Open-access PEDAGOGIA DECOLONIAL EM INTERFACE COM OS ESTUDOS DO LETRAMENTO: DECOLONIZANDO MONUMENTOS HISTÓRICOS

DECOLONIAL PEDAGOGY IN INTERFACE WITH LITERACY STUDIES: DECOLONIZING HISTORICAL MONUMENTS

RESUMO

Nossa intenção neste artigo é pensar uma proposta didática que entrelace teorias como decolonidade (Mignolo, 2003, 2007; Quijano, 2005; Walsh, 2009, 2013, 2020), estudos do letramento (Street, 2003, 2014; Kleiman, 1995, 2006; Soares, 2003; Rojo, 2009), criticidade (Aguiar, 2022; Freire, 1997, 2006; Carbonieri, 2016) e interculturalidade crítica (Walsh, 2007, 2009, 2010), chegando à constituição do conceito de Letramento Cartográfico Digital Crítico. A ideia é que, por meio de uma pedagogia decolonial, esses conceitos entrem em convergência e, de forma orgânica, a síntese construída a partir do diálogo dessas teorias possa oportunizar outras possibilidades de estar, ser, sentir, existir, fazer, pensar, olhar, escutar e saber (Walsh, 2013) na escola através da produção de mapas virtuais, interativos e decoloniais.

Palavras-chave: Decolonialidade; Pedagogia Decolonial; Estudos do Letramento; Letramento Cartográfico Digital Crítico; Monumentos Históricos

ABSTRACT

Our intention in this article is to think of a didactic proposal that intertwines theories such as decolonity (Mignolo, 2003, 2007; Quijano, 2005; Walsh, 2009, 2013, 2020), literacy studies (Street, 2003, 2014; Kleiman, 1995, 2006; Soares, 2003; Rojo, 2009), criticality (Aguiar, 2022; Freire, 1997, 2006; Carbonieri, 2016) and critical interculturality (Walsh, 2007, 2009, 2010), arriving at the constitution of the concept of Critical Digital Cartographic Literacy . The idea is that, through a decolonial pedagogy, these concepts converge and, in an organic way, the synthesis built from the dialogue of these theories can provide other possibilities of being, being, feeling, existing, doing, thinking, looking, listening and knowing (Walsh, 2013) at school through the production of virtual, interactive and decolonial maps.

Keywords: Decoloniality; Decolonial Pedagogy; Literacy Studies; Critical Digital Cartographic Literacy; Historical monuments

CONTEXTUALIZANDO A PROPOSTA

A pesquisa em tela pretende, dentro do escopo da Pedagogia Decolonial (Walsh, 2009, 2013), promover um trabalho pedagógico que crie gretas (Walsh, 2013), apontando para a necessidade de enfatizar a construção insurgente e criativa de formas outras de ser e de pensar, combatendo a monocultura, a homogeneização e a hegemonia da identidade eurocentrada (Walsh, 2007), fazendo com que, nessa perspectiva, a educação possa ir além de um mero instrumento de sobrevivência individual e passe a ser encarada como uma via de transgressão (hooks, 2013).

Então, o que pretendemos propor com este trabalho é a produção de atividades que oportunizem a confluência de variadas vozes ressonantes e dissonantes dentro do espaço escolar; que as atividades desenvolvidas nessas páginas possam ir além do estudo e da discussão dos saberes tidos como dominantes, abrindo espaço para saberes outros e para narrativas desprivilegiadas, colocando em cena a sociedade que está à margem, sujeita às massacrantes, incansáveis e, em sua maioria, exitosas tentativas de silenciamento executadas por alianças hegemônicas. Dito isso, podemos afirmar que, aqui, nosso compromisso social é educar por meio do desvelamento das estruturas dominantes de poder que segregam os indivíduos a partir de sua raça, religião, gênero, sexualidade, classe social, deficiência, dentre outros condicionantes sociais.

Desse modo, o contexto desta proposta parte do ano de 2020. Ano de pandemia. Ano do assassinato de George Floyd nos EUA. A morte desse senhor, um negro estadunidense, causou uma convulsão mundial e fez reavivar1 o movimento “Black Lives Matter”, no Brasil - Vidas Negras Importam.

Tal movimento teve inúmeros desdobramentos como vigílias, protestos, passeatas, mas, o que nos interessa aqui, foi o que chamaremos de um efeito colateral do movimento: o repensar de monumentos históricos. Passa a acontecer, inclusive no Brasil, a destruição e a depredação de estátuas que, a partir de problematizações, começaram a ser consideradas monumentos que homenageavam opressores, como podemos observar na Figura 1.

Figura 1
Manchetes sobre depredação de estátuas

Em meio à confusão destes tempos, frente à polarização política evidente na sociedade brasileira, muitos diriam que deixar de homenagear figuras consideradas “ilustres”, mas que, hoje, também podem ser contraditoriamente tratadas como vilões ou opressores, configuraria puro “mi-mi-mi”, expressão muito utilizada nas mídias digitais para indicar que discursos defendidos por grupos sociais minoritários seriam vitimizantes e sem sentido. A expressão ganha força, sobretudo, na ação de desqualificar reivindicações e posições defendidas em prol dos cidadãos menos favorecidos socialmente, na intenção de mostrar que uma crítica social, na verdade, seria apenas mera frivolidade. Com isso, algumas demandas passam a ser entendidas como hierarquicamente inferiores na ordem das prioridades sociais.

Contudo, estamos em uma era de problematizações e é preciso compreender que o que muitos chamam de “mi-mi-mi”, como os discursos e atitudes que combatem estruturas que causam dor e sofrimento, são, para além de reclamações sem fundamento, reflexões necessárias para a reconfiguração de nossa vida em sociedade, que se convertem em clamores por menos opressões, silenciamentos e discriminações. Observar essa movimentação em torno de estruturas históricas abre fronteiras e nos permite pensar: o que é um monumento histórico? Para que ou a quem ele serve?

Rodrigues (2001, p.45) assevera que um monumento é um legado à memória coletiva, um legado criado pela mão do homem e por ele edificado para carregar consigo toda uma carga de concepções que o farão símbolo de uma mensagem que quis ser passada, de um aviso ou de uma ideia que se desejou transmitir. Assim, entendemos que tais estruturas representam e revelam valores de uma sociedade; são o testemunho de determinada cultura sob a forma material, sendo consideradas como símbolos transmissores de ideologias dominantes de determinadas sociedades (Rodrigues, 2001).

Partindo da perspectiva de que monumentos são como representações materializadas de ideologias dominantes, é fundamental entendermos que esses monumentos não são meros objetos estéticos, ou seja, não são espacialmente instalados com a simples função de ornamentar as cidades. Não: eles são intencionalmente dotados de sentido político, capazes de “condensar complexos significados” (Rowntree; Conley, 1980, p. 460) em torno de valores e práticas e, ao mesmo tempo, atuar como “mecanismos regulatórios de informações que controlam significados” (Rowntree; Conley, 1980, p. 465).

