Resumo:
Este artigo analisa a robotização da proteção social a partir do estudo de benefícios sociais implementados como resposta à pandemia do novo coronavírus. O desenvolvimento metodológico do estudo pauta-se numa compilação de fontes primárias e secundárias referentes ao Auxílio Emergencial (federal) e à Renda Básica Emergencial (municipal). O artigo se propõe a apontar alguns desafios e impactos à atuação profissional do assistente social no contexto de robotização das políticas de proteção social.
Palavras-chave: Robotização; Proteção social; Benefícios monetários; Serviço social
Abstract:
This article analyzes the robotization of social protection from the study of social benefits implemented in response to the new coronavirus pandemic. The methodological development is guided by a compilation of primary and secondary sources references to the Auxílio Emergencial study (federal) and to the Emergency Basic Income (municipal). The article proposes to indicate some challenges and impacts to the social worker’s professional performance in the robotization of social context policies.
Keywords: Robotization; Social protection; Monetary benefits; Social service
Introdução
O agravamento da pandemia do novo coronavírus ao redor do mundo afetou severamente a vida da população em decorrência das medidas de precaução adotadas no combate à doença. A covid-19, doença respiratória, responsável pela morte de milhares de pessoas em cinco continentes, chegou ao Brasil no dia 26 de fevereiro de 2020.1
Diante desse cenário, as estratégias sanitárias de quarentena, o isolamento/lockdown provocaram consequências graves para a economia mundial e, certamente, para as populações mais vulneráveis.
Uma análise complexa da conjuntura pandêmica não pode deixar de reconhecer os impactos severos no campo do trabalho e das políticas sociais e a crescente demanda por renda dissociada do mercado de trabalho, portanto do acesso ao dinheiro no campo da proteção social não contributiva.
Ao mesmo tempo, a pandemia evidenciou a intensificação da robotização, da existência das relações sociais mediadas por telas conectadas pela internet. Contexto que tem se imposto também no âmbito das políticas sociais, em especial na gestão dos benefícios monetários, cujo acesso tem estado subordinado a aplicativos e exigências burocratizadas, como veremos adiante, ao tratar especialmente da realidade brasileira nas implantações do Auxílio Emergencial, de abrangência nacional, e da Renda Básica Emergencial, de abrangência municipal na cidade de São Paulo.
É diante desse cenário caracterizador da robotização da proteção social que se problematiza a incidência da atuação dos assistentes sociais em uma realidade profissional cada vez mais mediada e ameaçada pela adoção de tecnologias da informação e comunicação (TICs).
Considerando esse contexto, o presente artigo pretende problematizar as implicações éticas, políticas e técnicas da atuação profissional do assistente social diante da tendência em curso de robotização da proteção social e da expansão da “burocracia de nível de tela”.
1. As transformações no mundo do trabalho: desproteção e insegurança de renda
O acesso ao dinheiro dissociado do mercado de trabalho, nesse contexto de ampliação de situações de desproteção social, decorrente da insegurança de renda generalizada e potencializada pela pandemia do coronavírus, é demanda acirrada pelo irreversível aumento de desemprego e do consequente incremento do tempo livre como um fenômeno massivo e global - numa sociedade caracterizada pelo avanço tecnológico e pela robótica.
Diante dessa realidade, torna-se evidente a relevância de se problematizar novas formas de direito à sobrevivência e à dignidade, através da provisão pública de um benefício social monetarizado de caráter não contributivo, capaz de reconhecer, defender e legitimar a segurança de renda como direito de proteção social não contributiva.
As estratégias sanitárias de quarentena, o isolamento/lockdown provocaram consequências graves para a economia mundial e, certamente, afetaram com mais incidência as populações mais vulneráveis. O cenário se agrava ainda mais quando nos debruçamos sobre os dados do Relatório da Organização Internacional do Trabalho de 2019, que apontam 61% da força de trabalho mundial em empregos informais ou mal remunerados, com baixa proteção social e pouca garantia de direitos trabalhistas. Soma-se a isso o alerta da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a possibilidade de que a pandemia leve mais de 265 milhões de pessoas para uma situação de miséria e fome.2
Essa discussão, contudo, esbarra na necessidade de se desmistificar ou descortinar a ideia de trabalho como condição hegemônica de acesso ao dinheiro, sobretudo no atual contexto socioeconômico regido pela quarta revolução industrial e pela economia do imaterial, exponenciada pela pandemia do coronavírus, que evidenciou a intensificação da adoção de tecnologias da informação e comunicação (TICs) no âmbito das relações sociais empurrando a humanidade, mediadas por telas conectadas pela internet, em direção a uma existência ainda mais robotizada, mas também precarizada.
Nesse sentido, a pandemia atuou simbolicamente como um catalisador para novos (nossos) tempos de algocracia (Danaher, 2016; O’Neil, 2016),3 marcada pela robotização da existência, que nos coloca diante da tecnosfera, cuja realidade típica da sociedade não tem mais por centralidade o homem e cujos impactos evidentes incidem no campo da proteção social, da implementação de benefícios sociais e da atuação profissional do assistente social.
A eliminação de postos de trabalhos é realidade tratada na discussão da crise da sociedade do trabalho, já prenunciada por Castel (1998), na década de 1990, em seu livro As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário.
Cabe aqui considerar que essa discussão sobre o futuro (e presente) da configuração do trabalho está diretamente vinculada ao debate sobre direitos sociais e proteção social na sociedade capitalista.
