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Ocorrência de murcha vascular de Fusarium em Vigna radiata no estado de São Paulo, Brasil

Vigna radiata, também conhecido como feijão mungo-verde, é uma espécie anual, cujos plantios comerciais são destinados principalmente para produção de grãos, tipicamente consumidos na forma de brotos ou usados na produção de farinhas e outros alimentos processados (Hou et al. 20194 Hou, D.; Yousaf, L.; Xue, Y.; Hu, J.; Wu, J.; Hu, X.; Feng, N.; Shen, Q. Mung bean(Vigna radiataL. ):bioactive polyphenols, polysaccharides, peptides, and health benefits. Nutrients, v. 11, p. 1238, 2019. https://doi.org/10.3390/nu11061238
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). Os principais países consumidores são os asiáticos, como China e Japão, e os Estados Unidos (Nair; Schreinemachers, 20205 Nair, R.; Schreinemachers, P. Global Status and Economic Importance of Mungbean. In :Nair, R.; Schafleitner, R.; Lee, S. H. ( ed. )The Mungbean Genome. Compendium of Plant Genomes. Springer, Cham. 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-20008-4_1
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). No Brasil, até 2015 a produção comercial de feijão mungo-verde era insipiente, mas desde então, o país não só passou a produzir e deixar de importar, como virou a espécie mais exportada de feijão. Em 2021 foram exportadas cerca de 50 mil toneladas, sendo a Índia o principal destino, e o estado de Mato Grosso, como principal produtor nacional (APEXBRASIL, 20222 ApexBrasil e Ibrafe assinam convênio para o maior projeto em prol das exportações de feijões e gergelim do Brasil. APEXBRASIL, Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos,11 de jul. de 2022. Disponível em : https://apexbrasil.com.br/br/pt/conteudo/noticias/apexbrasil-ibrafe-convenio-projeto-exportacoes-feijoes-gergelim.html.Acesso em :24 de ago. de 2023.
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).

No ano de 2023, em um plantio piloto no município de Paranapanema/SP, com área total de 9ha, de duas cultivares de V. radiata (Ouro Verde MG-2 e BRSMG Camaleão), ambas lançadas pela EPAMIG, foi constatada a ocorrência de plantas manifestando sintomas de subdesenvolvimento, acompanhados de amarelecimento da folhagem, murcha e seca (Fig. 1a). Os sintomas afetavam plantas desde os 50 dias de plantio. As plantas sintomáticas se distribuíam de forma agregada nos plantios, formando reboleiras típicas, sendo que as plantas com quadro sintomático avançado se encontravam ao centro, enquanto nas bordas se encontravam aquelas ainda assintomáticas ou com sintomas iniciais. Após a remoção das plantas, foi observada a presença escassa de raízes.

Figura 1
Sintomas de subdesenvolvimento em plantio de feijão mungo-verde (a) e descoloração dos tecidos internos radiculares apresentados por plantas doentes (b). Colônias e esporos formados em meio de cultivo por Fusarium solani, isolado LPF41 (c), e Fusarium oxysporum, isolado LBF40 (d), obtidos de plantas de Vigna radiata doentes.

Amostras caulinares e radiculares de plantas sintomáticas foram coletadas e analisadas em condição de laboratório, sendo contatada a manifestação de descoloração dos tecidos internos da região próxima ao colo e raízes (Fig. 1b). Fragmentos com aproximadamente 1,0cm2, coletados dos tecidos sintomáticos, passaram pelo processo de assepsia superficial, por meio da lavagem sequencial em álcool 70%, hipoclorito de sódio 2% e água destilada autoclavada. Os fragmentos permaneceram por 1 minuto em cada solução, sendo o excesso de água removida com uso de papel absorvente esterilizado, e foram depositados em placas de petri descartáveis (90x15mm), contendo aproximadamente 15ml de meio de cultivo BDA 4% (Batata Dextrose Ágar; p/v), com adição de 100mg de sulfato de estreptomicina/L. As placas foram mantidas sob temperatura constante de 25oC e fotoperíodo alternado (12/12h). Após cinco dias, foi constatado o desenvolvimento de dois tipos de colônias fúngicas, indicando a associação de dois fungos com as amostras. Estes foram repicados e analisados separadamente, por meio da mensuração de 50 esporos de cada tipo observado e das características da colônia. O primeiro fungo (Fig. 1c), identificado pelo código LPF41, apresentava colônias de coloração esbranquiçada, com presença de micélio aéreo esparso, se tornando creme após sete dias de cultivo, com abundante formação de microconídios, com até 1 septo e dimensões 15.5 (10.6 - 20.5) x 5.5 (4.5 – 7.3) µm; e macroconídios, com 2 a 4 septos, 43.8 (30.2 - 53.1) x 6.4 (4.7 - 7.5) µm; ambos hialinos. O segundo fungo (LPF40; Fig. 1d) formava colônias de coloração arroxeada, com micélio aéreo cotonoso, e com abundantemente produção de microconídios asseptados, hialianos e com dimensões 7.9 (5.1 - 14.6) x 3.2 (2.2 – 4.4) µm. Ambos os fungos, baseado nas características das colônias formadas em meio de cultivo e na morfologia dos conídios, foram classificadas como pertencentes a fungos do gênero Fusarium (Crous et al., 20213 Crous, P. W.; Lombard, L.; Sandoval - Denis, M. et al. Fusarium: more than a node or a foot - shaped basal cell. Studies in Mycology, v. 98, 2021. https://doi.org/10.1016/j.simyco.2021.100116
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).

