Acessibilidade / Reportar erro

O caminho da pluralidade: alternativas e possibilidades nas ciências sociais

The path to plurality: alternatives and possibilities in social sciences

CASTRO, Celso. Além do cânone. : para ampliar e diversificar as ciências sociais. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2022

Resumo

Nas ciências sociais, alguns autores destacaram-se em suas tentativas interpretativas acerca da realidade social, tornando-se referências para pesquisas em várias áreas do conhecimento. A despeito de divergências teóricas, tais autores possuíam algumas características comuns: todos homens, brancos, oriundos de países europeus – quando muito, nascidos na América do Norte. Todavia, os esforços para entender as relações sociais não se restringiram à produção daqueles que se notabilizaram e aos quais fora concedido grande prestígio. Em diferentes disciplinas, as últimas décadas têm sido marcadas pela descoberta, emergência e visibilidade de possibilidades distintas daquelas estabelecidas no modelo hegemônico de intelectualidade moderna ocidental. Em se tratando das ciências sociais, o sociólogo e antropólogo Celso Castro publicou, em 2022, uma obra que caminha nessa mesma direção. Além do cânone: para ampliar e diversificar as ciências sociais demonstra que as abordagens consagradas não são as únicas possibilidades existentes. No livro, Castro apresenta ao público leitor uma seleção de cientistas sociais que, a partir de diferentes territórios, buscaram compreender a sociedade – as sociedades, aliás – com formas originais para explicá-las. A coletânea traz ao Brasil textos inéditos, excertos das obras produzidas pelas dezesseis autoras e autores selecionados. O principal objetivo da obra é despertar o interesse e a curiosidade de pesquisadoras e pesquisadores brasileiros sobre possibilidades novas e plurais para interpretar os fenômenos sociais. Neste texto, busca-se evidenciar o empenho de Castro, alinhando-o ao movimento amplo em direção à superação da razão moderna como única alternativa para a compreensão das sociedades.

Palavras-chave
ciências sociais; decolonialidade; diversidade; pluralidade

Abstract

In social sciences, some authors stood out in their attempts to interpret social reality, becoming references for research in various fields of knowledge. Despite theoretical divergences, these authors had some features in common: all men, white, from European countries – or, at most, born in North America. However, efforts to understand social relations were not restricted to the production of those who gained notoriety and to whom great prestige had been granted. In several disciplines, the last few decades have been marked by the discovery, emergence, and visibility of possibilities which differ from those established in the hegemonic model of Western modern intellectuality. Regarding social sciences, the sociologist and anthropologist Celso Castro published a work in 2022 that moves in the same direction. Além do cânone: para ampliar e diversificar as ciências sociais demonstrates that established approaches are not the only possibility. In the book, Castro presents his readers with a selection of social scientists who, from different territories, sought to understand society – societies, actually – proposing original ways to explain them. The collection brings to Brazil unpublished texts, excerpts from the works produced by the sixteen selected authors. The main objective of the work is to arouse the interest and curiosity of Brazilian researchers about new and plural possibilities for interpreting social phenomena. In this text, we seek to highlight Castro’s commitment, aligning him with the broad movement towards overcoming modern reason as the only alternative for understanding societies.

Keywords
social science; decoloniality; diversity; plurality

As chamadas ciências sociais são mais que um grupo de disciplinas organizadas a partir de convergências teóricas e metodológicas. A Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política constituem partes importantes – mas não exclusivas – de um todo complexo, composto por múltiplas possibilidades de análise a respeito das relações entre os indivíduos.1 1 A grande área das ciências sociais engloba também disciplinas como a Economia, a Demografia, a Psicologia Social, o Direito etc.

Não há dúvidas sobre a notoriedade das obras produzidas pelos chamados “pais” da Sociologia e pelos autores considerados canônicos. As abordagens de Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber sobre a modernidade e seus efeitos sobre as sociedades são lições introdutórias para qualquer estudante da disciplina; e a compreensão das organizações sociais a partir do materialismo histórico (Marx; Engels, 200715 MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauere Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). São Paulo: Boitempo, 2007.), do funcionalismo (Durkheim, 2007) e da ação social (Weber, 200222 WEBER, Max. Conceitosbásicos de Sociologia. São Paulo: Centauro, 2002.) se tornaram pontos de partida para inúmeras interpretações realizadas a posteriori.

Sem embargo, as transformações que tiveram lugar com o advento do capitalismo industrial na Europa não foram objeto de reflexão apenas para Marx, Durkheim e Weber. Georg Simmel, por exemplo, também teceu considerações de suma importância nos primeiros momentos da Sociologia como disciplina – ao estabelecer a perspectiva relacional para a compreensão das sociedades (Simmel, 200620 SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.) – sem obter, no entanto, o mesmo prestígio alcançado pelos colegas.

Nas gerações posteriores, Norbert Elias (1994)9 ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. 2 vol. destacou-se com suas contribuições sobre o longo processo civilizador, marcado por transformações psíquicas entendidas como fundamentais para regulação e controle dos ímpetos humanos. As reflexões a respeito das sociedades industriais e dos elementos significativos para a compreensão dos sistemas políticos capitalista e comunista, por sua vez, foram fundamentais na produção de Raymond Aron (1982)1ARON, Raymond. Dezoito lições sobre a sociedade industrial. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982..