É amplamente reconhecido nas Ciências Sociais que o Estado de Bem-Estar Social e sua construção se assentam na expansão do “pleno emprego”, sendo essa condição denominada por Castel (1998) sociedade salarial. A grande questão com que nos deparamos hoje decorre dos desafios a enfrentar para assegurar níveis de proteção social nesta sociedade de “crise do trabalho”, que se apresenta numa realidade de desemprego estrutural sem sinais de recuo. Ao contrário, a realidade se impõe com sinais de ampliação crescente de desemprego e precarização do trabalho, em decorrência das transformações do modo de produção cada vez mais robotizado.
Em outras palavras, se os direitos sociais são conquistas provenientes da sociedade salarial, o desafio central que temos neste momento diz respeito à situação dos direitos sociais numa sociedade salarial em declínio! Se o direito de viver está, ainda, atrelado ao trabalho, como viver em uma sociedade com cada vez menos postos de trabalho?
É justamente esse cenário distópico regido por esse modelo algocrático de existência que contribui para a aceleração de eliminação de postos de trabalho. Essa realidade nos coloca diante da urgência de repensarmos formas de acesso a direitos sociais desvinculados do mercado de trabalho, o que não é pouca coisa em termos teóricos, políticos, subjetivos, éticos e operacionais, pois implica a superação da racionalidade econômica hegemônica, subordinando-a, segundo Gorz (2003), à racionalidade ecossocial. Essas análises potencializam ainda mais a necessidade de defesa no âmbito planetário por níveis de proteção social que assegurem o direito à segurança de renda dissociado do mercado de trabalho formal, inclusive como potencial mecanismo de alcance ambiental e ecológico.
2. A robotização da proteção social: o Auxílio Emergencial e a Renda Básica Emergencial em pauta
Dado o contexto sindêmico,4 entre as medidas adotadas fora do campo da saúde, as que receberam mais destaque foram aquelas historicamente associadas ao campo da assistência social, através da criação de benefícios ou ampliação de programas de transferência de renda (PTR). No caso do Brasil, foram implantados benefícios monetários em diferentes esferas governamentais (municipais, estaduais e federal).
A robotização da proteção social é neste estudo entendida como uma categoria teórica capaz de representar nossa realidade societária, mediada cada vez mais por TICs interconectadas e presentes no território da formulação e implementação de políticas sociais, com destaque aqui aos benefícios sociais.
Para avançarmos na gênese da nossa discussão referente à robotização da proteção social, tendo por premissa que a configuração das políticas sociais não está dissociada da conjuntura política, econômica e cultural do capitalismo em nossos tempos de tecnosfera, a seguir faremos uma análise da experiência nacional do Auxílio Emergencial (AE) e da experiência municipal da Renda Básica Emergencial (RBE) em São Paulo (SP).
2.1 O Auxílio Emergencial (federal)
O Auxílio Emergencial (AE) foi o programa de transferência de renda implantado pelo governo federal em todo o território brasileiro como principal mecanismo no plano social e econômico de enfrentamento aos efeitos da pandemia do coronavírus.
É preciso aqui reconhecer o papel da sociedade civil nesse processo de implantação. As pressões advindas da campanha Renda Básica que Queremos5 tiveram um papel crucial diante da tomada de decisão institucional do governo brasileiro que, após mobilização social, sanciona, em 2 de abril de 2020, o Projeto de Lei n. 13.982, que estabelece medidas de proteção social durante o período de enfrentamento da pandemia de covid-19.
O decreto regulamentou Auxílio Emergencial no valor de R$ 600,00, mas a proposta inicial do governo era destinar R$ 300,00 mensais para cada membro das famílias mais pobres do país, por um período de seis meses.6
Apesar das conquistas em torno da mobilização da sociedade civil na aprovação e fiscalização do AE, sua operacionalização e gestão por parte do governo federal têm sido alvo, desde o início de sua implementação, de críticas por parte de especialistas e da população brasileira.
Parte significativa dessas análises críticas se refere à excessiva centralização da gestão por parte do governo federal e seus contornos na implementação do auxílio, com destaque às formas informatizadas/virtuais instituídas para o acesso ao AE.
O AE foi instituído por arbítrio unilateral do governo federal, sem interlocução com os demais entes federativos, e sua gestão (centralizada) não passa pelos serviços públicos municipalizados.
Desde o início dos pagamentos dos benefícios, diversos especialistas têm alertado sobre as dificuldades com o aplicativo e o não uso da rede de proteção social, com destaque para os serviços socioassistenciais, como os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS).
Note que dos 20 principais problemas identificados no relatório produzido pela campanha Renda Básica, a maioria está vinculada e decorre dessa tendência de burocratização e robotização da proteção social.7
O Estudo do Centro de Estudos da Metrópole (CEM),8 na Nota Técnica número 5 intitulada “Dificuldades com aplicativo e não uso da rede de proteção atual limitam acesso ao auxílio de emergência”, apresenta o perfil dos elegíveis, aponta os principais limites de cobertura do Programa RBE e identifica os gargalos da sua implementação. Especialmente sobre o “não uso da rede de proteção social” na operacionalização do AE, o estudo sugere que a utilização da rede do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) minimizaria os gargalos da implementação apresentados pela pesquisa.
