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DISCURSOS DE GESTORES SOBRE INFORMAÇÃO E CONHECIMENTO RELACIONADO AO TRATAMENTO DIRETAMENTE OBSERVADO DA TUBERCULOSE

RESUMO

Estudo qualitativo que objetivou analisar os discursos de 15 gestores distritais sobre o conhecimento e a informação relacionada à transferência de política do tratamento diretamente observado da tuberculose no município de João Pessoa, Paraíba. O material empírico coletado nos meses de maio e junho de 2013, da técnica de entrevista, foi analisado conforme o aporte teórico-analítico de análise de discurso na linha francesa pecheutiana. Apesar de contradições, equívocos e silêncios observados em alguns discursos sobre essa política, percebeu-se que os enunciadores valorizam o matriciamento e as discussões compartilhadas envolvendo os profissionais, a gestão e o usuário, com ênfase na reorganização do serviço para operacionalização do tratamento diretamente observado. Assinala-se a necessidade de investimento na qualificação profissional, buscando aprimorar o processo de trabalho a partir da reorientação de práticas na perspectiva da Educação Permanente, que representa um forte dispositivo para troca de saberes e propostas inovadoras para o efetivo controle da tuberculose.

DESCRITORES:
Atenção primária à saúde; Conhecimento; Políticas públicas; Tuberculose; Gestor de saúde

ABSTRACT

Qualitative study that aimed to analyze the discourse of 15 district managers about knowledge and information related to the transfer of the Directly Observed Treatment of Tuberculosis policy in the city of João Pessoa, Paraíba, Brazil. The empiric material, collected in May and June 2013 through interviews, was analyzed according to Michel Pêcheux's Discourse Analysis. Despite contradictions, misunderstandings and silences observed in some discourse about this policy, the interviewees value the matricial support and the shared discussions involving the professionals, the management and the users, with emphasis on the rearrangement of the service in operating the Directly Observed Treatment of Tuberculosis. The need for investments in professional qualification is clear, with a view to refining the work process through the reorientation of practices from the perspective of continuing education, which represents a strong device for the exchange of knowledge and innovative proposals with a view to effective tuberculosis control.

DESCRIPTORS:
Primary health care; Knowledge; Public policies; Tuberculosis; Health manager

RESUMEN

Estudio cualitativo que objetivó analizar discursos de 15 gestores distritales sobre conocimiento e información relacionada a la transferencia de política del tratamiento directamente observado de tuberculosis en el municipio de João Pessoa, Paraíba, Brasil. El material empírico colectado los meses de mayo y junio de 2013 a través de técnica de entrevista fue analizado conforme aporte teórico-analítico de análisis de discurso de línea francesa pecheutiana. A pesar de contradicciones, equívocos y silenciamientos observados en algunos discursos sobre esa política, se percibió que enunciadores valorizan lo matricial y las discusiones compartidas envolviendo profesionales, gestión y usuario, con énfasis en reorganización del servicio para operatividad del tratamiento directamente observado. Se identifica la necesidad de inversión en calificación profesional buscando mejorar el proceso de trabajo a partir de reorientación de prácticas en la perspectiva de la educación permanente, que representa fuerte dispositivo para intercambio de saberes y propuestas innovadoras para el efectivo control de la tuberculosis.

DESCRIPTORES:
Atención primaria de salud; Conocimiento; Políticas públicas; Tuberculosis; Gestor de salud

INTRODUÇÃO

A tuberculose é uma doença infecciosa que atinge todos os grupos etários e permanece como um dos principais problemas de saúde pública no cenário mundial. Ataca predominantemente os indivíduos do sexo masculino, economicamente ativo, com idades entre a faixa etária dos 15 aos 54 anos. A prevalência de casos registrados é maior em áreas de grande concentração populacional vinculada a importantes fatores sociais, econômicos e sanitários. Anualmente são notificados cerca de seis milhões de novos casos de tuberculose em todo o mundo, levando mais de um milhão de pessoas a óbito. O Brasil ocupa atualmente a 16ª posição dentre os 22 países com maior carga da doença, sendo responsáveis por 80% dos casos mundiais.11. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico. Brasília (DF): MS; 2014.

O tratamento diretamente observado (TDO) compõe um dos cincos pilares da estratégia Directly Observed Treatment-short Course (DOTS), lançado no Brasil em 1996 pelo Ministério da Saúde (MS), para melhoria de alguns indicadores relacionados à tuberculose. Consiste na observação da ingestão dos medicamentos, preferencialmente todos os dias, visando o fortalecimento da adesão do doente ao tratamento e à prevenção do aparecimento de cepas resistentes aos medicamentos.22. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica. Tratamento Diretamente Observado (TDO) da Tuberculose na Atenção Básica: protocolo de enfermagem. Brasília: MS; 2011.-33. Peruhype RC, Bath-Hextall F, Galvão CM, Darlington N, Palha PF. The effectiveness of educational interventions for health professionals in Direct Observed Therapy and the Directly Observed Therapy Short-Course strategy: a systematic review protocol. JBI Database of Systematic Reviews & Implementation Reports [online]. 2014 [cited 2015 May 18]; 12(4):17-6. Available from: http://joannabriggslibrary.org/index.php/jbisrir/article/view/996/1935
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Estudos realizados44. Souza MSPL, Aquino R, Pereira SM, Costa MCN, Barreto ML, Natividade M, et al. Fatores associados ao acesso geográfico aos serviços de saúde por pessoas com tuberculose em três capitais do Nordeste brasileiro. Cad Saúde Pública [online]. 2015 [cited 2015 Jun 18]; 31(1):111-20. Available from: http://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0102-311X2015000100111&script=sci_arttext&tlng=en
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-55. Arakawa T, Arcêncio RA, Scatolin BE, Scatena LM, Ruffino Netto A, Villa TCS. Accessibility to tuberculosis treatment: assessment of health service performance. Rev Latino-am Enfermagem [online]. 2011[cited 2015 Jun 18]; 19(4):1994-2002. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692011000400019&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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no Brasil constataram a baixa adesão dos serviços da Atenção Básica (AB) à incorporação do TDO e evidenciaram que as autoridades estaduais e municipais não respondem adequadamente às realidades demográficas aliadas ao planejamento e financiamento de programas para minimizar os custos, ditos como ocultos do acesso aos serviços de tuberculose.

