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Tornar-se refugiado: uma abordagem de trajetória de vida para a migração sob coação

Resumo

Este artigo apresenta uma abordagem sociológica para o debate em curso sobre a distinção entre refugiados e migrantes. Para tanto, adoto uma perspectiva de trajetória de vida para a análise da busca de refúgio. Esta busca por refúgio está incorporada não apenas nos regimes legais de proteção aos refugiados, mas também em outras estruturas institucionais que regem o curso da vida. Explorar as continuidades entre migrantes e refugiados permite uma melhor compreensão de se, e sob quais pré-requisitos, a categoria refugiado é aplicada pelas autoridades e acessada pelos próprios refugiados. Com a ajuda de estudos de caso estrategicamente selecionados a partir de uma amostra maior de entrevistas narrativas com migrantes com formação acadêmica, na Alemanha, Turquia e Canadá, o artigo mostra como a implementação e a administração da Convenção de Genebra sobre Refugiados na Alemanha é organizada de forma muitas vezes distanciada da realidade empírica da fuga por perseguição e falta de proteção. Com base nisso, uma comparação mais ampla, com migrantes na Turquia e no Canadá que poderiam se enquadrar na Convenção de Genebra sobre Refugiados, mas que, na sua maior parte, se abstêm de reivindicar asilo, mostra que aqueles com melhores recursos e autonomia socioespacial podem, se bem informados, encontrar opções alternativas para ganhar proteção ao invés de reivindicar o status de refugiado. Ver-se como refugiado ao migrar sob coação e reivindicar ou não asilo não resulta exclusivamente da perseguição enfrentada, mas também das especificidades dos marcos legais e administrativos, bem como da posição que a pessoa ocupa nas desigualdades estruturais globais, e tem relação com os diferentes graus de autonomia socioespacial.

Palavras-chave
Status de refugiado; Migração forçada; Sociologia da migração; Trajetória de vida; Autonomia socioespacial

Abstract

This article offers a sociological approach to the ongoing debate about the distinction between refugees and migrants. It adopts a life-course perspective on seeking refuge. Seeking refuge is embedded not only in the legal regimes of refugee protection, but also in other institutional frameworks governing the life-course. Exploring continuities between migrants and refugees allows for a better understanding of whether and under what preconditions the refugee category is applied by administrations and accessed by refugees themselves. With the help of case studies selected strategically from a larger sample of narrative interviews with university educated migrants to Germany, Turkey, and Canada, the article shows how the implementation and administration of the Geneva Refugee Convention in Germany is organized in a manner that often diverges from the empirical reality of fleeing from persecution and lack of protection. On this basis, a broader comparison with migrants in Turkey and Canada who could fall under the Geneva Refugee Convention, but who mostly refrain from claiming asylum, shows that those with better resources and socio-spatial autonomy can, if well informed, find alternative options for gaining protection rather than claiming refugee status. Whether migrants under duress see themselves as refugees and whether they claim asylum does not only result from the persecution they face but also from specificities of legal and administrative frameworks, as well as their position in global structural inequalities and it is related to divergent degrees of socio-spatial autonomy.

Keywords
Refugee status; Forced Migration; Sociology of migration; Life course; Socio-spatial autonomy

Resumen

Este artículo presenta un enfoque sociológico para el debate en curso sobre la distinción entre refugiados y migrantes. Para ello, yo adopto enfoque de curso de vida para el análisis de la búsqueda de refugio. La búsqueda de refugio está incorporada no sólo en los regímenes legales de protección a los refugiados, sino también en otras estructuras institucionales que dirigen el curso de la vida. Explorar las continuidades entre migrantes y refugiados permite una mejor comprensión de si, y bajo qué requisitos previos la categoría de refugiado es aplicada por las autoridades y accedida por los propios refugiados. Haciendo uso de estudios de caso elegidos estratégicamente a partir de una muestra mayor de entrevistas narrativas con migrantes con formación académica, en Alemania, Turquía y Canadá, el artículo muestra cómo la implementación y la administración de la Convención de Ginebra sobre los refugiados en Alemania se organiza de una forma que muchas veces se aleja de la realidad empírica de la fuga por persecución y por falta de protección. A partir de ello, se hace una comparación más amplia, con migrantes en Turquía y Canadá que podrían encuadrarse en la Convención de Ginebra sobre los refugiados, pero que, en su mayor parte, se abstienen de reivindicar asilo. Se ha observado que aquellos con mejores recursos y autonomía socio-espacial pueden, si están bien informados, encontrar alternativas para ganar protección, en lugar de reclamar el estatus de refugiado. Si los migrantes bajo coacción se ven a sí mismos como refugiados y si reclaman asilo o no es resultado no solo de la persecución que enfrentan, sino también de las especificidades de los marcos legales y administrativos, así como su posición en las desigualdades estructurales globales y, además, tiene relación con los distintos grados de autonomía socio-espacial.

Palabras clave
Estatus de refugiado; Migración forzada; Sociología de la migración; Enfoque del curso de vida; Autonomía socio-espacial

O direito internacional e a maioria das políticas nacionais de migração estabelecem uma clara distinção entre migrantes e refugiados. Enquanto migrantes podem ser recusados na fronteira do país, dependendo dos interesses daquele país (Money; Lockhart, 2017MONEY, Jeannette; LOCKHART, Sarah P. The paucity of international protections: global migration governance in the contemporary era. Global Summitry, v. 3, n. 1, p. 45-67, 2017. Available at: <https://doi.org/10.1093/global/guy007.
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), os refugiados devem receber proteção, pelo menos temporariamente. Este princípio de non-refoulement (não devolução) foi estabelecido pela Convenção de Genebra sobre Refugiados, em 1951, e é um dos poucos princípios vinculantes no direito internacional que rege qualquer tipo de migração (Hollifield, 2000HOLLIFIELD, James F. Migration and the "new" international order: the missing regime. In: GHOSH, Bimal (Ed.). Managing migration: time for a new international regime. Oxford: Oxford University Press , 2000. p. 95-109.).

Embora o princípio da proteção de refugiados seja amplamente reconhecido, sua implementação segue sendo altamente controversa. Em uma era de livres comércio e viagens, os estados nacionais encontram dificuldade em controlar as fronteiras (Castles, 2007CASTLES, Stephen. The factors that make and unmake migration policies. In: PORTES, Alejandro; DEWIND, Josh (Ed.). Rethinking migration: new theoretical and empirical perspectives. New York: Berghahn Books, 2007. p. 29-61.; 2017CASTLES, Stephen. Migration policies are problematic - because they are about migration. Ethnic and Racial Studies, v. 40, n. 9, p. 1538-43, 15 jul. 2017. Available at: <https://doi.org/10.1080/01419870.2017.1308532>.
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). Na perspectiva dos formuladores de políticas, a necessidade de proteger os refugiados acrescenta mais um entrave ao controle de fronteiras. A União Europeia (UE) tem, por exemplo, controles de fronteira externos (ex-territorialized) (Tsianos; Karakayali, 2010TSIANOS, Vassilis.; KARAKAYALI, Serhat. Transnational migration and the emergence of the European border regime: an ethnographic analysis. European Journal of Social Theory, v. 13, n. 3, p. 373-87, 2010. ; Laube; Müller, 2015LAUBE, Lena; MÜLLER, Andreas. Warum die Kontrolle abgeben? Die Delegation von Migrationskontrolle aus der Prinzipal-Agent-Perspektive. Berliner Journal für Soziologie, v. 25, n. 3, p. 255-81, out. 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000371242200002>.
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), que impedem a maioria dos refugiados de chegar às costas da UE e delegam a responsabilidade de proteger os refugiados a países de fora da Europa. A opinião pública nos países de acolhimento contesta a veracidade dos pedidos de asilo dos refugiados, o que resulta na contínua traumatização deste grupo extremamente vulnerável (Sibum, 2010SIBUM, Helen. “Asylshopping” und “Flüchtlingswellen” - ein Vergleich des Migrationsdiskurses in Deutschland und Australien. Berlin: Logos-Verl., 2010. ).

Neste contexto, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) assume uma posição clara contra a confusão entre migrantes e refugiados: “em primeiro lugar, refugiados não são migrantes. Em segundo lugar, é perigoso, e prejudicial à proteção de refugiados, confundir os dois grupos, terminologicamente ou de outro modo” (Feller, 2005FELLER, Erika. Refugees are not migrants. Refugee Survey Quarterly, v. 24, n. 4, p. 27-35, 2005. Available at: <https://doi.org/10.1093/rsq/hdi077.
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, p. 27).1 Anja Weiß is a professor of the Institute of Sociology at the Duisburg-Essen University, Germany. Email: anja.weiss@uni-due.de 1 See e.g. <http://www.unhcr.org/news/latest/2016/7/55df0e556/unhcr-viewpoint-refugee-migrant-right.html>. 1 Ver, por exemplo, <http://www.unhcr.org/news/latest/2016/7/55df0e556/unhcr-viewpoint-refugee-migrant-right.html> Essa afirmação é perfeitamente compreensível em termos políticos, mas vai de encontro a um processo central nas ciências sociais, isto é, o da revisão de categorias vigentes e avaliação do potencial de novas (Koser; Martin, 2011KOSER, Khalid; MARTIN, Susan. The migration-displacement nexus. In: KOSER, K.; MARTIN, S. (Eds.). The migration-displacement nexus: Patterns, Processes and Policies. New York: Berghahn Books , 2011. p. 1-13. ). No controverso campo da proteção de refugiados, interesses políticos e conceituais se interpõem (Van Hear, 2012VAN HEAR, Nicholas. Forcing the issue: migration crises and the uneasy dialogue between refugee research and policy. Journal of Refugee Studies, v. 25, n. 1, p. 2-24, mar. 2012. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000301363200002>.
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). O discurso público utiliza categorias científicas, e novas abordagens para estudar refugiados podem ser e têm sido subvertidas pelo discurso público e político, minando assim o já baixo grau de proteção que foi alcançado (Van Hear, 2012VAN HEAR, Nicholas. Forcing the issue: migration crises and the uneasy dialogue between refugee research and policy. Journal of Refugee Studies, v. 25, n. 1, p. 2-24, mar. 2012. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000301363200002>.
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; Baldwin-Edwards et al., 2018BALDWIN-EDWARDS, Martin; BLITZ, Brad K.; CRAWLEY, Heaven. The politics of evidence-based policy in Europe’s “migration crisis”. Journal of Ethnic and Migration Studies, p. 1-17, 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2018.1468307>.
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; Crawley; Skleparis, 2018CRAWLEY, Heaven; SKLEPARIS, Dimitris. Refugees, migrants, neither, both: categorical fetishism and the politics of bounding in Europe’s “migration crisis”. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 1, p. 48-64, 2 jan. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1348224>.
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).

