Resumos
Pesquisa descritiva, exploratória, de corte transversal, que teve como objetivo descrever a percepção de qualidade de vida em gestantes com cardiopatia. O Índice de Qualidade de Vida de Ferrans e Powers foi aplicado em 42 pacientes, a partir do segundo trimestre de gestação, entre janeiro de 2008 e março de 2009. Usaram-se estatística descritiva, análise de variância e teste t de Student. A mediana do escore total de qualidade de vida foi relativamente alta (23,9) e o domínio socioeconômico, o mais comprometido (22,9). Tendência entre gravidez não planejada e domínio socioeconômico foi observada (p=0,065). A qualidade de vida destas pacientes pode ser considerada boa, mas quando a gravidez não foi planejada contribuiu para piorar a dimensão socioeconômica. A gestação de alto risco não afetou a qualidade de vida, uma vez que a mesma está atrelada a significados de felicidade, satisfação e realização pessoal.
Qualidade de vida; Gestação; Cardiopatias; Enfermagem
Investigación descriptiva, exploratoria y transversal con objeto de describir la calidad de vida percibida en gestantes con cardiopatía. El Índice de Calidad de Vida de Ferrans y Powers fue aplicado en 42 pacientes, a partir del segundo trimestre de embarazo, entre enero del 2008 y marzo del 2009. Fueron usados la estadística descriptiva, análisis de variancia y test t de Student. La mediana del score total de calidad de vida fue relativamente alta (23,9) y el dominio socioeconómico el más comprometido (22,9). Fue observada tendencia entre embarazo no planeado y dominio socioeconómico (p=0,065). La calidad de vida de estos pacientes puede ser considerada buena pero, cuando el embarazo no fue planeado, contribuye para empeorar la dimensión socioeconómica. El embarazo de alto riesgo no influenció la calidad de vida, ya que la misma estuvo vinculada a significados de felicidad, satisfacción y realización personal.
Calidad de vida; Gestación; Cardiopatías; Enfermería
The objective of this cross-sectional, descriptive and exploratory study was to describe the perceptions of pregnant women with heart disease concerning their quality of life. Ferrans and Powers Quality of Life Index was applied to 42 patients from the second trimester of pregnancy on, between January 2008 and March 2009. Descriptive statistics, analysis of variance and Student's t test were used. The Quality of Life Index median total score was relatively high (23.9), while the socioeconomic domain was the most compromised (22.9). An association between unplanned pregnancies and the socioeconomic domain was observed (p=0.065). These patients' quality of life can be regarded as good, but unplanned pregnancies contributed to worsening scores in the socioeconomic domain. High-risk pregnancies did not affect quality of life because a pregnancy is linked to meanings such as happiness, satisfaction and personal fulfillment.
Quality of life; Pregnancy; Heart diseases; Nursing
ARTIGO ORIGINAL
Qualidade de vida em gestantes com cardiopatia
Calidad de vida en gestantes con cardiopatía
Silmara MeneguinI; Caroline de Lima XavierII
IDoutora em Ciências. Professora Assistente do Departamento do Enfermagem da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Botucatu, São Paulo, Brasil. E-mail: silmeneguin@fmb.unesp.br
IIEstudante do Curso de Graduação em Enfermagem da UNESP. Botucatu, São Paulo, Brasil. E-mail: carolclx@hotmail.com
Correspondência Correspondência: Silmara Meneguin Faculdade de Medicina de Botucatu. Departamento de Enfermagem Universidade Estadual Paulista - UNESP Distrito de Rubião Junior s/n 8618-970 - Botucatu, SP, Brazil E-mail: silmeneguin@fmb.unesp.br
RESUMO
Pesquisa descritiva, exploratória, de corte transversal, que teve como objetivo descrever a percepção de qualidade de vida em gestantes com cardiopatia. O Índice de Qualidade de Vida de Ferrans e Powers foi aplicado em 42 pacientes, a partir do segundo trimestre de gestação, entre janeiro de 2008 e março de 2009. Usaram-se estatística descritiva, análise de variância e teste t de Student. A mediana do escore total de qualidade de vida foi relativamente alta (23,9) e o domínio socioeconômico, o mais comprometido (22,9). Tendência entre gravidez não planejada e domínio socioeconômico foi observada (p=0,065). A qualidade de vida destas pacientes pode ser considerada boa, mas quando a gravidez não foi planejada contribuiu para piorar a dimensão socioeconômica. A gestação de alto risco não afetou a qualidade de vida, uma vez que a mesma está atrelada a significados de felicidade, satisfação e realização pessoal.