Frente à realidade produzida pela tuberculose, o MS, a partir do ano 2001, empreendeu estratégias de controle dessa doença, agregando instrumentos por meio da articulação entre a Estratégia de Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), por compreender que ambas poderiam facilitar a integração das atividades relacionadas às famílias e aos grupos da comunidade. Desse modo, foram ampliadas ações de prevenção e controle da doença, a fim de melhorar alguns indicadores epidemiológicos, como a taxa de cura, o índice de abandono e óbito.2

A transferência de política é considerada um modelo de desenvolvimento e/ou movimento que visa dar sentido a um conjunto de processos, em que o conhecimento sobre instituições, serviços e sistemas em um determinado setor ou nível de governança é usado para avaliação de uma dada política ou programa, considerando, sobretudo, informações e ações inovadoras em diferentes locais e contextos.6-8

O conhecimento e a informação, associados, são elementos-chave no processo de transferência de política do TDO. A transferência de política busca compreender um processo ou conjunto de processos em que diferentes tipos de conhecimentos relacionados às instituições, programas, políticas ou sistemas provenientes de um setor ou nível de governança são utilizados no desenvolvimento de políticas em outro serviço ou nível de governança, conforme acontece na descentralização do TDO para o serviço da AB.99. Carlfjord S, Lindberg M, Bendtsen P, Nilsen P, Andersson A. Key factors influencing adoption of an innovation in primary health care: a qualitative study based on implementation theory. BMC Family Practice [online]. 2010 [cited 2015 Apr 18]; 11(60):1-11. Available from: http://www.biomedcentral.com/1471-2296/11/60
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-1010. Nedjat S, Majdzadeh R, Gholami J, Nedjat S, Maleki K; Qorbani M, Shokoohi S, Ashoorkhani M. Knowledge transfer in Tehran University of Medical Sciences: an academic example of a developing country. Implement Science [online]. 2008 [cited 2015 Apr 18]; 3(39):1-8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2538542/
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Em João Pessoa-PB, a transferência de política do TDO transcorreu no ano de 2007 para os serviços da AB. Anteriormente era centralizada no Complexo Hospitalar de Doenças Infectocontagiosas Clementino Fraga, unidade de referência (UR) do estado.1111. Sá LD, Andrade MN, Nogueira JA, Villa TCS, Figueiredo TMRM, Queiroga RPF, et al. Implantação da estratégia DOTS no controle da tuberculose na Paraíba: entre o compromisso político e o envolvimento das equipes do programa saúde da família (1999-2004). Ciênc Saúde Coletiva [online]. 2011 Sep [cited 2015 May 23]; 16(9):3917-24. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232011001000028&lng=en
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Esse processo de transferência constituiu-se um significativo avanço, embora venha impondo vários desafios, como o de articulação das ações entre os diversos níveis técnico-administrativo-gerenciais do sistema de saúde.

No caso da implementação do TDO nos municípios, faz-se necessária uma efetiva negociação entre os integrantes de equipes gestoras, notadamente entre aqueles que coordenam o Programa de Controle da Tuberculose (PCT) e os que dirigem os Distritos Sanitários (DSs), nas esferas administrativas e técnicas. Nesse processo, são realizadas ações relacionadas à transferência de política do TDO que conduzem a transferência de conhecimento e de informações entre os atores envolvidos na implementação do tratamento, levando em consideração as especificidades e caracterização de cada local.

Considerando-se que o presente artigo apresentou como objeto de análise o discurso de gestores sob o ponto de vista da informação e do conhecimento acerca da transferência de política do TDO para o controle da tuberculose no município de João Pessoa-PB, questiona-se: o que externalizam os discursos desses gestores sobre o conhecimento e a informação relacionada à transferência de política do TDO da tuberculose em João Pessoa-PB? Tal problemática surgiu com vistas na necessidade de investigação dos aspectos organizacionais e de gestão, que podem se constituir em obstáculos à incorporação efetiva e à sustentabilidade das ações de tratamento e controle da doença nos serviços de saúde.

Credita-se a importância de estudos dessa natureza pela premente indigência de reconhecer e socializar as informações e os conhecimentos advindos da política do TDO para toda a rede de atenção que presta assistência ao doente de tuberculose. Destarte, o presente estudo almejou analisar os discursos dos gestores distritais sobre o conhecimento e a informação relacionada à transferência de política do TDO da tuberculose em João Pessoa-PB.

MÉTODOS

Configurou-se um estudo descritivo, de natureza qualitativa e abordagem discursiva, desenvolvido no município de João Pessoa-PB, considerado pelo MS como prioritário nas ações de controle da tuberculose.