A transformação das sociedades, organizadas sob princípios coletivos, em direção à individualidade existente na modernidade líquida – marcada pela lógica do consumo em todas as relações – compôs o ponto fulcral da perspectiva adotada por Zygmunt Bauman (2021)2 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2021.. E o estabelecimento dos campos, enquanto espaços de disputa por poder – nem sempre econômico, mas também simbólico – tornaram Pierre Bourdieu (2014)3 BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: Edições 70, 2014. um autor reconhecido mundialmente.

Das análises de Jürgen Habermas (1988)12 HABERMAS, Jürgen. Teoria de la Acción Comunicativa. Madrid: Taurus, 1988. 2 vol., pode-se mencionar a importância das reflexões sobre a racionalidade instrumental, vinculada à modernidade, e as possibilidades para sua superação pela ação comunicativa – em que a opinião pública se constitui como espaço de construção coletiva, fortalecendo a democracia.

E, embora tenha sido marcado nas últimas décadas por sua atuação política e seus esforços para encontrar uma “terceira via”, Anthony Giddens (1999)11 GIDDENS, Anthony. A terceira via. Brasília: Instituto Teotônio Vilela, 1999. foi sem dúvida um dos maiores sociólogos do século passado, tecendo considerações sobre a reflexividade das relações entre indivíduo e sociedade, bem como acerca da dualidade das estruturas (Giddens, 201810 GIDDENS, Anthony. Problemas centrais em teoria social: ação, estrutura e contradição na análise sociológica. Petrópolis: Vozes, 2018.).

Em tempos de discussão sobre inteligência artificial e suas implicações para as organizações sociais – e mesmo para o futuro da humanidade –, a interpretação das sociedades considerando sua organização em redes informacionais evidencia a relevância da obra de Manuel Castells (1999)6 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. Vol. 1.. O autor traçou, a partir da “era da informação” as características de um novo tipo de capitalismo, contribuindo significativamente para as reflexões sobre a contemporaneidade.2 2 A lista de autores relevantes para as ciências sociais é bastante extensa. Neste texto, optou-se por citar apenas alguns deles. Há interessantes coletâneas que reúnem os principais aspectos das obras de diversos autores, como Teoria social: vinte lições introdutórias, de Hans Joas e Wolfgang Knöbl (2017); Os sociólogos: de Auguste Comte a Gilles Lipovetsky, organizado por Sarah S. Telles e Solange L. de Oliveira (2018); e Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman, de Celso Castro (2014).

Prestígio e destaque, todavia, são elementos atribuídos a partir de crenças e valores compartilhados culturalmente em determinado tempo histórico. As obras comumente classificadas como “cânones” foram escritas por indivíduos que detinham, além de inquestionável qualidade intelectual, características capazes de lhes conferir relevância social. Não por acaso, a maior parte dos sociólogos mencionados nos compêndios da disciplina é formada por homens brancos, de nacionalidade europeia, norte-americana ou canadense.

Nas últimas décadas, a busca por opções teóricas e metodológicas capazes de alterar esse cenário tem sido constante. Nas ciências sociais, o giro decolonial se caracteriza como um movimento crítico – teórico, ético e político – da pretensa objetividade do conhecimento tido como científico nos últimos séculos (Ribeiro, 201416 RIBEIRO, Adélia M. Por uma razão decolonial: desafios ético-político-epistemológicos à cosmovisão moderna. Civitas, v. 1, n. 14, p. 66-80, 2014. https://doi.org/10.15448/1984-7289.201f1.16181
https://doi.org/10.15448/1984-7289.2014....
). Trata-se da reivindicação da pluralidade cultural como elemento fundamental para a emergência de uma razão cosmopolita oposta à razão moderna ocidental (Santos, 200418 SANTOS, Boaventura S. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. In: SANTOS, B. S. Conhecimento prudente para uma vida decente: “um discurso sobre as ciências” revisitado. São Paulo: Cortez, 2004. p. 777-821.).

O caminho em direção a novas abordagens parece estar sendo trilhado, ainda que a passos lentos.3 3 Iniciativa semelhante foi realizada por Verônica T. Daflon e Bila Sorj (2021), quando publicaram Clássicas do Pensamento Social: mulheres e feminismos no século XIX. O título demonstra a provocação das autoras, que trouxeram ao conhecimento de leitoras(es) textos escritos por mulheres nos primórdios das ciências sociais, mas silenciados pela história tradicional da disciplina. Em Além do cânone: para ampliar e diversificar as ciências sociais, obra organizada em 2022 por Celso Castro, apresentam-se a leitoras e leitores cientistas predominantemente desconhecidas ou desconhecidos do público brasileiro.4 4 Como apontara Grada Kilomba (2019), alguns idiomas – como o inglês e o alemão – não apresentam variação de gênero para vários substantivos e adjetivos. Na língua portuguesa, todavia, a variação ocorre e a normatização, nada casual, delimitou o uso do masculino para evidenciar generalidade singular e composição que incorpore palavras de ambos os gêneros. Neste texto, quando houver flexão de gênero, optar-se-á prioritariamente pelo uso das palavras no feminino; quando necessário, a flexão para o masculino será indicada entre parêntesis. De todo modo, partilha-se da perspectiva apresentada por Kilomba sobre a necessidade da construção de uma nova linguagem, capaz de incorporar as múltiplas identidades existentes na condição humana. O livro conta com dezesseis capítulos, compostos sempre por uma introdução a respeito da teórica(o) em análise e por fragmentos de sua obra escolhidos pelo organizador.