Descritores: Qualidade de vida. Gestação. Cardiopatias. Enfermagem.
RESUMEN
Investigación descriptiva, exploratoria y transversal con objeto de describir la calidad de vida percibida en gestantes con cardiopatía. El Índice de Calidad de Vida de Ferrans y Powers fue aplicado en 42 pacientes, a partir del segundo trimestre de embarazo, entre enero del 2008 y marzo del 2009. Fueron usados la estadística descriptiva, análisis de variancia y test t de Student. La mediana del score total de calidad de vida fue relativamente alta (23,9) y el dominio socioeconómico el más comprometido (22,9). Fue observada tendencia entre embarazo no planeado y dominio socioeconómico (p=0,065). La calidad de vida de estos pacientes puede ser considerada buena pero, cuando el embarazo no fue planeado, contribuye para empeorar la dimensión socioeconómica. El embarazo de alto riesgo no influenció la calidad de vida, ya que la misma estuvo vinculada a significados de felicidad, satisfacción y realización personal.
Descriptores: Calidad de vida. Gestación. Cardiopatías. Enfermería.
INTRODUÇÃO
A associação entre doença cardíaca e gravidez é reconhecidamente fator de risco obstétrico e fetal em potencial durante o ciclo gravídico-puerperal. Além disso, as cardiopatias são consideradas a principal causa indireta de mortalidade materna em nível mundial.1 No Brasil, a incidência de cardiopatia na gravidez atinge o índice de 4,2%, oito vezes maior do que as estatísticas internacionais.2 Esse alto percentual é atribuído à elevada incidência de doença reumática em mulheres em idade reprodutiva.3A doença reumática é considerada a determinante etiológica mais importante das valvopatias,4 uma vez que a cicatriz do processo inflamatório que afeta os seguimentos do coração durante os surtos de febre reumática causa deformação das valvas cardíacas.5-6
As alterações cardiovasculares associadas com a gravidez e o período pós-parto podem contribuir para deterioração clínica nestas pacientes e, muitas vezes, para o diagnóstico inicial de doença valvular.7 Nesse período, o volume de sangue circulante aumenta em torno de 30 a 50%, com correspondente aumento do débito cardíaco. Concomitantemente, há redução substancial da resistência vascular sistêmica e diminuição da pressão sanguínea. Essas alterações começam no primeiro trimestre e atingem o pico entre 20 a 24 semanas de gestação, com aumento adicional no pós-parto imediato.8
Partindo-se do pressuposto de que a gravidez é um processo biológico que tem repercussões sociais, econômicas, emocionais, psicológicas e sexuais para a mulher,9 pouca atenção tem sido dada à qualidade de vidas de gestantes com doença cardíaca. Neste contexto, destaca-se o papel do enfermeiro na melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, à medida que incorpora o princípio da integralidade como uma dimensão do cuidar.
Em geral, os estudos abordam qualidade de vida na gestação em mulheres saudáveis ou relacionada-a a outros processos patológicos neste período.10-12 No que tange à doença cardíaca, o enfoque tem sido direcionado para os desfechos clínicos da gravidez.13-15 Contudo, presume-se que as alterações hemodinâmicas que ocorrem durante a gestação bem como a limitação das atividades diárias podem ter impacto na qualidade de vida dessas mulheres, nesse momento peculiar de sua vida. Apesar de qualidade de vida ser um conceito subjetivo, como tal, sua avaliação depende da perspectiva de cada indivíduo.16
De fato, em estudo conduzido com gestantes adolescentes, pouca alteração foi observada na percepção de qualidade de vida pelas entrevistadas.17 Em outro estudo realizado com 202 gestantes atendidas em serviço filantrópico de pré-natal de baixo risco mostrou que o maior escore de qualidade de vida foi atribuído ao domínio estado geral de saúde.18
Frente ao exposto, o objetivo deste estudo foi descrever a percepção de qualidade de vida em gestantes com cardiopatia durante a gravidez.
MÉTODOS
Estudo descritivo, exploratório e transversal, realizado em hospital público especializado em cardiologia. A referida instituição é credenciada para atendimento de pacientes que requerem procedimentos de alta complexidade, provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS), beneficiários de convênios e seguros médicos, além de particulares. Além disso, destaca-se também pelas atividades de ensino e pesquisa.
A amostra não probabilística foi constituída de 42 pacientes, atendidas em ambulatório especializado, no período de janeiro de 2008 e março de 2009.