Em João Pessoa-PB, a rede de AB à saúde está distribuída de maneira regionalizada, dispondo de cinco DSs que administram 180 equipes de saúde, distribuídas em 125 Unidades de Saúde da Família (USFs), perfazendo 88,3% da cobertura populacional. Cada unidade distrital tem sua própria administração, direção, equipe de profissionais, incluindo os Apoiadores Matriciais (AM), que compõem o Núcleo de Apoio à Saúde da Família, e os Apoiadores Técnicos, que compõem os Grupos de Trabalhos (GT), dentre eles, o GT de tuberculose e hanseníase, considerados um elo entre as USFs e a Secretaria Municipal de Saúde.

Participaram do estudo 15 gestores distritais, considerados enunciadores, sendo cinco diretores gerais, cinco diretores técnicos e cinco técnicos responsáveis pelo PCT, selecionados por exercerem atividades de gestão e coordenação das ações para o controle da tuberculose nos cinco DSs.

A coleta de dados foi realizada nos meses de maio e junho de 2013, por meio da técnica de entrevista diretiva e guiada, que foi dividida em duas partes. A primeira refere-se à ficha técnica composta pelas variáveis sexo, data de nascimento, função, tempo de atuação na atual função e nível de instrução. Na segunda parte, os enunciadores foram convidados a discorrer sobre os motivos e o processo da transferência de política do TDO; sua experiência na discussão dessa problemática com os coordenadores da AB e do PCT no âmbito municipal ou estadual; as inovações nas ações de controle da doença advindas desse processo; as estratégias utilizadas pela Secretaria Estadual ou Municipal de Saúde nesse momento; os aspectos favoráveis e as barreiras da transferência de política do TDO, bem como, as ações utilizadas pela gestão no cuidado ao doente no TDO para o controle da tuberculose.

A coleta de dados foi realizada individualmente com auxílio de dispositivo de áudio MP4 nas dependências dos DSs, em locais escolhidos pelos enunciadores, após o devido esclarecimento dos aspectos éticos com leitura, entrega e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para preservar o anonimato, os gestores foram identificados, ao longo do texto, com as letras GD (Gestor Distrital), seguidas de algarismos arábicos representativos da ordem das entrevistas (GD1 a GD15).

Os dados empíricos foram analisados por meio do dispositivo teórico analítico da análise de discurso (AD) de filiação francesa pecheutiana, introduzida na década de 1960 com a obra Analyse automatique du discours, de Michel Pêcheux. Na AD, propõe-se apreender os processos de produção de sentidos, na relação entre a língua, a ideologia e o sujeito, compreendendo como a língua produz sentidos por e para sujeitos, visto que não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia.1212. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 8a ed. Campinas (SP): Pontes; 2009.

Em AD, o plano de análise dos dados começa com a circunscrição do conceito-análise. Essa etapa envolve escolha, interpretação e análise (discursiva) do corpus por meio de três perguntas heurísticas: qual o conceito-análise presente no texto? Como o texto constrói o conceito-análise? A que discurso pertence o conceito-análise? O conceito-análise é o objeto da análise que se manifesta pela definição do interesse do analista em definir primeiramente o conceito-análise antes de iniciar a montagem do corpus (conceito-análise a priori) ou pelo surgimento do mesmo durante o próprio processo de análise (conceito-análise a posteriori).1313. Souza SAF. Análise de discurso: procedimentos metodológicos. Manaus (AM): Instituto Census; 2014.

No presente estudo, o corpus foi constituído por textos transcritos das entrevistas realizadas com 15 GDs enunciadores, tendo como conceito-análise definido a priori: conhecimento e informação relacionados ao processo de transferência de política do TDO ocorrido em João Pessoa-PB. Realizaram-se repetidas leituras do corpus, em um constante ir e vir entre teoria e análise, em busca de compreender os processos de produção de sentido.

A análise discursiva compreendeu uma passagem do material empírico, que aqui se define como as entrevistas transcritas, para o objeto discursivo, mediante as seguintes etapas:1212. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 8a ed. Campinas (SP): Pontes; 2009. 1) da superfície linguística para o texto (discurso); 2) do objeto discursivo para a formação discursiva (FD), determina o que pode e deve ser dito numa formação ideológica; e 3) do processo discursivo para a formação ideológica.

Na primeira etapa foram observadas as condições de produção dos discursos que compreendem fundamentalmente os enunciadores e a situação das circunstâncias da enunciação ao contexto sócio-histórico e ideológico mais amplo. Nesse momento, utilizando-se as paráfrases, sinonímia, polissemia, metáfora, circunstâncias do dizer e não dizer,1212. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 8a ed. Campinas (SP): Pontes; 2009. procurou-se responder a segunda pergunta heurística: como o texto construiu o conceito-análise?

Com relação às condições de produção dos discursos, os enunciadores caracterizaram-se como profissionais da saúde em cargos de gestão no DS, com atividades voltadas para o PCT, AB e vigilância epidemiológica, com formação acadêmica em: Enfermagem (sete), Fisioterapia (dois), Psicologia (dois), Educação Física (um), Serviço Social (um), Farmácia (um) e Odontologia (um), possuindo cursos de pós-graduação lato sensu, especialização em saúde da família, políticas públicas e/ou gestão em saúde (14).

