Acessibilidade / Reportar erro

OLHAR DE PROFISSIONAIS NO ATENDIMENTO A MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA SEXUAL: PERSPECTIVA DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DE BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS

RESUMO

Objetivo:

analisar o atendimento a mulheres em situação de violência sexual, na ótica dos profissionais e na perspectiva da Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos.

Método:

estudo qualitativo, de abordagem exploratória e descritiva, realizado em um munícipio na região centro-norte do Estado do Rio Grande do Sul, com 30 profissionais da equipe multiprofissional dos serviços intersetoriais de atendimento a mulheres em situação de violência sexual. Coleta de dados realizada por meio da entrevista semiestruturada de janeiro a abril de 2016. Os resultados foram submetidos a Análise de Conteúdo Temática.

Resultados:

emergiram quatro categorias temáticas, intituladas: princípio do respeito pela vulnerabilidade humana e integridade pessoal, em que são constatadas situações de vulnerabilidade que cercam a mulher; princípio da não discriminação e não estigmatização: necessários serviços com estruturas adequadas, confidencialidade das informações, acolhida, práticas sem preconceitos e/ou julgamentos no atendimento; princípio da dignidade humana e direitos humanos, para tanto são mencionadas ações ágeis, prudência, articulação com outros serviços, a função do Estado e políticas públicas; e princípio da autonomia e reponsabilidade individual: na tomada de decisão, a importância da emancipação e empoderamento.

Conclusão:

profissionais enfrentam o desafio de estar diante de um agravo cercado por vulnerabilidades e, por vezes, não estão respaldados para atender as complexas demandas da mulher em situação de violência sexual. Políticas públicas de proteção e o atendimento pautado pela acolhida são formas de minimizar o trauma sofrido e podem encorajar a mulher para acessar os serviços.

DESCRITORES:
Violência contra a mulher; Violência sexual; Bioética; Políticas públicas; Equipe de assistência ao paciente

ABSTRACT

Objective:

to analyze the care provided to women in situations of sexual violence, from the perspective of professionals and from the perspective of the Universal Declaration of Bioethics and Human Rights.

Method:

a qualitative, exploratory and descriptive study, conducted in a municipality in the north-central region of the state of Rio Grande do Sul, with 30 professionals from the multiprofessional team of intersectoral care services for women in situations of sexual violence. Data collection was conducted through semi-structured interview from January to April 2016. The results were subjected to Thematic Content Analysis.

Results:

four thematic categories emerged, entitled: principle of respect for human vulnerability and personal integrity, in which situations of vulnerability surrounding women are found; principle of non-discrimination and non-stigmatization: services with adequate structures, confidentiality of information, acceptance, unprejudiced practices and/or judgments in care; principle of human dignity and human rights, agile actions, prudence, articulation with other services, the role of the state and public policies are mentioned; and principle of autonomy and individual responsibility: in decision making, the importance of emancipation and empowerment.

Conclusion:

professionals face the challenge of facing a grievance surrounded by vulnerabilities and sometimes are not supported to meet the complex demands of women in situations of sexual violence. Protective public policies and care-based on user embracement are ways to minimize trauma and can encourage women to access services.

DESCRIPTORS:
Violence against women; Sexual violence; Bioethics; Public policy; Patient care team

RESUMEN

Objetivo:

analizar la atención brindada a las mujeres en situaciones de violencia sexual, desde la perspectiva de los profesionales y desde la Declaración Universal de Bioética y Derechos Humanos.

Método:

estudio cualitativo, exploratorio y descriptivo, realizado en un municipio de la región centro-norte del estado de Rio Grande do Sul, con 30 profesionales del equipo multidisciplinario de servicios de atención intersectorial para mujeres en situaciones de violencia sexual.La recopilación de datos se realizó mediante una entrevista semiestructurada de enero a abril de 2016. Los resultados se sometieron a análisis de contenido temático.

Resultados:

surgieron cuatro categorías temáticas, tituladas: principio de respeto a la vulnerabilidad humana e integridad personal, en el que se encuentran situaciones de vulnerabilidad en torno a las mujeres; principio de no discriminación y no estigmatización: servicios necesarios con estructuras adecuadas, confidencialidad de la información, recepción, prácticas sin prejuicios y / o juicios de asistencia; principio de dignidad humana y derechos humanos, se mencionan acciones ágiles, prudencia, articulación con otros servicios, el papel del estado y las políticas públicas; y principio de autonomía y responsabilidad individual: en la toma de decisiones, la importancia de la emancipación y el empoderamiento.

Conclusión:

los profesionales enfrentan el desafío de enfrentar una queja rodeada de vulnerabilidades y, a veces, no reciben apoyo para satisfacer las complejas demandas de las mujeres en situaciones de violencia sexual. Las políticas públicas de protección y la atención basada en el huésped son formas de minimizar el trauma y pueden alentar a las mujeres a acceder a los servicios.

DESCRIPTORES:
Violencia contra la mujer; Violencia sexual; Bioética; Políticas públicas; Equipo de atención al paciente

INTRODUÇÃO

A violência sexual contra a mulher expressa a perversidade da violência e a desigualdade de gênero. Tratados e convenções, aprovados por órgãos internacionais de direitos, afirmam ser a violência sexual contra a mulher uma violação aos direitos humanos.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

Ainda que não seja o tipo de violência mais prevalente contra a mulher, a violência sexual tem impacto destruidor.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
A exposição à violência resulta em consequências que se estendem desde lesões físicas, risco de gravidez indesejada e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), problemas de saúde sexual e reprodutiva, até a dimensão psíquica, emocional e, em alguns casos, podendo levar à morte. 11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
-22. World Health Organization (WHO). Global status report on violence prevention 2014 [Internet]. Geneva(CH): WHO;2014 [cited 2016 Mar 12].Available from: http://apps.who.int/iris/handle/10665/145086
http://apps.who.int/iris/handle/10665/14...

Os problemas decorrentes da violência também abrangem áreas governamentais como a da saúde, justiça, assistência social, direitos humanos, entre outras, que demandam políticas e ações integradas no enfrentamento desse fenômeno.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
-22. World Health Organization (WHO). Global status report on violence prevention 2014 [Internet]. Geneva(CH): WHO;2014 [cited 2016 Mar 12].Available from: http://apps.who.int/iris/handle/10665/145086
http://apps.who.int/iris/handle/10665/14...
Ela está relacionada além da desigualdade de gênero, com determinantes sociais, com o papel do Estado e com as fragilidades da concretização de políticas públicas no enfrentamento da violência.22. World Health Organization (WHO). Global status report on violence prevention 2014 [Internet]. Geneva(CH): WHO;2014 [cited 2016 Mar 12].Available from: http://apps.who.int/iris/handle/10665/145086
http://apps.who.int/iris/handle/10665/14...