Estabeleceu-se como critério de inclusão ser portadora de cardiopatia, a partir do segundo trimestre de gestação, e não aceitaram participar da pesquisa foram excluídas.
Para a coleta dos dados utilizou-se um questionário constituído por duas partes, sendo a primeira, de dados de identificação das participantes, e a segunda, pelo Índice de Qualidade de Vida de Ferrans e Powers (IQV), em sua versão traduzida e validada para a língua portuguesa.19 Esse instrumento contém 33 itens para os quais atribuem-se valores em uma escala crescente de satisfação e importância, que varia de 1 a 6. Na primeira parte, a escala varia de muito insatisfeito (1) a muito satisfeito (6) e na segunda, de sem nenhuma importância (1) a muito importante (6).
Os itens do IQV compreendem as quatro dimensões da qualidade de vida, (subescalas), segundo modelo conceitual das autoras: saúde/funcionamento (13 itens), socioeconômico (oito itens), psicológico/espiritual (sete itens) e família (cinco itens), e cada item da primeira parte do instrumento que avalia satisfação corresponde ao mesmo na segunda, avaliando importância.20 A variação permitida para o escore total e em cada domínio é de 0 a 30; e valores maiores indicam melhor qualidade de vida.19
As entrevistas foram realizadas individualmente pelas pesquisadoras, sem a presença do acompanhante, após a consulta médica, nas dependências do ambulatório da instituição onde foi realizada a pesquisa.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Protocolo n. 1030/06). As pacientes participaram voluntariamente e assinaram o termo de consentimento. A confidencialidade dos dados foi respeitada em conformidade com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde que regulamenta a pesquisa com seres humanos no país.21
Inicialmente, todas as variáveis foram analisadas de forma descritiva. Para as variáveis quantitativas, essa análise foi feita por meio do uso dos valores mínimos e máximos, aplicando o cálculo da média, mediana e desvios-padrão. Para as variáveis qualitativas, calcularam-se as frequências absolutas e relativas.
Os escores de qualidade de vida foram expressos como medianas e amplitudes interquartílicas. Para avaliar a relação de alguns itens com os escores do IQV, utilizou-se a análise de variância. A comparação entre variáveis quantitativas e a média dos domínios do IQV foi realizada por meio do teste t de Student. A análise estatística realizada com o apoio do software SPSS, versão 15.0 (SPSS Inc., EUA), e valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente significante.
RESULTADOS
Com relação às caracteristicas sociodemográficas, as gestantes eram predominantemente jovens, 38% encontravam-se na faixa etária entre 22 e 26 anos (Tabela 1). A idade máxima foi 39 anos, com média de 28,6 anos (±SD 5,63). A maioria das participantes (42,9%) tinha de zero a sete anos de escolaridade, e somente uma concluiu o ensino superior, caracterizando uma amostra de baixo nível educacional.
No que se refere ao estado civil, 21 (50%) participantes referiram ter um companheiro, ou seja, eram casadas ou amasiadas. Além disso, observa-se que mais da metade das entrevistadas (52,4%) já tinham filhos.
Nessa casuística, 23 (54,8%) gestantes tinham atividade profissional com vínculo empregatício. Destas, 14 (33,3%) tinham trabalho classificado como manual não especializado, ou seja, caracterizado por atividades que não exigem experiência prévia como: empregada doméstica, diarista, auxiliar de limpeza, vendedora, entre outras, e também em menor número (3;7,2%) exerciam atividades manuais especializadas, que exigem do profissional capacitação técnica para execução como auxiliar de produção, manicure e artesã. Outras seis (14,3%) exerciam trabalhos caracterizados como não manuais, que exigem conhecimentos e habilidades técnicas do profissional, além de observação, concentração e capacidade de abstração. Nesta categoria também foram incluídos enfermeiros, protéticos, esteticistas, técnicos de enfermagem e secretárias.
Por outro lado, nota-se que praticamente a metade das entrevistadas que tinham vínculo empregatício encontravam-se afastadas do trabalho por problemas de saúde (26,2%). A renda média foi de R$ 1.237,00 (±520,61), demonstrando a grande variabilidade econômica dessa amostra.
No que se refere às variáveis clínicas e obstétricas (Tabela 2), 11 (26,2%) gestantes sofreram abortos prévios a esta gestação e 28 (66,7%) não planejaram a atual gestação. Além disso, 33 (78,6%) já tinham engravidado e, destas, praticamente a metade mais do que uma vez.