Cientistas sociais e políticos reconhecem esse risco, mas continuam a adotar mudanças conceituais. Termos como “migração forçada”, “migração de crise” ou “migração mista” respondem a uma crescente inquietude, dentro da comunidade acadêmica, de que estudos focados somente em refugiados podem excluir populações em circunstâncias similares, mas que não têm proteção adequada. Expandir o escopo da pesquisa para “migração forçada”, por exemplo, permite que os pesquisadores incluam pessoas internamente deslocadas em suas análises (Fiddian-Qasmiyeh et al., 2014FIDDIAN-QASMIYEH, Elena; LOESCHER, Gil; LONG, Katy; SIGONA, Nando. The Oxford handbook of refugee and forced migration studies. Oxford: Oxford University Press, 2014.; Zetter, 2015ZETTER, Roger. Protection in crisis: forced migration in a global era. Washington: Migration Policy Institute, 2015. Available at: <http://www.migrationpolicy.org/research/protection-crisis-forced-migrationand-protection-global-era>.
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), embora o deslocamento interno não esteja coberto pela Convenção de Genebra. Outra razão para explorar novas categorias pode ser uma insistência na autonomia da pesquisa social em relação a categorias jurídicas e formulação de políticas. O termo abrangente “migração forçada” também sugere a possibilidade de a sociologia da migração contribuir com novos conhecimentos para os estudos sobre refugiados (FitzGerald; Arar, 2018FITZGERALD, David Scott; ARAR, Rawan. The sociology of refugee migration. Annual Review of Sociology, v. 44, n. 1, p. 387-406, 2018. Available at: <https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-soc-073117-041204>.
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; Stepputat; Sørensen, 2014STEPPUTAT, Finn; SØRENSEN, Nina N. Sociology and forced migration. In: FIDDIAN-QASMIYEH, Elena et al. (Eds.). The Oxford handbook of refugee and forced migration studies. Oxford: Oxford University Press , 2014. p.86-98. ).

Outros termos foram inventados com base em considerações similares. O termo “migração de crise” enfatiza que a mudança climática pode deslocar pessoas em escala semelhante a uma guerra civil. Como a “migração de crise” ainda não está regulada por acordos internacionais, o debate teórico que faz referência a esse termo não precisa deixar de explorar a relação entre riscos e pobreza socioeconômica. McAdam (2014MCADAM, Jane. Conceptualizing “crisis migration”: a theoretical perspective. In: MARTIN, Susan F.;WEERASINGHE, Sanjula; TAYLOR, Abbie (Eds.). Humanitarian crises and migration: causes, consequences and responses. New York: Routledge, 2014. p. 28-49. ), por exemplo, argumenta que os riscos “naturais” se transformam em crises, primeiramente para indivíduos e comunidades socioeconomicamente vulneráveis. Do mesmo modo, a literatura sobre “migração mista” argumenta que os refugiados são frequentemente forçados a trabalhar e/ou usar a indústria de migração que atende os migrantes laborais, para finalmente alcançarem um refúgio seguro (Van Hear, 2009VAN HEAR, Nicholas. Managing mobility for human development. The growing salience of mixed migration. Human Development Research Paper, 2009/20. United Nations Development Programme, 2009. Available at: <http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdrp_2009_20.pdf>.
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). Dada a natureza mista dos fluxos migratórios, os formuladores de políticas que visam à indústria da migração (ilegal) também dificultam a proteção dos refugiados (Koser; Martin, 2011KOSER, Khalid; MARTIN, Susan. The migration-displacement nexus. In: KOSER, K.; MARTIN, S. (Eds.). The migration-displacement nexus: Patterns, Processes and Policies. New York: Berghahn Books , 2011. p. 1-13. ).

Enquanto o ACNUR teme que novas categorias enfraqueçam a proteção de refugiados, muitos pesquisadores temem que distinções legais improcedentes possam ser politicamente exploradas para desacreditar os refugiados. O fato de a migração ser “forçada”, em razão de perseguição ou desastre, ou “voluntária”, em busca de uma vida melhor, trata-se de uma distinção dicotômica importante para os formuladores de políticas. Mas, como Erdal e Oeppen (2018ERDAL, Marta Bivand; OEPPEN, Ceri. Forced to leave? The discursive and analytical significance of describing migration as forced and voluntary. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 6, p. 981-98, 26 abr. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1384149.
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) argumentam, a distinção é difícil de ser sustentada tanto em termos conceituais como empíricos (Stepputat; Sørensen, 2014STEPPUTAT, Finn; SØRENSEN, Nina N. Sociology and forced migration. In: FIDDIAN-QASMIYEH, Elena et al. (Eds.). The Oxford handbook of refugee and forced migration studies. Oxford: Oxford University Press , 2014. p.86-98. ). Há, é claro, casos extremos de refugiados que partem sem qualquer aviso e chegam diretamente a outro país onde solicitam asilo. Contudo, mais frequentemente, a perda de proteção é gradual, os refugiados partem ao atingirem um ponto crítico, e isso lhes toma um longo tempo em que atravessam várias etapas antes de acabarem como refugiados por longo tempo ou de conseguirem alcançar um refúgio seguro (Koser; Martin, 2011KOSER, Khalid; MARTIN, Susan. The migration-displacement nexus. In: KOSER, K.; MARTIN, S. (Eds.). The migration-displacement nexus: Patterns, Processes and Policies. New York: Berghahn Books , 2011. p. 1-13. ). Os migrantes forçados que, por várias razões, não podem requerer asilo devem usar outras categorias legais e são, então, erroneamente vistos como tendo migrado “voluntariamente” (Erdal; Oeppen, 2018ERDAL, Marta Bivand; OEPPEN, Ceri. Forced to leave? The discursive and analytical significance of describing migration as forced and voluntary. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 6, p. 981-98, 26 abr. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1384149.
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). Se observações empíricas apontam para um continuum complexo e “criação de status” (Robertson, 2018ROBERTSON, Shanthi. Status-making: Rethinking migrant categorization. Journal of Sociology, online first, 13 ago. 2018. Available at: <http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/1440783318791761>.
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), defender dicotomias taxativas pode beneficiar aqueles que querem, sobretudo, desacreditar os refugiados.

Esses debates conceituais são esclarecedores, mas permanecem dentro da comunidade de acadêmicos que se concentra nos refugiados e na migração “forçada”. De um modo geral, os estudos sobre migração têm seguido o conselho de Feller (2005DAHINDEN, Janine. A plea for the ‘de-migranticization' of research on migration and integration. Ethnic and Racial Studies, p. 1-19, 2016. Available at: <https://doi.org/10.1080/01419870.2015.1124129.
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) e evitado explorar continuidades conceituais e empíricas entre sociologia da migração e estudos sobre refugiados (como exceções, ver: Stepputat; Sørensen, 2014STEPPUTAT, Finn; SØRENSEN, Nina N. Sociology and forced migration. In: FIDDIAN-QASMIYEH, Elena et al. (Eds.). The Oxford handbook of refugee and forced migration studies. Oxford: Oxford University Press , 2014. p.86-98. ; FitzGerald; Arar, 2018FITZGERALD, David Scott; ARAR, Rawan. The sociology of refugee migration. Annual Review of Sociology, v. 44, n. 1, p. 387-406, 2018. Available at: <https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev-soc-073117-041204>.
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). Neste artigo, argumento que “descentralizar” os refugiados e analisá-los sob um marco geral de estudos sobre migração pode permitir entender melhor os modos pelos quais a categoria de refugiado é acessada e atribuída. A próxima seção apresenta uma abordagem de trajetória de vida para a migração e destaca suas implicações para o estudo sobre refugiados. Explorar as continuidades juntamente com as características distintivas entre migrantes e refugiados permite utilizar uma grande amostra de entrevistas narrativas com migrantes com formação universitária na Alemanha, Turquia e Canadá para contextualizar estudos de casos de migrantes que sofreram violenta perseguição (parte 2). Para evitar os debates conceituais acima mencionados, utilizo o termo “migrantes sob coação”2 2 This term is used for the empirical study only. We do not suggest using this term in conceptual debates. Nor do we want to negate the extreme differences between e.g. a Syrian fleeing from Aleppo and an Australian choosing to study in Germany. But since the category of “refugee” is already tainted by politicians contesting refugees’ truth claims, social scientists should do their job and contribute to the debate on the basis of clearly defined concepts, by a critical reflection of categories and through empirical findings (Bourdieu et al., 1991). 2 Este termo é usado apenas para o estudo empírico. Não recomendo usá-lo em debates conceituais. Tampouco pretendo negar as diferenças extremas entre, por exemplo, um sírio fugindo de Aleppo e um australiano escolhendo estudar na Alemanha. Mas, como a categoria “refugiado” já está contaminada por políticos que refutam a veracidade das alegações dos refugiados, os cientistas sociais devem fazer seu trabalho e contribuir para o debate com base em conceitos claramente definidos, por uma reflexão crítica de categorias e por descobertas empíricas (Bourdieu et al., 1991) para os migrantes da amostra que, embora tenham sofrido violência e perda da proteção por parte de seu país de origem, nem todos podem ser considerados “refugiados” no sentido legal do termo.

Estudos de caso comparativos desses migrantes sob coação confirmam que a categoria de “refugiado” é definida por regimes jurídicos e administrativos que seguem agendas ocultas de proteção para poucos refugiados e exclusão da maioria deles (parte 3). Neste contexto, destaco casos de migrantes que se esquivaram de buscar o status de refugiado, apesar de terem sofrido perseguição violenta e perda de proteção (parte 4). Esses casos podem explicar-se melhor através de uma abordagem sociológica da migração, ou seja, aceitando que o processo de se tornar refugiado e a necessidade de viver e/ou retomar uma vida interagem e se interpõem. O fato de os migrantes sob coação requererem ou não asilo e/ou receberem ou não proteção depende de distinções jurídicas, mas também é resultado de desigualdades estruturais globais e de diferentes graus de autonomia socioespacial (parte 5).