Os movimentos de mulheres e de outros segmentos da sociedade foram fundamentais na conquista dos direitos e fomento de ações do Estado, na implementação de políticas públicas de enfrentamento à violência contra a mulher. Assim, a legislação e políticas referentes à violência contra a mulher que vêm sendo desenvolvidas ao longo dos anos no Brasil, têm objetivo de prevenção e enfrentamento da violência, assistência à saúde, proteção e garantia dos direitos, respaldadas em normas e órgãos internacionais de direitos humanos.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

Referente ao atendimento à mulher em situação de violência sexual, este é realizado na rede de atendimento, que diz respeito a ações e serviços intersetoriais (em especial, da assistência social, da justiça, da segurança pública e da saúde).33. Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres (BR), Secretaria de Políticas para as Mulheres - Presidência da República. Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres [Internet]. Brasília, DF(BR);2011 [cited 2016 Mar 10].Available from: https://www12.senado.leg.br/institucional/omv/entenda-a-violencia/pdfs/rede-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as-mulheres
https://www12.senado.leg.br/instituciona...

É preconizada a assistência humanizada, qualificada e integral, através de equipe multiprofissional e habilitada. Na área da saúde, é recomendável que essa equipe seja composta por profissionais da enfermagem, medicina, psicologia, assistência social. Entretanto, os membros podem variar, dependendo dos profissionais que há em cada unidade de saúde. E, além dos serviços da saúde, atuam profissionais de setores como delegacias, Instituto Médico Legal, judiciário, serviços de apoio social, organizações não governamentais. O atendimento ocorre de acordo com as necessidades de cada situação.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

A realidade da prática assistencial, no contexto da saúde, como mostra uma revisão integrativa sobre a assistência de profissionais de saúde à mulher em situação de violência sexual, valoriza a atenção baseada no modelo biomédico, expõe a falta de articulação dos serviços intersetoriais e a necessidade de capacitação dos profissionais para o atendimento às mulheres em situação de violência sexual .44. Oliveira PS, Rodrigues VP, Morais RLGL, Machado JC. Health professionals’ assistance to women in situation of sexual violence: an integrative review. Rev enferm UFPE [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 16];10(5):1828-39.Available from: https://dx.doi.org/10.5205/reuol.9003-78704-1-SM.1005201632
https://dx.doi.org/10.5205/reuol.9003-78...

Outros estudos em âmbito nacional abordam os aspectos relacionados à rede intersetorial de serviços, o uso de protocolos e o atendimento por profissionais de outras áreas, como médico-legal e jurídico-policial.55. D’oliveira AFPL, Schraiber LB. Mulheres em situação de violência: entre rotas críticas e redes intersetoriais de atenção. Rev Med [Internet]. 2013 [cited 2016 June 08];92(2):134-40.Available from: https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v92i2p134-140 .
https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-98...
-66. Bonnet FR, Cintra RB. Protocolos e iniciativas de atendimento médico-legal em casos de violência sexual em mulheres: comparação entre os achados no Brasil e no mundo. Saúde Ética Jus [Internet]. 2014 [cited 2016 Ago 08];19(1):45-51.Available from: http://www.revistas.usp.br/sej/article/view/97140 .
http://www.revistas.usp.br/sej/article/v...
Internacionalmente, os estudos contextualizam situações de violência sexual contra a mulher em áreas de guerras, o cuidado dos profissionais de saúde, o sistema de atendimento à saúde e a epidemiologia da violência sexual contra a mulher.77. García-Moreno, C; Hegarty, K; d’Oliveira, AFL; Koziol-McLain, J; Colombini, M; Feder, G. The health-systems response to violence against women. Lancet [Internet]. 2015 [cited 2016 June 19];385(9977):1567-79. Available from: https://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(14)61837-7
https://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(14...
-88. Stewart DE, Aviles R, Guedes A, Riazantseva E, MacMillan H. Latin American and Caribbean countries’ baseline clinical and policy guidelines for responding to intimate partner violence and sexual violence against women. Public Health [Internet]. 2015 [cited 2016 June 19];15:665. Available from: https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-9
https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-...

Apesar da existência de estudos que retratam o atendimento à mulher em situação de violência sexual,99. Baptista RS, Chaves OBBM, França ISX, Sousa FS, Oliveira MG, Leite CCS. Sexual violence against women: nurses’ practice. Rev Rene [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 19];16(2):210-7.Available from: https://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.2015000200010
https://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.20...
-1010. Pinto LSS, Oliveira IMP, Pinto ESS, Leite CBC, Melo AN, Deus MCBR. Women’s protection public policies: evaluation of health care for victims of sexual violence. Ciênc. saúde colet [Internet]. 2017 [cited 2018 May 29];22(5):1501-8. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017225.33272016
https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017...
há uma revisão integrativa da literatura, recentemente publicada, em que são analisados, na perspectiva da bioética de risco e proteção, estudos sobre o atendimento hospitalar a mulheres vítimas de violência sexual no contexto brasileiro.1111. Messias PP, Silva JS, Sena ELS, Boery RNSO, Yarid SD. Bioética e atendimento a mulheres vítimas de violência sexual: revisão de literatura. Acta Bioeth [Internet]. 2016 [cited 2017 Aug 08];22(1):91-100. Available from: https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X2016000100010 .
https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X201...
Assim, diante da lacuna de estudos oriundos de pesquisa de campo, que tratam diretamente do atendimento a mulheres em situação de violência sexual, na ótica dos profissionais e na perspectiva da bioética, utilizando a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (DUBDH), o intuito é investigar o atendimento com a aproximação da DUBDH.

Adotou-se a DUBDH da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), por ser um referencial bioético. A DUBDH é um guia para decisões ou práticas de indivíduos, grupos, comunidades, instituições e empresas públicas e privadas.1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...
-1313. Caetano R, Garrafa V. Communication as a tool to promote and spread the Universal Declaration on Bioethics and Human Rights. Rev bioét [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 18];22(1):34-44. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S1983-80422014000100005 .
https://dx.doi.org/10.1590/S1983-8042201...
Incorpora princípios éticos do respeito à dignidade humana e apresenta uma bioética mais abrangente que, além das questões biomédicas e biotecnológicas, traz questões relacionadas com a desigualdade social, ambientais e outros. A DUBDH mostra a importância da bioética como instrumento de auxílio na resolução de conflitos éticos que desrespeitam os direitos humanos. 1414. Rippel JA, Medeiros C, Maluf F. Universal Declaration on Bioethics and Human Rights and CNS Resolution 466/12: a comparative analysis. Rev. bioét [Internet]. 2016 [cited 2018 Feb 21]; 24(3):603-12. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422016243160 .
https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422016...

Deste modo, o estudo tem a propositiva de contribuir para a produção do conhecimento e o fomento da reflexão na temática, a partir de um contexto real onde se processam os desafios profissionais do atendimento a mulheres em situação de violência sexual. Assim, o objetivo do estudo é analisar o atendimento a mulheres em situação de violência sexual, na ótica dos profissionais e na perspectiva da DUBDH. Salienta-se a questão norteadora do estudo: como os profissionais que integram os serviços de atenção à saúde, proteção e apoio psicossocial em um município do Rio Grande do Sul percebem o atendimento a mulheres em situação de violência sexual?