A identificação ao nível de espécie foi feita por meio do sequenciamento da região gênica da Translation Elongation Factor 1-α (TEF1α), usando os primers EF-1/EF-2 (O´Donnel et al., 19986 O’Donnell, K.; Kistler, H. C.; Cigelnik, E.; Ploetz, R. C. Multiple evolutionary origins of the fungus causing Panama disease of banana :concordant evidence from nuclear and mitochondrial gene genealogies. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 95, n. 5, p. 2044-2049, 1998. https://doi.org/10.1073/pnas.95.5.2044
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). O BLAST das sequências obtidas, assim como o agrupamento dos isolados na árvore filogenética construída no programa MEGA-X (Figura 2; Tabela 1), indicam que o isolado LPF41 pertence a espécie Fusarium solani, com 99.1% de similaridade com o isolado dessa mesma espécie relatada em soja (Glycine max) nos Estados Unidos (MH822037). Já LBF40 foi classificado como Fusarium oxysporum, com 100.0% de similaridade com o isolado oriundo de sementes de Aspidosperma polyneuron no Brasil (MN223435). Ambas as espécies fúngicas detectadas são relatadas em V. radiata como causadoras de patologias caulinares e radiculares (Abdallah et al., 20221 Abdallah, Y.; Hussien, M.; Omar, M. O. A.; Elashmony, R. M. S.; Alkhalifah, D. H. M.; Hozzein, W. N. Mung Bean(Vigna radiata)Treated with Magnesium Nanoparticles and Its Impact on Soilborne Fusarium solani and Fusarium oxysporumin Clay Soil. Plants, v. 11, 2022. https://doi.org/10.3390/plants11111514
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).

Figura 2
Árvore filogenética construída utilizando o método de máxima verossimilhança com 1000 repetições, das sequências da região TEF1α dos isolados de Fusarium spp. Calonectria pteridis foi mantido como outgroup. Os valores de bootstrap são indicados nos nós, enquanto os isolados estudados estão destacados em negrito.
Tabela 1
Detalhes dos isolados fúngicos utilizados na construção da árvore filogenética e número de acesso do Genbank das sequências obtidas neste estudo. Os isolados estudados estão destacados em negrito.

Fungos do gênero Fusarium são típicos habitantes do solo e estão associados a sintomas de podridão radicular e murcha vascular em culturas agronômicas, impactando diretamente na produtividade do plantio. Esse trabalho faz o primeiro relato de Fusarium spp. em plantios de feijão mungo-verde no estado de São Paulo, expandindo a gama de patógenos associados a essa cultura nesse estado.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES pela concessão da bolsa de pesquisa.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Abdallah, Y.; Hussien, M.; Omar, M. O. A.; Elashmony, R. M. S.; Alkhalifah, D. H. M.; Hozzein, W. N. Mung Bean(Vigna radiata)Treated with Magnesium Nanoparticles and Its Impact on Soilborne Fusarium solani and Fusarium oxysporumin Clay Soil. Plants, v. 11, 2022. https://doi.org/10.3390/plants11111514
    » https://doi.org/10.3390/plants11111514
  • 2
    ApexBrasil e Ibrafe assinam convênio para o maior projeto em prol das exportações de feijões e gergelim do Brasil. APEXBRASIL, Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos,11 de jul. de 2022. Disponível em : https://apexbrasil.com.br/br/pt/conteudo/noticias/apexbrasil-ibrafe-convenio-projeto-exportacoes-feijoes-gergelim.html.Acesso em :24 de ago. de 2023
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  • 3
    Crous, P. W.; Lombard, L.; Sandoval - Denis, M. et al. Fusarium: more than a node or a foot - shaped basal cell. Studies in Mycology, v. 98, 2021. https://doi.org/10.1016/j.simyco.2021.100116
    » https://doi.org/10.1016/j.simyco.2021.100116
  • 4
    Hou, D.; Yousaf, L.; Xue, Y.; Hu, J.; Wu, J.; Hu, X.; Feng, N.; Shen, Q. Mung bean(Vigna radiataL. ):bioactive polyphenols, polysaccharides, peptides, and health benefits. Nutrients, v. 11, p. 1238, 2019. https://doi.org/10.3390/nu11061238
    » https://doi.org/10.3390/nu11061238
  • 5
    Nair, R.; Schreinemachers, P. Global Status and Economic Importance of Mungbean. In :Nair, R.; Schafleitner, R.; Lee, S. H. ( ed. )The Mungbean Genome. Compendium of Plant Genomes. Springer, Cham. 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-20008-4_1
    » https://doi.org/10.1007/978-3-030-20008-4_1
  • 6
    O’Donnell, K.; Kistler, H. C.; Cigelnik, E.; Ploetz, R. C. Multiple evolutionary origins of the fungus causing Panama disease of banana :concordant evidence from nuclear and mitochondrial gene genealogies. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 95, n. 5, p. 2044-2049, 1998. https://doi.org/10.1073/pnas.95.5.2044
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Editado por

Editor associado para este artigo: Luadir Gasparoto

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2022
  • Aceito
    03 Maio 2023
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