Na etapa seguinte, procurou-se descortinar contradições, identificar silêncios, atos falhos, repetições e hesitações no universo discursivo dos gestores distritais enunciadores. Nesse nível de análise,12-13 deve-se considerar que o sujeito discursivo se inscreve em diferentes FD porque ocupa diferentes posições e, portanto, não há uma linearidade.

Na última etapa, observaram-se as relações das FDs com os efeitos da ideologia. Por meio das marcas textuais, entendidas como as entradas no discurso pela língua, verificaram-se os textos que ficaram de fora, assinalando o que esses textos ausentes significaram, quais foram as propriedades do discurso, a que FD pertencem e, por fim, qual a formação ideológica que lhe dá sustentação.1212. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 8a ed. Campinas (SP): Pontes; 2009.-1313. Souza SAF. Análise de discurso: procedimentos metodológicos. Manaus (AM): Instituto Census; 2014. Procurou-se responder a terceira pergunta heurística: a que discurso pertence o conceito construído?

Partindo dessas considerações, foram realizados gestos de interpretação sobre enunciados acerca do conhecimento e informação relacionados ao processo de transferência de política do TDO da tuberculose ocorrido em João Pessoa-PB, nos quais foram organizados no bloco discursivo: informação e conhecimento sobre a política do TDO.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (protocolo nº 0301/2012/UFPB/CCS/CEP) em conformidade com a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde que dispõe sobre o desenvolvimento de pesquisas envolvendo seres humanos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise da transferência de política se relaciona à promoção do conhecimento no processo político e visa à compreensão do modo como ocorre a transferência de conhecimento e informação entre as instituições, políticas ou sistemas de um setor ou nível de governança para outro nível de governança. Estudiosos que se voltam para a transferência de política estão interessados em compreender o processo de pré-decisão e autores-chave que trabalham no "fazer política", o gerenciamento da transferência desses programas, a implementação e as causas de uma falha nessas políticas, bem como os aspectos relacionados às mudanças políticas.66. Bissell K, Lee K, Freeman R. Analysing policy transfer: perspectives for operational research. Int J Tuberc Lung Dis [online]. 2011 Sep [cited 2015 Apr 25]; 15(9):1140-8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21943837
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-77. Evans M. New directions in the study of policy transfer. Abingdon (UK): Routledge; 2010.,1414. James O, Lodge M. The limitations of 'policy transfer' and 'lesson drawing' for public policy research. Political Stud Rev [online] 2003 [cited 2015 Jun 18]; 1(2):179-93. Available from: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1478-9299.t01-1-00003/full
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Bloco discursivo: informação e conhecimento sobre a política do tratamento diretamente obsevado

Inicia-se a análise discursiva do GD1, destacando as seguintes marcas textuais: [...] eu não tive dificuldade não, porque como eu já tenho o livro grande de tuberculose [...] eu acho que quem tem dificuldade é quem não tem esse livro, quem não tem realmente, porque você vai encontrar pessoas que não vão ter esse livro e não vai ter esse acompanhamento (GD1).

O documento ora citado refere-se o livro de registro e acompanhamento do tratamento da infecção latente da tuberculose, que deve ser usado como ferramenta para ações de vigilância epidemiológica nas unidades de saúde, servindo de instrumento para o cálculo de indicadores operacionais e epidemiológicos.22. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica. Tratamento Diretamente Observado (TDO) da Tuberculose na Atenção Básica: protocolo de enfermagem. Brasília: MS; 2011.

A análise discursiva do enunciado de GD1 possibilita a inferência, a partir das marcas textuais destacadas, de que o gestor possui conhecimento limitado sobre o PCT e, mais especificamente, sobre a operacionalização do TDO nas USFs, uma vez que valoriza, como sendo suficiente, possuir ou dispor em sua unidade de saúde o livro para acompanhar os casos de tuberculose, minimizando ou eliminando as dificuldades relacionadas no manejo do TDO. Nessa perspectiva, entende-se que o GD1, na condição de sujeito gestor responsável pelas ações do PCT no DS, identifica-se com FD que valoriza apenas os instrumentos materiais como ferramenta principal de trabalho para o controle da tuberculose.

Essa valorização foi construída a partir de um interdiscurso, marcado por experiências de atos burocráticos, preenchimentos de formulários e boletins, procedimentos caracterizados como tecnologia dura, utilizada para a produção da saúde por meio do trabalho morto.1515. Baêta NCA. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. Cad Saúde Pública [online]. 2008 [cited 2015 Abr 18]; 24(8):1953-5. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2008000800023

A produção da saúde por meio do trabalho vivo corresponde à expressão que dá significado ao trabalho em ato, no exato momento da sua atividade produtiva. Já o trabalho morto diz respeito às máquinas e instrumentos e possui essa denominação porque sobre essas máquinas e instrumentos já se aplicou determinado trabalho anterior. Quando o processo de trabalho é guiado pelo trabalho vivo, o trabalhador tem liberdade para ser criativo, relacionar-se com o usuário, interagir e inseri-lo no processo de produção da sua própria saúde.1515. Baêta NCA. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. Cad Saúde Pública [online]. 2008 [cited 2015 Abr 18]; 24(8):1953-5. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2008000800023