Com esse formato, Castro (2022) pretende encorajar o público leitor a conhecer mais detidamente o pensamento de cada analista social que a coletânea apresenta, demonstrando a profundidade e a relevância de suas análises. Dessa forma, o autor desvenda uma porta de entrada para a compreensão de diferentes perspectivas e possibilidades explicativas acerca das sociedades. Segundo Castro (2022)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014., sua escolha se deu por cientistas sociais não conhecidos no Brasil e responsáveis por textos cujos impactos foram significativos em escalas locais e regionais. Ademais, a “beleza” presente em todos os escritos também desempenhou função importante na seleção – aspecto de caráter absolutamente subjetivo, como ele próprio reconhece.

Harriet Martineau foi a autora escolhida para abrir a coletânea. A pesquisadora inglesa viajara entre os anos de 1834 e 1835 pelos Estados Unidos, tornando-se pioneira nos trabalhos sociológicos de campo. Ainda na década de 1830, escrevera Society in America, resultado de sua exaustiva observação empírica. No ano de 1838, ela publicara uma espécie de manual sobre a pesquisa sociológica intitulado How to observe morals and manners. Tendo em vista que o livro de Durkheim5 5 Trata-se da obra As regras do Método Sociológico, publicada em 1895. seria publicado apenas no final do século, a autora foi inegavelmente uma precursora nas ciências sociais. De fato, a “mãe” da Sociologia conforme recentes abordagens.

Mas, ainda que prógona ao teorizar sobre o método de pesquisa empírica, Martineau permanece praticamente ignorada entre os nomes dignos de nota na disciplina. Ao decidir iniciar o livro com a apresentação de Harriet Martineu, Castro (2022) ressalta especialmente o caráter pioneiro da pesquisadora, que tratara de aspectos metodológicos muito antes de autores consagrados pelo mesmo feito.

Nos capítulos seguintes, as abordagens selecionadas trazem contribuições diversificadas e plurais. Sem embargo, pode-se observar certa correlação entre os assuntos estudados pelas(os) cientistas sociais escolhidas(os) pelo organizador. Em Além do cânone, é possível encontrar autoras e autores que escreveram sobre relações raciais;6 6 Capítulos 2, 4, 6 e 12: textos de Anténor Firmin, W.E.B. Du Bois, Manuel Gamio Martínez e E.F. Frazier, respectivamente. mulheres nas sociedades;7 7 Capítulos 3, 5, 7 e 9: Pandita Ramabai, Marianne Weber, Jane Addams e Mirra Komarovsky – nessa ordem. fascismos;8 8 Capítulos 8 e 10: Lucie Varga e Massao Maruyama. e críticas ao modo ocidental de produção do conhecimento.9 9 Capítulos 11, 13, 14, 15 e 16: Hilda Kuper, M.N. Srinivas, Yoshimi Takeuchi, Jalal Al e-Ahmad e Şerif Mardin, respectivamente.

Em relação à primeira temática, a coletânea apresenta incialmente Joseph Anténor Firmin, autor haitiano nascido em 1850. Por integrar uma família de classe baixa, sua formação intelectual passara longe da educação superior formal. Firmin aprendera de forma independente os conteúdos ligados ao Direito e tornou-se advogado por sua própria iniciativa. Exilado na França – onde se tornara membro da Sociedade de Antropologia de Paris – escrevera sua principal contribuição intelectual: Hierarquização fictícia das raças humanas, publicada em 1885.10 10 Interessante observar, conforme Castro (2022), que o livro tivera sua primeira tradução para o inglês apenas no ano 2000, uma reedição francesa em 2004 e a tradução para o espanhol somente no ano de 2013. Ou seja, o pensamento de Firmin permanecera esquecido por mais de um século. Como Lilia M. Schwarcz (1993) demonstrara, as teorias racialistas tiveram amplo espaço no Brasil no final do século XIX e no início do século XX, período em que a miscigenação fora concebida como mal a ser superado por meio do progressivo branqueamento da população. Nota-se, portanto, que as teorias raciais chegaram ao país; mas, a oposição a elas, não. O apagamento de sua contribuição certamente guardara relação com a insurgente posição adotada em um mundo que, àquela altura, era marcado pela estigmatização dos indivíduos a partir de suas características físicas.

Já Manuel Gamio Martínez nascera no ano de 1883 no México, e seu pensamento fora profundamente marcado pelo combate ao preconceito contra a população indígena mexicana. A obra intitulada Forjando Pátria (pro-nacionalismo), publicada em 1916, tornara-se um marco do nacionalismo naquele país. Para Martínez, que fora o primeiro nome do campo antropológico em território mexicano, a população indígena era parte da nação e detinha a mesma aptidão para o progresso que indivíduos brancos – postura destoante daquela que dominava os círculos intelectuais no período. Apesar de sua importância regional, os textos de Manuel Gamio não tiveram reconhecimento internacional, mesmo do ponto de vista específico da Antropologia.

William Edward Burghardt Du Bois e Edward Franklin Frazier foram sociólogos negros, nascidos nos Estados Unidos. Ambos tiveram acesso ao ensino universitário – em instituições dedicadas exclusivamente a pessoas negras – e desenvolveram carreiras acadêmicas.

Du Bois mudara-se para a Alemanha em 1832, em virtude de uma bolsa de estudos alcançada na Universidade de Berlim. Lá, conviveu com Max Weber, estudou ciência política, estatística e defendeu sua tese de doutorado. Sob a perspectiva de Castro (2022)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014., Du Bois foi pioneiro nos estudos de sociologia urbana, embora a história tradicional da disciplina atribua tal papel a Robert E. Park. A obra The Philadelphia negro: A social study, escrita em 1899, teria sido o grande marco de emergência da nova área. Com amplo material, produzido a partir de métodos quantitativos e qualitativos, o pensamento de Du Bois tratara da dinâmica racial nos Estados Unidos considerando as relações de poder, que oprimiam e discriminavam a população negra.