Ainda sobre a articulação entre o Auxílio Emergencial e o SUAS, cabe citar a “Nota Técnica SUAS e proteção social na pandemia covid-19” (Sposati, 2020) que, ao discorrer sobre o Relatório de Acompanhamento das Ações Federais em Relação à Pandemia do Coronavírus (Processo 016.827/2020-1), elaborado pelo Tribunal de Contas da União, com destaque para a Proposta 8, indica que o SUAS deveria estar sendo acionado pelo governo federal e reforça no item 114 a desarticulação do auxílio emergencial com a Rede SUAS, o que tende a explicar o acréscimo de dificuldades enfrentadas pela população para sua inclusão na atenção em agências bancárias.
Reforçando essa orientação, em abril de 2021, a Defensoria Pública da União (DPU) enviou uma recomendação ao Ministério da Cidadania para que apresentasse, no prazo de 15 dias, plano nacional de descentralização político-administrativa do Auxílio Emergencial.9 A recomendação visava também dar mais agilidade aos processos de concessão do benefício e de contestação de negativas.
2.2 A Renda Básica Emergencial (municipal)
Também em decorrência da sindemia da Covid-19”, o município de São Paulo, passados sete meses da experiência do governo federal, aprova e institui a Lei n. 17.504, de 11 de novembro de 2020, que “dispõe sobre a instituição da Renda Básica Emergencial no âmbito do Município de São Paulo.10
O valor definido da RBE consiste em benefício de complementação de renda no valor de R$ 100,00, pagos por indivíduo que componha o respectivo grupo familiar. Prevê ainda a lei que o benefício será pago por três meses, com periodicidade mensal.
No município de São Paulo, a RBE atendeu a 474.499 famílias, beneficiando 1.276.425 pessoas, sendo o valor médio pago às famílias de R$ 277,00.
A realidade de robotização, de desvinculação dos benefícios aos serviços e de priorização da “burocracia de nível de tela”, evidenciadas na implementação do AE em âmbito federal, é também evidenciada no caso da RBE, aprovada e implementada no âmbito do município de São Paulo.
Atentos a esse contexto, no caso da RBE, observam-se dois fatores interconectados: (1) o acesso ao programa se deu, exclusivamente, por aplicativo “Caixa Tem”; (2) a apartação e a desintegração entre o benefício (RBE) e os serviços socioassistenciais, a exemplo dos CRAS, embora gerido pela Coordenação de Gestão de Benefícios vinculada à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS).
Especialmente no caso da RBE, a própria orientação oficial da gestão municipal manifesta: “Não é necessário se dirigir aos CRAS para realizar cadastro ou solicitar abertura de conta, enfatizando a preferência a canais virtuais e oficiais para tirar dúvidas”.
Ora, essa informação oficial se distancia das orientações técnicas publicadas sobre a experiência (anterior) do AE e indica desconsiderar a realidade nos territórios mais vulnerabilizados, onde o CRAS é espaço de referência legítimo, reconhecido pela população para questões de benefícios e transferência de renda, a exemplo do Programa Bolsa Família.
Essa análise nos permite afirmar que, no processo de implementação de um benefício social, não basta uma articulação institucional com os setores de alto escalão, no caso da RBE, entre o gabinete da SMADS e os “burocratas de nível de sistema”, do sistema bancário, a saber, a Caixa Econômica Federal. Se o objetivo é assegurar proteção social em curto espaço de tempo no campo da renda, é preciso aprimorar a comunicação para além de sistemas informatizados, é necessário assegurar uma implementação de formato híbrido, que não exclua os trabalhadores que atendem à população diariamente nos CRAS, portanto os “burocratas de nível de rua”.
No caso da RBE, embora a taxa de efetividade de pagamento tenha sido superior a 99,53% (benefícios pagos/total de beneficiários, descontados os óbitos) em 2020 e 2021, o olhar comprometido com a dignidade humana deve se pautar na concretude desse dado, que revela que aproximadamente 3.000 famílias na cidade de São Paulo, cerca de 15 mil pessoas, ficaram sem receber o benefício em decorrência de problemas burocráticos para acesso ao serviço bancário (Carnelossi; Francisquini, 2021).
Certamente vivem essas famílias excluídas do direito ao acesso ao benefício, em decorrência de mecanismos de “burocracias de nível de tela” e “burocracia de nível de sistema”, em situações de extrema vulnerabilidade. Fato que demanda ações de busca ativa por parte dos serviços de proteção social, em especial aos serviços que integram o SUAS.
Porém, como registrado, não se observaram direcionamentos nessa direção por parte da gestão municipal da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, pelo contrário, a orientação oficial, como visto, incentiva a não procura dos CRAS.
2.3 A gestão de benefícios monetários no labirinto burocrático
No que diz respeito à implementação de ambos os programas (Auxílio Emergencial e Renda Básica Emergencial), vimos que o processo foi pensado para ser realizado por intermédio de meios digitais, através da criação de um aplicativo e de um site para que os beneficiários realizassem o cadastro, sendo aplicado o cruzamento dos dados das famílias cadastradas no Cadastro Único para Programas Sociais e daquelas recebedoras (ou não) do Bolsa Família, com a finalidade de avaliar as condições de elegibilidade.
Constata-se que a centralização político-administrativa da experiência do AE, no âmbito do governo federal, e da RBE, no âmbito municipal, não se dissocia do modelo de implementação adotado, que prioriza “burocracia de nível de tela” e “burocracia de nível de sistema”, em detrimento da dimensão relacional construída entre trabalhador social/servidor público e o cidadão (“burocracia de nível de rua”) (Valentin et al., 2022).