Estudos de migração e as instituições que regem as trajetórias de vida

O debate conceitual nos estudos sobre migração assemelha-se ao debate sobre os refugiados, na medida em que explora as opções de expansão conceitual, por exemplo, integrando migração a uma discussão sociológica mais ampla (Dahinden, 2016DAHINDEN, Janine. A plea for the ‘de-migranticization' of research on migration and integration. Ethnic and Racial Studies, p. 1-19, 2016. Available at: <https://doi.org/10.1080/01419870.2015.1124129.
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; Nieswand, 2016NIESWAND, Boris. Die Dezentrierung der Migrationsforschung. In: KAZZAZI, Kerstin; TREIBER, Angela; WÄTZOLD, Tim (Eds.). Migration - Religion - Identität. Aspekte transkultureller Prozesse. Wiesbaden: Springer VS, 2016. p. 283-297.). Em uma análise sociológica das desigualdades globais, Weiß (2017WEIß, Anja. Soziologie globaler Ungleichheiten. Berlin: Suhrkamp, 2017.; 2018WEIß, Anja. Contextualizing global inequalities. A sociological approach. In: KORZENIEWICZ, Roberto P. (Ed.). The World-System as unit of analysis: past contributions and future advances. New York: Routledge , 2018. p.75-85. ) apoia-se na abordagem das capacidades de Amartya Sen (1985SEN, Amartya. Commodities and capabilities. Nova York: North-Holland, 1985.) para argumentar que todos os seres humanos - migrantes e não migrantes - esforçam-se para melhorar suas oportunidades de vida. As capacidades não dependem apenas dos recursos que uma pessoa detém, mas esses recursos também devem ser reconhecidos e colocados em uso para aprimorar as capacidades. Assim, as relações contextuais são importantes para a validação dos recursos.

O destaque das relações contextuais na análise das capacidades é relevante para o estudo da migração. Se as relações contextuais são decisivas para a transformação de recursos em capacidades, pessoas que estão situadas em contextos mais privilegiados ou que podem escolher entre contextos, estão em melhor posição do que aquelas presas a contextos desfavoráveis. Weiß (2017WEIß, Anja. Soziologie globaler Ungleichheiten. Berlin: Suhrkamp, 2017.) denomina o acesso a relações contextuais superiores de “autonomia socioespacial”. Um baixo grau de autonomia socioespacial seria observado, por exemplo, em uma pessoa rica e instruída que está presa a um contexto que oferece pouco em termos de infraestrutura. Seria difícil para um profissional de TI trabalhar, enquanto sua cidade é bombardeada; até mesmo os médicos - que geralmente são vistos como necessários em qualquer lugar - não podem atingir seu pleno potencial sem água, medicamentos e eletricidade.

A autonomia socioespacial, assim como os recursos, constitui uma dimensão das desigualdades globais que estruturam posições sociais. O contexto não se limita apenas aos contextos territoriais e à mobilidade em busca de uma melhor infraestrutura. Mais frequentemente, as relações contextuais são de natureza política e social, o que as torna suscetíveis a disputas simbólicas e à exclusão política. Estados-nação não apenas protegem uma fronteira territorial, mas também incluem pessoas específicas como cidadãos - mesmo quando essas pessoas moram no exterior (Brubaker, 1992BRUBAKER, Rogers. Citizenship and nationhood in France and Germany. Cambridge: Harvard University Press, 1992.) e excluem não cidadãos - mesmo quando esses não cidadãos vivem no território do país há longo tempo3 3 Racial hierarchies serve a similar function as global systems of exclusion (Boatcă, 2015). 3 As hierarquias raciais desempenham uma função semelhante à dos sistemas globais de exclusão (Boatcă, 2015). . Assim, uma minoria étnica pode ser excluída da proteção de um Estado-nação, mesmo que nunca tenha se mudado. E, se a médica de Aleppo chega à Alemanha, ela pode não ser capaz de realizar seu potencial, porque a regulação profissional nacional proíbe que ela trabalhe como médica.

Além da exclusão ou inclusão política, a funcionalidade dos recursos depende das relações contextuais (Weiß, 2016WEIß, Anja. Understanding physicians’ professional knowledge and practice in research on skilled migration. Ethnicity & Health, v. 21, n. 4, p. 397-409, 2016. ). O administrador de uma empresa agrícola pode obter sucesso em um país periférico, mas ter dificuldades em traduzir suas competências em um contexto fortemente industrializado. A autonomia socioespacial, portanto, não deve ser equiparada apenas ao movimento geográfico. Um alto grau de autonomia socioespacial resulta da capacidade de mudar fisicamente os contextos, de alcançar politicamente o status de cidadão protegido e da versatilidade do portfólio de capital que uma pessoa detém (Weiß, 2017WEIß, Anja. Soziologie globaler Ungleichheiten. Berlin: Suhrkamp, 2017.).

Tanto a abordagem das capacidades quanto o conceito de autonomia socioespacial estão situados no domínio econômico. Então, à primeira vista, eles parecem lidar com um assunto muito diferente dos estudos sobre refugiados. Ambas as literaturas estão, no entanto, preocupadas com a complexa relação entre movimento geográfico e oportunidades de vida. Erdal e Oeppen (2018ERDAL, Marta Bivand; OEPPEN, Ceri. Forced to leave? The discursive and analytical significance of describing migration as forced and voluntary. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 6, p. 981-98, 26 abr. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1384149.
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) defendem os refugiados, argumentando que uma pessoa “forçada” a ficar em boa situação em casa pode não ter opção, mas ainda assim estará melhor do que uma pessoa que “escolhe” fugir “voluntariamente” no decorrer de uma trajetória de risco de vida.

Assim, a partir de um marco ampliado, pode-se chegar a um segundo passo, em que a diferença entre refugiados e migrantes é especificada no marco geral. Na Convenção de Genebra para Refugiados, um refugiado é definido como uma pessoa que tem

fundados temores de perseguição devido à sua raça, religião, nacionalidade, associação a determinado grupo social ou opinião política, encontra-se fora de seu país de origem e que, por causa dos ditos temores, não pode ou não quer fazer uso da proteção desse país (Artigo 1A (2), Convenção de 1951 sobre Refugiados)4 4 <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html>. 4 Disponível em: <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html>. .

Evidentemente, a convenção não trata apenas de “força” ou de falta de opções. Tampouco a violência por si só é suficiente para requerer asilo. Em vez disso, a Convenção de Genebra sobre Refugiados concentra-se em dois aspectos muito específicos em que a autonomia socioespacial pode ser comprometida: os refugiados estão tanto territorialmente fora do alcance das medidas de seu país de origem quanto politicamente desconectados de seu estado-nação.

Uma teoria geral da migração pode oferecer ainda outras percepções ao estudo de refugiados e de outros migrantes sob coação. Mesmo que a autonomia socioespacial dos refugiados esteja drasticamente comprometida, eles ainda são seres humanos, o que significa que buscam capacidades e tentam (re)obter acesso. Se a situação de refugiado for prolongada, os migrantes sob coação podem querer assumir uma nova cidadania e precisarão de contextos sociais em que seus recursos sejam validados. Enquanto os conceitos de “refugiado” e as literaturas sobre migração forçada ou de crise concentram-se nos pré-requisitos legais do status de refugiado, no momento do deslocamento e nas populações que precisam de apoio, a sociologia da migração estaria mais interessada em como o “tornar-se” refugiado é parte de um processo de mais longo prazo, que evoluciona para um momento crítico, e em como a busca de refúgio é um processo longo e gradual (Paul, 2011PAUL, Anju Mary. Stepwise international migration: a multistage migration pattern for the aspiring migrant American Journal of Sociology, v. 116, n. 6, p. 1842-86, 2011.)5 5 This is in line with recent literature in refugee studies such as Crawley and Skleparis (2018) who criticize the political implications of calling Syrians moving on to the EU after having tried to find protection in Turkey “transit migrants”. 5 Isso está em consonância com a literatura recente de estudos sobre refugiados, como Crawley e Skleparis (2018), que criticam as implicações políticas de denominar os sírios que se dirigem para a UE, depois de terem tentado encontrar proteção na Turquia, de “migrantes em trânsito”. .

Em um marco sociológico mais amplo da migração, os processos de busca de refúgio estão inseridos em estruturas institucionais que definem a trajetória de vida para além da regulamentação relativa a migração e refugiados. Schittenhelm (2005SCHITTENHELM, Karin. Soziale Lagen im Übergang. Junge Migrantinnen und Einheimische zwischen Schule und Berufsausbildung. Wiesbaden: VS Verlag für Sozialwissenschaften, 2005.) e Nohl et al. (2014NOHL, Arnd-Michael et al. Work in transition. Cultural capital and highly skilled migrants' passages into the labour market. Toronto: Toronto University Press, 2014.) argumentam que as trajetórias de vida podem ser estudadas como mudanças multidimensionais de status. Tanto migrantes quanto não migrantes passam pelo sistema educacional e tentam ingressar nos mercados de trabalho. Em segundo lugar, independentemente de migração, as pessoas estão envolvidas em relações sociais, de modo que a integração ao mercado de trabalho pode se sobrepor à transição para o casamento ou a maternidade/paternidade. É apenas em uma terceira dimensão da inserção institucional que os migrantes diferem das populações sedentárias: eles cruzam fronteiras nacionais (Tsianos; Karakayali, 2010TSIANOS, Vassilis.; KARAKAYALI, Serhat. Transnational migration and the emergence of the European border regime: an ethnographic analysis. European Journal of Social Theory, v. 13, n. 3, p. 373-87, 2010. ) e atravessam regimes de mobilidade (Schwarz, 2018SCHWARZ, Inga. Migrants moving through mobility regimes: the trajectory approach as a tool to reveal migratory processes. Geoforum, 16 mar. 2018. Available at: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0016718518300848>.
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). No caso dos migrantes, as duas primeiras dimensões das mudanças de status também interagem com uma transição entre instituições nacionalmente estruturadas (Nohl et al., 2014NOHL, Arnd-Michael et al. Work in transition. Cultural capital and highly skilled migrants' passages into the labour market. Toronto: Toronto University Press, 2014.). Esse é o caso, por exemplo, quando uma migrante não documentada regulariza seu status casando-se com um nativo. Isso lhe dá acesso a uma categoria de visto em que ela pode fazer uso parcial de sua educação como médica e ingressar no mercado de trabalho como enfermeira.