MÉTODO

Estudo de natureza qualitativa, de abordagem exploratória e descritiva. Realizado em um munícipio localizado na região centro-norte do Estado do Rio Grande do Sul, com profissionais da equipe multiprofissional dos serviços intersetoriais de atendimento a mulheres em situação de violência sexual, sendo: 2 (dois) hospitais de referência, Secretaria Municipal de Saúde (SMS) que coordena o Serviço de Atendimento Especializado (SAE), Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e Estratégia Saúde da Família (ESFs); Secretaria de Cidadania e Assistência Social (SEMCAS) que coordena o Centro de Referência Especializada em Assistência Social (CREAS) e a Casa Abrigo; a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM); o Departamento Médico Legal (DML); Ministério Público; e os projetos de extensão da universidade local: Clínica de Prevenção, Intervenção e Acompanhamento em Situações de Violência (CEPAVI), e Prestação Jurídica e Atendimento Multidisciplinar às Mulheres Vítimas de Violência e Familiares (PROJUR/Mulher).

Esses locais foram selecionados por constituírem-se em serviços que realizam atendimento a mulheres em situação de violência sexual. Os participantes da pesquisa foram: enfermeiras/os, psicólogas/os, médicas/os, advogadas/os, assistentes sociais, e outras profissões. A amostra foi composta intencionalmente, totalizando 30 profissionais. Os critérios de inclusão foram: participantes de formação profissional superior ou técnica, que tenham atendido ou atendem mulheres em situação de violência sexual, independente de idade, sexo, horário de trabalho e tempo de atuação. Excluíram-se os profissionais que estavam de férias ou afastados legalmente por algum tipo de licença.

Realizado via telefone o agendamento da entrevista conforme disponibilidade de data e horário do participante, no local de trabalho e assegurando a privacidade. A ordem de coleta de dados foi flexível e seguiu conforme a situação de cada local e das possibilidades apresentadas pelos participantes.

O estudo atendeu as orientações da Resolução n. 466/12 do Conselho Nacional de Saúde que trata das Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo Seres Humanos.

Utilizada como técnica de pesquisa a entrevista semiestruturada. A entrevista consiste em uma estratégia na pesquisa de campo, de comunicação verbal e coleta de informações. A entrevista semiestruturada convenciona questões abertas e fechadas e segue um roteiro como instrumento de pesquisa qualitativa.1515. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14th ed. São Paulo(BR): Hucitec; 2014. As perguntas deste estudo foram abertas e discorreram acerca da organização do atendimento à mulher em situação de violência sexual, modo de atuação profissional; dificuldades e facilidades vivenciadas no atendimento e problemas éticos em casos de mulheres violentadas sexualmente.

Das 30 entrevistas, 23 foram autorizadas a gravação, e sete foram manuscritas, devido a não autorização da gravação pelos participantes. O tempo médio de duração da entrevista foi de 20 minutos. As entrevistas foram transcritas na íntegra em documento do Microsoft Word pela pesquisadora. A coleta de dados ocorreu no período de janeiro a abril de 2016. Os participantes foram identificados pela letra P de profissional, seguida da inicial por área de atuação: S=Saúde (hospitalar e saúde pública) e PAP= Proteção ou Apoio Psicossocial e de um número.

Para a análise dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo Temática.15 As três etapas que compõem essa técnica conduziram a análise: primeira etapa (pré-análise); segunda etapa (exploração do material) e terceira etapa (tratamento dos resultados obtidos e interpretação). Foi realizada a transcrição das entrevistas e, após, a validação de conteúdo pelos participantes. E realizada a caraterização dos participantes.

RESULTADOS

Dos 30 profissionais que participaram das entrevistas: 11 eram enfermeiras/os, seis psicólogas/os, cinco médicas/os, três advogadas/os e três assistentes social, e outras profissões: dois participantes. Na área da saúde: 12 são profissionais que atuam na área hospitalar e 10 na saúde pública. E na área de proteção ou apoio psicossocial foram entrevistados oito profissionais. O tempo de serviço variou de 1 ano a 25 anos ou mais, sendo 28 profissionais com formação de ensino superior e dois de formação técnica.

A partir da leitura, exploração e análise das falas emergiram categorias que possibilitaram uma interface produtiva com quatro dos princípios da DUBDH. Neste sentido, as categorias temáticas foram intituladas com os princípios que melhor agregaram sentido às falas dos participantes da pesquisa, a saber: princípio do respeito pela vulnerabilidade humana e integridade pessoal; princípio da não discriminação e não estigmatização; princípio da dignidade humana e direitos humanos e princípio da autonomia e reponsabilidade individual. Estes princípios foram elencados por conta de seu conceito subsidiar a reflexão de situações trazidas pelos participantes que emergem no atendimento à mulher em situação de violência sexual.

Princípio do respeito pela vulnerabilidade humana e integridade pessoal

Este princípio versa sobre o dever de proteção dos indivíduos e grupos vulneráveis, bem como o respeito pela integridade pessoal. Na aplicação e no avanço dos conhecimentos científicos, na prática médica e das tecnologias, deve ser considerada a vulnerabilidade humana.1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...

As falas a seguir manifestam a apreensão dos profissionais quanto às situações de vulnerabilidade em que chegam as mulheres em situação de violência sexual ou mesmo que poderão enfrentar. Além da dependência financeira, medo, insegurança e sofrimento são alguns dos elementos expressos durante o atendimento e acenam a condição de vulnerabilidades dessas mulheres que convivem e permanecem em situação de violência e, ao mesmo tempo, desvelam as possíveis fragilidades da rede de atendimento: ela trazia o medo de que o agressor que estava preso pudesse sair e pudesse ter alguma represália, por ter processado. A pessoa que faz a queixa e depois retira. Esses jogos que podem acontecer de ameaças é uma hipótese (PS22); elas têm muito medo e receio e sinalizam que não gostariam que a situação relatada fosse publicada. Elas dizem: mas se vou lá e faço essa denúncia, depois ele vai me bater e me violentar da mesma forma (PPAP18); ela acaba se sujeitando porque se ela sair desse relacionamento, ela não sabe fazer “nada”, digamos assim, não tem um preparo profissional para uma atividade que ela possa exercer e ela tem que sustentar cinco crianças e ela vai ter que ficar com essa pessoa (PS17).

Além dos sentimentos vivenciados pelas mulheres, a vulnerabilidade resulta no silêncio e na invisibilidade da violência, assim como no desconhecimento dos direitos e outros fatores que favorecem esse cenário velado: uma mulher que há cerca de 5 anos é abusada sexualmente pelo seu companheiro e, se não bastasse, ele abusava também de sua filha de 8 anos. A mulher era obrigada a manter relações sexuais com o agressor sob ameaças de morte. A mesma sabia também do abuso com sua filha, mas por medo silenciava (PPAP23); as mulheres que vem para nós, muitas não abrem que elas sofrem violência, porque para elas a noção de abuso é desconhecida. A maioria é violentada pelo próprio marido e acham que isso é normal, que têm obrigação de satisfazer o desejo do marido (PPAP18); quando o abusador é dentro de casa fica mais difícil; quando é marido, porque as mulheres acabam não acusando e isso faz com que não existe uma punição. Elas têm um carinho, amor, afeto de anos de relação ou o próprio medo de não conseguirem ficar sozinhas. Há vários fatores sociais de vulnerabilidade dessa mulher, que faz com que às vezes elas só busquem o atendimento de saúde e não chegue a essa parte da delegacia (PS4).

