Acessibilidade / Reportar erro

Influência de temperaturas e de fotoperíodos na germinação in vitro de conídios de Aspergillus niger, agente etiológico do mofo preto da cebola

A cebola (Allium cepa L.) é a terceira hortaliça mais cultivada e no Brasil, o estado de Santa Catarina contribuiu em 2017 com 29,6% da produção nacional, totalizando 509.389 mil toneladas (11 IBGE. Levantamento sistemático da produção agrícola: pesquisa mensal de previsão e acompanhamento das safras agrícolas no ano civil, dezembro 2017. Rio de Janeiro, 2018 Disponível em:< https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=76>.Acessoem: 09 jul. 2018.
https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php...
). Nesse estado, aproximadamente 80% desta produção concentra-se na região do Alto Vale do Itajaí, onde bulbos das cultivares Crioula e Bola Precoce são normalmente armazenados na propriedade, em estaleiros com ventilação natural, por um período de 60 a 120 dias, aguardando melhores preços para a comercialização. No entanto, o Instituto CEPA (22 ICEPA. Instituto de Planejamento e Economia Agrícola de Santa Catarina/EPAGRI. Dados e Informações - Balanço de oferta e demanda – safras – 2012/13. Florianópolis: Epagri/Cepa. Disponível em <http://www.epagri.sc.gov.br/?page_id=2620>.Acesso em: 22 ago. 2016.
http://www.epagri.sc.gov.br/?page_id=262...
) estimou em 2013 perdas em torno de 27% da cebola armazenada nessas condições, perdas essas inaceitáveis para a maioria dos produtos agrícolas. Diversas doenças incidem sobre a cultura da cebola no armazenamento e entre elas o mofo preto também chamado de carvão do bulbo ou falso-carvão causado por Aspergillus niger van Tieghem tem sido comumente encontrado na pós-colheita da cultura. A doença é uma das principais causas da depreciação comercial dos bulbos no Brasil, no qual a cebola acaba sendo comercializada sem película, já que o patógeno deixa-as enegrecidas. A doença se manifesta em variedades que possuem película mais fina aliado ao processo inadequado de cura e de temperatura elevadas durante o armazenamento. Várias espécies de Aspergillus incidem sobre o bulbo de cebola, no entanto A. niger é o mais frequentemente encontrado em pós-colheita no Brasil. A. niger não possui hospedeiro especifico, podendo contaminar vários substratos ou causar doença em homens, animais e plantas e tem sido encontrado no solo, sobre matéria orgânica em decomposição e patogênico causando apodrecimento em frutas e hortaliças, podridão do hipocótilo do amendoim e podridão da haste de Dracena sp. (55 Wordell Filho, J. A.; Boff, P. Carvão-do-bulbo ou falso-carvão – Aspergillus spp. Walker. In: Wordell Filho, J.A.; Rowe, E.; Gonçalves, P.A.; Debarba, J.F.; Boff, P.; Thomazelli, L.F.. Manejo Fitossanitário na cultura da cebola. Florianópolis: EPAGRI, p.110-116, 2006.). Os bulbos apresentam uma tonalidade de cores diferenciadas na película decorrente do desenvolvimento interno do patógeno, no entanto pode se desenvolver sobre a película em contato com outros bulbos infectados no armazenamento. A película externa solta e se rompe facilmente e quando ela é removida verifica-se uma fuligem preta constituídas pelos os esporos do fungo. Essa fuligem pode se desenvolver sobre a escama externa da cebola, mas não desenvolve internamente ao bulbo. O fungo não consegue penetrar diretamente na película mesmo quando há condições favoráveis de temperatura e umidade. A infecção ocorre pelo pescoço do bulbo nas cebolas inteiras ou através de ferimentos e/ou rompimento da película, e se desenvolvendo abaixo da película externa. O patógeno cresce com intensidade ao longo das nervuras das escamas. A variação de temperatura no armazenamento favorece a infecção, no entanto esse processo não tem sido descrito com detalhes. O conhecimento da biologia do patógeno é de grande importância para compreender o desenvolvimento da doença, bem como para tomar medidas de manejo da doença. Diante disto, este trabalho teve como objetivo avaliar em condições in vitro a influência da temperatura e do fotoperíodo na germinação de conídios de A. niger. A pesquisa foi realizada no Laboratório de Microbiologia e Fitopatologia do Instituto Federal Catarinense/Campus Rio do Sul com isolado identificado de A. niger, obtido de bulbo de cebola com sintoma da doença e multiplicado em placas de Petri contendo meio de cultura em BDA (batata-dextrose-ágar) através da coleta de conídios sobre o bulbo. Posteriormente as placas foram incubadas em câmaras de germinação do tipo Biological Oxigen Demand (B.O.D) a 25°C e fotoperíodo de 12 horas durante o período de sete dias. Após isso os conídios foram removidos através de raspagem com pincel e água esterilizada e distribuídos com auxílio de alça de Drigalski 100 µl de suspensão de conídios contendo a concentração de 8x104 conídios/mL em cinco (repetições) placas de Petri com meio ágar-água 1%. Em seguida, as placas foram incubadas a temperaturas de 10, 20, 30, 40, 50 e 60°C em escuro contínuo. Em um segundo momento repetiu-se o experimento incubando conídios de A. niger a 34°C (temperatura ideal de germinação obtida com o experimento da temperatura) com os fotoperíodos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas de luz. Em ambos os experimentos foi avaliada a percentagem de germinação após 24 horas de incubação. Devido ocorrer baixa germinação (~20% na temperatura de 30ºC) em ágar-água 1%, foi realizado um experimento contendo três repetições com adição de100 µl de suspensão em água destilada estéril de 0, 1, 5, 10 e 50% de