Como dispositivo jurídico, a Convenção sobre Refugiados não se preocupa com relações contextuais mais amplas, mas concentra-se em perseguições e na necessidade de proteção. Os direitos ao trabalho, moradia, educação e assim por diante estão previstos nos capítulos 3 e 4, mas a Convenção também reconhece que o acesso a esses direitos humanos básicos pode depender do tempo que os refugiados passam no país de asilo e de outros fatores. Na prática, os refugiados são frequentemente mantidos em um “estado de exceção” por um longo tempo (Koser; Martin, 2011KOSER, Khalid; MARTIN, Susan. The migration-displacement nexus. In: KOSER, K.; MARTIN, S. (Eds.). The migration-displacement nexus: Patterns, Processes and Policies. New York: Berghahn Books , 2011. p. 1-13. ; Agamben, 2014AGAMBEN, Giorgio. Die Souveränität der Macht und das nackte Leben. Frankfurt: Suhrkamp, 2014.; Jansen, 2016JANSEN, Bram J. “Digging aid”: the camp as an option in East and the Horn of Africa. Journal of Refugee Studies, v. 29, n. 2, p. 149-65, 2016. Available at: <https://doi.org/10.1093/jrs/fev018.
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). Quando desejam voltar a uma vida normal o mais rápido possível e trabalhar e/ou estudar, em vez de esperar em um acampamento, as sociedades dos países receptores não veem isso como uma tentativa de superar experiências traumáticas, mas como indicativo de abuso do status de refugiado (Sibum, 2010SIBUM, Helen. “Asylshopping” und “Flüchtlingswellen” - ein Vergleich des Migrationsdiskurses in Deutschland und Australien. Berlin: Logos-Verl., 2010. )6 6 Until recently, Germany did not allow asylum applicants to study German or to work. Today, administrators distinguish between those who have a chance to stay and other applicants. The latter are still excluded from integration courses (Bach et al., 2017). 6 Até recentemente, a Alemanha não permitia que os requerentes de asilo estudassem alemão ou trabalhassem. Hoje, os gestores distinguem entre aqueles que têm uma chance de permanecer e outros candidatos. Estes últimos ainda estão excluídos dos cursos de integração (Bach et al., 2017). .

O fato de os refugiados também estarem inseridos no mercado de trabalho e nas relações sociais é, certamente, reconhecido nos estudos sobre refugiados e migrantes de crise, mas principalmente para populações muito pobres e populações expostas, que são “forçadas” a trabalhar como parte da obtenção de proteção: “a migração laboral pode tornar-se a migração de asilo para as famílias mais pobres, se o propósito dessa migração for pensado de forma abrangente como a segurança de todo o agregado familiar, em lugar de estritamente uma fonte de proteção para um indivíduo” (Van Hear, 2009VAN HEAR, Nicholas. Managing mobility for human development. The growing salience of mixed migration. Human Development Research Paper, 2009/20. United Nations Development Programme, 2009. Available at: <http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdrp_2009_20.pdf>.
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, p. 15). Especialmente os refugiados pobres encontram dificuldades em obter proteção e precisam recorrer à migração laboral para proteger a si e aos seus familiares (Valenta; Jakobsen, 2017VALENTA, Marko; JAKOBSEN, Jo. Mixed migrations to the Gulf: an empirical analysis of migrations from unstable and refugee-producing countries to the GCC, 1960-2015. Refugee Survey Quarterly, v. 36, n. 2, p. 33-56, jun. 2017. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000404131600002>.
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).

Numa perspectiva mais geral, a relação entre perseguição violenta, recursos socioeconômicos e migração é provavelmente mais complexa. Williams (2015WILLIAMS, Nathalie E. Mixed and complex mixed migration during armed conflict: multidimensional empirical evidence from Nepal. International Journal of Sociology, v. 45, n. 1, p. 44-63, 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000217700100004>.
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) expande a abordagem da migração mista, com base em uma pesquisa representativa e dados históricos de eventos em um vale devastado pela guerra civil no Nepal. O vale é caracterizado por uma longa história de emigração. Ao contrário das expectativas, a violência continuada resultou em uma diminuição da emigração em comparação com os níveis pré-conflito, pois os caminhos de migração tornaram-se inseguros e as pessoas, que antes do conflito teriam emigrado, agora tentavam sobreviver em casa. Portanto, neste caso, a violência resultou em uma perda de autonomia socioespacial, porque nesse vale esta autonomia, em geral, tomou a forma de emigração territorial. Williams (2015WILLIAMS, Nathalie E. Mixed and complex mixed migration during armed conflict: multidimensional empirical evidence from Nepal. International Journal of Sociology, v. 45, n. 1, p. 44-63, 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000217700100004>.
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) também considera que a composição de emigrantes muda durante os picos de violência e, assim, propõe uma “hipótese complexa de migração mista”, argumentando que “não só fatores não relacionados a conflito influenciam a migração durante conflitos armados, como também a influência de tais fatores é diferente durante um conflito comparado ao seu antes” (Williams, 2015WILLIAMS, Nathalie E. Mixed and complex mixed migration during armed conflict: multidimensional empirical evidence from Nepal. International Journal of Sociology, v. 45, n. 1, p. 44-63, 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000217700100004>.
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, p. 45). Em sua opinião, a relação entre falta de proteção e migração é “complexa”, uma vez que é mediada por condições socioeconômicas.

Em suma, uma abordagem de trajetória de vida para a migração contribui para a compreensão dos fatores que estruturam o curso de vida dos refugiados, os quais extrapolam seu status legal. Os migrantes diferem dos não migrantes, na medida em que suas mudanças de status não se dão apenas entre educação e mercado de trabalho, e entre ser solteiro e começar uma família, mas também na necessidade de superar regimes de fronteira nacionais, um processo durante o qual pesam as vantagens e desvantagens colocadas pelos diversos contextos, no esforço para melhorar - ou, no caso dos refugiados, recuperar - a autonomia socioespacial. Os refugiados diferem da maioria dos outros migrantes não apenas porque migram sob condições de violência, mas também porque perdem o acesso territorial ao seu Estado-nação e à proteção política do mesmo. No entanto, como humanos, os refugiados também estão buscando melhores capacidades como parte de trajetórias biográficas familiares, educacionais e de carreira de longo prazo.

Apesar das importantes diferenças jurídicas entre refugiados e migrantes, algumas continuidades são esperadas. Muitas vezes, a perseguição violenta anda de mãos dadas com a deterioração de outros fatores contextuais - de ordem socioeconômica (Williams, 2015WILLIAMS, Nathalie E. Mixed and complex mixed migration during armed conflict: multidimensional empirical evidence from Nepal. International Journal of Sociology, v. 45, n. 1, p. 44-63, 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000217700100004>.
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, p. 46). O processo de busca de refúgio é frequentemente demorado e acontece através de uma série de migrações por etapas (Van Hear, 2009VAN HEAR, Nicholas. Managing mobility for human development. The growing salience of mixed migration. Human Development Research Paper, 2009/20. United Nations Development Programme, 2009. Available at: <http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdrp_2009_20.pdf>.
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; Crawley; Skleparis, 2018CRAWLEY, Heaven; SKLEPARIS, Dimitris. Refugees, migrants, neither, both: categorical fetishism and the politics of bounding in Europe’s “migration crisis”. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 1, p. 48-64, 2 jan. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1348224>.
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), durante as quais pode ser difícil distinguir entre as trajetórias de refugiados e de migrantes laborais (Toma; Castagnone, 2015TOMA, Sorana; CASTAGNONE, Eleonora. What drives onward mobility within Europe? The Case of Senegalese migrations between France, Italy and Spain. Population, v. 70, n. 1, p. 69-101, 2015. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000357141200004>.
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, Kelly; Hedman, 2016KELLY, Melissa; HEDMAN, Lina. Between opportunity and constraint: understanding the onward migration of highly educated Iranian refugees from Sweden. Journal of International Migration and Integration, v. 17, n. 3, p. 649-67, 2016. Available at: <https://doi.org/10.1007/s12134-015-0422-4.
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). Finalmente, os migrantes sob coação querem retomar a vida como todos os outros - o que, aliás, é importante para superar o trauma. Obter reconhecimento e poder continuar na busca de uma nova vida podem depender de fatores socioeconômicos, bem como dos contextos jurídicos e políticos em que eles ingressam.

Amostra e métodos

Em estudos sobre migração, a amostragem concentra-se, geralmente, em uma ou poucas etnias em um país de chegada. Como a migração é um processo gradual (Paul, 2011PAUL, Anju Mary. Stepwise international migration: a multistage migration pattern for the aspiring migrant American Journal of Sociology, v. 116, n. 6, p. 1842-86, 2011.) regido por regimes de fronteira altamente seletivos (Tsianos; Karakayali, 2010TSIANOS, Vassilis.; KARAKAYALI, Serhat. Transnational migration and the emergence of the European border regime: an ethnographic analysis. European Journal of Social Theory, v. 13, n. 3, p. 373-87, 2010. ), seria melhor incluir nas pesquisas países de emigração, de trânsito e de chegada, assim como todas as etnias. Nos últimos anos, amostras mais abrangentes incluindo várias etnias em mais de um país foram produzidas (Massey, 1987MASSEY, Douglas S. The ethnosurvey in theory and practice. The International Migration Review, v. 21, n. 4, p. 1498-522, 1987.), mas continuam sendo uma exceção (Recchi; Favell, 2009RECCHI, Ettori; FAVELL, Adrian (Eds.). Pioneers of European integration: citizenship and mobility in the EU. Cheltenham: Edward Elgared. 2009.; Crul et al., 2012CRUL, Maurice; SCHNEIDER, Jens; LELIE, Frans. The European Second Generation Compared: Does the Integration Context Matter? Amsterdam: Amsterdam University Press, 2012.; Wiesböck; Verwiebe, 2017WIESBÖCK, Laura; VERWIEBE, Roland. Crossing the border for a higher status? Occupational mobility of East-West commuters in the Central European Region. International Journal of Sociology, v. 47, n. 3, p. 1-20, 2017. ).

Os estudos sobre refugiados também tendem a se concentrar em um ou vários países de chegada, mas, ao contrário daqueles sobre migração, prestam mais atenção aos países de origem e a trajetórias de migração (Schwarz, 2018SCHWARZ, Inga. Migrants moving through mobility regimes: the trajectory approach as a tool to reveal migratory processes. Geoforum, 16 mar. 2018. Available at: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0016718518300848>.
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). Devido à dificuldade de atingir populações desprotegidas, amostras representativas são raras.7 7 A new panel of all asylum claimants in Germany studies not only their migration trajectories and values, but also their educational and vocational characteristics which will enable comparison to non-refugee migrants (Brücker et al., 2016). Still the panel focuses on integration in one state of arrival alone as in other kinds of migration and integration studies and it draws a clear line between asylum seekers and other migrants. 7 Um novo painel de todos os requerentes de asilo na Alemanha estuda não apenas suas trajetórias e valores migratórios, mas também suas características educacionais e profissionais que permitirão a comparação com migrantes não refugiados (Brücker et al., 2016). Ainda assim, o painel enfoca a integração em um único estado de chegada, como em outros tipos de estudos de migração e integração, e traça uma linha clara entre requerentes de asilo e outros migrantes. Tanto os pesquisadores que aplicam a definição de refugiados do ACNUR como aqueles que defendem uma abordagem mais abrangente excluem de sua amostragem migrantes que não precisam de apoio e proteção. Isso dificulta a compreensão das continuidades entre a migração forçada e a “voluntária” e a compreensão do processo pelo qual os migrantes sob coação obtêm e aceitam o rótulo de “refugiado” (Lacroix, 2004LACROIX, Marie. Canadian refugee policy and the social construction of the refugee claimant subjectivity: understanding refugeeness. Journal of Refugee Studies, v. 17, n. 2, p. 147-66, 2004. Available at: <https://doi.org/10.1093/jrs/17.2.147.
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).