Princípio da não discriminação e não estigmatização

O princípio prevê que “nenhum indivíduo ou grupo deve, em circunstância alguma, ser submetido, em violação da dignidade humana, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, a uma discriminação ou a uma estigmatização”.1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...
:88. Stewart DE, Aviles R, Guedes A, Riazantseva E, MacMillan H. Latin American and Caribbean countries’ baseline clinical and policy guidelines for responding to intimate partner violence and sexual violence against women. Public Health [Internet]. 2015 [cited 2016 June 19];15:665. Available from: https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-9
https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-...

O estigma e a discriminação cercam a violência sexual contra a mulher. Os profissionais expressam a “dor” que essas mulheres carregam: que feridas pela violência sexual, passam por situações constrangedoras, por serviços com estruturas não adequadas para o atendimento, causando a revitimização da mulher: a questão do espaço seria bem importante, se está numa salinha, ninguém vai entrar e atrapalhar; porque às vezes o atendimento é de urgência, às vezes, dentro de uma enfermaria e dependendo onde a pessoa está ela não vai contar, não vai falar, é muito delicado (PS20); ao mesmo tempo alguém está registrando ocorrência que roubaram o rádio do carro, um policial militar registrando a ocorrência de um arrombamento de um banco e entre nós, no outro guichê tem uma pessoa dizendo que foi violentada, vítima de estupro. É um melindre só. Penso nisso como uma dificuldade (PS19); e para a mulher isso já é estar sofrendo outra violência, ela sai do atendimento e depois? O que ela vai fazer? Ela está sendo violentada de novo. Porque ela não está tendo aquele atendimento que a mulher merece ter (PS13).

A confidencialidade das informações é uma das questões importantes a serem observadas para não favorecer o estigma e a discriminação contra a mulher: quanto ao prontuário do paciente, ele passa por várias pessoas dentro da unidade: pela recepção, enfermagem, psicologia e médica. Temos uma alta rotatividade de funcionários terceirizados, portanto frequentemente novos; e você nunca sabe o perfil desse profissional (PS7); ela procurou outra unidade pelo receio que as pessoas que trabalham dentro daquela unidade básica levassem o assunto para os vizinhos. Isso era a preocupação dela (PS29).

Destacam-se também falas acerca da sensação que a mulher percebe de não ser acreditada pela violência sofrida: quando ela chegou em casa, não tinha suporte familiar, porque nenhum familiar acreditou que tinha sido abusada, mesmo estando toda cheia de hematomas (PS3); primeiro porque ela tem o constrangimento de buscar o atendimento, porque ela pode sofrer uma discriminação e outra que não é fácil você admitir que você é vítima de violência [...] ela conta pouco, com bastante dificuldade e vergonha do fato que aconteceu (PS4); uma grande dificuldade é o preconceito social em relação à vítima de violência. A mulher evita procurar ajuda, porque sabe que pode ser discriminada e provavelmente vai ser (PPAP28); ela demorou todos aqueles dias para falar ao esposo, por receio que ele não acreditasse que tivesse realmente sido violentada (PS29).

O estigma que envolve a violência sexual, em muitas situações, incide na culpabilização da mulher: ah, mas anda assim na rua! A questão da roupa, de que às vezes a pessoa provoca para que aconteça alguma coisa, ou, ah saiu de noite, tal hora da madrugada sozinha (PS4); já tivemos algumas pacientes que a primeira consulta foi difícil. Elas sempre ficam envergonhadas e ou culpadas, embora, sempre expliquemos que não têm que ter nenhuma vergonha ou culpa pelo que aconteceu (PS17); ela pode se penalizar, não procurar ajuda e se culpabilizar pelo que aconteceu. A própria sociedade vai discriminar. Então, às vezes, o próprio isolamento é uma forma de proteção, de tentativa de se preservar [...] há a também a dificuldade do acesso, do estigma, então são situações semelhantes nesse ponto, daí a nossa acolhida é fundamental para a paciente ter adesão ao tratamento (PS22).

O preconceito com a mulher em situação de violência sexual, o julgamento e a desconstrução de alguns conceitos são elementos que aparecem também e dificultam o acesso e o atendimento: ainda tem muito a questão da vergonha e do preconceito para acessar não só o atendimento de saúde, mas mesmo para fazer um Boletim de Ocorrência (PS6); como ela vai dizer: eu fui vítima de uma violência sexual. Sempre há um pré-julgamento! Não tem o que julgar, tenho que ouvir o que a paciente está me dizendo e seguir o protocolo [...] para que se comece a derrubar algumas coisas que são uma resistência muito grande dos colegas em relação ao atendimento da violência sexual (PS24).

Princípio da dignidade humana e direitos humanos

O princípio cita que “a dignidade humana, os direitos humanos e as liberdades fundamentais devem ser plenamente respeitados. Os interesses e o bem-estar do indivíduo devem prevalecer sobre o interesse exclusivo da ciência ou da sociedade”.1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...
:66. Bonnet FR, Cintra RB. Protocolos e iniciativas de atendimento médico-legal em casos de violência sexual em mulheres: comparação entre os achados no Brasil e no mundo. Saúde Ética Jus [Internet]. 2014 [cited 2016 Ago 08];19(1):45-51.Available from: http://www.revistas.usp.br/sej/article/view/97140 .
http://www.revistas.usp.br/sej/article/v...

Ações ágeis, prudência, um olhar de todas as dimensões da pessoa e articulação com outros serviços no munícipio remetem ao respeito à dignidade humana e aos direitos da pessoa, aqui especificamente, as mulheres em situação de violência sexual: a vítima de violência sexual é submetida a vários momentos de recapitulação da situação vivenciada. Isso causa um estresse, que prejudica o atendimento na investigação, e em algumas situações, a vítima desiste de levar ao final a punição do agressor (PPAP1); no momento que a paciente procurar, devemos agir, porque se não fizermos naquele instante ela desiste, porque as dificuldades e a pressão são tantas e temos que entender isso [...] orientamos para fazer um Boletim de Ocorrência na Delegacia da Mulher, da necessidade em ser feito, aí percebemos a dificuldade devido às condições que esta mulher se encontra emocionalmente, muitas vezes precisamos chamar o serviço até a unidade (PS7); dentro do possível tentamos não questionarmos muito e passarmos de uma equipe para outra; tentamos já direcionar para que a pessoa não sofra esse constrangimento, porque já tem o constrangimento da situação e ainda o constrangimento de estar todo mundo querendo saber o que houve (PS9).