Em relação à produção do cuidado e suas tecnologias, três categorias em saúde merecem destaque: as tecnologias duras, as leve-duras e as leves. Na primeira estão inscritas as máquinas e instrumentos utilizados na produção das ações de saúde. A segunda refere-se ao conhecimento técnico associado ao modo particular como o trabalhador aplica a técnica e cuida do usuário. As tecnologias leves correspondem às relações, um jeito ou atitude próprio do profissional que é guiado por certa intencionalidade vinculada ao campo cuidador, ao seu modo de ser, à sua subjetividade.1515. Baêta NCA. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. Cad Saúde Pública [online]. 2008 [cited 2015 Abr 18]; 24(8):1953-5. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2008000800023

Outra marca textual foi destacada nos enunciados dos gestores referente ao processo transferência de política do TDO: [...] acho que a busca ativa. É principalmente o que eles têm feito (GD5). Considerando que a busca ativa é uma atividade desenvolvida com vistas à identificação precoce de pessoas com tosse por tempo igual ou superior a três semanas, visando à descoberta dos casos bacilíferos e o retardo do diagnóstico da tuberculose,22. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica. Tratamento Diretamente Observado (TDO) da Tuberculose na Atenção Básica: protocolo de enfermagem. Brasília: MS; 2011. e que, no momento da entrevista, a questão tratava-se do cuidado ao doente com diagnóstico já confirmado, elenca-se duas hipóteses sobre o discurso de GD5: ou o enunciador desconhece a política propriamente dita do PCT ou ele, apesar de compreender o significado da busca ativa, não atentou para o cenário apresentado, para as ações realizadas pela gestão no cuidado ao doente em TDO.

Um estudo realizado em 2010 com apoiadores matriciais gestores de unidades integradas do município de João Pessoa-PB vem corroborar com os achados da presente pesquisa. Ao analisar a discursividade desses gestores, a pesquisa identifica que eles confundiram a busca ativa de casos novos com o monitoramento terapêutico ou dos casos alusivos ao abandono de tratamento.1616. Pinheiro PGOD, Sá LD, Palha PF, Souza FBA, Nogueira JA, Villa TSC. Busca ativa de sintomáticos respiratórios e o diagnóstico tardio da tuberculose. Rev Rene [online]. 2012 [cited 2015 Abr 21]; 13(3):572-81. Available from: http://www.revistarene.ufc.br/revista/index.php/revista/article/view/724
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Ao reportar o pensamento que o discurso é efeito de sentidos entre locutores, observam-se no discurso do GD5 efeitos de sentidos contraditórios acerca das diretrizes estabelecidas pelo MS para o controle da tuberculose. Assim, justifica-se a presença do sem-sentido, do equívoco, do sentido "outro".1212. Orlandi EP. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 8a ed. Campinas (SP): Pontes; 2009.

No tangente à experiência do gestor sobre o processo de transferência de política ocorrido no município para a descentralização do TDO para as UFs, destaca-se a seguinte marca textual: [...] eu só faço receber, como eu digo?, as planilhas aqui no distrito. Então eu não participo. [...] Ela [Coordenadora do Programa de Tuberculose no distrito] só traz as informações para mim, as coisas que eu tenho que fazer, que preencher (GD9).

Por vários momentos durante a entrevista, o enunciador mascara sua responsabilidade, assumindo a figura de gestor passivo, ao dar indícios de que seu trabalho é prioritariamente burocrático. Tal fato o distancia de um processo de trabalho efetivo e de qualidade que o mesmo deveria conhecer, apropriar-se e incluir-se como protagonista da equipe gestora daquele DS.

No discurso do GD8, foram destacadas as marcas textuais: [...] é... eu estou aqui há cinco meses, né? [...] Mas, antes disso, eu fui apoiadora; não sei se houve esse contato lá... [...] para que eles vão lá e consigam superar alguma dificuldade [...] algum apoio em outros órgãos.

Vê-se no início desse discurso que, ao mesmo tempo em que justifica sua recente admissão no cargo de gestor, o enunciador também informa que já foi apoiador matricial, fato esse que o leva a apresentar conhecimentos mais amplos acerca da temática, pois já recebeu informações pertinentes à política do TDO, na posição de apoiador matricial. Contudo, percebe-se um discurso vazio, duvidoso e superficial, anunciado em vários momentos por expressões inespecíficas como "algum" ou "alguma", demonstrando nitidamente indefinição do que referiam, até mesmo quando solicitado a esclarecer melhor o que foi dito naquele momento.

Semelhante posicionamento foi visualizado no discurso do GD4: [...] a gente sempre está buscando potencializar esse tema [...] as adequações é a gente potencializar. A palavra "potencializar" apareceu em seu discurso diversas vezes, instigando a seguinte reflexão: a partir de qual sentido o discurso foi efetivamente construído?

O verbo "potencializar" significa tornar eficaz, tornar ativo. Considerando a frequência com que os gestores municipais o utilizam em seus discursos, cabe aqui a seguinte indagação: quando o gestor enfatiza o termo "potencializar", será que ele o faz de forma consciente em relação ao significado da palavra ou se trata apenas de uma repetição de algo que já ouviu? Poder-se-ia dizer que GD4 foi assujeitado, sendo interpelado ideologicamente por esta ideia, já que não deixa pistas ou vestígios em seu discurso de como poderia potencializar as ações para o TDO.