Na tentativa de entender melhor as formas pelas quais os migrantes sob coação buscam proteção e como a categoria legal de “refugiado” se destaca em suas trajetórias de vida, este artigo revisita uma amostra de cerca de 200 entrevistas narrativas, resultantes de vários projetos de pesquisa qualitativa8 8 The largest pool of interviews stems from an international study group “Cultural Capital During Migration” funded by the VW-Foundation in the years 2005-2009” and headed by the author together with Arnd-Michael Nohl, Karin Schittenhelm and Oliver Schmidtke (Nohl et al., 2014). The interviews in Turkey were conducted and analyzed by Barbara Pusch (2010; 2011). I would also like to thank Samuel Mensah, Stella Müller and Ariana Kellmer for giving me access to interviews and analyses conducted by them in various contexts. 8 O maior grupo de entrevistas resulta de um grupo de estudo internacional “Capital Cultural durante a Migração” financiado pela Fundação VW nos anos de 2005-2009 e liderado pela autora juntamente com Arnd-Michael Nohl, Karin Schittenhelm e Oliver Schmidtke (Nohl et al., 2014). As entrevistas na Turquia foram conduzidas e analisadas por Barbara Pusch (2010; 2011). Gostaria também de agradecer a Samuel Mensah, Stella Müller e Ariana Kellmer por me darem acesso a entrevistas e análises conduzidas por eles em vários contextos. que a autora vem (co-)conduzindo ou supervisionando desde 2002. Todos os projetos se concentraram nas maneiras pelas quais migrantes com formação acadêmica obtêm reconhecimento dos recursos que possuem após se mudarem para outro país. Profissões, gênero e estatuto legal variaram muito, enquanto os migrantes mais jovens, entre 18 e 45 anos de idade, eram os preferidos na amostragem. Este artigo não apresenta resultados abrangentes das 200 entrevistas, mas usa esse conjunto para selecionar estrategicamente casos de migrantes sob coação, a fim de extrair conclusões com base em amostragem teórica (Glaser; Strauss, 1967GLASER, Barney; STRAUSS, Anselm L. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. Chicago: Aldine, 1967.).

Para explorar as continuidades entre migrantes e refugiados, a estrutura da amostra maior é ideal porque se concentra em migrantes com um grau razoável de recursos que, em teoria, deveriam dar-lhes algumas aspirações e opções na vida. Ao mesmo tempo, a amostra maior inclui cerca de 20 migrantes sob coação. Para muitos deles, a ameaça de violência era um motivo para migrar, mas nem todos solicitaram asilo. Isso se sobrepõe a casos de migrantes com um estatuto legal muito desfavorável, como imigrantes indocumentados e/ou solicitantes de asilo no momento da entrevista ou durante períodos mais longos de seu histórico de migração. Na amostra total, muitos migrantes sofreram um rebaixamento social e, nos casos analisados, este rebaixamento resultou principalmente da exclusão jurídica (Pajo, 2008PAJO, E. International migration, social demotion, and imagined advancement: an ethnography of socioglobal mobility. 2. ed. New York: Springer, 2008. ). Assim, um grupo central de refugiados autodeclarados e/ou legalmente aceitos pode ser comparado com uma amostra maior de outros migrantes que compartilham algumas características com casos centrais e/ou vivem em circunstâncias semelhantes.

Como discutido acima, a migração é um processo altamente seletivo e a categoria de refugiado é central e controversa na governança da migração. Portanto, é útil para os fins deste artigo que o grande grupo de entrevistas contenha não apenas migrantes entrevistados na Alemanha, mas também aqueles entrevistados em outros países, particularmente Canadá, Turquia e África do Sul. Entre os menores números de entrevistados, na Turquia (n = 20) e na África do Sul (n = 4), alguns falaram em não conseguir chegar à UE ou ao Canadá ou sobre retornar ao seu país em razão do racismo sofrido nos primeiros. Esses casos servem como contraponto para os migrantes sob coação que conseguiram chegar à Alemanha e ao Canadá.

A fim de mostrar o valor de uma abordagem sociológica à migração sob coação, os dados não devem se concentrar apenas nas decisões de migração, mas em toda a biografia do migrante. A técnica de entrevista empregada nos estudos é narrativa com perguntas semiestruturadas de acompanhamento. As entrevistas começam com o pedido inicial aos migrantes para contarem sua história de vida em detalhes. As perguntas de acompanhamento concentram-se em temas que eram relevantes para o estudo em particular e que os entrevistados não cobriram com detalhes suficientes durante a narração inicial. Além disso, dados sobre o contexto legal e institucional da migração foram coletados em entrevistas com especialistas, e através da análise de documentos relevantes e de material estatístico.9 9 For a comprehensive description of the legal situation in Canada, Turkey and Germany at the time, see Nohl et al. (2014, p. 101-121). 9 Para uma descrição abrangente da situação legal no Canadá, Turquia e Alemanha na época, ver Nohl et al. (2014, p. 101-121).

Os casos discutidos neste artigo são interpretados com a ajuda do método documental (Bohnsack, 2008BOHNSACK, Ralf. Rekonstruktive Sozialforschung: Einführung in qualitative Methoden. 8. ed. Opladen: Barbara Budrich, 2008.; Bohnsack et al., 2010BOHNSACK, Ralf.; PFAFF, Nicole; WELLER, Wivian (Eds.). Qualitative analysis and documentary method in international educational research. Opladen: Barbara Budrich , 2010.; Nohl, 2013NOHL, Arnd-Michael. Interview und dokumentarische Methode. Anleitungen für die Forschungspraxis. 4. ed. rev. Wiesbaden: VS Verlag, 2013.). A interpretação documental das entrevistas narrativas não apenas reconstrói aspectos explícitos da história de vida conforme apontados pelos próprios entrevistados. A interpretação também se concentra no conjunto implícito de conhecimento que molda as práticas cotidianas e está incorporado nelas. Por exemplo, um jovem migrante pode descrever sua decisão de migrar como voluntária, mas pode-se apreender de seu relato que seu grupo social foi perseguido e ele próprio foi atacado antes de sua mudança para o exterior. O método documentário permite, assim, uma distinção analítica entre autoteorizações explícitas e conhecimento implícito, o qual é reconstruído através de uma comparação entre narrativas. Ambos os níveis de análise são validados e ambos contribuem para os resultados.

Os estudos de caso deste artigo são apresentados em duas etapas. Na próxima seção, dois casos de requerentes de asilo na Alemanha são comparados. Ambos deixaram seus lares em resposta à perseguição, mas enquanto um deles fugiu de uma maneira que converge com as expectativas subjacentes à Convenção de Genebra e às regras administrativas alemãs, o outro caso diverge em vários aspectos dos dispositivos legais e administrativos. Na quarta parte, migrantes que poderiam ser abrangidos pela Convenção, mas que se abstiveram (parcialmente) de requerer asilo, são incluídos na comparação. Eles foram encontrados na Turquia e no Canadá. Entre outras coisas, a comparação mostra que aqueles com melhores recursos e um maior grau de autonomia socioespacial podem, se bem informados, encontrar melhores opções para alcançar proteção.

O processo de busca de refúgio e os dispositivos legais e administrativos para a proteção de refugiados

Quando a Convenção de Genebra sobre Refugiados foi adotada, em 1951, ela respondia à perseguição política em larga escala durante a Segunda Guerra Mundial e limitava-se geográfica e temporalmente a proteger pessoas que buscavam refúgio de eventos na Europa antes de 1951. As restrições temporais e geográficas foram levantadas pelo protocolo relativo ao status dos refugiados em 196710 10 <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html> 10 Disponível em: <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html>. , mas as suposições subjacentes sobre como as pessoas se tornam refugiadas permaneceram as mesmas.

A proteção internacional a refugiados é complementada por dispositivos legais e administrativos nacionais. Na Alemanha, por exemplo, o parágrafo 16a da constituição afirma que os indivíduos politicamente perseguidos têm direito ao asilo. Até a década de 1980, o refugiado típico na Alemanha era um dissidente do comunismo que havia cruzado a fronteira como parte de uma delegação oficial. Quando os números aumentaram e os requerentes de asilo deixaram de ser dissidentes individuais, mas eram, por exemplo, refugiados da Iugoslávia destroçada pela guerra civil, houve um intenso debate público e, em 1994, uma emenda à constituição foi aprovada, determinando que as pessoas vindas de países terceiros seguros poderiam ser devolvidas a esses países e deveriam requerer asilo lá.

Na grande amostra utilizada, mais de uma dúzia de entrevistados, em sua maioria na Alemanha, identificaram-se explicitamente como refugiados no momento da entrevista ou em sua narrativa biográfica. Um exame mais atento de alguns desses casos confirma uma opinião frequentemente verbalizada (Koser; Martin, 2011KOSER, Khalid; MARTIN, Susan. The migration-displacement nexus. In: KOSER, K.; MARTIN, S. (Eds.). The migration-displacement nexus: Patterns, Processes and Policies. New York: Berghahn Books , 2011. p. 1-13. , p. 7) de que as circunstâncias históricas da Convenção de Genebra, bem como sua administração nos estados nacionais, podem não se adequar à realidade empírica de muitos refugiados hoje. O Sr. Ibezim11 11 Names and other details have been changed. In some cases, we felt it necessary to obscure the country of origin. 11 Os nomes e outros detalhes foram alterados. Em alguns casos, sentimos a necessidade de ocultar o país de origem. se encaixa no modelo de refugiado político para o qual a legislação alemã é formulada, enquanto o Sr. Mammad representa os refugiados - mais frequentes - que divergem dela.

O Sr. Ibezim foi entrevistado em 2006, três anos depois de ter entrado na Alemanha. Algum tempo depois da entrevista ele foi oficialmente reconhecido como refugiado. Em seu país africano, o Sr. Ibezim trabalhava em um setor econômico que era alvo de muitas críticas internacionais por prejudicar o meio ambiente, matar seus críticos e por sua corrupção desenfreada. O Sr. Ibezim foi treinado por uma agência de desenvolvimento alemã que desejava apoiar profissionais em seus esforços para combater esse tipo de má prática. Uma conferência dessa agência na Alemanha possibilitou-lhe entrar no país diretamente e legalmente, por via aérea, e pedir asilo após sua chegada.