A complexidade da situação é um desafio para o atendimento, conforme alguns profissionais relatam. Há a dificuldade na abordagem e, por outro lado, da própria mulher relatar o fato ocorrido, estando a dignidade humana relacionada além do respeito, com a empatia: ela vem com humildade e sofrimento interior. Muitas vezes elas não querem identificar muito bem a situação; contam só um pouco, outro pouco e se retraem (PS9); na maioria das vezes, senão na sua totalidade, as vítimas sentem-se constrangidas em falar sobre o que realmente aconteceu, pois precisam lembrar e relembrar a grave situação de violação de direitos a que foram expostas, o que contribui de sobremaneira para o agravamento das consequências nefastas no físico e psiquismo (PPAP23).

Outra questão é a função do Estado na preservação dos direitos da pessoa e na promoção da autonomia da mulher, além da existência de locais de referência e da rede de atendimento constituída. No entanto, lacunas na articulação desses locais são um problema para o profissional: o que fazer?

Há situações que nós ficamos de “saia justa”, sem saber o que fazer. Esse direcionamento que nós temos que ter bem claro e nós não temos ainda (PS5); o governo tem que buscar para a mulher a prevenção e capacitação para que ela possa se formar em algum serviço e que ela possa trabalhar, tirar seu sustento, ser independente e não depender do agressor. Trabalhar a autonomia da mulher [...] entendo que a violência sexual contra a mulher é um problema de saúde pública, tanto que desenvolvemos várias atividades dentro da nossa comunidade, dentro dos órgãos e cobramos muito [...] o Estado nos “violenta” pela demora nas consultas, na demora dos exames, na demora do atendimento à mulher, nos encaminhamentos (PPAP18); o Estado hoje como um todo não está preparado para esse tipo de questão. Nós estamos despreparados para atender essa questão [...] (PPAP30).

Princípio da autonomia e reponsabilidade individual

Refere-se à autonomia no que respeita à tomada de decisões, assumindo a respectiva responsabilidade e respeitando a autonomia dos outros. Em casos de pessoas incapazes de exercer a sua autonomia, medidas especiais devem ser adotadas para proteger os seus direitos e interesses. 1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...

Em situações de violência sexual de mulheres na vida conjugal, uma questão que possibilitaria a pessoa pensar por si e agir por si mesma na tomada de decisão seria a emancipação, assim como superação da vulnerabilidade social e outras vulnerabilidades. Considerando o respeito da tomada de decisão e a proteção dos direitos e interesses dos indivíduos, o profissional precisa fornecer as informações, mas também precisa compreender o que está envolvido na tomada de uma decisão pela mulher, como nos fatores envolvidos no rompimento do ciclo da violência: existem também as dificuldades do usuário saber de seus direitos. Temos que trabalhar com várias dificuldades. Chega a usuária que não sabia que teria certos direitos, então ela vai conhecer e se inteirar dos seus direitos aqui dentro (PPAP2); no momento que elas são abordadas na questão de registrar o Boletim de Ocorrência, de buscar validar os seus direitos, a maioria delas não busca, não quer buscar, então só vem para atendimento médico mesmo (PS4); então tem que romper com uma identidade que a mulher é vítima de violência e passar a ser alguém não violentada, é muito complicado. É romper com um parâmetro, uma identidade, e às vezes elas fogem dos tratamentos por conta disso [...] não temos outro recurso, a não ser orientar o paciente a despertar para que ela faça esse movimento, mas é muito complicado, porque para algumas dessas mulheres está ruim, mas é a única vida que elas têm e para outras tem que romper com uma vida que elas viveram a vida toda (PS6).

DISCUSSÃO

As falas mostram duas circunstâncias específicas da mulher em situação de violência sexual: a mulher que vem de uma condição de violência sexual crônica, perpetrada por alguém próximo ou com vínculo afetivo; e a situação da violência sexual aguda, na maioria dos casos praticada por desconhecidos. No entanto, ambas as violências apontam situações de vulnerabilidade que a mulher vivencia; como se analisa na categoria do respeito pela vulnerabilidade humana e integridade pessoal.

Sobre vulnerabilidade, salienta-se a diferença entre os conceitos de vulnerável e vulnerado. Vulnerável é a característica universal de qualquer organismo, como fragilidade e não como dano, em que ações do Estado de proteção são importantes para que a vulnerabilidade, que é aspecto inerente ao ser humano, não se transforme em lesão à integridade do indivíduo. Já, vulnerado diz respeito à situação de fato de dano e que é importante na tomada de decisão; e, devido aos danos, é necessário que a sociedade ofereça serviços terapêuticos e de proteção para redução dos mesmos. A atenção deve ser direcionada a indivíduos, famílias, grupos e comunidades que se tornaram vulneráveis por alguma condição, seja individual, social ou ambiental. Mulheres também estão no grupo como vulneráveis.1616. Morais TCA, Monteiro PS. Concepts of human vulnerability and individual integrity in bioethics. Rev. bioét [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];25(2):311-19.Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017252191
https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017...

A situação de violência crônica exige do profissional durante o atendimento a perspicácia em perceber que há algo além da queixa presente da mulher. O âmbito doméstico, situações de dependência financeira e outros fatores favorecem, por exemplo, a vulnerabilidade social dessa mulher e conferem à violência a característica da invisibilidade1717. Leite MTS, Figueiredo MFS, Dias OV, Vieira MA, Souza LPS, Mendes DC. Reports of violence against women in different life cycles. Rev Latino-Am Enferm [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 18];22(1):85-92. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.3186.2388 .
https://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.318...
e do silêncio. Mesmo sendo orientada e encaminhada aos órgãos responsáveis para completar o atendimento na rede, o que os profissionais relatam é ver que muitas vezes a situação fica restrita ao atendimento à saúde, e que o ciclo da violência possivelmente continuará.

Na violência sexual aguda, como na crônica, percebe-se, nas falas dos profissionais, o medo de muitas mulheres em denunciar o agressor, podendo ser inferida uma análise de possíveis lacunas na rede intersetorial. Estudo55. D’oliveira AFPL, Schraiber LB. Mulheres em situação de violência: entre rotas críticas e redes intersetoriais de atenção. Rev Med [Internet]. 2013 [cited 2016 June 08];92(2):134-40.Available from: https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v92i2p134-140 .
https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-98...
realizado em outro cenário brasileiro, referente à rede de intersetorial à mulher em situação de violência, descreve a fragmentação e a desarticulação entre os serviços da rede, em que a articulação e o funcionamento desta, como demostrou um estudo sobre a sustentabilidade e a continuidade de redes de articulação, inclui a participação ativa dos membros, investimento da gestão, reuniões, visitas, entre outras estratégias.1818. Brigagão JIM, Santos FBP, Spink PK. A sustentabilidade e a continuidade de redes de articulação: o caso do Iluminar Campinas. Saúde Soc [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 10];25(2):361-8. vailable from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902016143671"

Além disso, há o sentimento de inferioridade, insegurança e medo que a mulher expressa. Sequelas por vezes ficam para sempre e remontam a situação vulnerável em que consiste a violência sexual contra a mulher. Neste sentido, a DUBDH, como um referencial da bioética, contribui com diretrizes para a construção de políticas públicas voltadas a grupos vulneráveis.1919. Corgozinho MM, Oliveira AAS. Equidade em saúde como marco ético da bioética. Saúde Soc [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 10];25(2):431-41. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902016153764
https://dx.doi.org/10.1590/S0104-1290201...
A DUBDH é um documento global que representa um importante instrumento para respaldar as ações dos profissionais, implicados nos atendimentos a este público. Para a efetivação das práticas acolhedoras às mulheres em situação de violência sexual, os elementos de natureza bioética podem tornar-se normativos, pois consideram todos os aspectos de vulnerabilidade que envolvem a mulher, para que ações de proteção sejam oferecidas de modo a compreender e respeitar os fatos velados do contexto social destas mulheres e que podem influenciar nas suas decisões.