Nesse sentido, Corrêa (2005) afirma que os monumentos carregam forte potencial para perpetuar antigas tradições, fazer parecer antigo o que é novo e representar valores que são passados como se fossem de todos, configurando-se como poderosos meios de comunicar valores, crenças e utopias e afirmar, definitivamente, o poder daqueles que os construíram, poder que deseja ser repassado à memória coletiva, a fim de perpetuar-se, demonstrando às gerações futuras a existência e a força dos grupos hegemônicos que definem as homenagens e que são, por eles mesmos, homenageados.

Pensar a produção e a manutenção de monumentos históricos por meio desse viés é entrar, inevitavelmente, na esfera do poder, da manutenção do status quo, pois, como vimos, tais estruturas são utilizadas pelos que conservam o poder hegemônico como maneira de impor à sociedade aquilo que ela não pode - melhor, não deve - esquecer. Contudo, a produção quase que forçada dessa memória coletiva pode causar dor e revolta em determinados grupos, notadamente, os minoritarizados.

A sociedade em que estamos inseridos hoje não é a mesma de outrora, estamos mergulhados em informações, tudo está em constante movimento. Em relação a esses monumentos históricos que podem causar dor e revolta, hoje basta observar um pouco mais detalhadamente a história desses monumentos e problematizá-la, para perceber que o que antes era digno de homenagem em praça pública, hoje pode ser considerado como escória social - vide exemplo da estátua de Borba Gato2. Tal movimento é possível porque a história dos homens e das sociedades se constrói e reconstrói em um constante devir - por isso, é preciso darmos espaço para outras narrativas e abertura para outros pontos de vista sobre o mesmo fenômeno, fugindo da máxima da modernidade de verdades absolutas.

A problemática está exposta: monumentos representam ideologias e poder. Alguns monumentos oprimem e silenciam grupos minoritarizados, o que faz necessário e urgente debater o que representam esses monumentos para a sociedade e quais grupos eles possivelmente apagam ou silenciam. Feita essa discussão, precisamos também refletir sobre a atitude dos participantes desse movimento: Devemos conservar esses monumentos? É correta a depredação deles? O que fazer com esses monumentos?

Muitas perguntas. Debates precisam ser iniciados. As respostas para essas perguntas podem ser encontradas no diálogo em sala de aula. É o que propomos neste artigo: uma proposta didática, embasada nos princípios da pedagogia decolonial, que pretende produzir um mapa virtual problematizando monumentos históricos localizados na região da Grande Vitória (ES), confrontando a história oficial do monumento com a produção de uma versão, uma história outra, com um olhar mais crítico e decolonial sobre o mesmo objeto.

Na próxima seção, debateremos sobre a Pedagogia Decolonial e seu olhar sobre a escola do sul global. Em seguida, a partir dos Estudos dos Letramentos, entrelaçando organicamente os letramentos cartográfico, crítico e digital, formularemos o conceito de Letramento Cartográfico Digital Crítico (LCDC), que será, juntamente com os estudos da decolonialidade, o escopo teórico de nossa proposta de trabalho.

1. Por uma Pedagogia Decolonial

Produzir propostas didáticas que explorem pensamentos decoloniais é trabalhar em lugares pouco explorados, é se abrir para o novo, para o outro e, às vezes, para o desconhecido. Partindo desse pressuposto, a decolonialidade é considerada como caminho para resistir e desconstruir padrões, conceitos e perspectivas impostos aos povos subalternizados durante séculos, sendo também uma crítica direta à modernidade e ao capitalismo.

A noção de decolonialidade materializa-se como via teórica e prática de desconstruir padrões, conceitos e perspectivas impostas aos povos historicamente colonizados. Como defende Mignolo (2007), o pensamento decolonial emergiu como um movimento de contraposição inerente à fundação da própria modernidade, tomando corpo, especialmente, na América Latina e nos contextos asiáticos e africanos. Dessa maneira, pensar e atuar de forma decolonial significa dar relevância ao apagamento, ao silenciamento, à opressão e à desumanização sofrida pelas populações que habitam essas regiões e, além disso,

considerar as lutas dos povos historicamente subalternizados pela existência, para a construção de outros modos de viver, de poder e de saber. Portanto, decolonialidade é visibilizar as lutas contra a colonialidade a partir das pessoas, das suas práticas sociais, epistêmicas e políticas. (Oliveira; Candau, 2010, p. 24)

Assim, latinos e colonizados que somos, julgamos fundamental desenvolver trabalhos na perspectiva decolonial no ambiente escolar. Coadunamos com o argumento de Maldonado-Torres (2008), que afirma que a decolonialidade

é um tema que progressivamente adquire relevância mundial, pois a colonização se transformou e já é, desde muito tempo, o modus operandi da globalização. Podemos ainda dizer que o problema do século XXI será, em grande parte, o problema da colonização na forma do empobrecimento contínuo das populações racializadas, da invasão de seus territórios a partir de um novo imperialismo que busca fazer das mesmas peças-chave o triunfo da expansão da lógica do capital no mundo todo, e da criação de muros de contenção entre as zonas privilegiadas e o que antes era chamado de Terceiro Mundo. (Maldonado-Torres, 2008, p. 64, ênfases adicionadas, tradução nossa)3

Entendendo a colonização e seus desdobramentos neoliberais como o grande problema do século XXI, urge a necessidade de formarmos gerações que se sintam preparadas a lidar com esse cotidiano opressor. Desse modo, é preciso politizar as ações pedagógicas e converter o espaço escolar em um ambiente estratégico que: i) convoque os saberes subordinados pela colonialidade do poder e do saber; ii) dialogue constantemente com os movimentos sociais, valorizando suas críticas e experiências; iii) seja engajado na práxis e nas lutas de povos colonizados, almejando sua transformação e libertação.

A escola, vista também como ambiente de luta e transformação, trabalhará na perspectiva de que a decolonialidade não é um conteúdo a ser estudado, a ser transcrito no quadro negro, ela é muito mais que isso, é transversal, é transdisciplinar, devendo embasar as práticas e discussões dos atores escolares como um projeto de enfrentamento a todas as formas de opressão colonial que nos violentam diuturnamente.

Para transformar o ambiente escolar nessa arena estratégico-política, é preciso a criação de outras pedagogias. Walsh (2013) entende que as pedagogias não podem ser externas às realidades, subjetividades e histórias vividas pelos povos, muito além disso, elas precisam ser pensadas para se integrarem às lutas de conscientização, afirmação e desalienação dos seres humanos perante a negação de sua humanidade. Construir esse tipo de pedagogia seria um esforço em direção a um trabalho de orientação decolonial que rompe as correntes, desescravizando mentes e ensinando a desaprender o aprendido para voltar a aprender (Walsh, 2009, p. 12).