Durante o curto período de tempo em que circulou pelas ruas da Alemanha comparando suas opções, ele conheceu compatriotas que o encorajaram a reivindicar uma falsa nacionalidade. Eles o informaram de que as chances de aceitação eram muito baixas para sua nacionalidade, mas alegou na entrevista que preferiu ficar com a verdade. Não é possível controlar até que ponto esse relato é verdadeiro, mas o modo como ele se apresenta na entrevista atesta o fato de ele ser hábil em lidar com as suspeitas por parte das autoridades de imigração.

Em todos esses pontos, o Sr. Ibezim se adequa à experiência histórica e expectativas da Alemanha em relação a requerentes de asilo: assim como ativistas políticos da Europa Oriental durante a Guerra Fria, ele entrou na Alemanha legalmente e, em seguida, pediu asilo. Esses ativistas, muitas vezes famosos, conquistaram grande respeito por sua postura correta e o asilo normalmente foi concedido. Isso também significa que o caso do Sr. Ibezim se insere em um vazio regulatório. Como mencionado, a emenda constitucional de 1994 determinou que países terceiros seguros deveriam ser responsáveis pelos procedimentos em relação aos refugiados. Desde então, todos os países vizinhos têm sido considerados seguros e a Alemanha “ex-territorializou” os controles de fronteira para as companhias aéreas, a fim de garantir que ninguém possa entrar em um avião para a Alemanha sem um visto adequado. O fato de a Alemanha ainda ter precisado processar um grande número de requerentes de asilo resultou da entrada ilegal desses no país e/ou da “perda” de seus documentos no processo. Isso garantiu que a Alemanha tivesse que processar seus requerimentos, pois se desconhecia por qual país haviam entrado ou para qual poderiam ser deportados. Isso, evidentemente, fragilizou a credibilidade de suas reivindicações.

O Sr. Ibezim é um caso excepcional de um refugiado que conseguiu entrar legalmente na Alemanha, diretamente de seu distante país de origem, com um visto de participação em uma conferência, apesar de estar sob ameaça lá. Ele também é uma exceção, na medida em que pode seguramente afirmar estar em conformidade com todos os preceitos legais e que, de fato, recebeu a proteção de que precisa. Pode-se, portanto, tomar seu caso como um teste para explorar a asserção de que uma abordagem de trajetória de vida pode oferecer insights sobre o processo de se tornar um refugiado. Um exame mais aprofundado da entrevista permite perceber que o Sr. Ibezim não se preocupa apenas com a perseguição e questões legais. Ao descrever o momento em que partiu, ele menciona que fora casado por pouco tempo, mas que estava, de outro modo, sem relações sociais, o que facilitou sua saída. O Sr. Ibezim também detalha suas realizações profissionais e deseja ter um bom desempenho no mercado de trabalho. Depois de requerer asilo, ele ficou surpreso ao saber que a Alemanha fez de tudo para deportá-lo, em vez de considerar a contribuição que ele poderia dar ao país. Ambos os pontos confirmam que, mesmo para um refugiado em conformidade com as leis de asilo internacionais e alemãs, em grande medida sua vida pessoal e sua identidade profissional são importantes tanto para a decisão de fugir como para a forma como se posiciona no país de acolhimento.

Para a maioria dos requerentes de asilo encontrados na Alemanha, a fuga é um processo muito mais complicado e de longo prazo (Brücker et al., 2016BRÜCKER, Herbert et al. IAB-BAMF-SOEP-Befragung von Geflüchteten: Flucht, Ankunft in Deutschland und erste Schritte der Integration. IAB-Kurzbericht, n. 24, p. 2016. Available at: <http://doku.iab.de/kurzber/2016/kb2416.pdf>.
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). O caso do Sr. Mammad é discutido em comparação com o do Sr. Ibezim, porque o primeiro, sem dúvida, foge da perseguição, mas diverge de vários dispositivos da Convenção de Genebra e dos regulamentos administrativos alemães. O Sr. Mammad vem de um país formado após a dissolução da União Soviética. Pouco depois, 20% de seu território foi perdido:

tivemos de deixar nossa casa e a família toda sair apenas com as roupas do corpo. Tínhamos uma casa própria, de dois andares, e uma chácara com cerca de um hectare e tivemos que partir, porque os tanques chegaram. […] Algumas pessoas estavam doentes e ficaram […] perdemos tudo, todos os nossos documentos e eu havia estudado durante cinco anos na Ucrânia […] e esse diploma ficou lá e passamos por um rio […] e depois de cerca de um quilometro você vê que sua casa já está queimando, nossa casa já queimada, isto foi muito difícil, diante dos seus olhos isso acontecer, isto é, psicologicamente e tudo isso, eu tenho cerca de 40 anos de idade, meu cabelo está todo branco.

O relato do Sr. Mammad é vívido e deixa evidente que partir era uma questão de vida ou morte. Em comparação com o Sr. Ibezim, suas opções futuras parecem muito mais limitadas, porque ele perde seu diploma e, como se revela mais tarde, sua empregabilidade no trajeto de fuga. Se poderá ou não contribuir para a prosperidade do país que o recebe não é algo que ele esteja considerando.

Neste momento, pode-se ver o Sr. Mammad como uma pessoa deslocada (displaced), mas ele (ainda) não se conforma à definição legal de refugiado, porque foge para um campo de refugiados na recém fundada república. No campo, ele e outros logo percebem que não são bem tratados por seu “próprio” novo país. Eles protestam e depois que o Sr. Mammad testemunha a violência policial contra outro manifestante, ele e sua família fogem novamente. Nessa altura, o Sr. Mammad toma uma decisão mais consciente. Uma vez que ele suspeita de que a Rússia poderia devolvê-lo, seu principal objetivo é chegar a qualquer país democrático. A maneira como chegou à Alemanha não foi detalhada, mas insinuações sugerem o caminho então predominante, ou seja, a entrada ilegal com a ajuda de traficantes. No momento da entrevista, seu caso ainda estava sendo processado. Como seus dois filhos apresentam uma enfermidade crônica, é provável que ele receba proteção humanitária.

Do ponto de vista da proteção a refugiados, o caso do Sr. Mammad é dúbio em vários aspectos: o primeiro deslocamento violento pode ser visto como “interno” para um novo estado nacional. Seu segundo movimento poderia ser qualificado como “voluntário”, porque ele também poderia ter ficado em um campo no “seu” país. Do ponto de vista da Alemanha, seu caso também poderia ser processado em um terceiro país seguro, além disso, o caso abala o regime alemão por ocultar o caminho tomado. Finalmente, a proteção que ele provavelmente receberá depende mais da má saúde de seus filhos, do que da perseguição violenta e da falta de proteção que transformou a família em refugiada.

Ambos os casos lançam alguma luz sobre as “decisões” consecutivas que os refugiados tomam na tentativa de conduzir suas vidas e escolher a melhor das más opções. A maior parte deles mostra que a complexidade da busca de refúgio não é suficientemente captada pelos dispositivos legais e administrativos que transformam refugiados como o Sr. Mammad em requerentes de asilo prontos a recorrer a meios semilegais. Pode-se concluir que a atribuição do status de refugiado não depende apenas de questões legais, mas também de outros fatores. Este último ponto pode ser aprofundado com a ajuda de uma amostra mais ampla e de uma teoria da migração mais abrangente.

Dotação de recursos e capacidade ou necessidade de reivindicar status de refugiado

Após confirmar que as definições jurídicas e administrativas do status de refugiado podem divergir dos padrões empíricos de busca de refúgio, examinarei mais de perto os casos contrastantes encontrados em outros países de destino. Isso permite compreender melhor a seletividade da migração e as desigualdades socioeconômicas que resultam em trajetórias de migração conformes e não conformes à Convenção de Genebra. Também explica por que alguns migrantes não se veem como refugiados, embora sua migração tenha ocorrido em resposta à violência e à falta de proteção em seu país de origem.

Em contraste com os casos discutidos acima que chegaram à Alemanha, o Sr. Young foi entrevistado na Turquia, em 2005, onde permaneceu por 15 anos, apesar das contínuas tentativas de migração para a Europa.12 12 Mr Young was interviewed in English, a second language to him and the interviewer, Barbara Pusch. For a discussion of the situation of refugees in Turkey see Pusch (2010). 12 O Sr. Young foi entrevistado em inglês, uma segunda língua tanto para ele como para a entrevistadora, Barbara Pusch. Para uma discussão sobre a situação dos refugiados na Turquia, ver Pusch (2010). Antes de entrar na Turquia, ele estudou direito e relações internacionais na União Soviética com a ajuda de uma bolsa de estudos concedida por seu país de origem, Ruanda. Ele diz que, em 1991, quando estava prestes a concluir seus estudos, aquela “era uma época em que a guerra civil em Ruanda era muito, muito perigosa. Não havia como voltar quando eu terminasse minha universidade”. Seu país o chamou de volta para que se juntasse ao exército. Quando se recusou a fazê-lo, sua bolsa de estudos foi descontinuada. Sem pagamento, a universidade russa que frequentava não o deixou fazer o exame final.

Nessa situação, ele visitou vários consulados em Moscou em uma vã tentativa de obter um visto de estudante para qualquer país da Europa Ocidental. Ele então se mudou para a Turquia, na esperança de uma passagem de fronteira ilegal para a UE, o que também não conseguiu. Os consulados da Europa Ocidental mais uma vez rejeitaram seu pedido, levando-o a assumir a vida de imigrante indocumentado e ilegal encalhado na Turquia. Ele começa a trabalhar e, por ser muito visível sendo um homem negro, é preso repetidas vezes, mas sempre solto após um curto período de tempo, voltando a trabalhar. Depois de dois anos, o clima político muda para pior e ele é deportado para um campo no leste da Turquia, onde mal consegue sobreviver. Depois de organizar uma fuga bem-sucedida de volta a Istambul, ele é preso mais duas vezes. No momento da entrevista, ele já estava há 15 anos na Turquia sem poder seguir em frente.

De uma perspectiva jurídica e considerando que o Sr. Young estivesse de fato estudando direito e relações internacionais na época, seria de esperar que ele solicitasse asilo. Dado que estava ocorrendo um genocídio em Ruanda - que ele eufemisticamente chama de “guerra civil” - e que fora chamado de volta para se juntar ao exército, ele deve ter sentido o bem fundado temor de perseguição e falta de proteção que a Convenção dos Refugiados exige. Mas, em sua narrativa introdutória, ele está preocupado em continuar seus estudos. “E então, eu senti que poderia ter a sorte de ir para a Europa e terminar a faculdade, terminar o meu curso”. Só mais tarde o Sr. Young tenta reivindicar oficialmente o status de refugiado.