Outra situação relatada pelos participantes diz respeito a situações em que as mulheres são violentadas pelos próprios companheiros, entretanto, elas não reconhecem como violência sexual, pois entendem que estão cumprindo com seu papel de parceira. Esta situação é revelada como algo natural nos serviços, que por vezes, não é propriamente pela violência sexual que a mulher procura o serviço, mas por outros tipos de violência, como a física, moral, psicológica, ou por outras situações de saúde. Para o profissional entender que a mulher acredita ser normal estar nessa situação o remete à compreensão de uma construção cultural e da alienação de direitos como ser humano desta mulher, traduzindo a desigualdade de gênero representada pela violência sexual. 2020. Silva EB, Padoin SMM, Vianna LAC. Violence against women and care practice in the perception of the health professionals. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 10];24(1): 229-37. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072015003350013
https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072015...

A categoria do princípio da não discriminação e não estigmatização permite expressar os elementos imbricados na violência sexual contra a mulher, tanto por parte de familiares, de profissionais como também da sociedade. Um fator que contribui para essa situação são serviços não adequados para atender a mulher, no que diz respeito à estrutura física e a profissionais não habilitados para receber a mulher violentada sexualmente.1111. Messias PP, Silva JS, Sena ELS, Boery RNSO, Yarid SD. Bioética e atendimento a mulheres vítimas de violência sexual: revisão de literatura. Acta Bioeth [Internet]. 2016 [cited 2017 Aug 08];22(1):91-100. Available from: https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X2016000100010 .
https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X201...
Outro fator são as práticas assistenciais que estigmatizam e discriminam a mulher em situação de violência sexual, quando não acolhidas ou tratadas como culpadas pelo ato, preconceitos, entre outras atitudes, que ferem a dignidade humana e os direitos humanos, princípios bioéticos fundamentais.1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...

O estigma atribui à mulher a desconfiança de si mesma, ou seja, ela vive o temor de não ser acreditada pela violência sofrida, resistindo em procurar ajuda. Um estudo,2121. Serisier T. “How Can a Woman Who Has Been Raped Be Be-lieved?”. Andrea Dworkin, Sexual Violence and the Ethics of Belief. Diegesis [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 10];4(1):68-87.Available from: http://pure.qub.ac.uk/portal/files/15896256/Serisier_diegesis_published.pdf
http://pure.qub.ac.uk/portal/files/15896...
ao tratar dessa temática, analisa a descrença ou a negação vivenciada pelas mulheres diante do relato de estupro. E, em outro estudo analítico do princípio de não discriminação e não estigmatização, é abordado sobre a importância de compreender os processos de produção do estigma e da discriminação e as implicações destas práticas às pessoas e sociedade.2222. Godoi AMM, Garrafa V. Bioethics reading of the principle of non-discrimination and non-stigmatization. Saúde Soc. [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 08];23(1):157-66. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902014000100012
https://dx.doi.org/10.1590/S0104-1290201...
Diante disso, estar ciente destes processos pode evitar que tais práticas sejam reproduzidas no atendimento à mulher, uma vez que em muitas situações a mulher já é discriminada pela família e sociedade.

Assegurar confidencialidade das informações fornecidas pela mulher nos serviços é um desafio, conforme alguns participantes. Um estudo realizado na área da saúde também destacou a preocupação entre os profissionais com o respeito à confidencialidade das informações dos usuários. 2323. Siqueira-Batista R, Gomes AP, Motta LCS, Renno L, Lopes TC, Miyadahira R, et al. (Bio)ethics and Family Health Strategy: mapping problems. Saúde Soc [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];24(1):113-28. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902015000100009
https://dx.doi.org/10.1590/S0104-1290201...
São questões que configuram uma preocupação bioética de diferentes profissionais para além das questões normativas da profissão e seus códigos deontológicos. Confidencialidade é um princípio implicado, inclusive na DUBDH,1212. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
https://unesdoc.unesco.org/images/0014/0...
é um dos fundamentos do respeito à dignidade humana.

Os depoimentos revelam, em algumas situações, o desconforto e o sofrimento vivenciado pela mulher que procura o atendimento. Independente do local da rede de atendimento, se não houver profissionais preparados para acolher essa mulher, a assistência e o seu seguimento estão comprometidos. Logo, o silêncio e o isolamento social podem ser uma defesa para enfrentar a “carga” do estigma e da discriminação. Nesse sentido, o acolhimento pelo profissional fundamentado em princípios bioéticos, como o respeito, favorece a mulher a se sentir verdadeiramente acolhida pelos serviços, diferente de um atendimento restrito a aspectos técnicos, operacionais, apáticos. Este acolhimento pautado pela empatia é um pressuposto descrito em estudos que minimiza a dor da mulher nessa situação e encoraja-a para acessar a rede de atendimento e buscar os seus direitos. 2424. Cortes LF, Padoin SMM, Vieira LB, Landerdahl MC, Arboit J. Care for women victims of violence: empowering nurses in the pursuit of gender equity. Rev Gaúcha Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];36(spe):77-84. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.57162 .
https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.201...
-2525. Trigueiro TH, Merighi MAB, Medeiros ARP, Ribeiro CEL, Mata NDS, Jesus MCP. Victims of sexual violence attended in a specialized service. Cogitare Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];20(2):249-56. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/40355/25510
http://revistas.ufpr.br/cogitare/article...

Sobre a categoria do princípio da dignidade humana e direitos humanos, no contexto do atendimento à mulher em situação de violência sexual, pode-se inferir que a agilidade e o respeito na assistência constituem ações na defesa da dignidade da mulher, além de outros elementos já discutidos nas categorias anteriores. Os profissionais, participantes da pesquisa, sinalizam que por vezes há a dificuldade da mulher relatar o ocorrido. Logo, acredita-se que o relato pode ocorrer na medida em que a assistência configure-se em um atendimento diferenciado. Isto é, além do tratamento clínico, faz-se necessário o aporte emocional, psicológico e espiritual, capaz de proporcionar efetividade de condutas pertinentes e de condições para minimizar o trauma sofrido.

Salienta-se que a integralidade da assistência é preconizada também em outras situações, mas em muitos locais a mulher em situação de violência sexual é atendida em serviços que não são exclusivos, como nos centros de referências à mulher (saúde pública, delegacias, hospitais). Logo, o atendimento em serviços gerais torna-se desafiador.