Nessa perspectiva, precisamos pensar

pedagogias que dialogam com os antecedentes crítico-políticos ao mesmo tempo em que partem das lutas e práxis de orientação de-colonial. Pedagogias que enfrentam o que Rafael Bautista se referiu como “o mito racista que inaugura a modernidade […] e o monólogo da razão moderno-ocidental”; pedagogias que se esforcem por transgredir, deslocar e incidir na negação ontológica, epistémica y cosmogônica-espiritual que foi -e éestratégia, fim e resultado do poder da colonialidade. Isto é, “pedagogia(s) de-colonia(is)”. (Walsh, 2009, p. 15, tradução nossa)4

Em 2013, Walsh edita a coletânea Pedagogías Decoloniales - práticas insurgentes de resistir, (re)existir y (re)vivir e, na introdução da obra, a pesquisadora traz uma definição interessante do que seriam essas Pedagogias Decoloniais. A autora afirma que tais pedagogias

orientam rupturas, transgressões, deslocamentos e inversões dos conceitos e práticas impostas e herdadas. E por outro lado, como o componente cêntrico e constitutivo do decolonial mesmo, seu condutor; o que dá caminho e força aos processos de libertação e desprendimento, e o que conduz a situações de de(s)colonização. (Walsh, 2013, p.64, tradução nossa)5

Atuar na escola a partir de uma pedagogia que busca transgressões e rupturas de conceitos e de práticas arraigadas, apontando para um caminho de transformação vai muito além da aplicação de metodologias ou paradigmas. A pedagogia decolonial é muito mais uma atitude transversal transgressora que deve atravessar o fazer pedagógico, independente de área de conhecimento, de currículo, já que tal pedagogia “se constrói de várias maneiras no interior das lutas, como uma necessidade crítica de sustentar e entender o que se enfrenta, contra o que se deve resistir, levantar e atuar” (Walsh, 2013, p.63).

Desse modo, entendemos que a postura do professor que atua nessa perspectiva deve ser sempre de enfrentamento, de intervenção, de criação e, sobretudo, de ação. Não há como haver postura de passividade dentro do escopo da prática da pedagogia decolonial. É preciso movimentar a comunidade escolar para a ação da problematização e desconstrução de forças e pensamentos coloniais que, de maneira tentacular, oprimem as populações do sul global. O fazer docente embasado na pedagogia decolonial é aquele que provoca gritos (Walsh, 2013), que registra a presença dos povos oprimidos no tempo e no espaço.

Essa pedagogia, que abre cicatrizes sócio-históricas para expor as feridas coloniais e, a partir das vozes dos subalternizados, tentar curá-las, considerando outros saberes e produzindo outras narrativas, se esforça para provocar gretas e fissuras e, por meio delas ir realizando o seu trabalho de decolonizar. Desse modo, podemos entender que gretas e fissuras

são parte integral de como e onde me posiciono política, epistêmica, ética e estrategicamente. São parte também das transgressões, indisciplinas, rupturas e deslocamentos que me obrigam a olhar criticamente, a aprender a desaprender para reaprender a pensar, atuar, sentir e caminhar decolonialmente, em nível individual e em coletividade. (Walsh, 2020, p.163, tradução nossa)6

Acreditamos que a proposta didática que construímos aqui pode funcionar como uma ferramenta que abre gretas e fissuras na ordem colonial, questionando as relações de poder impostas pelos monumentos históricos e criando narrativas, narrativas que decolonizam essas estruturas e promovem a assunção da voz daqueles que foram silenciados. Assim, como Walsh (2020), pensamos que práticas de ruptura, de transgressão e de desafio do sistema dominante só podem ocorrer a partir da abertura e aprofundamento de gretas e fissuras decoloniais, pois é nelas que podemos encontrar e/ou construir “formas de estar/fazer/ser/sentir/pensar/saber/viver e muitas outras” (Walsh, 2020, p.163), que podem nos fortalecer para provocar fraturas e desmoronamentos “na ordem moderno/colonial e, ao mesmo tempo, encaminhar esperanças, horizontes e projetos outros” (Walsh, 2013, p.32).

Outro conceito da Pedagogia Decolonial que utilizamos para embasar e construir nossa proposta foi o entendimento de interculturalidade crítica (Walsh, 2007, 2009). No entendimento de Walsh (2009), a interculturalidade crítica7

permite considerar a construção de novos marcos epistemológicos que pluralizam, problematizam e desafiam a noção de um pensamento e conhecimento totalitários, únicos e universais, partindo de uma política e ética que foram submetidos estes conhecimentos. Assim, alenta novos processos, práticas e estratégias de intervenção intelectual que poderiam incluir, entre outras, a revitalização, revalorização e aplicação dos saberes ancestrais [...]. (Walsh, 2009, p. 12, tradução nossa)8

A interculturalidade crítica precisa ser entendida como um “processo e projeto dirigido para a construção de modos outros de poder, saber, ser e viver” (Walsh, 2009, p.11), sendo encarada como uma política cultural e um pensamento oposicional (Walsh, 2007) que se volta para a transformação da estrutura sócio-histórica da colonialidade.

Esses construtos - decolonialidade e interculturalidade crítica - devem trabalhar entrelaçados e, a partir dos nós estabelecidos entre eles, produzir forças e agência humana para questionar, sacudir o moderno/colonial e rearmar, construir outros modos de ser e estar no mundo. Compreendendo o desenho desse conceito, entendemos que Walsh (2007, 2009) propõe que vejamos a interculturalidade crítica

como uma ferramenta pedagógica que questiona de maneira contínua a racialização, subalternização, inferiorização e seus padrões de poder, visibiliza maneiras distintas de ser, viver e saber e busca o desenvolvimento e criação de compreensões e condições que não só articulam e fazem dialogar as diferenças em um marco de legitimidade, dignidade, igualdade, equidade e respeito, mas também - e ao mesmo tempo - encorajam a criação de modos “outros” de pensar, ser, estar, aprender, ensinar, sonhar e viver que cruzam fronteiras. (Walsh, 2009, p.13, ênfase adicionada, tradução nossa)9

Desse modo, entendendo a interculturalidade crítica como ferramenta pedagógica e um conceito que permite pensar novos marcos epistemológicos para problematizar e desafiar a colonialidade/modernidade por meio de outros processos e práticas de intervenção intelectual, é que propomos a aliança desses conceitos aqui apresentados (gretas, fissuras e interculturalidade crítica) com os Estudos do Letramento, tecendo o conceito de Letramento Cartográfico Digital Crítico, para construir mapas que interroguem os monumentos históricos espalhados pelas cidades, colocando no mapa, a voz dos grupos marginalizados e oprimidos.

Na próxima seção, explicamos o caráter plástico e dinâmico dos Letramentos, que passam a ser plurais a partir do entendimento de que são calcados nas práticas sociais e culturais dos povos. Essa plasticidade, maleabilidade dos Letramentos, nos incita a promover pensamentos fronteiriços (Mignolo, 2003) e, na porosidade e permeabilidade das práticas sociais, construirmos práticas imbricadas de letramento que nos oportunizem pensar de forma decolonial.