Sobre o assujeitamento, é válido saber que a ideologia atua para constituir sujeitos e suas formas de subjetividade, apontando que esses indivíduos foram sempre interpelados pela ideologia, conduzindo-os à condição de "sempre já-sujeitos". Nesse caso, o sujeito é tanto sujeito da ação, das práticas, como também um sujeito assujeitado ao Sujeito (com S maiúsculo) que o interpela constantemente, sem que este esteja ciente deste processo de reconhecimento/desconhecimento do sujeito ante a interpelação.1717. Chagas AT. O sujeito ideológico na perspectiva de Louis Althusser - o assujeitamento. Portal dos psicólogos [online] 2012 [cited 2015 Abr 18]. Available from: http://www.psicologia.pt/artigos/ver_artigo.php?codigo=A0675
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Pode-se inferir, a partir das marcas textuais identificadas nos discursos de GD1, GD5, GD9, GD8 e GD4, que tais gestores apresentam um discurso determinado, que desconhece o processo de transferência de política e/ou da política do TDO, concorrendo para fragilidades na condução e organização das ações para o controle da tuberculose no município. Considerando a condição de sujeito-gestor, esperava-se que os mesmos apresentassem um maior nível de conhecimento em relação ao tema abordado, haja vista que o TDO foi implantado no município há mais de sete anos e que alguns destes já trabalharam na AB em outros momentos.

Apesar da fragilidade elucidada, observa-se no fio dos discursos que outros enunciadores identificaram atividades a serem direcionadas aos profissionais de saúde capazes de fortalecer e/ou ampliar o conhecimento sobre a política do TDO. Tal fato é visualizado nas marcas textuais: [...] qualificações, oficinas (GD12): [...] palestras, reuniões (GD11). Contudo, o sentido que lhes foi atribuído para a disseminação desse conhecimento corresponde apenas ao repasse, como destacados nas marcas: [...] a gente fica responsável de repassar o conhecimento (GD5): [...] sempre fazem oficinas de repasse (GD13).

O efeito ideológico desses repasses aparece como discursos pautados no tradicionalismo, ancorados em uma ação mecânica e gestão verticalizada, partindo do estado para o município, dos gestores para os profissionais de saúde, sendo estes meramente receptores de informações sem um conhecimento prévio.

Ainda observando marcas textuais relacionadas ao conhecimento e a informação sobre o TDO, destaca-se: [...] há sim, há todo um repasse de conhecimento sobre a patologia, sobre como é a fisiopatologia dessa doença, até para a gente chegar a tratamentos, formas de tratamento, as drogas, as medicações que são utilizadas, até chegar à questão da importância do TDO. Mas há sim um repasse municipal para distrital e distrital para a equipe de saúde da família. Há sim essa qualificação (GD3).

Somam-se, mais uma vez, efeitos de sentidos contrários atribuídos em relação à informação e conhecimento do TDO. Em outras palavras, a memória discursiva do enunciador GD3 está voltada para o modelo curativista de atenção à saúde, não evocando informações do ponto de vista social e político sobre a tuberculose.

O sentido atribuído pelo gestor para o conhecimento do TDO referido como feito na forma de "repasse", discutido em reuniões de equipe, qualificações, reuniões do grupo de trabalho, enfim, nos movimentos realizados entre as instâncias estaduais, municipais e distritais não possibilita o fortalecimento de processos cujos desdobramentos resultariam em inovação. Na transferência de política a inovação possui caráter de aprendizado interativo que envolve intensas articulações entre diferentes agentes requerendo novos formatos organizacionais em redes.99. Carlfjord S, Lindberg M, Bendtsen P, Nilsen P, Andersson A. Key factors influencing adoption of an innovation in primary health care: a qualitative study based on implementation theory. BMC Family Practice [online]. 2010 [cited 2015 Apr 18]; 11(60):1-11. Available from: http://www.biomedcentral.com/1471-2296/11/60
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,1818. Jansen MWJ, Oers HAMV, Kok G, Vries NK. Public health: disconnections between policy, practice and research. Health Res Policy Systems [online]. 2010 [cited 2015 Abr 18]; 8(37):1-13. Available from: http://www.health-policy-systems.com/content/8/1/37
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Percebe-se ainda no discurso de GD3, um silenciamento a respeito do reconhecimento dos determinantes sociais da tuberculose, destituído de atributos sócio-políticos, como posição socioeconômica desfavorável, comorbidade de tuberculose e aids, alcoolismo, dependência química, tabagismo, má nutrição e barreiras de acesso aos serviço de saúde. Esses determinantes expõem a complexidade do problema e a necessidade do estabelecimento de novas estratégias para o enfrentamento da tuberculose.55. Arakawa T, Arcêncio RA, Scatolin BE, Scatena LM, Ruffino Netto A, Villa TCS. Accessibility to tuberculosis treatment: assessment of health service performance. Rev Latino-am Enfermagem [online]. 2011[cited 2015 Jun 18]; 19(4):1994-2002. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692011000400019&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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,1111. Sá LD, Andrade MN, Nogueira JA, Villa TCS, Figueiredo TMRM, Queiroga RPF, et al. Implantação da estratégia DOTS no controle da tuberculose na Paraíba: entre o compromisso político e o envolvimento das equipes do programa saúde da família (1999-2004). Ciênc Saúde Coletiva [online]. 2011 Sep [cited 2015 May 23]; 16(9):3917-24. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232011001000028&lng=en
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Para a transferência de política do TDO, a informação representa o momento em que o serviço e os profissionais que irão executar essa política, se apropriarão de subsídios pertinentes ao que está sendo transferido. O conhecimento, por sua vez, está relacionado ao momento em que os profissionais passarão a assimilar e compreender a política que foi recebida/transferida para o seu local de trabalho.66. Bissell K, Lee K, Freeman R. Analysing policy transfer: perspectives for operational research. Int J Tuberc Lung Dis [online]. 2011 Sep [cited 2015 Apr 25]; 15(9):1140-8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21943837
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-77. Evans M. New directions in the study of policy transfer. Abingdon (UK): Routledge; 2010.