Frazier, por sua vez, nascera em 1894, fizera o mestrado em Sociologia na Clark University, mudando-se para a Dinamarca entre 1921 e 1922, quando recebera uma bolsa da Universidade de Copenhague. O sociólogo retornara aos Estados Unidos e fora professor em diferentes universidades ao longo da carreira. Em 1955, ele publicara sua obra mais importante – Burguesia Negra. No livro, Frazier buscou compreender os valores e comportamentos dos membros dessa classe, explicando a relação entre a ascensão social e o desmantelamento da cultura popular negra. Para ele, a identidade negra seria esfacelada na medida em que os indivíduos tentavam agir e se comportar a partir de valores da burguesia branca.

No tocante a estudos sobre o papel das mulheres nas sociedades, Castro (2022)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. brinda o público com Pandita Ramabai, autora nascida em 1858 no sul da Índia. Membro da casta brâmane, a mais alta do sistema de estratificação social do país, Ramabai Dronge era filha de um professor de sânscrito, idioma ancestral no qual foram escritos os principais textos religiosos do hinduísmo. Privilegiada em uma cultura na qual as mulheres não tinham acesso à instrução, a autora viajara por diferentes partes do país realizando recitais com a família.

Com o destaque alcançado por seu conhecimento de sânscrito, Ramabai recebera da Universidade de Calcutá o tratamento “Pandita” que significa “erudita”. Em 1887, a autora publicara o livro The High-Caste Hindu Woman que se tornaria sua mais importante obra. Em seu país natal, fundara inicialmente a Sharada Sadan e depois a Mukti Sadan – Casa para Aprendizagem e Casa da Salvação, respectivamente. A última instituição surgira com o objetivo de assistir e defender melhorias sociais para as mulheres indianas. Em uma sociedade marcada por enormes desigualdades, Pandita Ramabai dedicara-se intelectualmente e agira pelos direitos das mulheres hindus, denunciando as opressões sofridas por elas durante grande parte de sua vida.

Marianne Weber e Mirra Komarovsky também escreveram seus textos sobre questões de gênero – a bem da verdade, nos momentos em que todas o fizeram, o epíteto não fazia parte do vocabulário das análises sociais.11 11 Compreende-se gênero aqui de modo análogo àquele de Butler (2022, p. 77): “Gênero é o mecanismo pelo qual as noções de masculino e feminino são produzidas e naturalizadas, mas o gênero pode muito bem ser o dispositivo pelos quais os termos são desconstruídos e desnaturalizados”. Não obstante, os temas abordados por essas autoras estiveram inegavelmente atrelados a aspectos ligados aos posteriores estudos de gênero.12 12 Judith Butler (2022) chamara a atenção para a ampliação das temáticas ligadas à problemática de gênero. Se tradicionalmente os estudos são ligados a aspectos da condição das mulheres na sociedade, os movimentos transsexuais, transgênero e queer reivindicam novas formas de interpretação do conceito, seja para utilizá-lo em suas demandas, seja para rechaçar suas diretrizes, que acabam por ratificar, de algum modo, a normatização dos corpos e dos comportamentos humanos.

Marianne ficara conhecida mundialmente por ser a esposa de Max Weber, mas desempenhara outros papéis na organização social para além desse. Contemporaneamente a Max e a outros autores, ela fora responsável por importantes textos sociológicos – especialmente vinculados à posição das mulheres na sociedade. Embora não tenha tido acesso ao ensino superior formal, recebera o título de doutorado honorário da Universidade de Heidelberg e permanecera em franco diálogo com sociólogos daquele período, tendo grande amizade com Georg Simmel. A defesa da igualdade entre homens e mulheres fora o cerne principal de suas obras.

A obra mais importante publicada por Marianne Weber foi Ehefrau und Mutter in der Rechtsentwicklung: Eine Einführung (Esposa e mãe no desenvolvimento jurídico: uma introdução, tradução livre), em 1907. O caminho percorrido pela autora fora marcado não apenas por sua atuação como analista social, mas também por seu ativismo político e feminista – que a tornara, em 1919, a primeira mulher a ter assento em uma assembleia estadual alemã.

Já Mirra Komarovsky, nascida em 1905 no Azerbaijão, chegara aos Estados Unidos com a família na década de 1920; e graduara-se no Barnard College, instituição de ensino superior ligada à Universidade de Columbia voltada apenas para mulheres.13 13 Aliás, a permanência no Barnard College fora um traço característico da carreira da autora, que cursara pós-graduação na mesma instituição. Durante todo o período de atuação acadêmica, ela fora docente no Barnard. Komarovsky fora pioneira ao evidenciar o conflito pelo qual as mulheres passavam em meados do século passado: de um lado, os valores e normas ligados ao modelo tradicional do que deveria ser o feminino; de outro, a perspectiva moderna que permitia às mulheres a orientação para a profissão e a carreira. Ainda que analisando os papéis sociais ligados ao sexo biológico, Mirra Komarovsky foi precursora ao tratar dos valores culturais responsáveis pela construção de normas e atribuições limitadoras da atuação das mulheres na sociedade.