Então, desse intercruzamento de teorias e práticas sociais, construiremos, a seguir, o conceito de Letramento Cartográfico Digital Crítico, com o intuito de utilizá-lo em conjunto com os pensamentos da Pedagogia Decolonial. Buscamos, assim, a produção de práticas educacionais que fissurem o estabelecido pelo status quo, problematizem hegemonias, descontruam relações de poder que massacram e coloquem, no mínimo, em pé de igualdade, a voz daqueles que são negligenciados ou apagados pela colonialidade.

2. Do Letramento aos Letramentos

Inicialmente, o termo letramento tinha como conceito o domínio das habilidades do código de leitura e escrita (Soares, 2003). Essa concepção foi denominada letramento autônomo por Street ([1995] 2014), entendendo que esse modelo de letramento é fortemente influenciado por ideais liberais, que enfatizam o caráter utilitário das práticas de leitura e escrita. Desse modo, o letramento autônomo concebe o letramento como habilidades que permitirão ao indivíduo atuar “adequadamente” na sociedade.

A partir do entendimento de que, muito mais que uma habilidade cognitiva, o ato de ler representa também uma ação social, Street ([1995] 2014) propõe o modelo de letramento ideológico, correspondente às práticas sociais que as pessoas estabelecem com a leitura e a escrita, permeadas por diferentes crenças e valores. Essas práticas não podem ser tratadas sob o ponto de vista da autonomia, uma vez que são construídas socialmente, “geradas por processos sociais mais amplos, e responsáveis por reforçar ou questionar valores, tradições e formas de distribuição de poder presentes nos contextos sociais” (Soares, 2003, p. 75).

Kleiman (1995) relaciona os estudos sobre o letramento no Brasil com a proposta iniciada na década de 1960 por Freire, para quem o domínio dos usos e funções da escrita serve como um importante meio para empoderar as pessoas. Assim, cotejando-o com Street ([1984] 2014), a autora constrói o conceito de letramento que defende e reconhece o papel da escola no desenvolvimento das práticas de letramento. Para ela, a escola é “a mais importante das agências de letramento” (Kleiman, 1995, p. 20), mas, em seu estudo, por seu papel social, as práticas de letramento ultrapassam os muros da escola, contribuindo para ressignificar a forma com que a leitura e a escrita são concebidas pelas instituições escolares.

Ao longo do tempo, o conceito de letramento tem se expandido, passando a abarcar reflexões sobre as transformações sociais em curso, tais como a globalização, a pós-modernidade, os avanços tecnológicos e a difusão das tecnologias da comunicação e informação, somente para citar algumas mudanças.

Desse modo, passamos a estudar o letramento como fenômeno social complexo, multifacetado e heterogêneo. Nessa perspectiva, torna se fundamental reconhecer que não existe apenas um letramento, mas sim letramentos (Street, 2003; Rojo, 2009). Essa multiplicidade de Letramentos (Letramento Digital, Letramento Visual, Letramento Racial, Letramento Acadêmico, Letramento Cartográfico, Letramento Matemático, Letramento Queer, Letramento Crítico, entre outros) passa a existir a partir do momento em que se leva em consideração a heterogeneidade dos modos pelos quais os sujeitos se apropriam da leitura e da escrita em sociedade (Rojo, 2009), situando-as em seus contextos sociais.

2.1 A composição do Letramento Cartográfico Digital Crítico

É entendendo o letramento como uma prática social e cultural (cf. Street, 2014; Kleiman, 1995; Soares, 2003) e que os letramentos são plurais (Street, 2003; Rojo, 2009) que nos aprofundamos na ideia de Letramento Cartográfico. Para além de sua adjetivação, defendemos que, se os professores planejarem o trabalho pedagógico a partir de eventos de letramento, é possível ensinar a partir de práticas sociais e trazer a vida que se vive (Marx; Engels, [1845-1846] 2007) para dentro do ambiente escolar.

Essa é a nossa proposta neste artigo: por meio da expansão do conceito de letramentos, em que associaremos dialeticamente cartografia, digitalidade e criticidade, pensar formas de trabalho na escola em que professores e alunos possam problematizar, decolonizar e desconstruir estruturas sociais que perpetuam visões estereotipadas e preconceituosas, que retroalimentam os discursos do senso comum, embasando ações de opressão e discriminação em nossa sociedade.

Associar conceitos nem sempre é uma tarefa fácil. É preciso observar o conceito por vários prismas e buscar pontos de interseções entre eles. Aqui proponho associar as ideias do Letramento Cartográfico ao Letramento Digital, embasando o trabalho pedagógico na filosofia do Letramento Crítico.

Nesse sentido, partimos da noção da multiplicidade de letramentos, considerando que esses três tipos de letramento possuem uma mesma coluna vertebral: o engajamento dos cidadãos em práticas sociais, já que todas envolvem o uso da leitura e da escrita na heterogeneidade das práticas que estruturam o nosso viver em sociedade. Desse modo, podemos afirmar que todos os tipos de letramentos estão voltados para a construção de cidadãos capazes de viver de forma ativa e consciente na cultura grafocêntrica em que estamos inseridos.

Desde o surgimento das primeiras civilizações (árabes, babilônios, romanos, egípcios, chineses e indianos), os humanos produziram ferramentas para poderem se localizar no tempo e no espaço. Mapear é uma dessas práticas milenares que foram criadas pela humanidade para registrar e expandir territórios. Os homens catalogam suas experiências e sua visão de mundo, por meios e suportes diversos: pinturas rupestres, desenhos em madeira, couro e papel, e, hoje, telas de computadores.

Os mapas são produzidos, por meios cada vez mais complexos; contudo, o que fazer com esses mapas? Como lidar com a miríade de informações que eles podem trazer? Mapas podem ser utilizados para as mais diversas atividades. De acordo com Sena (2011), por trás de todo mapa, há um interesse (político, econômico, pessoal), um objetivo (ampliar o território, melhorar a área agrícola etc.) e um conceito (o direito sobre determinada região, o uso do solo etc.), ou seja, os mapas são representações adaptadas da realidade, por isso, nunca são neutros, isentos. Olhando os mapas por esta perspectiva, entendemos que muito mais do que aprender a ler mapas, precisamos aprender a dar sentido a essas representações, compreendendo as ideologias e relações de poder que ali estão ocultadas, o que quer dizer que

ler e escrever em cartografia envolve muito mais que o domínio de um conjunto de códigos específicos. Ser letrado nesta linguagem implica conseguir dar sentido aos usos que fazemos dela e, para isso, é necessário tomar os mapas também como uma prática social, mergulhando no entendimento de seus diferentes contextos de uso. (Canto, 2017, p.1654)

Entender a leitura, a produção e a utilização de mapas como uma prática social, como vimos, nos coloca no terreno dos letramentos, nesse caso, do Letramento Cartográfico. De acordo com Castellar e Vilhena (2011), Letramento Cartográfico

consiste na compreensão do espaço, na crítica, na síntese, nas comparações e nas articulações com outros saberes para poder, não somente, se localizar no espaço, mas também, para se deslocar com autonomia e analisar/criticar/modificar o espaço em que está inserido. (Castellar; Vilhena, 2011, p.88)

Assim, conforme a perspectiva do letramento cartográfico, ler mapas seria uma atividade complexa que envolve o sujeito que o produz, o usuário deste instrumento e os contextos históricos e espaciais em que eles estão inseridos (Eldochy; Valença; Roberti, 2008) e, para realizar tal mecanismo, os mapas dependem de “leitores críticos e, ao mesmo tempo, mapeadores conscientes” (Simielli, 2002, p. 99), pois os mapas são ativos, eles constroem conhecimento ativamente, eles exercitam poder e podem representar o próprio poder (Crampton; Krygier, 2006, p. 15).