E, além dos profissionais, ações do Estado também corroboram com o princípio da dignidade humana e direitos humanos. Todavia, há a percepção dos participantes sobre o enfraquecimento do Estado, embora o direito à saúde seja seu dever, existem fragilidades no enfrentamento da violência contra mulher. E isso é constatado pela falta de profissionais e demora no agendamento de especialistas, repercutindo também na equipe que não tem um direcionamento para os encaminhamentos e comprometendo, assim, a proteção da mulher. O papel do Estado na garantia de direitos, como a saúde e a proteção social, é elemento de discussão bioética. Assumir este critério para pensar os conflitos oriundos da frágil proteção do Estado pode fornecer argumentos para a produção de políticas que considerem além da prevenção, a responsabilidade solidária para uma proteção que seja tanto individual como coletiva. 2626. Lessa SC, Schramm FR. Proteção individual versus proteção coletiva: análise bioética do programa nacional de vacinação infantil em massa. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2017 Mar 08];20(1):115-24. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014201.14882013
https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014...

Na quarta categoria, autonomia e responsabilidade individual, entende-se que a mulher em situação de violência sexual necessita de um suporte social e individual para sobrepor essa realidade e romper com o ciclo. O conhecimento de seus direitos, o trabalho e o estudo são fatores que contribuem na emancipação e empoderamento da mulher. Esses aspectos são apontados em uma pesquisa realizada com mulheres em situação de violência interpessoal pelo parceiro íntimo, analisando os fatores envolvidos na tomada de decisão na busca por apoio institucional de referência e autoconfiança para a saída da situação de violência. 2727. AlbuquerqueNettoL, Moura MAV, Silva GF, Penna LHG, Pereira ALF. Women in situation of violence by their intimate partner: making a decision to seek a specialized violence support service. Rev Gaúcha Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];36(spe):135-42.Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.54361
https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.201...

No entanto, os participantes da pesquisa expressam a preocupação de que a mulher, para sair da situação de violência, precisa ser ajudada a romper muitas vezes com uma identidade e isso é um desafio. Assim, o vínculo com o profissional, numa relação de confiança e apoio, o acesso e adesão ao tratamento formam um conjunto de elementos que dentro de um contexto social podem fortalecê-la como pessoa emancipada.2323. Siqueira-Batista R, Gomes AP, Motta LCS, Renno L, Lopes TC, Miyadahira R, et al. (Bio)ethics and Family Health Strategy: mapping problems. Saúde Soc [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];24(1):113-28. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902015000100009
https://dx.doi.org/10.1590/S0104-1290201...
Um estudo realizado com mulheres em situação de violência pelo parceiro íntimo destaca que os vínculos estabelecidos pelo acolhimento, integralidade e efetividade do atendimento são importantes para a autonomia da mulher. 2828. Albuquerque Netto L, Moura MAV, Araujo CLF, Souza MHN, Silva GF. Social support networks for women in situations of violence by an intimate partner. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];26(2):e07120015. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017007120015
https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017...

Um estudo de reflexão, ao abordar o conceito da autonomia, relaciona-o à liberdade de escolha pautada nas informações recebidas e opções oferecidas. Assim, a autonomia é um processo desenvolvido com base no meio em que o indivíduo vive, como contribuições biológicas, psíquicas e socioculturais, que podem interferir na capacidade de decisão do indivíduo. Logo, a autonomia do indivíduo pode ser aumentada ou reduzida por circunstâncias como faixa etária, estado psicológico, entre outras situações. 2929. Cosac DCS. Autonomy, consent and vulnerability of clinical research participants. Rev. bioét [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];25(1):19-29. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017251162
https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017...

A reflexão proposta entre as questões cotidianas relatadas por profissionais no atendimento às mulheres em situação de violência sexual e a análise inferida na perspectiva da DUBDH estão limitadas a um cenário específico de serviços de atendimento a este público. Desta forma, seus resultados não podem ser generalizados a outras realidades. A realização de estudos em outros contextos, utilizando a DUBDH, pode ampliar a discussão acerca da temática.

Ainda recomenda-se a realização de outros estudos de forma a aprofundar aspectos bioéticos implicados no atendimento a fim de contribuir na integralidade da assistência e no enfrentamento da violência sexual contra a mulher.

CONCLUSÃO

Os resultados analisados ressaltam que as questões implicadas no atendimento à mulher em situação de violência sexual identificadas pelos profissionais remetem a elementos da bioética, como a dignidade humana, a autonomia, a não discriminação, não estigmatização, os direitos humanos, proteção do Estado e por possíveis fragilidades na rede de atendimento, como desarticulação entre os serviços.

Infere-se que os profissionais enfrentam o desafio de estar diante de um agravo que acomete a saúde e a vida da mulher em todas as dimensões e, por vezes, não estão respaldados, seja por estruturas adequadas, organização da rede ou mesmo porque não se sentem apropriados de todo conhecimento requerido para atender as complexas demandas da mulher em situação de violência sexual.

A escolha de alguns princípios da DUBDH, um dos referenciais da bioética, respaldou os achados do estudo, aproximando questões contextuais, técnicas, operacionais e subjetivas de uma reflexão pautada em fundamentos bioéticos. Com isso, migra-se de uma compressão unidirecional e desvela-se um cenário com outras possibilidades para discussão e construção de novas perspectivas.

