais à reprodução das condições de vida da população brasileira, como mercado de trabalho, distribuição de rendimento e condições de moradia, e educação. São analisados, da mesma forma, indicadores relativos à violência e à representação política. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf. Acesso em 17 mar. 2022.
  • 14
    Para fins de análise dos indicadores construídos nesta publicação, será mantido o conceito de ocupação informal, utilizado como proxy da definição apresentada na 17ª Conferência Internacional de Estadísticos del Trabajo - CIET, realizada, em Genebra, pela Organização Internacional do Trabalho - OIT (INTERNATIONAL CONFERENCE OF LABOUR STATISTICIANS, 2003). Essa conceituação, também utilizada em edições da Síntese de indicadores sociais, compreende: empregados do setor privado e trabalhadores domésticos sem carteira de trabalho assinada, trabalhadores por conta própria, empregadores que não contribuem para a previdência social, e trabalhadores familiares auxiliares (PERFIL..., 2009; PERFIL..., 2012).
  • 15
    “Assim como no total da população brasileira, as pessoas de cor ou raça preta ou parda constituem, também, a maior parte da força de trabalho no País. Em 2018, tal contingente correspondeu a 57,7 milhões de pessoas, ou seja, 25,2% a mais do que a população de cor ou raça branca na força de trabalho, que totalizava 46,1 milhões. Entretanto, em relação à população desocupada e à população subutilizada, que inclui, além dos desocupados, os subocupados e a força de trabalho potencial, as pessoas pretas ou pardas são substancialmente mais representadas - apesar de serem pouco mais da metade da força de trabalho (54,9%), elas formavam cerca de ⅔ dos desocupados (64,2%) e dos subutilizados (66,1%) na força de trabalho em 2018”. (IBGE, 2019, p. 2)
  • 16
    Os estados que apresentaram maior risco relativo de vitimização letal de mulheres negras foram Rio Grande do Norte (5,2), Amapá (4,6) e Sergipe (4,4), onde os percentuais de mulheres negras vítimas de homicídios em relação ao total de assassinatos de mulheres foram de 88%, 89% e 94%, respectivamente. Também chama atenção o caso de Alagoas, onde todas as vítimas de homicídios femininos em 2019, sem contar uma das vítimas sem identificação de cor/raça, eram negras (Atlas da Violência, 2021, p. 39).
  • 17
    O risco relativo é calculado pela razão entre a taxa de homicídios de mulheres negras e a taxa das mulheres não negras.
  • 18
    Tradução livre: A virtude é uma disposição (ou traço) do caráter de um indivíduo, em relação a um domínio específico; É algo tendencialmente estável ao longo do tempo, passível de ser cultivado pelo indivíduo e pelos demais com quem interage e, portanto, o indivíduo é responsável por isso; Uma vez cultivada, a virtude ajuda uma pessoa a alcançar a excelência em um determinado domínio [...]; O que é obtido por meio da virtude (caráter, comportamento, hábito...). Em suma, a disposição é objeto da aprovação e simpatia dos outros, e não primariamente o resultado das ações, embora haja uma relação circular entre os dois níveis.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2022
  • Aceito
    15 Dez 2023
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