Para desenvolver essa criticidade e consciência e, concomitantemente, entender as relações de poder contidas nos mapas, podemos associar os conhecimentos do Letramento Cartográfico aos de outro tipo de letramento: Letramento Crítico. Tal conexão é possível e necessária, pois a participação em diferentes práticas sociais, em contextos específicos, nos exige linguagens e habilidades diferentes e adequadas à cada circunstância. Fortemente ligados às práticas socioculturais, os letramentos, em suas esferas, podem propiciar o desenvolvimento de habilidades diferentes, auxiliando-nos a nos adaptarmos às situações em que nos envolvemos cotidianamente.

Desse modo, letrar-se cartograficamente, além de nos possibilitar a aprendizagem de nos localizar no espaço, implica aprender as habilidades de “se deslocar com autonomia e analisar/criticar/modificar o espaço em que está inserido” (Castellar; Vilhena, 2011). Nessa conjuntura, associar essas habilidades às habilidades do Letramento Crítico, ampliaria os horizontes para outros tipos de participação na vida social, uma vez que

o letramento crítico nos ajuda a examinar e combater visões estereotipadas e preconceituosas que, porventura, surjam nas interações em sala de aula e fora dela. É uma perspectiva educacional que tem como propósito instigar o indivíduo a repensar sua realidade, auxiliando-o a tornar-se mais consciente e autônomo para transformá-lo, se assim o decidir. O letramento crítico interroga as relações de poder, os discursos, ideologias e identidades estabilizados, ou seja, tidos como seguros e inatacáveis. Proporciona meios para que o indivíduo questione sua própria visão de mundo, seu lugar nas relações de poder estabelecidas e as identidades que assume. Alicerça-se no desafio incansável à desigualdade e à opressão em todos os níveis sociais e culturais. (Carbonieri, 2016, p. 133)

Ancorados na concepção freireana de que a leitura do mundo sempre precede a leitura da palavra (Freire, 1989), isto é, muito antes de ingressar na escola já interagimos com diversos textos (escritos, orais, visuais, multimodais), o letramento crítico expande a noção de práticas sociais vinculadas ao texto escrito e passa a abordar também a leitura do mundo, das estruturas sociais, com vistas a possibilitar que os indivíduos percebam onde se inserem nessas estruturas e passem a compreender as condições de produção dos textos (Mattos, 2015), ou seja, quem é que fala, de onde fala, para quem fala, para quem não fala e por que assim o faz ou deixa de fazer.

A partir dessa perspectiva, entendemos que o trabalho pedagógico embasado nos preceitos do letramento crítico é fulcral para o desenvolvimento de alunos que possam participar ativamente na sociedade, pois possibilita aos estudantes criarem capacidades leitoras que vão além do explícito, permitindo-lhes refletir sobre seu lugar no mundo e sobre como atuar agentivamente nele. Para tal, é preciso fazer com que os alunos entendam não só as razões pelas quais um texto foi elaborado de determinada maneira, mas também as razões pelas quais se lê esse texto de uma forma ou de outra.

Hoje já não se escreve ou se lê como antes. Estamos na era da digitalidade e os textos passaram a ser cada vez mais digitais, multimodais e colaborativos, incluindo, além da escrita, imagens estáticas e em movimento, músicas e sons variados. Nessa conjuntura, o texto obtém várias camadas de significados imbricadas, como conteúdos e efeitos de expressão que acabam criando efeitos de sentido. Assim, é preciso saber ler os efeitos de sentido e, para isso, são necessárias análise crítica e novas práticas de leitura e escrita ao lidar com esses novos conteúdos.

A escola do séc. XXI precisa estar aberta para a digitalidade; pensamos que é tarefa da escola fazer esse link entre alunos e tecnologias, cumprindo o seu papel de “uma das mais importantes agências de letramento” (Kleiman, 1995). Dessa maneira,

é preciso que a instituição escolar prepare a população para um funcionamento da sociedade cada vez mais digital e, também, para buscar no ciberespaço um lugar para se encontrar, de maneira crítica, com diferenças e identidades múltiplas. (Aguiar; Souza, 2021, p. 36)

Tal preparação para a digitalidade poderá ocorrer por meio do planejamento e da execução de atividades escolares que se hibridizem com as práticas de Letramento Digital. Por sua vez, esse tipo de letramento

diz respeito às práticas sociais de leitura e produção de textos em ambientes digitais, isto é, ao uso de textos em ambientes propiciados pelo computador ou por dispositivos móveis, tais como celulares e tablets, em plataformas como e-mails, redes sociais na web, entre outras. [...] Ser letrado digital implica saber se comunicar em diferentes situações, com propósitos variados, nesses ambientes, para fins pessoais ou profissionais. (Coscarelli; Ribeiro, 2011, p.69)

Ainda refletindo sobre a definição de Letramento Digital, Buzato (2003, 2007) o considera como práticas sociais que se entrelaçam e se modificam através das tecnologias de informação e comunicação, incluindo habilidades para construir sentidos a partir de textos multimodais e a capacidade para localizar, filtrar e avaliar criticamente a informação disponibilizada eletronicamente, além da familiaridade com as “normas” que regem a comunicação através do computador. Pinheiro (2018) afirma que no letramento digital, ocorre uma mescla de outros letramentos, como o letramento visual e o letramento informacional, que são praticados harmoniosamente para fazer sentido, através das tecnologias digitais, num entrelaçamento de práticas nas quais uma auxilia a outra para obtenção dos objetivos dos usuários. Na Figura 2, apresentamos algumas habilidades do letramento digital:

Figura 2
Habilidades do Letramento Digital

Figura 3
Fluxo da proposta de produção de mapa

Isto posto, o que estamos propondo aqui seria um trabalho transdisciplinar, focado não apenas em conteúdos, mas sim um trabalho que aponta para as diversas práticas sociais cotidianas, no intuito de construir habilidades múltiplas para que os alunos possam atuar proativamente na sociedade. Pinheiro e Araújo (2016) corroboram nossa visão, quando defendem que somente um ensino pautado no desenvolvimento dos diversos letramentos, e não somente no letramento tradicional, pode perceber o processo de ensino-aprendizagem como algo para a vida, o que é uma demanda do mundo globalizado.