No entanto, o que deveria ser uma medida protetiva para evitar contato social acabou produzindo nos dois programas estudados (AE e RBE) dificuldades de cadastramento (seja pela falta de informação, seja pelo sistema on-line instável, seja pela dificuldade de acesso à internet), ocasionando filas e aglomerações nas sedes da Receita Federal, em agências da Caixa Econômica, unidades do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e lotéricas por todo o país.
Como vimos, apesar das conquistas em torno da mobilização da sociedade civil na implementação dos benefícios dissociados do mercado de trabalho, sua operacionalização e gestão por parte do governo federal e municipal têm sido criticadas por especialistas de políticas públicas e pela população brasileira, sobretudo a parcela demandante desses benefícios monetários.
Como apontam Tebet Marins et al. (2021, p. 11), encontramos várias adversidades dessa política emergencial: (i) as longas filas para cadastramento do benefício, gerando aglomeração; (ii) as dificuldades iniciais quanto ao CPF não regularizado; (iii) a demora na tomada de decisão para o pagamento do auxílio; (iv) a precariedade dos recursos humanos; (v) o limitado conhecimento com as tecnologias digitais entre a população mais vulnerável; e (vi) os problemas de ineficiências horizontal e vertical.
A maioria dessas críticas se refere à excessiva centralização da gestão desses benefícios sociais, através de sua implementação sem intermediação da interação típica da “burocracia de nível de rua”.11 Essa estratégia dificultou o acesso aos benefícios pelos cidadãos.
Os recentes benefícios de renda, criados no contexto de pandemia, intensificaram essa discussão referente à necessidade de aprimoramento da relação entre os serviços da assistência social e os benefícios monetários, evidenciando uma questão pautada desde 2009 no Protocolo de Gestão Integrada de Serviços, Benefícios e Transferências de Renda, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), e que afirma:
[...] as famílias beneficiárias dos benefícios e programas de transferência de renda, tais como Programa Bolsa Família (PBF), Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), Benefício de Prestação Continuada (BPC) e benefícios eventuais de Assistência Social, devem se constituir público prioritário nos serviços socioassistenciais (Brasil, 2009, p. 8, grifo nosso).
Podemos considerar por hipótese que a associação desses benefícios ao SUAS, com sua alta capilaridade dos serviços socioassistenciais no país, com destaque para os CRAS, CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) e Centros Pops (Centros de Referência Especializados para População em Situação de Rua), que vinculam milhões de brasileiros ao campo da proteção social, serviria potencialmente como escudo e aliado ao enfrentamento dessa tendência de robotização e burocratização da proteção social, caracterizada no âmbito da implementação dos benefícios sociais pelo predomínio da “burocracia em nível de tela” e, mais ainda, da “burocracia de nível de sistema”.
Certamente, o SUAS é o sistema público de proteção social que deveria ser utilizado de forma estratégica pelo poder público na gestão de benefícios monetários dissociados do mercado de trabalho. Isso porque é direito reconhecido pela política de assistência social à segurança de renda (Carnelossi, 2017).
O SUAS teria papel importante, por exemplo, no atendimento às pessoas com dificuldade de acesso ao benefício, como aquelas que não conseguem usar internet, além de permitir a agilidade nos processos de concessão e de contestação de negativas, certamente possibilitando um atendimento mais qualificado e condizente com os padrões de proteção social diante situações variadas de vulnerabilidade.
As experiências estudadas demonstraram certo desprezo à realidade que, segundo dados da PNAD/IBGE, revela que dos 60 milhões de indivíduos (29,1% da população) elegíveis ao Auxílio Emergencial, 7,4 milhões vivem em domicílios que não têm acesso à internet e que, portanto, apresentam um enorme empecilho de acesso ao benefício monetário concedido.
Essa compreensão entende que está na sinergia entre a oferta de renda e de serviços socioassistenciais a possibilidade de obter melhores resultados no âmbito da capacidade protetiva das famílias. Inclusive, possivelmente, esse direcionamento impactaria na redução de reclamações e dúvidas registradas nos canais de Ouvidoria institucionais e transmitiria à população a certeza de poder contar com atendimento humanizado de qualidade, em vez de constrangimentos para acessar meios digitais de atendimento.
A burocratização ao acesso aos direitos sociais no contexto da covid-19 é tendência observada com preocupação pelos pesquisadores do campo da proteção social, que nos alertam que o acesso ao benefício social mediado por sistemas informatizados e aplicativos em celulares representa o avanço da robotização da proteção social, bem como o predomínio da “burocracia de nível de sistema” na implementação desses benefícios (Valentin et al., 2022).
A ideia aqui é de que a robotização da proteção social e “o predomínio da burocracia de nível de tela” são facetas das passagens que compõem de maneira complexa o “labirinto burocrático”, que enredam os cidadãos no acesso aos benefícios sociais.
É justamente essa realidade que contextualiza a discussão sobre a “burocratização do acesso aos direitos sociais no contexto da covid” que a conecta com a história narrada no livro Silencio administrativo: la pobreza en el labirinto burocrático (Mesa, 2019).
Sara Mesa (2019), escritora espanhola, narra nesse livro uma história real: a saga de uma mulher em situação de rua, idosa e doente, para acessar um benefício monetário a que tem direito, segundo as otimistas mensagens oficiais do governo e da mídia.