REFERENCES

  • 1. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: Norma Técnica [Internet]. Brasília, DF(BR): MS;2012 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
    » https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf
  • 2. World Health Organization (WHO). Global status report on violence prevention 2014 [Internet]. Geneva(CH): WHO;2014 [cited 2016 Mar 12].Available from: http://apps.who.int/iris/handle/10665/145086
    » http://apps.who.int/iris/handle/10665/145086
  • 3. Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres (BR), Secretaria de Políticas para as Mulheres - Presidência da República. Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres [Internet]. Brasília, DF(BR);2011 [cited 2016 Mar 10].Available from: https://www12.senado.leg.br/institucional/omv/entenda-a-violencia/pdfs/rede-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as-mulheres
    » https://www12.senado.leg.br/institucional/omv/entenda-a-violencia/pdfs/rede-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as-mulheres
  • 4. Oliveira PS, Rodrigues VP, Morais RLGL, Machado JC. Health professionals’ assistance to women in situation of sexual violence: an integrative review. Rev enferm UFPE [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 16];10(5):1828-39.Available from: https://dx.doi.org/10.5205/reuol.9003-78704-1-SM.1005201632
    » https://dx.doi.org/10.5205/reuol.9003-78704-1-SM.1005201632
  • 5. D’oliveira AFPL, Schraiber LB. Mulheres em situação de violência: entre rotas críticas e redes intersetoriais de atenção. Rev Med [Internet]. 2013 [cited 2016 June 08];92(2):134-40.Available from: https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v92i2p134-140
    » https://dx.doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v92i2p134-140
  • 6. Bonnet FR, Cintra RB. Protocolos e iniciativas de atendimento médico-legal em casos de violência sexual em mulheres: comparação entre os achados no Brasil e no mundo. Saúde Ética Jus [Internet]. 2014 [cited 2016 Ago 08];19(1):45-51.Available from: http://www.revistas.usp.br/sej/article/view/97140
    » http://www.revistas.usp.br/sej/article/view/97140
  • 7. García-Moreno, C; Hegarty, K; d’Oliveira, AFL; Koziol-McLain, J; Colombini, M; Feder, G. The health-systems response to violence against women. Lancet [Internet]. 2015 [cited 2016 June 19];385(9977):1567-79. Available from: https://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(14)61837-7
    » https://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(14)61837-7
  • 8. Stewart DE, Aviles R, Guedes A, Riazantseva E, MacMillan H. Latin American and Caribbean countries’ baseline clinical and policy guidelines for responding to intimate partner violence and sexual violence against women. Public Health [Internet]. 2015 [cited 2016 June 19];15:665. Available from: https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-9
    » https://doi.org/10.1186/s12889-015-1994-9
  • 9. Baptista RS, Chaves OBBM, França ISX, Sousa FS, Oliveira MG, Leite CCS. Sexual violence against women: nurses’ practice. Rev Rene [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 19];16(2):210-7.Available from: https://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.2015000200010
    » https://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.2015000200010
  • 10. Pinto LSS, Oliveira IMP, Pinto ESS, Leite CBC, Melo AN, Deus MCBR. Women’s protection public policies: evaluation of health care for victims of sexual violence. Ciênc. saúde colet [Internet]. 2017 [cited 2018 May 29];22(5):1501-8. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017225.33272016
    » https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017225.33272016
  • 11. Messias PP, Silva JS, Sena ELS, Boery RNSO, Yarid SD. Bioética e atendimento a mulheres vítimas de violência sexual: revisão de literatura. Acta Bioeth [Internet]. 2016 [cited 2017 Aug 08];22(1):91-100. Available from: https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X2016000100010
    » https://dx.doi.org/10.4067/S1726-569X2016000100010
  • 12. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (UNESCO). Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humano [Internet]. Paris(FR): UNESCO; 2005 [cited 2016 Mar 10]. Available from: https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
    » https://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf
  • 13. Caetano R, Garrafa V. Communication as a tool to promote and spread the Universal Declaration on Bioethics and Human Rights. Rev bioét [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 18];22(1):34-44. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S1983-80422014000100005
    » https://dx.doi.org/10.1590/S1983-80422014000100005
  • 14. Rippel JA, Medeiros C, Maluf F. Universal Declaration on Bioethics and Human Rights and CNS Resolution 466/12: a comparative analysis. Rev. bioét [Internet]. 2016 [cited 2018 Feb 21]; 24(3):603-12. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422016243160
    » https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422016243160
  • 15. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14th ed. São Paulo(BR): Hucitec; 2014.
  • 16. Morais TCA, Monteiro PS. Concepts of human vulnerability and individual integrity in bioethics. Rev. bioét [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];25(2):311-19.Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017252191
    » https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017252191
  • 17. Leite MTS, Figueiredo MFS, Dias OV, Vieira MA, Souza LPS, Mendes DC. Reports of violence against women in different life cycles. Rev Latino-Am Enferm [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 18];22(1):85-92. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.3186.2388
    » https://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.3186.2388
  • 18. Brigagão JIM, Santos FBP, Spink PK. A sustentabilidade e a continuidade de redes de articulação: o caso do Iluminar Campinas. Saúde Soc [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 10];25(2):361-8. vailable from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902016143671"
  • 19. Corgozinho MM, Oliveira AAS. Equidade em saúde como marco ético da bioética. Saúde Soc [Internet]. 2016 [cited 2016 Aug 10];25(2):431-41. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902016153764
    » https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902016153764
  • 20. Silva EB, Padoin SMM, Vianna LAC. Violence against women and care practice in the perception of the health professionals. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 10];24(1): 229-37. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072015003350013
    » https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072015003350013
  • 21. Serisier T. “How Can a Woman Who Has Been Raped Be Be-lieved?”. Andrea Dworkin, Sexual Violence and the Ethics of Belief. Diegesis [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 10];4(1):68-87.Available from: http://pure.qub.ac.uk/portal/files/15896256/Serisier_diegesis_published.pdf
    » http://pure.qub.ac.uk/portal/files/15896256/Serisier_diegesis_published.pdf
  • 22. Godoi AMM, Garrafa V. Bioethics reading of the principle of non-discrimination and non-stigmatization. Saúde Soc. [Internet]. 2014 [cited 2016 Aug 08];23(1):157-66. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902014000100012
    » https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902014000100012
  • 23. Siqueira-Batista R, Gomes AP, Motta LCS, Renno L, Lopes TC, Miyadahira R, et al. (Bio)ethics and Family Health Strategy: mapping problems. Saúde Soc [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];24(1):113-28. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902015000100009
    » https://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902015000100009
  • 24. Cortes LF, Padoin SMM, Vieira LB, Landerdahl MC, Arboit J. Care for women victims of violence: empowering nurses in the pursuit of gender equity. Rev Gaúcha Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];36(spe):77-84. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.57162
    » https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.57162
  • 25. Trigueiro TH, Merighi MAB, Medeiros ARP, Ribeiro CEL, Mata NDS, Jesus MCP. Victims of sexual violence attended in a specialized service. Cogitare Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];20(2):249-56. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/40355/25510
    » http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/40355/25510
  • 26. Lessa SC, Schramm FR. Proteção individual versus proteção coletiva: análise bioética do programa nacional de vacinação infantil em massa. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2017 Mar 08];20(1):115-24. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014201.14882013
    » https://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014201.14882013
  • 27. AlbuquerqueNettoL, Moura MAV, Silva GF, Penna LHG, Pereira ALF. Women in situation of violence by their intimate partner: making a decision to seek a specialized violence support service. Rev Gaúcha Enferm [Internet]. 2015 [cited 2016 Aug 08];36(spe):135-42.Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.54361
    » https://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.54361
  • 28. Albuquerque Netto L, Moura MAV, Araujo CLF, Souza MHN, Silva GF. Social support networks for women in situations of violence by an intimate partner. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];26(2):e07120015. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017007120015
    » https://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017007120015
  • 29. Cosac DCS. Autonomy, consent and vulnerability of clinical research participants. Rev. bioét [Internet]. 2017 [cited 2018 Feb 21];25(1):19-29. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017251162
    » https://dx.doi.org/10.1590/1983-80422017251162

NOTAS

  • ORIGEM DO ARTIGO

    Texto extraído da dissertação - Atendimento a mulheres em situação de violência sexual em um município do sul do brasil: análise na perspectiva da bioética, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, da Universidade Federal de Santa Catarina, em 2016.
  • FINANCIAMENTO

    O presente trabalho contou com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
  • APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

    Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina parecer nº 1.353.999 e CAAE: 50935915.9.0000.0121

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    13 Mar 2018
  • Aceito
    12 Jun 2018
Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós Graduação em Enfermagem Campus Universitário Trindade, 88040-970 Florianópolis - Santa Catarina - Brasil, Tel.: (55 48) 3721-4915 / (55 48) 3721-9043 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: textoecontexto@contato.ufsc.br