Pensando nesse ensino para a vida, que se baseia em práticas reais e concretas, precisamos pensar: o que seria o Letramento Cartográfico Digital Crítico? A nosso ver, seria uma forma de ler, produzir e interagir com mapas, a partir de ferramentas digitais e multimidiáticas, para além da mera localização no espaço, sempre preocupando-nos em problematizar e questionar os interesses e as relações de poder intrínsecos ao território representado.

Acreditamos que desenvolver esse tipo de letramento propicia o aprimoramento de habilidades vinculadas à prática social de ler, utilizar e orientar-se por meio de mapas, como: i) aprender novas formas de utilizar ferramentas cartográficas disponíveis na internet; ii) passar de consumidor para produtor de conteúdos cartográficos úteis e refinados para internet; iii) olhar para os espaços públicos de forma mais crítica; iv) repensar e questionar as relações de poder que estruturam as sociedades.

Dessa forma, o conceito de Letramento Cartográfico Digital Crítico (doravante LCDC) dialoga com os preceitos da Pedagogia Decolonial, sobretudo quando pensamos em provocar rupturas nas relações de poder hegemônicas, questionando e desestabilizando discursos e práticas que colocam em estado de privação e sofrimento grupos sociais minoritarizados. A seguir, descrevemos nossa proposta didática, a qual enseja colocar em diálogo os Estudos do Letramento e a Pedagogia Decolonial, no intuito de formar cidadãos aptos a lidarem com os problemas e com as consequências causados pela colonialidade/modernidade em nossa sociedade.

3. Proposta de Trabalho - criação de mapa decolonial-interativo

A questão que colocamos agora é: como trabalhar cartografia, criticidade, digitalidade e decolonialidade na escola? O trabalho é complexo e apresenta inúmeras demandas e muitos desafios. Irá requerer compromisso e esforço conjunto de alunos e professores, já que exigirá, além de equipamentos tecnológicos, conhecimentos inerentes ao mundo da digitalidade. Desse modo, acreditamos que as habilidades e expertises que circunscrevem o trabalho com o LCDC podem estruturar a execução da proposta, ao mesmo tempo em que os preceitos da Pedagogia Decolonial orientam um olhar, um foco na direção da compreensão das privações sofridas pelos povos subalternizados e incita para a luta e a transformação de injustiças perpetuadas em nossa sociedade.

No intuito de articular toda essa discussão em sala de aula é que propomos a atividade de Criação de um Mapa Digital com monumentos históricos problematizados e decolonizados. Nesta proposta, defendemos a ação de problematizar que vai além de simplesmente provocar debates e discussões em sala de aula. A problematização que aqui defendemos é embasada nos princípios de Freire (1997, p.229), que afirma que problematizar é exercer uma análise crítica sobre uma realidade problema, e também nos estudos de Foucault (2004), para quem

[...] problematização não quer dizer representação de um objeto preexistente, nem tampouco a criação pelo discurso de um objeto que não existe. É o conjunto das práticas discursivas ou não discursivas que faz alguma coisa entrar no jogo do verdadeiro e do falso e o constitui como objeto para o pensamento (seja sob a forma da reflexão moral, do conhecimento científico, da análise política etc.). (Foucault, 2004, p. 242, ênfases adicionadas).

Nesses termos, para problematizar é necessário afastar-se e desprender-se do fato ou objeto a ser analisado, criando uma espécie de distância crítica que nos permita analisar o que produzimos, dando-nos a oportunidade de analisar noções pré-estabelecidas do que é certo ou errado, falso ou verdadeiro, feio ou bonito. Esse distanciamento que criticamente produzimos pode permitir repensar as normas e questionar de onde elas surgiram; no caso da proposta, repensar as homenagens feitas e as relações de poder que subjazem a construção, localização e manutenção do monumento em estudo.

A ideia pode ser realizada em qualquer região do país ou do mundo, com turmas dos anos finais do ensino fundamental e com turmas do ensino médio e consiste em discutir com os alunos os monumentos históricos da região, a fim de compreender sua relevância e pertinência por meio de uma ótica crítica e decolonial. Tal proposta de trabalho pode ser resumida no esquema abaixo:

Partindo de nossa localização, construiremos, a título de exemplo, um mapa digital interativo decolonial com 3 monumentos localizados em nossa região: a Grande Vitória (ES). A ideia é que nesse mapa, criado de forma colaborativa e interativa, coexistam duas versões sobre o monumento: a) ficha descritiva/sinopse oficial, retextualizada pelos alunos e b) ficha descritiva/sinopse problematizada-decolonizada, produzida pelos alunos.

O trabalho em sala de aula começaria com a divisão da turma em grupos, que ficarão responsáveis por realizar o levantamento dos monumentos históricos da região e por pesquisar a história oficial desses monumentos. Feito isso, serão apresentados pela turma os monumentos pesquisados e expostas suas respectivas histórias.

Após o estudo desses monumentos ou ao mesmo tempo em que eles serão apresentados, professores e alunos debaterão e problematizarão sobre essas estruturas históricas, em uma perspectiva decolonial, na intenção de questionar, tentar desconstruir e rever a história oficial contada sobre aquele ser/objeto homenageado. Debater com alunos numa perspectiva decolonial seria trazer para o chão da escola

a luta e ação tanto contra os padrões de poder que pretendem negar, controlar ou dominar o ser, estar, saber, pensar, sentir e viver, como a favor da construção de práticas e possibilidades distintas, práticas e possibilidades “muito outras”. (Walsh, 2020, p.143, tradução nossa)10

Feitas as discussões, sugerimos que os grupos escolham os monumentos que querem registrar no mapa, pesquisem a história oficial desses monumentos e, juntos, produzam textos dos gêneros ficha descritivo-informativa ou sinopses problematizando e decolonizando o monumento escolhido, para, posteriormente, disponibilizá-los na internet. É importante dialogar com os alunos que o objetivo dessa atividade é desconstruir noções de poder que já estão estabilizadas e registradas no território das cidades, na intenção de reconsiderar a utilização desses espaços públicos e criar uma outra forma de pensamento coletivo, inculcando, em relação aos monumentos históricos, noções de criticidade e decolonialidade no ideário social, por meio dos textos produzidos e veiculados na internet para leitura e utilização de moradores e turistas que visitam a região.

Com os textos escritos e revisados, professor e alunos deverão fazer uso da ferramenta do Google My Maps, pelo celular ou computador, geolocalizar os respectivos monumentos, buscar fotos de cada um dos que foram escolhidos e registrar no mapa as fichas descritivas ou sinopses produzidas. O uso do aplicativo My Maps é bem intuitivo e de fácil manipulação. Como exemplo, produzimos um mapa em versão beta com 3 monumentos da Grande Vitória (ES): a) Estátua de Iemanjá - Praia de Camburi, Vitória (ES); b) Homenagem ao Imigrante Italiano - Santa Helena, Vitória (ES) e c) Estátua de Luiza Grimaldi - Prainha, Vila Velha (ES).