Mas o labirinto burocrático que deve ser percorrido para isso, as armadilhas e os obstáculos que encontra e a crueldade de um sistema que exige mais de quem tem o mínimo levam ao desespero. Enquanto isso, os cidadãos ficam com a impressão oposta: há muitos benefícios e ajuda para os mais pobres (Mesa, 2019).
Essa construção narrativa alheia à realidade acaba por contribuir para a reprodução de preconceitos que fomentam o ódio aos pobres e alimentam o fenômeno da “aporofobia”, termo para “aversão aos pobres”, neologismo recentemente incorporado ao dicionário em espanhol criado pela filósofa Adela Cortina.12
É essa realidade que cruza o caminho da protagonista do livro de Sara, como a de milhões de brasileiros que vivem e viveram a saga para acesso ao AE13 e à RBE.
Dessa configuração informatizada e robotizada de gestão e implementação dos benefícios sociais emerge a hipótese que indica estar profundamente alinhada e conectada a essa realidade: trata-se do processo também em curso da chamada financeirização14 e bancarização15 dos benefícios sociais. Isso porque as sociedades e a proteção social têm se movido ao sabor e ao ritmo da inovação tecnológica aliada ao mercado financeiro, cuja gestão dos benefícios sociais se ancora em um capitalismo de base tecnológica. Dialoga com esse contexto algocrátaSposati (2020, p. 29), ao afirmar que:
[...] à lógica da prática bancária, seus valores não são éticos, mas de lucratividade. [...] Afinal o corpo vivo presente, embora visível, não é garantia para a economia bancária, ele não transita na digitalização burocrática. O ser humano é incompatível com a digitalização bancária. [...] Para a hierarquia bancária o envoltório é de importância maior do que o envolvido. A proteção social fica contida pela burocracia, não se manifesta com outras possibilidades, não alarga sua forma de alcance, esconde-se na muralha. A proteção social é dita essencial, todavia, essa essencialidade não resiste à norma burocrática da bancarização exigente de garantias, sem considerar nada essencial na proteção social.
Estamos diante de um labirinto burocrático no acesso à proteção social, cuja tendência de exclusão da dimensão relacional no acesso aos direitos sociais (via “burocracia de nível de rua”) enreda milhões de pessoas em um labirinto burocrático, que as silencia, numa ambiência de “silêncio administrativo” típico de “sociedades algocratas”.
3. A robotização da proteção social: impactos à atuação profissional do assistente social
Os aspectos que caracterizam o tempo presente de robotização da proteção social impõem uma série de implicações para a profissão do Serviço Social e para a atuação do assistente social na gestão das políticas sociais.
No caso da gestão dos benefícios monetários estudados, os assistentes sociais, trabalhadores no âmbito de burocratas de nível rua, foram desconsiderados como agentes públicos no processo de implementação. Nesse contexto, em que impera a “burocracia de nível de sistema”, os assistentes sociais deixaram de lidar diretamente com os casos dos cidadãos, embora, paradoxalmente, a realidade tenha evidenciado que milhões de brasileiros se deslocaram aos CRAS para buscarem informações referentes à concessão de tais benefícios.
No caso da implementação desses benefícios sociais analisados, os assistentes sociais vinculados aos serviços de proteção social se deparam com um cotidiano de trabalho permeado pela desinformação e pela ausência de orientação sobre as problemáticas vivenciadas pelos cidadãos, enredados no labirinto burocrático da implantação e concessão desses benefícios monetários. A hegemonia da “burocracia de nível de sistemas” na gestão dos benefícios monetários reduziu por completo a discricionariedade dos assistentes sociais nesse processo de implementação e a consequente possibilidade de atuação profissional comprometida em desburocratizar o acesso, de preferência universal e incondicional aos direitos sociais.
Certamente, a desinformação silencia e distancia o usuário do acesso aos benefícios de proteção social, portanto amplia a insegurança de renda e as desigualdades.
Também é fator de ampliação da desigualdade a substituição da dimensão relacional com as famílias de baixa renda por atendimentos mediados por aplicativos regidos por uma algocracia. Estamos falando de realidade de ampliação da exclusão social agravada pela exclusão digital que hoje vive, aproximadamente, um em cada quatro brasileiros.16
Será possível conciliar essa realidade que transforma políticas públicas em sistemas de informação com os direcionamentos teórico-metodológico e ético-político do Serviço Social?
Diante da tendência de implementação de políticas sociais cada vez mais robotizadas e burocratizadas, um dos grandes desafios aos assistentes sociais se refere à interpretação e à aplicação de parte do seu Código de Ética, especialmente relacionado às relações do/a assistente social com os/as usuários/as. Segundo o Código de Ética do assistente social:
É dever do profissional nas suas relações com os/as usuários/as democratizar as informações e o acesso aos programas disponíveis no espaço institucional; e contribuir para a criação de mecanismos que venham desburocratizar a relação com os/as usuários/as, no sentido de agilizar e melhorar os serviços prestados (CFESS, 1993, p. 30).
A objetivação desse dever do assistente social de desburocratizar a relação com os/as usuários/as, no sentido de agilizar e melhorar os serviços prestados, se depara com um contexto absolutamente desfavorável, como observamos nas análises aqui empreendidas.