Em Chicago, Jane Addams buscara compreender aspectos da realidade social urbana desde fins do século XIX. A socióloga nascera em 1860 e integrara, desde 1895, o grupo de cientistas responsável pela obra Hull-House maps and papers: A presentation of nationalities and wages in a congested district of Chicago, together with comments and essays on problems growing out of the social conditions.14 14 Em virtude de sua extensão, optou-se por traduzir o título do livro nesta nota: Mapas e documentos da Hull-House: uma apresentação de nacionalidades e salários em um distrito congestionado de Chicago, acrescido de comentários e ensaios sobre problemas decorrentes das condições sociais. O livro contava com oito capítulos escritos por mulheres – no total, eram dez. A autora teve grande produção acadêmica e foi membro da American Sociological Association desde sua criação, em 1895. Em um texto de 1916, “The long road of women’s memory”, Jane Addams analisara a construção da memória de mulheres a partir de sua experiência em Hull-House.

Embora bastante famosa nos Estados Unidos, Addams mantivera-se pouc`geração dos Annalles, Lucie Varga é desconhecida por grande número de sociólogas(os) e historiadoras(es). Dentre as possíveis causas para seu apagamento, Castro (2022)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. considera os marcadores de gênero e de religião, além de sua condição de migrante, ativista feminista e antifascista.15 15 A trajetória de Varga permite observar, ainda, a proximidade entre a História e a Sociologia no início do século XX. Peter Burke (2012) afirma que as disciplinas são vizinhas, mesmo que nem sempre a política da boa vizinhança se faça presente. De todo modo, é inegável o quanto a História, a Sociologia e até mesmo a Antropologia Social são disciplinas que guardam, ressalvadas suas especificidades, interesses comuns: a sociedade e o comportamento humano.

Ainda em relação à ascensão dos fascismos, Celso Castro apresenta o caso do Japão, país oriental e de cultura muito distinta daquelas existentes nas sociedades ocidentais. A contribuição de Massao Maruyama, autor que se dedicara a compreender e explicar a emergência do fascismo naquele país, fora a abordagem escolhida. Maruyama nascera em 1914 em Osaka; tornara-se advogado e professor no início dos anos 1940. No exército japonês, vivera as experiências da guerra, retornando à docência após o fim do conflito mundial. No livro Teoria e psicologia do ultranacionalismo, publicado em 1946, buscara compreender as causas da emergência do fascismo na sociedade japonesa. Tal obra fora possivelmente a mais conhecida de sua carreira. Todavia, o autor tivera inúmeras produções importantes e fora o cientista político japonês mais importante da segunda metade do século XX. Ainda assim, seus escritos não alcançaram o destaque conferido a autores europeus, nem ultrapassaram fronteiras a ponto de popularizarem-se em territórios ocidentais.

A crítica ao modelo hegemônico de produção do conhecimento – concebido como única possiblidade – fora o aspecto central do livro organizado por Castro. De origem brâmane, tal qual Ramabai, Mysore Narasimhachar Srinivas nascera em 1916 e se graduara na Universidade de Mysore aos vinte anos de idade. Na Universidade de Bombaim, defendera sua tese que originara o livro Religion and society among the coorgs of South India (Religião e sociedade entre os coorgs do sul da Índia, tradução livre).

A carreira de M. N. Srinivas fora marcada por grande produção intelectual. Em suas obras, o autor primava pelo trabalho de campo e estabelecera a diferença entre o que chamava de book view e field view – em que ratificava sua posição sobre a relevância da prática empírica de pesquisa para compreender a sociedade indiana. O pesquisador analisara o processo pelo qual castas inferiores lograram ascensão na hierarquia social do país, incorporando características de castas superiores – processo que chamara de sanscritização. Com base nos estudos de Srinivas, as intepretações sobre a sociedade indiana incorporaram as dimensões processual e relacional dos fenômenos sociais.

A abordagem de Yoshimi Takeuchi também buscara compreender as realidades sociais asiáticas apoiando-se em padrões não dominantes. Takeuchi estudara na Universidade Imperial de Tóquio, ainda nos anos de 1930. Participara, assim como Maruyama, da Segunda Guerra Mundial nas fileiras japonesas. Antes disso, no entanto, fora responsável pela fundação da Sociedade de Pesquisa em Literatura Chinesa. Com o fim do conflito, retornara ao país e fora professor universitário até 1960 – primeiro na Universidade de Keiô e posteriormente na Universidade Metropolitana de Tóquio.

Takeuchi propôs, em 1961, a Ásia como método para analisar as modernizações japonesa e chinesa. O grande feito dessa abordagem fora o de estabelecer uma alternativa à interpretação tradicional sobre os processos de modernização no Oriente, que admitiam o Japão como modelo de sucesso e a China, paradoxalmente, de fracasso. Para Takeuchi, o cerne da questão se vinculara ao fato de o Japão ter se modernizado imitando o modelo ocidental; e a China, ao contrário, por meio de um processo de resistência a essa matriz, estabelecendo sua modernidade de “dentro para fora”.

Em caminho semelhante seguira o iraniano Jalāl Āl-e Ahmad. O autor nascera em Teerã no ano de 1923 e falecera em 1969 – período em que o território iraniano passava por reformas “modernizantes” a partir da perspectiva do Ocidente. Além de professor de ensino médio, escritor de literatura e tradutor de obras clássicas – de Dostoievski a Camus –, Jalāl Āl-e Ahmad fora militante comunista e, sobretudo, pensador social.