Apesar de alguns gestores enfatizarem os sentidos apenas como repasse do conhecimento, outros, por sua vez, valorizam o matriciamento, a discussão compartilhada sobre a política do TDO envolvendo os profissionais, a gestão, o usuário e o Conselho Local de Saúde, conforme evidenciado nas marcas textuais: [...] deve envolver os profissionais nessa discussão, de como eles acham que deveria ser o TDO, e aí para ver se a gente, pegava um pouco a proposta da gestão com a deles e até colocarem os usuários, por que não usar o espaço de uma reunião com o conselho local de saúde e discutir isso com os usuários? (GD15). [...] quando a gente verifica que há a necessidade de ser realizado um matriciamento naquela temática, a gente faz um agendamento da equipe, e aquela área temática vai fazer o matriciamento na equipe. Não só na equipe, mas no distrito sanitário. Ou se eu identificar que eu estou com alguma fragilidade, eu também posso estar indo no distrito sanitário, ou... na secretaria, e estar fazendo essa ponte também lá na secretaria (GD12).

Os GDs realizam o matriciamento. O matriciamento é o suporte realizado por profissionais de diversas áreas especializadas, oferecido a uma equipe com o intuito de ampliar o campo de atuação e qualificar suas ações. O matriciamento ou apoio matricial, a partir da proposta da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS), é um novo modo de produzir saúde, em que duas ou mais equipes, em um processo de construção compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica.19

A PNEPS parte da aprendizagem significativa, que promove e produz sentidos e propõe que a transformação das práticas deve estar baseada na reflexão crítica sobre as práticas reais de profissionais em ação na rede de serviços. A ressignificação desse processo de trabalho exige uma reflexão sobre o trabalho dos profissionais, da articulação dos gestores e coordenadores do PCT com os demais serviços na AB, que possibilite mudanças na sua prática e qualifique a todos os envolvidos para fortalecimento da política do TDO no município.1919. Silva LAA, Ferraz F, Lino MM, Backes VMS, Schmidt SMS. Educação permanente em saúde e no trabalho de enfermagem: perspectiva de uma práxis transformadora. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2010 Set [cited 2015 May 18]; 31(3):557-61. Available from: www.scielo.br/pdf/rgenf/v31n3/v31n3a21.pdf
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A lógica original desse matriciamento foi mobilizada no discurso do GD2. Isso pode ser explicitado no momento em que ele evoca o sentido de matriciamento por meio da seguinte marca textual: [...] a gente está até tentando modificar essas estratégias de capacitação desses profissionais, tentar fazer in loco mesmo, tentar fazer a discussão de casos que sejam reais pra eles (GD2).