O contexto de robotização da proteção social e da burocratização da gestão de benefícios monetários17 distancia o assistente social de suas competências profissionais vinculadas à implementação de políticas sociais em órgãos da administração pública (Brasil, 1993). Ou, ainda, a realidade tem transformado o assistente social em um “burocrata de nível de tela”, que atua de maneira errática e antiética ao efetuar uma ação pautada num tecnicismo,18 descolada do senso ético e político que orienta o Serviço Social brasileiro.
Seguramente, as três dimensões do Serviço Social (teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa) são essenciais e devem ser articuladas para que se possa fazer uma intervenção mais propositiva e com mais qualidade. Contudo, a lógica robotizada da proteção social coloca o profissional na contramão dos preceitos éticos e político do Serviço Social. Estamos, nesse caso, diante de uma realidade profissional caracterizada pela sobreposição da dimensão técnico-operativa em relação às dimensões ético-política e teórico-metodológica.
Como reafirmar a importância da relativa autonomia do assistente social, inerente à discricionariedade do “burocrata de rua”, para qualificar o exercício profissional e enfrentar o total descompromisso com a demanda gerada pela incompetência da “burocracia de nível de sistema”?
A resposta a essa questão passa pela compreensão de que, como nos lembra Carvalho (2020, p. 170):
[...] a partir de uma orientação ético-política é possível romper com os processos de alienação, negar as práticas burocratizadas e imediatistas, tendo como horizonte a defesa dos princípios e valores que fundamentam o Projeto Ético-Político. Caso contrário, ao se apegar aos entraves institucionais, pessoais e relacionais, reforça uma prática excludente, que invisibiliza os usuários e suas demandas específicas, reforçando sua condição de subalternidade frente à política de assistência social.
É nesse contexto inclusive que a autora afirma que:
[...] os burocratas de nível de rua precisam cada vez mais se propor ao exercício de reflexão e articulação entre as teorias assumidas, com as práticas realizadas, rompendo de vez com o discurso de que “a prática nada tem a ver com a teoria”. Ao contrário disso, ampliar a construção do saber sobre a prática profissional, tendo por base um conhecimento teórico consistente, sobre a política pública, sobre a atuação profissional ou, ainda, sobre os públicos e suas demandas específicas (Carvalho, 2020, p. 170)
Em que pese a realidade desfavorável à atuação do assistente social na implementação dos benefícios sociais, é preciso reconhecer a dimensão contraditória desse contexto que permite e ainda dá possibilidade de intervenções, mesmo que numa condição contra-hegemônica, conectadas à efetivação dos valores éticos e princípios políticos do Serviço Social.
A opção por dispor de TICs na implementação dos benefícios estudados permitiu o surgimento, inédito, de fóruns de opiniões e reclamações nas mais variadas redes sociais, com destaque ao Facebook, que conecta beneficiários, inclusive, a organizações da sociedade civil, como a Rede Brasileira de Renda Básica, que tem atuado diretamente na visibilidade e judicialização desses casos silenciados pela “burocracia de nível de tela e sistema”.
Diante de tantos desafios, torna-se fundamental reconhecer a necessidade de uma atuação profissional inspirada em um dos grandes legados do Código de Ética Profissional de 198619 no plano da reflexão e da normatização ética. Falo especialmente da conquista da afirmação de um novo perfil do/a técnico/a, não mais um/a agente subalterno/a e apenas executivo/a, mas um/a profissional competente teórica, técnica e politicamente (Barroco; Terra, 2012).
Considerações finais
Os impactos e o alcance global da pandemia de coronavírus evidenciaram a intensificação da robotização, da existência e das relações sociais mediadas por telas conectadas pela internet. Essa realidade, por sua vez, afetou diretamente o trabalho e a classe trabalhadora com a eliminação acelerada e acentuada de postos de trabalho.
Nesse contexto, a pandemia escancarou a necessidade por benefícios monetários dissociados do mercado de trabalho e revelou a importância do debate sobre a segurança de renda como direito de proteção social. No âmbito global, entre as medidas adotadas, as que receberam mais destaque foram aquelas referentes à assistência social, através da criação ou ampliação de programas de transferência de renda (PTR).
A partir da análise crítica da experiência nacional do Auxílio Emergencial (AE) e da experiência municipal da Renda Básica Emergencial (RBE) em São Paulo (SP), observamos que a gestão desses tipos de benefícios acompanhou essa tendência de robotização da realidade social ao excluir a dimensão relacional no processo de implementação deles. A implementação desses benefícios priorizou a “burocracia de nível de tela” e a “burocracia de nível de sistema”, em detrimento da dimensão relacional construída entre trabalhador social/servidor público e o cidadão (“burocracia de nível de rua”).
Observamos que essa engenharia institucional é estratégica, inclusive no sentido de contribuir para a centralização político-administrativa, a partir do não uso da rede de proteção social, além de intensificar a burocratização de acesso mediado pela lógica bancária, em detrimento da lógica de proteção social.
A exclusão da dimensão relacional no acesso aos direitos sociais empurra milhões de pessoas para um labirinto burocrático, cujo silêncio administrativo produzido compõe o fenômeno típico dos nossos tempos de algocracia.
O enfrentamento dessa realidade passa pela integração entre os benefícios monetários e os serviços da rede de proteção social, em especial do SUAS, o que permitiria agilizar os processos de concessão do benefício e de contestação de negativas, além de possibilitar o atendimento mais qualificado em relação às situações de vulnerabilidades dos beneficiários, em vez de constrangimentos para acessar meios digitais de atendimento.