Examinando-se a perspectiva biográfica do Sr. Young, a relutância em reivindicar asilo pode ser facilmente explicada. No momento em que se transforma em refugiado, ele ainda se vê como um estudante. Tendo quase concluído uma formação acadêmica, ele é rico em capital cultural. Embora considere que seria uma sorte ir para a Europa, não é despropositado, para ele, tentar continuar sua educação acadêmica lá. Ao mesmo tempo, a aceitação como requerente de asilo não teria melhorado sua sorte. Até recentemente, a Turquia não aceitava refugiados de origem não europeia e os refugiados registrados não podiam trabalhar legalmente. O ACNUR registrou refugiados na Turquia, mas a principal oferta da agência era o realojamento em outro país, após longos períodos de espera (Pusch, 2011PUSCH, Barbara. Irreguläre Migration in die Türkei. Facetten, Zahlen und Tendenzen. In: PUSCH, Barbara; TEKIN, Uğur (Eds.). Migration und Türkei. Neue Bewegungen am Rande der Europäischen Union. Würzburg: Ergon und Orient-Institut Istanbul, 2011. p. 153-70.). Assim, reivindicar asilo não ajudaria o Sr. Young a continuar seus estudos. Ele, portanto, primeiro tenta obter um visto de estudante, depois tenta chegar ilegalmente à Europa, o que o colocaria na mesma posição em que encontramos o Sr. Mammad e, apenas como último recurso, ele se registra no ACNUR.

O Sr. Young não é o único migrante sob coação que se abstém de reivindicar o status de refugiado. A Sra. Goudareva13 13 Ms. Goudareva was interviewed in English by Oliver Schmidtke and Beatrice Marry. 13 A Sra. Goudareva foi entrevistada em inglês por Oliver Schmidtke e Beatrice Marry. também foi entrevistada em 2005, mas, ao contrário do Sr. Young, chegou ao Canadá com a ajuda do sistema de pontos canadense. Vinda de uma guerra na Chechênia, sua narrativa é semelhante à dos refugiados, mas ela nunca se identifica como tal:

Ok, eu sou do sul da Rússia e quando tudo começou na Chechênia, eu comecei a me perguntar o que eu vou fazer… ahm… Sou uma engenheira química de formação - eu tenho mestrado… e eu trabalhei em uma instalação militar por sete anos. Então, em 1991… '90… sim, '91… o governo começou a cortar todo o financiamento e tivemos cada vez menos contratos e ficou perigoso no país. […] Eu então comecei meu próprio negócio. […] E em 1998, muitas coisas aconteceram de uma vez: eu me divorciei; tudo desabou no país e ... ah ... seis ou sete pessoas muito próximas ... ahm ... amigos e familiares morreram em situações muito diferentes. Dois foram assassinados, um teve um ataque cardíaco, sabe?, e eu comecei a pensar seriamente em emigrar. Eu me candidatei e havia apenas dois países disponíveis, Nova Zelândia e Canadá, para a imigração profissional. Eu não tenho parentes no exterior e escolhi o Canadá. Porque tem um clima mais parecido e é melhor, é longe.

Em muitos aspectos, o relato da Sra. Goudareva é comparável com o dos requerentes de asilo na Alemanha ou na Turquia. Ela nunca havia considerado emigrar antes de a situação política na Chechênia e sua vida pessoal se deteriorarem dramaticamente. Então, ela simplesmente quer partir, ou seja, não tem um destino específico em mente, mas apenas pesquisa quais são suas opções legais de destino.

Depois desse ponto, os relatos começam a divergir drasticamente. Em contraste com o Sr. Young (mas da mesma forma que o Sr. Mammad e o Sr. Ibezim), ela possui formação acadêmica. Ao contrário dos outros três, ela tem tempo e recursos financeiros para se candidatar à imigração profissional - o que inclui viajar para Paris, onde ela deve passar por uma entrevista. Ela consegue obter acesso como migrante profissional para o Canadá, apesar de já não ser jovem e de saber muito pouco inglês e francês. Parece que a diferença decisiva entre a Sra. Goudareva e os outros é que ela é privilegiada em seus recursos financeiros e tem a capacidade e o tempo para coletar informações não de boca a boca, mas informações confiáveis sobre alternativas legais para reivindicar asilo14 14 The opposite is the case for another interviewee in Germany. Mr. Ahmad from Pakistan had the bad luck of not only being an IT-professional, but also a political activist. As he was politically persecuted he applied for asylum and ended up in a dead-end street, when he could have gained a green card for IT-professionals had he been better informed. 14 O oposto é o caso de outro entrevistado na Alemanha. Ahmad, do Paquistão, que teve a má sorte de não apenas ser um profissional de TI, mas também um ativista político. Por ser politicamente perseguido, ele requereu asilo e acabou em um beco sem saída, quando poderia ter ganhado um green card para profissionais de TI se tivesse sido mais bem informado. .

Além do dinheiro, do tempo e da capacidade de buscar informações, também podemos suspeitar que o racismo desempenhe um papel na estruturação das opções dos migrantes. Isso fica evidente pelo contraste entre o Sr. Young e o Sr. Fagan,15 15 Mr. Fagan was interviewed in English by Oliver Schmidtke and Beatrice Marry. 15 O Sr. Fagan foi entrevistado em inglês por Oliver Schmidtke e Beatrice Marry. um sul-africano branco que entrou no Canadá com a ajuda do sistema de pontos. Perguntado sobre quando a ideia de deixar o seu país passou por sua cabeça, o Sr. Fagan responde:

Hum, eu tinha isso em mente porque meu irmão tinha ido embora e minha irmã tinha ido embora, e era um lugar onde havia tanta maldade, e até mesmo porque, mesmo se você não fosse racista, por causa das mudanças, se você não fosse africano, as pessoas, que talvez tivessem sido abusadas anos atrás, não paravam para checar se você era um cara branco legal ou não, elas simplesmente tinham essa animosidade // mmh // fui assaltado e esfaqueado e isso foi meio que o fim [...] Bem, não foi realmente o fim porque eu saí no dia seguinte e comprei para minha esposa e para mim uma arma para cada um, então passamos alguns meses andando por aí carregando armas, pensando que nós, finalmente pensamos “Isso é ridículo” [...] E meu irmão estava em Calgary, dizendo como era legal lá [...] Então, finalmente, nós decidimos tentar.

À primeira vista, o Sr. Fagan se enquadra, pelo menos tanto quanto os demais casos discutidos neste artigo, na categoria de refugiado. Ele sobreviveu a um ataque direto contra sua vida. Como os outros, ele vivencia uma deterioração geral de seu grupo étnico antes da última gota que o faz partir. Mais tarde, na entrevista, fica-se sabendo que ele emprega uma estratégia de migração semilegal de tentativa e erro, assim como muitos refugiados.

Apesar dessas semelhanças, o Sr. Fagan nunca descreve a si mesmo como um refugiado nem reivindica asilo. Isso está de acordo com uma visão jurídica que afirma que seu país de origem, a África do Sul, tenta proteger todos os cidadãos, inclusive os brancos, da violência. Também corresponde à sua perspectiva biográfica subjetiva, segundo a qual ele era jovem, queria se afastar dos negócios da família e seguir seu irmão em uma tentativa de explorar o mundo. Dito isto, a análise reconstrutiva mostra que ele tinha um receio fundado de violência em grupo. Na época de sua emigração, o apartheid acabara de terminar e não estava claro se os sul-africanos brancos acabariam sendo renegados como no vizinho Zimbábue ou se continuariam recebendo proteção de seu país. Além disso, ele realmente se tornou alvo da violência racial. O fato de o Sr. Fagan estar disposto a desistir de uma posição na qual gerenciava 300 trabalhadores para trabalhar ilegalmente no Reino Unido e como vendedor no Canadá pode ser explicado como uma aventura juvenil, mas também pode apoiar a perspectiva de que ele tenha migrado sob algum grau de coação. Pode-se concluir, portanto, que este é um caso contraintuitivo de um migrante forçado que não se vê como tal.

Este caso novamente aponta para as inequidades que estruturam a obtenção ou não do status de refugiado pelos migrantes. Ao contrário do jovem negro ruandês, Sr. Young, que não consegue obter um visto da UE para continuar seus estudos, o sul-africano branco, Sr. Fagan, não encontra problemas para migrar para a Grã-Bretanha e trabalhar lá ilegalmente:

Quando eu me candidatei inicialmente, na África do Sul, através do Alto Comissariado Canadense, eles disseram que havia uma lista de espera de quatro ou cinco anos para ser processada, ‛então nós entraremos em contato com você’ [risos]. Então, eu saí da África do Sul e fui para a Inglaterra e me candidatei da Inglaterra para emigrar para o Canadá e para a Bélgica, então, em cinco meses, minha candidatura canadense foi aceita, hum, já que foi a primeira eu aceitei e nós chegamos aqui em 95, depois de morar na Inglaterra por cerca de um ano e meio. Minha esposa estava em uma licença de trabalho para jovens, então ela estava trabalhando legalmente, eu trabalhava ilegalmente, apenas me virando.

Em termos jurídicos, o Sr. Fagan nunca será um refugiado. Tampouco ele tem motivos para se ver buscando refúgio. Ele pertence à categoria de pessoas bem-dotadas de recursos e que podem, portanto, usar outros canais de migração, mesmo quando são forçados a sair. Sua autonomia socioespacial não é restringida por seu passaporte nem pelo racismo.

Depois de estabelecer que a legislação e a administração da concessão de asilo muitas vezes se contrapõem às realidades da busca de refúgio, esta seção discutiu casos de vários migrantes que partiram sob coação, mas não se viam refugiados nem pediram asilo. O fato de evitarem o status de refugiado não resulta apenas da quantidade relativamente elevada de recursos de que alguns deles dispõem. Também reflete diferentes padrões de autonomia socioespacial. Como profissionais brancos bem informados, a Sra. Goundareva e o Sr. Fagan podem acessar o sistema canadense de imigração altamente qualificada e sequer mencionam a opção de buscar refúgio. Em contraste com eles, o Sr. Young teve que aprender da maneira mais difícil que o status de refugiado é a única opção disponível para um homem negro sem um diploma universitário, que não conseguiu atravessar ilegalmente o Mediterrâneo.

Conclusão

Há muita controvérsia, envolvendo a legislação, a prática administrativa, o discurso público e as ciências sociais empíricas, em relação a considerar um migrante sob coação como refugiado. Pesquisadores que examinam as continuidades entre refugiados e outros migrantes podem, involuntariamente, contribuir para debilitar ainda mais a proteção aos refugiados. O oposto também poderia ocorrer, se houver lacunas entre a realidade empírica da busca de refúgio e as pré-condições legais para sua obtenção: analistas políticos e públicos veem essas lacunas e as exploram para desacreditar os refugiados (Crawley; Skleparis, 2018CRAWLEY, Heaven; SKLEPARIS, Dimitris. Refugees, migrants, neither, both: categorical fetishism and the politics of bounding in Europe’s “migration crisis”. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 1, p. 48-64, 2 jan. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1348224>.
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; Erdal; Oeppen, 2018ERDAL, Marta Bivand; OEPPEN, Ceri. Forced to leave? The discursive and analytical significance of describing migration as forced and voluntary. Journal of Ethnic and Migration Studies, v. 44, n. 6, p. 981-98, 26 abr. 2018. Available at: <https://doi.org/10.1080/1369183X.2017.1384149.
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).