Outro dado de interesse refere-se ao fato de a maioria das gestantes (76,2%) não terem participado de grupos de planejamento familiar, o que poderia ter contribuído para redução do índice de gravidez não planejada. A idade gestacional média foi de 27,4 semanas.
Em relação à etiologia das cardiopatias, 18 (42,9%) gestantes tiveram como patologia de base predominante a febre reumática, seguida de insuficiência cardíaca congestiva (19%). Cardiopatias congênitas (9,5%), estenose valvar (9,5%) e arritmias foram (7,1%) menos frequentemente reportadas.
Em relação à avaliação de qualidade de vida, o escore total foi relativamente alto (23,9), e o domínio socioeconomico o mais comprometido (22,9), seguido de saúde e funcionamento (23,2). Nota-se, também, que para 25% das entrevistadas o domínio família foi o melhor avaliado (Tabela 3).
Na tabela 4 verifica-se que houve tendência entre o domínio socioeconômico e planejamento da gravidez, ou seja, quando a gestação não foi planejada, contribuiu para piorar a dimensão socioeconômica das entrevistadas. Com relação aos demais domínios e ao índice de qualidade de vida total não houve diferença significante.
DISCUSSÃO
Em relação às características sociodemográficas, predominaram gestantes na faixa etária de 22 a 26 anos, e nível fundamental incompleto. Associações significativas entre menor escolaridade das mães e ocorrência de baixo peso ao nascer foram encontradas em estudo realizado no interior do Estado de São Paulo. Fato atribuído ao baixo nível socioeconômico dessas mulheres que, possivelmente, apresentam menor ganho de peso durante a gestação e início mais tardio do pré-natal.22 O nível de instrução também está associado com otimismo/pessimismo e qualidade de vida relacionada à saúde durante a gestação.23
Com relação à etiologia das cardiopatias, a febre reumática continua sendo a principal complicação. Dado corroborado por estudo que analisou mil casos de gestantes com cardiopatias atendidas em ambulatório de hospital terciário especializado em cardiologia.24
Outro dado a ser considerado refere-se à avaliação da percepção de qualidade de vida em gestantes com cardiopatia, considerando a complexidade clínica e obstétrica deste grupo, no qual aspectos de saúde, psicológicos e sociais podem influenciar a percepção do conceito, neste momento peculiar e especial na vida de uma mulher.
Em relação à avaliação de qualidade vida, foi considerada relativamente boa pelas gestantes. Entre os quatro domínios do IQV, o familiar e o psicológico/espiritual foram os que obtiverem melhor avaliação, e o socioeconômico, a pior.
Avaliar qualidade de vida é reconhecidamente uma tarefa complexa, por se tratar de um conceito abstrato, subjetivo e para o qual ainda não existe uma definição consensual. A própria definição de qualidade de vida adotada pela WHO é complexa e demonstra as facetas positivas e negativas de vida, além da multidimensionalidade do conceito ao lidar com a interrelação entre ambiente e aspectos físiopsicológicos do indivíduo, nível de independência, relações sociais e crenças pessoais.25
Além disso, deve-se considerar que esta inter-relação existe dentro de um determinado contexto cultural, dentro do contexto de sistema de valores no qual cada individuo vive, e em relação aos seus objetivos, preocupações, expectativas e padrões.26-27 Portanto, qualquer medição de qualidade de vida necessita alcançar uma tradução exata deste conjunto de elementos dentro de um índice ou escore que reflita a percepção de diferentes individuos, em diferentes circunstâncias de suas vidas.28
De fato, em estudo que avaliou a qualidade de vida de gestantes com Diabetes Melitus tipo I e diabetes gestacional, concluiu-se que houve piora na percepção geral de saude pelas participantes.12
Ainda que nesta pesquisa a avaliação de qualidade de vida tenha sido considerada relativamente boa pelas pacientes, constatou-se tendência entre o domínio socioeconomico e o planejamento da gravidez. Por esse dado, pode-se inferir que qualidade de vida também está relacionada a fatores socioeconômicos. Apesar de nossa amostra ter sido constituida eminentemente por mulheres sem vínculo empregatício, deve-se considerar, neste contexto, a dependência econômica familiar. As dificuldades financeiras decorrentes de uma gestação não planejada provavelmente sejam um empecilho para que estas mães possam oferecer condições consideradas ideais por elas, para criar seu filho. Além disso, numa sociedade em que a mulher contribui de diversas maneiras para o orçameno familiar, o fato de ter um filho, sem planejamento, como mostra esta pesquisa, pode acarretar consequências significativas para a vida pessoal e profissional.