Em 1962 fora publicada sua obra mais importante; e somente vinte anos após o lançamento da primeira edição o livro tivera sua primeira tradução para o inglês: Occidentosis: A plague from the West. Na obra, o tema central dizia respeito à ocidentalização em curso nos países orientais – e especialmente no Irã. Segundo Jalāl Āl-e Ahmad, a oposição entre capitalismo e comunismo – àquela altura, ele já havia se desiludido com a URSS – dizia muito pouco sobre a realidade mundial, pautada em nações produtoras de matérias-primas e exploradas; e aquelas modernas, responsáveis pelo quadro de pobreza e miséria das primeiras. A ocidentose, nesse sentido, seria a doença a ser combatida, de modo a suplantar a inverídica oposição entre Ocidente e Oriente.

As formas de organização social não ocidentais também chamaram a atenção de Hilda Kuper, uma antropóloga nascida no início do século XX na Rodésia – atual Zimbábue. Embora tenha sido contemporânea de outros grandes pesquisadores, sua produção intelectual é pouco mencionada quando se trata da história da Antropologia. A autora formara-se na Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo, na África do Sul; na Inglaterra, defendera seu doutorado pela London School of Economics, ainda na década de 1930. Em sua tese, estudara as relações entre brancos e negros na Suazilândia – antigo território colonizado pelo império britânico no sul da África, atualmente denominado como Reino de Essuatíni.

Dentre os métodos de pesquisa empregados por Kuper, destacaram-se o trabalho de campo imersivo e sua profunda relação com os membros da sociedade suazi. Em meados dos anos de 1940, depois do final da Segunda Guerra, sua tese fora publicada em duas partes: African Aristocracy: Rank among the Swazi of the Protectorate e The Uniform of the Colour: A study of white-black relationships in Swaziland.16 16 Uma aristocracia africana: a posição na hierarquia social entre os suázi; e O uniforme da cor: um estudo das relações entre brancos e negros na Suazilândia.

A antropóloga também se envolvera nas questões políticas da África do Sul, posicionando-se contrariamente à política de apartheid implementada no país. Kuper fora uma das fundadoras do Partido Liberal no início dos anos de 1950, mas as pressões relacionadas a esses acontecimentos a levaram até Los Angeles na década seguinte, onde se tornara professora da Universidade da Califórnia.

O último autor apresentado por Castro fora Şerif Mardin, que estudara em Istambul, mas vivera grande parte de sua vida nos Estados Unidos. Naquele país, cursara mestrado em Relações Internacionais e doutorado em Ciência Política – na Johns Hopkins University e em Stanford, respectivamente. Em 1961, retornara à Turquia – onde permanecera até 2017, quando de sua morte, destacando-se por sua grande produção acadêmica na área da sociologia da religião.

Em obras como Religion and social change in modern Turkey: The case of Bediuzzaman Said Nursi; e Religion, society and modernity in Turkey,17 17 Religião e mudança social na Turquia moderna: o caso de Bediuzzaman Said Nursi; e Religião, sociedade e modernidade na Turquia. publicados em 1989 e 2006, respectivamente, Mardin compreendera o islamismo turco como algo mais complexo que uma força conservadora, retrógrada e ligada ao passado. Para o autor, o apelo religioso se fortalecera na medida em que o nacionalismo de matriz laica não se mostrara capaz de produzir sentido, garantindo aos símbolos sociais pontos de coesão e identificação para as massas populares turcas.

A diversidade de gênero, raça e nacionalidade das(os) autoras(es) selecionadas(os) por Celso Castro, assim como a pluralidade de suas abordagens, torna patente o quanto há de produção intelectual qualificada para além dos lugares e olhares comuns. Mulheres e homens de diferentes territórios que, desde o século XIX, buscaram explicar as distintas realidades sociais ao redor do globo com interpretações originais, distanciando-se das matrizes e interpretações pré-concebidas ocidentais.

Faz parte do compromisso ético-teórico-político, ressaltado por Ribeiro (2014)16 RIBEIRO, Adélia M. Por uma razão decolonial: desafios ético-político-epistemológicos à cosmovisão moderna. Civitas, v. 1, n. 14, p. 66-80, 2014. https://doi.org/10.15448/1984-7289.201f1.16181
https://doi.org/10.15448/1984-7289.2014....
, iluminar cientistas e teorias desconsideradas, bem como métodos e objetos de pesquisa negligenciados ou menoscabados, com base em uma razão universalizante – que negara às divergências a possibilidade de existência.

Agir dessa forma não pressupõe, de modo algum, desprezar as importantes contribuições teóricas, metodológicas e analíticas que ganharam relevância e se tornaram canônicas nas ciências sociais. Ampliar os horizontes e descolonizar os olhares não significa negar a notoriedade ou a qualidade das obras “clássicas”; não se trata de descartar os conhecimentos que fizeram das ciências sociais o que elas são hoje.

Mas, o esforço de Castro explicita que é urgente refletir epistemologicamente acerca das disciplinas, concebendo-as também como frutos de seu tempo; resultados tanto das estruturas quanto da agência dos indivíduos. A Sociologia, a Antropologia, a Ciência Política e tantas outras áreas do conhecimento não são a-históricas. Pensá-las como produtos da dualidade das estruturas (Giddens, 201810 GIDDENS, Anthony. Problemas centrais em teoria social: ação, estrutura e contradição na análise sociológica. Petrópolis: Vozes, 2018.) talvez seja a chave para a transformação dos campos do saber a partir de novos e potentes pontos de vista.