Neste contexto, argumento neste artigo que uma abordagem mais ampla da migração pode contribuir para a compreensão das formas em que a categoria refugiados é usada e apropriada pelas administrações, mas também pelos próprios refugiados. Fiz uso de uma grande amostra multipaíses, de migrantes detentores de diplomas acadêmicos, para contextualizar casos de migrantes sob coação, ou seja, migrantes que sofreram perseguição violenta e falta de proteção, mas que nem sempre solicitaram o status de refugiado e nem sempre o receberam.

Os resultados confirmam que a experiência de perseguição violenta e de falta de proteção constitui apenas um fator, que em si não é decisivo para o fato de uma pessoa se tornar um refugiado em termos legais. De fato, casos da Alemanha mostram que os dispositivos legais e administrativos impedem a maioria dos que buscam refúgio de chegar ao país e apenas uma minoria daqueles que chegam à Alemanha precisando de proteção são protegidos como refugiados.16 16 The protection rate varies. Summing up several years, more than a third of applicants are refused. Among those who do receive some kind of protection, other legal attributes are frequent, so that only a minority receives recognition as refugee (Bundesamt Für Migration Und Flüchtlinge, 2018, p. 50). 16 A taxa de proteção varia. Resumindo vários anos, mais de um terço dos candidatos são recusados. Entre aqueles que recebem algum tipo de proteção, outros atributos legais são frequentes, de modo que apenas uma minoria recebe reconhecimento como refugiado (Bundesamt für Migration und Flüchtlinge, 2018, p. 50). O caso do Sr. Mammad foi discutido para exemplificar uma maioria de requerentes de asilo que provavelmente usaram meios clandestinos para entrar na Alemanha e que dificilmente receberão proteção como refugiados. Em contraste com os dispositivos legais, centrados em uma “situação” de ser perseguido e estar desprotegido, buscar refúgio foi um processo gradual para o Sr. Mammad e é difícil estabelecer qual país deve ser responsável por ele. Na Alemanha, as redefinições da categoria de refugiado servem para reduzir o número de concessões legais de asilo e são usadas para minar a credibilidade dos refugiados.

Neste contexto, o estudo aplicou uma abordagem sociológica mais abrangente à migração para contextualizar casos de migrantes sob coação. Nesse cenário, a busca de refúgio está inserida em uma trajetória de vida, durante a qual as pessoas que precisam de proteção como refugiadas também buscam outros objetivos. Isso foi mostrado para o caso do Sr. Ibezim, que é evidentemente um refugiado em termos legais e em termos sociológicos, assim como em sua autodescrição. Em outros estudos de caso, as pré-condições para se tornar um refugiado tornaram-se mais aparentes. Examinando os casos de migrantes sob coação que não reivindicaram ou não conseguiram asilo, mostrei que a (auto)atribuição da categoria de refugiado e a descoberta de um refúgio seguro também dependem dos recursos que uma pessoa detém e da sua autonomia socioespacial.

Em termos de recursos, informações válidas e tempo para comparar opções, bem como dinheiro e formação acadêmica permitem que os migrantes sob coação nem sequer considerem um pedido de asilo. Outro fator foi denominado de autonomia socioespacial, ou seja, a capacidade de permanecer em um contexto bem equipado ou de procurar um melhor. Os refugiados estão territorial e politicamente desconectados de seu estado de nacionalidade, mas também podem sofrer outras restrições de autonomia socioespacial. Como um ruandês negro, Sr. Young viu que era impossível entrar na UE, mesmo ilegalmente, enquanto o sul-africano branco, Sr. Fagan menciona, ademais, que passou algum tempo trabalhando ilegalmente no Reino Unido antes de obter um visto canadense. Isso aponta para a possível relevância da estratificação racial para encontrar proteção.

Devido ao pequeno número de casos, uma análise sistemática de todas as instituições, recursos e relações contextuais que impactam o processo de se tornar um refugiado não pôde ser alcançada neste estudo. No entanto, forneceu apoio empírico para a alegação de que a trajetória de vida dos refugiados e os pré-requisitos para alcançar o status de refugiado merecem mais atenção se quisermos entender quem “se torna” um refugiado. Embora possa ser vital para os mais vulneráveis alcançarem o status de refugiado, os mais bem-dotados podem ter boas razões para fugir disso. Entre aqueles que migram sob coação, as formas e a extensão em que podem obter proteção, retomar uma vida normal e expandir suas capacidades não se bifurcam entre as opções de ser um refugiado ou não. Ao contrário, as opções são estruturadas por desigualdades globais, ou seja, são drasticamente desiguais, dependendo dos recursos que um migrante detém, mas também do país de origem, identidade racial e mero acaso.

Permitir uma sobreposição parcial entre refugiados e migrantes também permite ver os refugiados não apenas como vítimas passivas, mas também como agentes que querem voltar a “conduzir a vida”. Pesquisas futuras devem apoiar-se nas literaturas que afirmam uma “autonomia de migração” (Papadopoulos; Tsianos, 2013PAPADOPOULOS, Dimitris; TSIANOS, Vassilis. After citizenship: autonomy of migration, organisational ontology and mobile commons. Citizenship Studies, v. 17, n. 2, p. 178-96, 2013. ; Schwarz, 2018SCHWARZ, Inga. Migrants moving through mobility regimes: the trajectory approach as a tool to reveal migratory processes. Geoforum, 16 mar. 2018. Available at: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0016718518300848>.
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) ou explorar a experiência subjetiva da “condição de refugiado” (Jackson; Bauder, 2014JACKSON, Samantha; BAUDER, Harald. Neither temporary, nor permanent: the precarious employment experiences of refugee claimants in Canada. Journal of Refugee Studies, v. 27, n. 3, p. 360-81, set. 2014. Available at: <<Go to ISI>://WOS:000342981700003>.
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) nesse sentido. O fato de os refugiados também conduzirem suas vidas não deve desacreditá-los como “refugiados voluntários”, e sim ser visto como uma maneira de superar os efeitos da perseguição violenta.

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  • 1
    Ver, por exemplo, <http://www.unhcr.org/news/latest/2016/7/55df0e556/unhcr-viewpoint-refugee-migrant-right.html>
  • 2
    Este termo é usado apenas para o estudo empírico. Não recomendo usá-lo em debates conceituais. Tampouco pretendo negar as diferenças extremas entre, por exemplo, um sírio fugindo de Aleppo e um australiano escolhendo estudar na Alemanha. Mas, como a categoria “refugiado” já está contaminada por políticos que refutam a veracidade das alegações dos refugiados, os cientistas sociais devem fazer seu trabalho e contribuir para o debate com base em conceitos claramente definidos, por uma reflexão crítica de categorias e por descobertas empíricas (Bourdieu et al., 1991)
  • 3
    As hierarquias raciais desempenham uma função semelhante à dos sistemas globais de exclusão (Boatcă, 2015).
  • 4
    Disponível em: <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html>.
  • 5
    Isso está em consonância com a literatura recente de estudos sobre refugiados, como Crawley e Skleparis (2018), que criticam as implicações políticas de denominar os sírios que se dirigem para a UE, depois de terem tentado encontrar proteção na Turquia, de “migrantes em trânsito”.
  • 6
    Até recentemente, a Alemanha não permitia que os requerentes de asilo estudassem alemão ou trabalhassem. Hoje, os gestores distinguem entre aqueles que têm uma chance de permanecer e outros candidatos. Estes últimos ainda estão excluídos dos cursos de integração (Bach et al., 2017).
  • 7
    Um novo painel de todos os requerentes de asilo na Alemanha estuda não apenas suas trajetórias e valores migratórios, mas também suas características educacionais e profissionais que permitirão a comparação com migrantes não refugiados (Brücker et al., 2016). Ainda assim, o painel enfoca a integração em um único estado de chegada, como em outros tipos de estudos de migração e integração, e traça uma linha clara entre requerentes de asilo e outros migrantes.
  • 8
    O maior grupo de entrevistas resulta de um grupo de estudo internacional “Capital Cultural durante a Migração” financiado pela Fundação VW nos anos de 2005-2009 e liderado pela autora juntamente com Arnd-Michael Nohl, Karin Schittenhelm e Oliver Schmidtke (Nohl et al., 2014). As entrevistas na Turquia foram conduzidas e analisadas por Barbara Pusch (2010; 2011). Gostaria também de agradecer a Samuel Mensah, Stella Müller e Ariana Kellmer por me darem acesso a entrevistas e análises conduzidas por eles em vários contextos.
  • 9
    Para uma descrição abrangente da situação legal no Canadá, Turquia e Alemanha na época, ver Nohl et al. (2014, p. 101-121).
  • 10
    Disponível em: <http://www.unhcr.org/protection/basic/3b66c2aa10/convention-protocol-relating-status-refugees.html>.
  • 11
    Os nomes e outros detalhes foram alterados. Em alguns casos, sentimos a necessidade de ocultar o país de origem.
  • 12
    O Sr. Young foi entrevistado em inglês, uma segunda língua tanto para ele como para a entrevistadora, Barbara Pusch. Para uma discussão sobre a situação dos refugiados na Turquia, ver Pusch (2010).
  • 13
    A Sra. Goudareva foi entrevistada em inglês por Oliver Schmidtke e Beatrice Marry.
  • 14
    O oposto é o caso de outro entrevistado na Alemanha. Ahmad, do Paquistão, que teve a má sorte de não apenas ser um profissional de TI, mas também um ativista político. Por ser politicamente perseguido, ele requereu asilo e acabou em um beco sem saída, quando poderia ter ganhado um green card para profissionais de TI se tivesse sido mais bem informado.
  • 15
    O Sr. Fagan foi entrevistado em inglês por Oliver Schmidtke e Beatrice Marry.
  • 16
    A taxa de proteção varia. Resumindo vários anos, mais de um terço dos candidatos são recusados. Entre aqueles que recebem algum tipo de proteção, outros atributos legais são frequentes, de modo que apenas uma minoria recebe reconhecimento como refugiado (Bundesamt für Migration und Flüchtlinge, 2018, p. 50).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2018
  • Data do Fascículo
    Dez 2018

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2018
  • Aceito
    24 Set 2018
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