Além da sinergia entre a oferta de renda e de serviço, que ampliaria melhores resultados no âmbito da capacidade protetiva das famílias, outro ponto a ser destacado como instrumento necessário ao aprimoramento da implementação dos benefícios se refere à garantia de uma engenharia institucional híbrida entre a gestão virtual e a presencial no seu acesso aos benefícios monetários.
Os aspectos que caracterizam o tempo presente de robotização no campo da proteção social influenciam o Serviço Social e impõem uma série de implicações e desafios para a atuação profissional no campo da gestão das políticas sociais.
A centralização administrativa dos benefícios, os meios de acesso exclusivamente robotizados e mediados pela lógica bancária, impõe uma realidade de trabalho nos espaços sócio-ocupacionais, permeada pela desinformação e pela ausência de orientação sobre as necessidades vivenciadas pelos cidadãos, enredados no labirinto burocrático da implantação e concessão desses benefícios monetários. A hegemonia da “burocracia de nível de sistemas” na gestão dos benefícios monetários reduziu por completo a discricionariedade dos assistentes sociais nesse processo de implementação e a consequente possibilidade de atuação profissional, comprometida em desburocratizar o acesso, de preferência, universal e incondicional aos direitos sociais.
Nesse contexto, um dos grandes desafios aos assistentes sociais se refere à interpretação e à aplicação do seu dever ético nas suas relações com os/as usuário/as, comprometidos com a democratização das informações e a desburocratização no acesso a benefícios e serviços prestados. Do contrário, estaremos atuando a favor de uma atuação profissional de caráter tecnicista, caracterizada pela sobreposição da dimensão técnico-operativa em relação às dimensões ético-política e teórico-metodológica.
Nossos tempos de algocracia evidenciam com força a importância e a necessidade de o Serviço Social atuar, de forma comprometida, com a tríade composta das dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa, sendo esse o caminho para uma atuação profissional crítica e propositiva, capaz de transgredir a tendência da configuração das políticas sociais transformadas em sistemas de informação, cuja execução tem exigido um perfil exclusivamente técnico, burocrata, executivo e subalterno.
Referências
- AMARO, Maria Ines. Urgências e emergências do Serviço Social: fundamentos da profissão na contemporaneidade. 2. ed. Lisboa: Universidade Católica, 2015.
- BARROCO, Maria Lúcia; TERRA, Sylvia Helena. Código de ética do(a) assistente social comentado São Paulo: Cortez, 2012.
- BRASIL. Lei n. 8.662, de 7 de junho de 1993 Dispõe sobre a profissão de assistente social e dá outras providências. Brasília, 1993.
- BRASIL. Protocolo de gestão integrada de serviços, benefícios e transferências de renda no âmbito do sistema Brasília: MDS, 2009.
- CARNELOSSI, Bruna. Segurança de renda: direito de proteção social do cidadão brasileiro. 2017. 178 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) - Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2017.
- CARNELOSSI, Bruna; FRANCISQUINI, Luiz. A gestão da Renda Básica Emergencial na cidade de São Paulo: uma análise crítica. In: CICLO DE ESTUDOS E DEBATES: Renda e proteção social para a região metropolitana de Porto Alegre em tempos de pandemia São Leopoldo: Unisinos, 2021.
- CARVALHO, Paola Loureiro. Cadastro único e burocratas de nível de rua: o uso do poder discricionário na assistência social para as populações rurais. 2020. 192 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2020.
- CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes, 1998.
- CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL (CFESS). Código de ética profissional do assistente social Brasília: CFESS, 1993.
- CORTINA, Adela. Aporofobia: a aversão ao pobre, um desafio para a democracia. Tradução: Daniel Febre. São Paulo: Contracorrente, 2020.
- DANAHER, John. The threat of algocracy: reality, resistance and accommodation. Philosophy and Technology, v. 29, n. 3, p. 245-268, 2016.
- GORZ, Andre. Metamorfoses do trabalho: busca do sentido, crítica da razão rconômica. Tradução: Ana Montoia. São Paulo: Annablume, 2003.
- IAMAMOTO, Marilda Vilela. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
- JUNIOR, José Patrício Bispo; SANTOS, Djanilson Barbosa. Covid-19 como sindemia: modelo teórico e fundamentos para a abordagem abrangente em saúde. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 37, n. 10, out. 2021.
- LAVINAS, Lena. A financeirização da política social: uma perspectiva introdutória. XII Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira. Campinas: Unicamp, 2019.
-
MARINS, Mani Tebet et al Auxílio emergencial em tempos de pandemia. Sociedade e Estado, v. 36, n. 2, p. 669-692, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020013. Acesso em: 15 fev. 2022.
» https://doi.org/https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020013 - MESA, Sara. Silencio administrativo: la pobreza en el labirinto burocrático. Barcelona: Anagrama, 2019.
- O’NEIL, Cathy. Weapons of math destruction Londres: Penguin, 2016.
- SPOSATI, Aldaíza. SUAS e proteção social na pandemia covid-19: nota técnica do NEPSAS. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020.
- VALENTIN, Agnaldo et al Auxílio emergencial e burocracia de nível de sistemas: uma janela para a análise da implementação por meio dos comentários de usuários do aplicativo da Caixa Econômica Federal. In: MOUNTIAN, A. et al (ed.). Políticas públicas e covid: a experiência brasileira. São Paulo: Edições EACH, 2022. No prelo.
-
1
Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/vigilancia_em_saude/doencas_e_agravos/coronavirus/index.php?p=291730. Acesso em: dez. 2021.