Se, no passado, todas as alternativas pareciam apontar para o mesmo lugar, os estudos descoloniais, as epistemologias do Sul e o giro decolonial18 18 Em comum, a visão crítica a respeito do colonialismo e de suas implicações, com destaque para a espoliação cultural e natural de territórios colonizados. De fato, são possibilidades interpretativas e metodológicas similares, com diferenciações acadêmicas vinculadas a tradições “geopolítica e intelectual” (Santos, 2022). (Santos, 202217 SANTOS, Boaventura S. Descolonizar: abrindo a história do presente. Belo Horizonte: Autêntica Editora; Boitempo, 2022.) descortinaram novos referenciais teóricos, temas e autoras(es). Cada cientista social que deseje olhar o mundo para além dos ângulos tradicionais, culturalmente construídos e socialmente convencionados poderá optar por qual trajeto caminhar.

Ao atestar a pluralidade interpretativa, Celso Castro demonstra a inaceitabilidade de uma razão universal; e ao apresentar ao público autoras e autores invisibilizadas(os), avança em direção à desconstrução da perspectiva dominante na produção do conhecimento. Ao fim e ao cabo, em Além do cânone: para ampliar e diversificar as ciências sociais o autor cumpre seu objetivo: indica novos caminhos e as inúmeras possibilidades neles disponíveis.

  • 1
    A grande área das ciências sociais engloba também disciplinas como a Economia, a Demografia, a Psicologia Social, o Direito etc.
  • 2
    A lista de autores relevantes para as ciências sociais é bastante extensa. Neste texto, optou-se por citar apenas alguns deles. Há interessantes coletâneas que reúnem os principais aspectos das obras de diversos autores, como Teoria social: vinte lições introdutórias, de Hans Joas e Wolfgang Knöbl (2017)13 JOAS, Hans; KNÖBL, Wolfgang. Teoria social: vinte lições introdutórias. Petrópolis: Vozes, 2017.; Os sociólogos: de Auguste Comte a Gilles Lipovetsky, organizado por Sarah S. Telles e Solange L. de Oliveira (2018)21 TELLES, Sarah S.; OLIVEIRA, Solange L. (org.). Os sociólogos: de Auguste Comte a Gilles Lipovetsky. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: Editora PUC, 2018.; e Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman, de Celso Castro (2014)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014..
  • 3
    Iniciativa semelhante foi realizada por Verônica T. Daflon e Bila Sorj (2021)8 DAFLON, Verônica T.; SORJ, Bila. Clássicas do pensamento social: mulheres e feminismos no século XIX. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2021., quando publicaram Clássicas do Pensamento Social: mulheres e feminismos no século XIX. O título demonstra a provocação das autoras, que trouxeram ao conhecimento de leitoras(es) textos escritos por mulheres nos primórdios das ciências sociais, mas silenciados pela história tradicional da disciplina.
  • 4
    Como apontara Grada Kilomba (2019)14 KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019., alguns idiomas – como o inglês e o alemão – não apresentam variação de gênero para vários substantivos e adjetivos. Na língua portuguesa, todavia, a variação ocorre e a normatização, nada casual, delimitou o uso do masculino para evidenciar generalidade singular e composição que incorpore palavras de ambos os gêneros. Neste texto, quando houver flexão de gênero, optar-se-á prioritariamente pelo uso das palavras no feminino; quando necessário, a flexão para o masculino será indicada entre parêntesis. De todo modo, partilha-se da perspectiva apresentada por Kilomba sobre a necessidade da construção de uma nova linguagem, capaz de incorporar as múltiplas identidades existentes na condição humana.
  • 5
    Trata-se da obra As regras do Método Sociológico, publicada em 1895.
  • 6
    Capítulos 2, 4, 6 e 12: textos de Anténor Firmin, W.E.B. Du Bois, Manuel Gamio Martínez e E.F. Frazier, respectivamente.
  • 7
    Capítulos 3, 5, 7 e 9: Pandita Ramabai, Marianne Weber, Jane Addams e Mirra Komarovsky – nessa ordem.
  • 8
    Capítulos 8 e 10: Lucie Varga e Massao Maruyama.
  • 9
    Capítulos 11, 13, 14, 15 e 16: Hilda Kuper, M.N. Srinivas, Yoshimi Takeuchi, Jalal Al e-Ahmad e Şerif Mardin, respectivamente.
  • 10
    Interessante observar, conforme Castro (2022)7 CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014., que o livro tivera sua primeira tradução para o inglês apenas no ano 2000, uma reedição francesa em 2004 e a tradução para o espanhol somente no ano de 2013. Ou seja, o pensamento de Firmin permanecera esquecido por mais de um século. Como Lilia M. Schwarcz (1993)19 SCHWARCZ, Lilia M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. demonstrara, as teorias racialistas tiveram amplo espaço no Brasil no final do século XIX e no início do século XX, período em que a miscigenação fora concebida como mal a ser superado por meio do progressivo branqueamento da população. Nota-se, portanto, que as teorias raciais chegaram ao país; mas, a oposição a elas, não.
  • 11
    Compreende-se gênero aqui de modo análogo àquele de Butler (2022, p. 77)4 BUTLER, Judith. Desfazendo gênero. São Paulo: Editora Unesp, 2022.: “Gênero é o mecanismo pelo qual as noções de masculino e feminino são produzidas e naturalizadas, mas o gênero pode muito bem ser o dispositivo pelos quais os termos são desconstruídos e desnaturalizados”.
  • 12
    Judith Butler (2022)4 BUTLER, Judith. Desfazendo gênero. São Paulo: Editora Unesp, 2022. chamara a atenção para a ampliação das temáticas ligadas à problemática de gênero. Se tradicionalmente os estudos são ligados a aspectos da condição das mulheres na sociedade, os movimentos transsexuais, transgênero e queer reivindicam novas formas de interpretação do conceito, seja para utilizá-lo em suas demandas, seja para rechaçar suas diretrizes, que acabam por ratificar, de algum modo, a normatização dos corpos e dos comportamentos humanos.
  • 13
    Aliás, a permanência no Barnard College fora um traço característico da carreira da autora, que cursara pós-graduação na mesma instituição. Durante todo o período de atuação acadêmica, ela fora docente no Barnard.
  • 14
    Em virtude de sua extensão, optou-se por traduzir o título do livro nesta nota: Mapas e documentos da Hull-House: uma apresentação de nacionalidades e salários em um distrito congestionado de Chicago, acrescido de comentários e ensaios sobre problemas decorrentes das condições sociais.
  • 15
    A trajetória de Varga permite observar, ainda, a proximidade entre a História e a Sociologia no início do século XX. Peter Burke (2012)5 BURKE, Peter. História e Teoria Social. São Paulo: Editora Unesp, 2012. afirma que as disciplinas são vizinhas, mesmo que nem sempre a política da boa vizinhança se faça presente. De todo modo, é inegável o quanto a História, a Sociologia e até mesmo a Antropologia Social são disciplinas que guardam, ressalvadas suas especificidades, interesses comuns: a sociedade e o comportamento humano.
  • 16
    Uma aristocracia africana: a posição na hierarquia social entre os suázi; e O uniforme da cor: um estudo das relações entre brancos e negros na Suazilândia.
  • 17
    Religião e mudança social na Turquia moderna: o caso de Bediuzzaman Said Nursi; e Religião, sociedade e modernidade na Turquia.
  • 18
    Em comum, a visão crítica a respeito do colonialismo e de suas implicações, com destaque para a espoliação cultural e natural de territórios colonizados. De fato, são possibilidades interpretativas e metodológicas similares, com diferenciações acadêmicas vinculadas a tradições “geopolítica e intelectual” (Santos, 202217 SANTOS, Boaventura S. Descolonizar: abrindo a história do presente. Belo Horizonte: Autêntica Editora; Boitempo, 2022.).