O discurso de GD2 é sustentado por uma filiação ideológica próxima à valorização do conhecimento coletivo, pois há uma evocação da realidade dos profissionais e dos casos acompanhados por eles, bem como a apresentação de um sentido de deslocamento da informação, pois empodera a equipe que se encontra mais próxima do usuário. A importância dos profissionais da equipe de saúde para a realização do TDO é comprovada por diferentes motivos, que vão desde o estabelecimento de vínculo entre profissional - usuário, identificação de necessidades de cunho social, escuta qualificada, até o manejo de reações adversas. Dentre os pontos que necessitam de atenção especial, a ressignificação das práticas desses profissionais merece destaque.2020. Alves RS, Souza KMJ, Oliveira AAV, Palha PF, Nogueira JA, Sá LD. Tuberculosis treatment abandonment and comprehensive health care to patients in the family healthcare strategy. Texto Contexto Enferm [online]. 2012 Jul-Set [cited 2015 April 18]; 21(3):650-7. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072012000300021
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O grupo de trabalho é formado por apoiadores matriciais, especialistas que podem agregar recursos de saber e contribuir com intervenções que aumentem a capacidade de resolver problemas de saúde da equipe primariamente responsável pelo caso. O apoiador matricial é tido como um dinamizador do processo de reformulação das práticas de saúde que visa o estabelecimento de vínculo, acolhimento e responsabilização das equipes de saúde para construção do cuidado integral por meio de projeto terapêutico, construído em encontros, com a adoção de ações educativas voltadas à promoção da autonomia e da participação do usuário em seu tratamento.2121. Tenório CG, Campos GWS. Apoio Matricial e Atenção Primária em Saúde. Saude Soc [online]. 2011 [cited 2015 May 21]; 20(4):961-70. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902011000400013
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Esses apoiadores matriciais, quando inseridos no grupo de trabalho de tuberculose e hanseníase, além de realizarem suas funções primordiais, articulam as ações que envolvem essas temáticas em seu território e se qualificam para a construção compartilhada do conhecimento. A criação do grupo de trabalho para a realização do matriciamento apresenta-se como uma ação inovadora do município, uma vez que o matriciamento é uma alternativa utilizada na descentralização da política de transferência, que se encontra associada à diluição do poder. É uma transferência de responsabilidades que permite empoderamento dos que a estão recebendo.2121. Tenório CG, Campos GWS. Apoio Matricial e Atenção Primária em Saúde. Saude Soc [online]. 2011 [cited 2015 May 21]; 20(4):961-70. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902011000400013
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-2222. Kleba ME, Wendausen A. Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização política. Saúde Soc [online]. 2009 [cited 2015 May 18]; 18(4):733-43. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902009000400016
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O matriciamento é uma estratégia para ampliar a participação da equipe de Saúde da Família, aumentando a possibilidade de realizar a clínica ampliada, bem como a integração e o diálogo entre diferentes especialidades e profissões.2121. Tenório CG, Campos GWS. Apoio Matricial e Atenção Primária em Saúde. Saude Soc [online]. 2011 [cited 2015 May 21]; 20(4):961-70. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902011000400013
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Com isso, o município favorece e possibilita uma maior discussão e participação dos envolvidos, gestores e profissionais levando a uma diluição de saber e de poder ao proporcionar um deslocamento de algo que é culturalmente centralizado.1919. Silva LAA, Ferraz F, Lino MM, Backes VMS, Schmidt SMS. Educação permanente em saúde e no trabalho de enfermagem: perspectiva de uma práxis transformadora. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2010 Set [cited 2015 May 18]; 31(3):557-61. Available from: www.scielo.br/pdf/rgenf/v31n3/v31n3a21.pdf
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Há, portanto, um deslizamento que se materializa na contradição de sentidos nos discursos apresentados, com relação aos processos de construção do conhecimento e ressignificação das práticas de trabalho acerca da transferência de política do TDO. Observa-se que os enunciadores GD15, GD2 e GD12 apresentam a criação do grupo de trabalho como ação inovadora para a descentralização da política do TDO, uma vez que o dispositivo do matriciamento vem sendo empregado na construção do conhecimento, na perspectiva de se trazer inovação para o controle da tuberculose.99. Carlfjord S, Lindberg M, Bendtsen P, Nilsen P, Andersson A. Key factors influencing adoption of an innovation in primary health care: a qualitative study based on implementation theory. BMC Family Practice [online]. 2010 [cited 2015 Apr 18]; 11(60):1-11. Available from: http://www.biomedcentral.com/1471-2296/11/60
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,1919. Silva LAA, Ferraz F, Lino MM, Backes VMS, Schmidt SMS. Educação permanente em saúde e no trabalho de enfermagem: perspectiva de uma práxis transformadora. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2010 Set [cited 2015 May 18]; 31(3):557-61. Available from: www.scielo.br/pdf/rgenf/v31n3/v31n3a21.pdf
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Por outro lado, os enunciadores GD5, GD13 e GD3 se posicionam discursivamente de forma mais tradicional e detentora do conhecimento. Essa posição acaba por barrar a descentralização do poder, tendo em vista que esses gestores, inconscientemente, apresentam-se filiados a uma visão de repasse, ou seja, de apenas levar conhecimento sem, necessariamente, empoderar a equipe de Saúde da Família. O sentido aqui empregado para empoderamento da equipe se baseia no compartilhamento de informações, ideias, troca de experiências e fortalecimento dos processos para operacionalização da política do TDO na AB.2222. Kleba ME, Wendausen A. Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização política. Saúde Soc [online]. 2009 [cited 2015 May 18]; 18(4):733-43. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902009000400016
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Destarte, infere-se o entendimento de que a capacidade de gerar, adaptar, recontextualizar e aplicar conhecimentos, de acordo com as necessidades e especificidades de cada organização e ou instituição, torna-se, portanto, uma questão central para a transferência de política do TDO. Isso é importante para veiculação de informações em meio aos processos de negociação durante a transferência, bem como de reconstrução do conhecimento por meio de processos de aprendizagem dos profissionais das instituições envolvidas na transferência de política do TDO e, mais ainda, a capacidade de converter esse conhecimento em práticas inovadoras nas periferias dos sistemas locais de saúde, nos quais efetivamente essas políticas são experienciadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A condução e a organização para operacionalização do TDO nas USFs apresentam-se como um dos desafios para a gestão em saúde do município estudado. Perceberam-se nos discursos dos enunciadores contradições, equívocos e silêncios no que dizem respeito ao conhecimento e a informação sobre a transferência de política do TDO, das diretrizes do Programa de Controle da Tuberculose, resultando em deslizamentos de sentidos da responsabilização e coparticipação a partir da posição-sujeito que ocupam, neste caso, como parte integrante da equipe gestora nos DSs.

Em vista disso, a gestão, por intermédio do grupo de trabalho e apoiadores matriciais, deve lançar processos de discussão e reflexão junto aos coordenadores do Programa de Controle da Tuberculose, da Atenção Básica, da Vigilância Epidemiológica e equipe de Saúde da Família, com a meta da ressignificação das práticas e reorganização das ações vinculadas à política do TDO na AB.

Para tanto, a gestão deve investir na qualificação profissional, buscando aprimorar e reorganizar o processo de trabalho, com mudanças de práticas na perspectiva da PNEPS, envolvendo o quadrilátero: formação, gestão, atenção e controle social, adotando, como metodologia, a problematização do processo de trabalho nas redes de cuidado do Sistema Único de Saúde. Isto representa um forte dispositivo, capaz de aproximar todos os atores envolvidos, otimizando o matriciamento com discussões sobre a tuberculose fundamentadas no programa específico, oferecendo um espaço de troca de saberes, de propostas inovadoras a partir das experiências exitosas a fim de implementar ações planejadas para seu efetivo controle, considerando, sobretudo, o usuário inserido nessas redes de cuidados como principal ator.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2015
  • Aceito
    10 Nov 2015
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