A figura 4 é uma visão do mapa versão beta disponibilizado no Google Maps. Nessa figura, demonstramos os 3 pontos que escolhemos para utilizar como exemplo. Em cada marcação no mapa, haverá 2 textos produzidos pelos grupos, demarcados por um ponto verde (versão oficial) e por um ponto vermelho (versão problematizada-decolonizada), disponibilizadas da seguinte forma:

Figura 4
Mapa em versão beta

Figura 5
Mapa em versão beta com dupla marcação

Nesses pontos, verde e vermelho, inserimos as fichas descritivas/sinopses com base em informações oficiais pesquisadas pelos alunos em livros ou encontrados na internet, juntamente com as fichas descritivas problematizadas produzidas por eles. É importante frisar que, nesta atividade de pesquisar e produzir textos, na intenção de garantir a visibilidade da “história que a história não conta” (Walsh, 2010), as fichas ou sinopses deverão ser construídas a partir de uma práxis que se preocupe com a criação e produção de novas condições sociais, políticas, culturais e de pensamento, por isso, deve ser um texto problematizando a existência daquele monumento que, de forma decolonial, questiona sua importância, a quem ele representa, a quem ele apaga ou silencia, quais relações de poder estão por trás da homenagem realizada e por fim, pensar propostas alternativas para decolonizar aquela homenagem.

O primeiro exemplo que utilizamos é um monumento polêmico da cidade de Vitória: a estátua em homenagem a Iemanjá, localizada na Praia de Camburi, em um píer. A estátua foi erguida pela prefeitura da cidade em 1988 no intuito de homenagear as tradições afro-brasileiras. Porém, a grande polêmica, anos depois, foi que a estátua que representava uma divindade de religião de matriz africana estava representada como uma mulher branca. Após muita discussão com o movimento negro e com representantes de religiões de matriz africana, somente em 2017, a estátua passou por uma “adequação” e recebeu nova pintura, conforme exposto na Figura 6.

Figura 6
Mapa com a versão oficial da estátua de Iemanjá

O fato de uma estátua de uma divindade afro ser pintada de branco, a nosso ver, é uma forma de apagamento e uma violência simbólica em relação ao povo preto. Precisamos romper, via Pedagogia Decolonial, com essa forma de opressão que denota preconceito e intolerância religiosa, por meio de ações que

partem com frequência da identificação e reconhecimento de um problema, anunciam a desconformidade com e a oposição à condição de dominação e opressão, organizando-se para intervir; o propósito: derrubar a situação atual e fazer possível outra coisa. (Walsh, 2013, p.29, ênfases adicionadas, tradução nossa)11

Assim, para a pedagogia decolonial é preciso pensar e agir sob crítica ao hegemônico, mas sobretudo por um modo “outro”, que conteste saberes historicamente eurocentrados, promovendo sistemas de afirmação de lugar, fala, e igualmente, escuta. Foi o que foi feito neste caso, a criação de outra possibilidade. Por meio de embates e diálogos travados entre a prefeitura da capital e os movimentos negros, em 2017, a estátua foi repintada com a cor adequada. Isso só foi possível por meio da luta organizada, a qual expôs uma ferida colonial aberta na cidade, na intenção de reparar esse equívoco não só histórico, como também sociocultural.

Contudo, tudo isso deixou uma marca, uma cicatriz histórica que precisa ser debatida nas escolas, auxiliando os alunos a entenderem a perversidade ocultada por trás de uma simples pincelada de tinta. Por meio de perguntas, provocamos o debate com a turma ou com os grupos fazendo-os refletir sobre esse branqueamento, analisando as relações de poder e compreendendo o que significa o uso da cor branca naquela situação. Dessa forma, defendemos aqui uma espécie de pedagogia da pergunta, não fundamentadas em questionamentos automatizados de estímulo-resposta, mas perguntas que fazem refletir, que desconcertam o pensamento, que desestabilizam a lógica estabelecida, pois acreditamos que “perguntando se caminha, perguntando também se abrem gretas no muro da história” (Walsh, 2020, p.166).

Na nossa proposta, pensamos as seguintes questões: a) Por que uma estátua de uma divindade de religião de matriz africana com feições europeias?; b) A quem interessa esse tipo de monumento? Quem ele realmente representa?; c) Quem deixou de ser ouvido?; d) Quem foi silenciado?; e) Quem não estava sendo representado? Por quê?; f) Por que uma estátua negra incomodaria tanta gente?; g) Com que outras imagens esse “branqueamento” também acontece? O que você acha disso?.

Outra estrutura escolhida foi o Monumento ao Imigrante Italiano (Figura 7), situado na área nobre da cidade de Vitória (ES), dois obeliscos de granito de 30m de altura se encontram e representam a importância da cultura italiana na formação do povo capixaba. Sabemos dos fluxos migratórios que até hoje vem contribuindo para a formação de nossa cultura, entretanto, indagamos: só os povos europeus contribuíram para a nossa formação sociocultural? E os povos indígenas? E os negros trazidos em diáspora? E os novos fluxos migratórios de massas de refugiados? Será que não são dignos de homenagem? Será que não contribuíram?

Figura 7
Mapa com a versão oficial do Monumento ao Imigrante Italiano

Figura 8
Mapa com a versão oficial da estátua de Luiza Grimaldi

No exemplo desse monumento, percebemos o que Walsh (2007) chamou de interculturalidade funcional, aquela que só se preocupa em juntar certas culturas, ignorando outras, sobretudo se for uma cultura que não seja de origem branca, europeia, cristã e heterossexual. Vemos aqui exatamente o que combate a decolonialidade: o apagamento dos povos do sul global. Uma situação em que, ingenuamente, podemos simplesmente pensar que as autoridades se esqueceram de mencionar outras contribuições culturais, na verdade, é uma forte manifestação de poder em direção à manutenção da hegemonia das comunidades europeias em detrimento das outras, pois, desde muito tempo,

o eurocentrismo torna-se uma metáfora para descrever a colonialidade do poder, na perspectiva da subalternidade. Da perspectiva epistemológica, o saber e as histórias locais europeias foram vistos como projetos globais, desde o sonho de um Orbis universalis christianus até a crença de Hegel em uma história universal, narrada de uma perspectiva que situa a Europa como ponto de referência e de chegada. (Mignolo, 2003, p. 41)

Temos consciência de que a história e a cultura brasileiras não são contadas pelos negros e indígenas que aqui viveram e vivem, mas sim por uma única cosmovisão válida, aquela pautada em uma visão europeia, por conseguinte,

a incorporação de tão diversas e heterogêneas histórias culturais a um único mundo dominado pela Europa, significou para esse mundo uma configuração cultural, intelectual, em suma intersubjetiva [...]. Em outras palavras, como parte do novo padrão de poder mundial, a Europa também concentrou sob sua hegemonia no controle de todas as formas de controle da subjetividade, da cultura, e em especial do conhecimento, da produção do conhecimento (Quijano, 2005, p. 121).