Referências

  • 1
    ARON, Raymond. Dezoito lições sobre a sociedade industrial Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.
  • 2
    BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida Rio de Janeiro: Zahar, 2021.
  • 3
    BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico Lisboa: Edições 70, 2014.
  • 4
    BUTLER, Judith. Desfazendo gênero São Paulo: Editora Unesp, 2022.
  • 5
    BURKE, Peter. História e Teoria Social São Paulo: Editora Unesp, 2012.
  • 6
    CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede São Paulo: Paz e Terra, 1999. Vol. 1.
  • 7
    CASTRO, Celso. Textos básicos de Sociologia: de Karl Marx a Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
  • 8
    DAFLON, Verônica T.; SORJ, Bila. Clássicas do pensamento social: mulheres e feminismos no século XIX. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2021.
  • 9
    ELIAS, Norbert. O processo civilizador Rio de Janeiro: Zahar, 1994. 2 vol.
  • 10
    GIDDENS, Anthony. Problemas centrais em teoria social: ação, estrutura e contradição na análise sociológica. Petrópolis: Vozes, 2018.
  • 11
    GIDDENS, Anthony. A terceira via Brasília: Instituto Teotônio Vilela, 1999.
  • 12
    HABERMAS, Jürgen. Teoria de la Acción Comunicativa Madrid: Taurus, 1988. 2 vol.
  • 13
    JOAS, Hans; KNÖBL, Wolfgang. Teoria social: vinte lições introdutórias. Petrópolis: Vozes, 2017.
  • 14
    KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.
  • 15
    MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauere Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). São Paulo: Boitempo, 2007.
  • 16
    RIBEIRO, Adélia M. Por uma razão decolonial: desafios ético-político-epistemológicos à cosmovisão moderna. Civitas, v. 1, n. 14, p. 66-80, 2014. https://doi.org/10.15448/1984-7289.201f1.16181
    » https://doi.org/10.15448/1984-7289.2014.1.16181
  • 17
    SANTOS, Boaventura S. Descolonizar: abrindo a história do presente. Belo Horizonte: Autêntica Editora; Boitempo, 2022.
  • 18
    SANTOS, Boaventura S. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. In: SANTOS, B. S. Conhecimento prudente para uma vida decente: “um discurso sobre as ciências” revisitado. São Paulo: Cortez, 2004. p. 777-821.
  • 19
    SCHWARCZ, Lilia M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
  • 20
    SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.
  • 21
    TELLES, Sarah S.; OLIVEIRA, Solange L. (org.). Os sociólogos: de Auguste Comte a Gilles Lipovetsky. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: Editora PUC, 2018.
  • 22
    WEBER, Max. Conceitosbásicos de Sociologia São Paulo: Centauro, 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2022
  • Aceito
    19 Jul 2023
Programa de Pós-Graduação em Sociologia - UFRGS Av. Bento Gonçalves, 9500 Prédio 43111 sala 103 , 91509-900 Porto Alegre RS Brasil , Tel.: +55 51 3316-6635 / 3308-7008, Fax.: +55 51 3316-6637 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revsoc@ufrgs.br