- 2
-
3
Algocracia é um conceito recente no campo das Ciências Humanas que define um cenário no qual uma infinidade de dados produzidos em massa é coletada, armazenada, rearranjada por códigos de programação, acabando, em algum grau, organizando nossas vidas e o que vemos na internet.
-
4
Numa abordagem sindêmica, a covid-19 é analisada como uma sindemia resultante da interação entre vários grupos de doenças e o contexto socioeconômico (Junior; Santos, 2021).
-
5
A campanha Renda Básica que Queremos foi composta de mais de 300 organizações e redes da sociedade civil e objetivou fortalecer o sistema de proteção social construído desde o processo constituinte de 1988 e a defesa de uma política de Renda Básica Permanente, sem prejuízo das outras políticas de proteção social.
-
6
O Auxílio Emergencial foi inicialmente destinado aos cidadãos com mais de 18 anos, aos beneficiários do Programa Bolsa Família, às famílias cadastradas no Cadastro Único para Programas Sociais, aos trabalhadores informais, aos microempreendedores individuais (MEI) ou contribuintes individuais da Previdência Social. A determinação exigia renda familiar mensal inferior a meio salário mínimo per capita ou três salários mínimos no total, além de o indivíduo não ser beneficiário de outros programas sociais (com exceção do Programa Bolsa Família) ou do seguro-desemprego. As mães que habitam sozinhas e atendem ao critério de elegibilidade de renda teriam direito a receber o valor do auxílio em dobro. No dia 16 de abril, a Câmara dos Deputados aprovou a expansão da medida para mães menores de idade e para toda família monoparental.
-
7
As 162 organizações e movimentos que integram a campanha Renda Básica que Queremos fizeram um levantamento que aponta os 20 principais problemas na implementação do Auxílio Emergencial. Relatório completo dos 20 principais problemas identificados. Disponível em: https://bit.ly/RelatorioRendaBasica. Acesso em: 22 abril. 2021.
-
8
Disponível em: https://ods.fapesp.br/pesquisa-apresenta-o-perfil-dos-elegiveis-para-receber-a-renda-basica-emergencial/6444. Acesso em: dez. 2021.
- 9
-
10
Os beneficiários da Renda Básica Emergencial são todos aqueles que estão no Programa Bolsa Família (PBF), assim como todos os trabalhadores ambulantes cadastrados no Termos de Permissão de Uso (TPU) e “Tô Legal”, desde que se enquadrem nos critérios do Programa Bolsa Família.
-
11
Os conceitos de burocracia de nível de rua se pautam em Lipsky (2005 apudValentin et al., 2022) e dizem respeito a atores que fazem a relação direta com a população, relacionando seu papel dentro da implementação da política pública e da produção e reprodução das desigualdades. Os burocratas de nível de rua são definidos como aqueles funcionários públicos que interagem diretamente com os cidadãos para realizar seu trabalho e que possuem relativa discricionariedade na sua execução, tais como professores, policiais e trabalhadores sociais.
-
12
Disponível em: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/Aporofobia-termo-para-aversao-aos-pobres-e-eleito-palavra-do-ano-na-Espanha/5/39047. Acesso em: 15 dez. 2021
-
13
Saga essa acompanhada de maneira grandiosa por Paola Carvalho, juntamente à Rede Brasileira de Renda Básica (RBRB), e relatada em suas redes sociais: @sou.paola (Facebook, Instagram e YouTube).
-
14
O conceito de “financeirização” não possui definição única e consensual (Lavinas, 2019), contudo aqui entendemos que a financeirização retrata um processo no qual os mercados financeiros, as instituições financeiras e as elites financeiras passam a ter peso crescente nas políticas econômicas e sociais e nos seus efeitos.
-
15
A bancarização se refere ao processo de ampliação do contato dos cidadãos com os produtos e os serviços fornecidos por instituições financeiras, incluindo a população no sistema bancário.
-
16
Dados mais recentes da pesquisa TIC Domicílios mostram que cerca de um em cada quatro brasileiros ainda não utiliza a internet. São aproximadamente 47 milhões de pessoas, a maior parte das classes D e E e residentes em áreas rurais. Ou seja, justamente aqueles em condição de mais vulnerabilidade social e que são públicos-alvo de políticas de transferência de renda. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/02/digitalizacao-e-o-perigo-do-retrocesso-no-bolsa-familia.shtml. Acesso em: 8 fev. 2021
-
17
Parte dessa realidade é que nos leva a pensar sobre os impactos dessa relação entre cidadania e tecnologia, também retratada no filme de 2016, Eu, Daniel Blake, do diretor Ken Loach.
-
18
Para uma melhor compreensão dos erros do teoricismo, do militantismo e do tecnicismo no Serviço Social, sugere-se consultar Iamamoto (2005).
-
19
No plano da reflexão e da normatização ética, o Código de Ética Profissional de 1986 foi uma expressão de conquistas e ganhos através de dois procedimentos: negação da base filosófica tradicional, nitidamente conservadora, que norteava a “ética da neutralidade”, e afirmação de um novo perfil do/a técnico/a, não mais um/a agente subalterno/a e apenas executivo/a, mas um/a profissional competente teórica, técnica e politicamente (Barroco; Terra, 2012).
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Maio 2022 -
Data do Fascículo
May-Sep 2022
Histórico
-
Recebido
20 Dez 2021 -
Aceito
07 Fev 2022