Assim, uma das questões evidenciadas nesta pesquisa refere-se não somente à falta de informação, mas também à falta de formação dessas mulheres, uma vez que apenas realizar orientação sobre questões inerentes à fisiologia sexual e práticas contraceptivas é uma política insuficiente e pouco eficaz para evitar as consequências que daí advêm. O canal que leva essa informação deve-se abrir e se sensibilizar à complexidade do universo psicossocial dessas mulheres, particularizando o significado da gravidez.29
Cada mulher é um ser único com idealizações e significados pessoais do que é estar grávida e do que é ser mãe, construídas a partir do seu contexto sociocultural e familiar.18 Em mulheres cardiopatas, a gravidez é a base capaz de sustentar e consolidar a identidade feminina, e cumprir o papel social que a maternidade representa. Por outro lado, a não consolidação deste papel é fator determinante de frustração dos sonhos e das fantasias femininas.30 Por esta razão, muitas mulheres desejam a gravidez, apesar do alto risco.
Partindo-se da premissa de que a maternidade é um processo de transformação, o mesmo se torna complexo quando se trata de uma mulher vivenciando os problemas e limitações de uma cardiopatia associadas à gestação. Estudo conduzido com gestantes hospitalizadas no terceiro trimestre, sendo onze cardiopatas e nove diabéticas, mostrou que essa experiência muitas vezes é sofrida e difícil de ser suportada, em decorrência dos incômodos causados pelo tratamento e limitações na vida social, provocadas pela doença.31 Portanto, o manejo da gravidez nestas circunstâncias demanda a construção de uma assistência integral e humanizada, pautada no acolhimento e orientação. Com isso, espera-se que essas mulheres se sintam amparadas e tenham condições de futuramente fazer escolhas conscientes no âmbito reprodutivo.
A importância da anticoncepção em portadoras de cardiopatias fundamenta-se na premissa de que a doença cardíaca é a principal causa não obstétrica de morte materna na gravidez. Assim sendo, o diagnóstico precoce atrelado ao tratamento apropriado da doença cardíaca permite que um número cada vez maior de mulheres cardiopatas planeje a concepção.2
Por outro lado, também se deve considerar que, mesmo estando devidamente orientada, a mulher, muitas vezes inconscientemente, deseja engravidar, apesar da contraindicação médica. Esta atitude provavelmente pode estar atrelada à necessidade íntima de se ater ao papel feminino de procriar que, para essas mulheres, parece integrar-se ao seu modelo de mulher. A gravidez cria para elas a possibilidade de superação dos obstáculos,29 por isso não é planejada, mas desejada.
Por esta razão, os profissionais de saúde que atuam em programas de planejamento familiar devem considerar e valorizar os aspectos subjetivos, culturais e psicossociais que permeiam a gestação de alto risco, tanto quanto os fisiopatológicos. A constituição da prole e a escolha do método anticoncepcional mais adequado são opções que toda mulher tem o direito de fazer de forma livre e por meio de informação, sem discriminação, coerção ou violência.32
Contudo, algumas limitações deste estudo devem ser reconhecidas. A escassez de estudos sobre a qualidade de vida em pacientes gestantes com cardiopatia dificultou a comparação de nossos resultados. Mas, por outro lado, mostrou que futuras pesquisas certamente devem ser conduzidas nesta área.
CONCLUSÃO
Os resultados deste estudo indicam que a qualidade de vida destas pacientes foi relativamente boa, contrariando a expectativa que as alterações fisiológicas que ocorrem no segundo trimestre de gestação poderiam interferir negativamente na percepção do conceito. Contudo, quando a gravidez não foi planejada, contribuiu para piorar a dimensão socioeconômica. A gestação de alto risco não afetou a qualidade de vida, uma vez que a mesma está atrelada a significados de felicidade, satisfação e realização pessoal, fato que demonstra a importância de assistência de enfermagem integral, pautada na redefinição de saberes e fazeres, valorizando a subjetividade e singularidade como elementos fundamentais desta pratica, bem como a autonomia do indivíduo na condução de sua vida.
Face à escassez de estudos acerca desta temática, propõe-se o desenvolvimento de futuras pesquisas que possam contemplar um número maior de gestantes, e deste modo, aumentar o poder de generalização do mesmo.
Recebido: 09 de Novembro de 2011
Aprovação: 06 de Agosto de 2012
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Correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Out 2013 -
Data do Fascículo
Set 2013
Histórico
-
Recebido
09 Nov 2011 -
Aceito
06 Ago 2012