cebola picada (0,5x0,5 cm) agitadas por 15 minutos na superfície do meio e espalhadas com a alça de Drigalski e em seguida a suspensão de conídios. Para visualização dos conídios em ambos os experimentos foi adicionado algumas gotas de azul de metileno 0,33% e com movimentos circulares espalhou-se o corante sobre toda a superfície com o corante. A contagem foi feita com microscópio óptico com magnitude de 100 vezes através da contagem de 100 conídios aleatórios na placa. Foi considerado germinado o que apresentou o tubo germinativo maior que o diâmetro do conídio. Os dados foram submetidos à análise estatística. Verificou-se que a aplicação da suspensão de cebola aumentou de 21,3% para 38,3; 59,7; 90 e 91% respectivamente nas suspensões de 0, 1, 5, 10 e 50%. Não houve diferença estatística (Tukey 5%) entre a suspensão de 10 e 50% e a germinação foi representada pela equação y=-0,128x2+7,736x+25,43 (R2=0,987). Devido a esse resultado foi utilizado à suspensão de 10% para avaliar o efeito da temperatura e fotoperíodo. Essa informação explica porque não ocorreu esporulação nas túnicas e escamas de cebola que não tinham ferimento no trabalho de Marques (Efeito da temperatura e do fotoperíodo no desenvolvimento in vitro e in vivo de Aspergillus niger em cebola. 2015. 44p. Trabalho de curso. Instituto Federal Catarinense, campus Rio do Sul, Rio do Sul) e também por Thamizharasi & Narasimham (44 Thamizharasi, V.; Narasimham, P. Growth of Aspergillus niger on onion bulbos and its control by heat and sulphur dioxide treatments. Tropical Science, v.33, n.1, p.45-55, 1992.), em que bulbos não foram infectados quando estavam intactos, mas o fungo invadia rapidamente os bulbos feridos. Isso evidencia que necessita exsudação dos compostos celulares da cebola para que ocorra a infecção e conseqüente esporulação dos conídios em sua superfície. Com base nos dados obtidos, constatou-se que a temperatura exerce grande influência sobre a germinação dos conídios de A. niger. Devido ao baixo ajuste da curva (R2=0,594) entre 10 e 60º, já que apresentaram 1,2 e 0,8% respectivamente de germinação e que não diferiram entre si (Tukey 5%) foram excluídas do experimento. Essas duas temperaturas também não diferiram entre si de 50°C. Observa-se que entre as temperaturas de 30 e 40°C (Figura 1A) houve a maior percentagem de germinação variando ente 85 e 67% respectivamente. Isso, provavelmente, reflete o que ocorre no campo, pois a temperatura ótima para o desenvolvimento do mofo preto varia entre 28 e 34ºC. A germinação dos conídios também foi bruscamente reduzida nas temperaturas de 20 e 50°C sendo de 7,2% e 1% respectivamente. Wordell filho et al. (55 Wordell Filho, J. A.; Boff, P. Carvão-do-bulbo ou falso-carvão – Aspergillus spp. Walker. In: Wordell Filho, J.A.; Rowe, E.; Gonçalves, P.A.; Debarba, J.F.; Boff, P.; Thomazelli, L.F.. Manejo Fitossanitário na cultura da cebola. Florianópolis: EPAGRI, p.110-116, 2006.) descreve que temperatura de 50ºC por 3 horas (máximo tolerado pela cebola) resultou na morte de 18%, 58% e 100%, respectivamente, dos esporos secos, úmidos e germinados de A. niger. Em meio de cultura, o fungo cresce à temperatura mínima de 17ºC, da mesma forma que a germinação dos conídios nos tecidos dos bulbos danificados como ao encontrado em 20°C e 1,2% a 10°C nesse trabalho. Pelos dados obtidos observa-se que na temperatura de 20°C a percentagem de germinação foi de 7,2 %, sendo 91,52% inferior a germinação a 30°C, concordando com o descrito por Maude (33 Maude R.B. Storage diseases of onions. In: Rabinowitch, H.D.R.; Brewster, J.L. (Eds.). Onions and allied crops: agronomy, biotic interactions, pathology, and crop protection. Flórida: CRC Press. p.273-296, 1990.). Esses resultados in vivo confirmam os obtidos com esse trabalho in vitro. Constatou-se que A. niger tem sua germinação favorecida em temperaturas entorno dos 34°C e isto acontece durante o armazenamento da cebola na região do Alto Vale do Itajaí/SC, favorecendo a germinação dos conídios e consequentemente a ocorrência da doença. Na Figura 1B observa-se a influência do fotoperíodo na germinação de conídios de A. niger, onde nos fotoperíodos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas, obteve-se respectivamente 90; 88,2; 87,8; 87,2 e 89% de germinação. Ressaltando que o fotoperíodo exerce pouca influência na germinação de conídios, diferindo-se apenas 3,1% do maior para o menor percentual de geminação, mas não significativo (Teste F) entre os fotoperíodos. Em decorrência disso é possível que A. niger tem seu desenvolvimento favorecido por temperaturas elevadas (34°C) e menores períodos de luz, assim levando a crer que esta característica do fungo vem torná-lo mais agressivo no armazenamento de cebola a granel ou em sacos empilhados em galpões mal ventilados que acabem aumentando a temperatura e aonde não recebe iluminação, como o que acontece na região do Alto Vale do Itajaí durante o armazenamento da cebola. Conclui-se que a germinação de A. niger sofre influência da temperatura e nenhuma do fotoperíodo, onde os maiores valores de crescimento são obtidos em temperaturas de 30 a 40°C, sendo a temperatura ótima de 34°C e no escuro, onde deve-se evitar essas condições durante o armazenamento de bulbos de cebola. As informações obtidas em relação à temperatura e o fotoperíodo na germinação de conídios de A. niger permitem um maior conhecimento da biologia do agente causal do mofo preto cebola, auxiliando no entendimento da epidemiologia e suporte para manejo da doença no armazenamento.

Figura 1
Curva de germinação de conídios de Aspergilus niger sob diferentes temperaturas (A) e fotoperíodos (B). IFC/Campus Rio do Sul, 2016

REFERÊNCIAS

  • 1
    IBGE. Levantamento sistemático da produção agrícola: pesquisa mensal de previsão e acompanhamento das safras agrícolas no ano civil, dezembro 2017. Rio de Janeiro, 2018 Disponível em:< https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=76>.Acessoem: 09 jul. 2018.
    » https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=76
  • 2
    ICEPA. Instituto de Planejamento e Economia Agrícola de Santa Catarina/EPAGRI. Dados e Informações - Balanço de oferta e demanda – safras – 2012/13. Florianópolis: Epagri/Cepa. Disponível em <http://www.epagri.sc.gov.br/?page_id=2620>.Acesso em: 22 ago. 2016.
    » http://www.epagri.sc.gov.br/?page_id=2620
  • 3
    Maude R.B. Storage diseases of onions. In: Rabinowitch, H.D.R.; Brewster, J.L. (Eds.). Onions and allied crops: agronomy, biotic interactions, pathology, and crop protection Flórida: CRC Press. p.273-296, 1990.
  • 4
    Thamizharasi, V.; Narasimham, P. Growth of Aspergillus niger on onion bulbos and its control by heat and sulphur dioxide treatments. Tropical Science, v.33, n.1, p.45-55, 1992.
  • 5
    Wordell Filho, J. A.; Boff, P. Carvão-do-bulbo ou falso-carvão – Aspergillus spp. Walker. In: Wordell Filho, J.A.; Rowe, E.; Gonçalves, P.A.; Debarba, J.F.; Boff, P.; Thomazelli, L.F.. Manejo Fitossanitário na cultura da cebola Florianópolis: EPAGRI, p.110-116, 2006.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2016
  • Aceito
    10 Fev 2019
Grupo Paulista de Fitopatologia FCA/UNESP - Depto. De Produção Vegetal, Caixa Postal 237, 18603-970 - Botucatu, SP Brasil, Tel.: (55 14) 3811 7262, Fax: (55 14) 3811 7206 - Botucatu - SP - Brazil
E-mail: summa.phyto@gmail.com