A perspectiva decolonial, como buscamos, defende que é preciso olhar para os outros povos, incluí-los, romper com essa lógica colonial/moderna e colocá-los no mesmo patamar. Então, por que não há um monumento que valorizasse a integração de todas as culturas? Por que não há uma homenagem à cultura tupi-guarani que habita as terras de nosso estado? Por que não há um monumento que enaltece as contribuições negras, como o congo, manifestação cultural típica do ES? É fundamental debatermos essas questões com nossos alunos, fazê-los entender que tais fatos não são mero esquecimento das outras culturas, mas que se tratam de apagamento de culturas de Améfrica (González, 1988).

Tudo isso tem a ver com a construção da memória coletiva que discutimos na introdução deste artigo. Para agir decolonialmente, precisamos mexer com essa memória coletiva criada por forças hegemônicas, a fim de produzir outras ou novas memórias, uma vez que

a memória coletiva é um espaço entre outros onde se entretece na prática o pedagógico e o decolonial. A memória coletiva é a reafirmação do que a tradição nos ensina, do que o ancestral ensina. Justamente é memória coletiva porque está em todo o coletivo […] é um saber coletivizado; é o afiançamento, a verificação, a que nos permite continuar”. (Walsh, 2013, p.26-27, tradução nossa)12

A presença dessa estrutura gigante (Monumento ao Imigrante Italiano), na área nobre de uma capital, reforça, e muito, a ideia de supremacia europeia na memória da população do entorno. Precisamos estilhaçar esse molde de memória nefasta e, por meio de gretas e fissuras, reconfigurar a memória do povo de modo que essa outra/nova memória possa ser considerada como um ponto de articulação da continuidade de uma aposta decolonial (Walsh, 2013).

Em sala de aula, a partir dessa situação-problema, propomos o seguinte debate: a) Por que uma homenagem aos imigrantes italianos?; b) Quem foram esses imigrantes? Por que eles vieram para cá?; c) Em que contexto se encontrava a Itália na época dessa “imigração” em massa?; d) Como o governo capixaba recebeu esses imigrantes na época?; e) Por que outros povos (não europeus) que também contribuíram para a formação do povo capixaba/brasileiro não recebem tais homenagens?; f) Hoje, como são tratados os povos que imigram pelo mesmo motivo que os italianos imigraram para cá?.

O 3º e último monumento escolhido para esta demonstração foi a estátua de Luiza Grimaldi, localizada no sítio histórico da cidade de Vila Velha (ES). Luiza foi esposa do filho do 1º donatário da capitania do Espírito Santo e, devido à morte do sogro e do marido, acabou tornando-se donatária da capitania, ou seja, foi a 1ª governadora do Espírito Santo. Contudo, tal fato histórico foi negligenciado por séculos e, somente em 2016, Luiza Grimaldi recebeu da prefeitura de Vila Velha a devida homenagem.

Aqui, mais uma vez, cabe uma discussão problematizadora com os alunos sobre o papel da mulher na sociedade. Sabendo-se que há um monumento a Vasco F. Coutinho, 1º donatário da capitania, inaugurado em 1935 e que há vários bustos e estátuas que fazem menção a governadores do ES, vamos refletir: a) Por que só em 2016 a governadora Luiza Grimaldi foi homenageada?; b) Qual a relevância da história dessa personagem para o ES?; c) Que grupo foi silenciado? Que grupo foi excluído? Que grupo foi apagado?; d) Que outros casos semelhantes a esse silenciamento você conhece?; e) Podemos entender esse apagamento como um tipo de violência histórica?; f) Quais são os reflexos dessa atitude na nossa sociedade? Seria mais uma vez um mero esquecimento? Ou a presença da mulher foi invisibilizada?. É importante registrar que

o colonialismo não se contenta com apertar o povo entre suas redes, com esvaziar o cérebro colonizado de toda forma e de todo conteúdo. Por uma espécie de perversão da lógica, se orienta em direção ao passado […], o distorce, o desfigura, o aniquila. (Walsh, 2009, p.21, tradução nossa)13

O que vemos é que a história de Grimaldi foi silenciada. Walsh (2020, p.156) defende que “silêncios e silenciamientos […] são só algumas das alterações que caracterizam o momento atual, parte também de uma hegemonia ideológica e de pensamento que está invadindo todas as esferas”. Desse modo, silenciamento é projeto de manutenção de status quo; assim, ocultar a história da 1ª governadora da capitania é o mesmo que enfraquecer a presença das mulheres na sociedade e sua contribuição na constituição e no desenvolvimento das nações, reforçando a hegemonia dos homens.

A ausência de figuras femininas em posições de poder precisa deixar de ser vista como falta de interesse desse grupo, é necessário mostrar para os alunos todo um mecanismo há séculos em funcionamento que impede ou dificulta a presença de mulheres em vários setores de nossa sociedade. Para alcançar tal intento é preciso gritar, um grito decolonial se configura como

mecanismo, estratégia e ação de luta, rebeldia, resistência, desobediência, insurgência, ruptura e transgressão ante à condição imposta de silenciamiento, ante os intentos de silenciar e, também, ante os mesmos silêncios - impostos e estratégicos acumulados. Os gritos reúnem silêncios e reclamam - se apoderam de novas vozes sequestradas, subjetividades negadas, corpos, natureza e territórios violados e despojados. (Walsh, 2020, p.153, tradução nossa)14

Esse grito é luta política-epistemológica-existencial. Ele aponta para a intervenção e transformação do status quo. “São gritos de, desde, com, por e para a vida, por e para o re-existir, re-vivir e con-vivir com justiça e dignidade (Walsh, 2020, p.161). Tornar visível, dessilenciar a história de Grimaldi é uma maneira de intervir e corrigir o rumo da história, fissurar o sistema e colocar a mulher em posições que lhes são socio-historicamente negadas.

Devemos continuar assim? Vamos derrubar esses monumentos? É isso que estamos propondo com este trabalho? Não! O que propomos aqui é a criação de alternativas para mitigar ou fraturar essas relações de poder opressoras. Nossa ideia, com a criação desse mapa, que ficará disponível na internet, com acesso livre para qualquer pessoa, é registrar narrativas outras, narrativas que escutem o Sul Global e que friccionem os ideais dos grupos que detêm o poder com os dos que são por eles subalternizados.

Realizar um trabalho dessa envergadura é agir a partir de pensamentos-outros, conforme Oliveira e Candau (2010), o que seria, para esses pesquisadores, sempre partir do princípio da possibilidade de pensamento, a partir da decolonização, ou seja, a luta contra a não-existência, a existência dominada e a desumanização, configurando-se como uma categoria que serve como força para questionar a negação histórica da existência dos não-europeus, como os afrodescendentes e os povos originários da América Latina.

Consideramos que tal proposta de trabalho se encaixa com o que Walsh (2007, 2009) defende de interculturalidade crítica, pois o que propomos aqui é a produção de outras compreensões simbólicas do mundo, a partir de monumentos históricos, ouvindo e registrando a voz dos subalternizados. Por meio dessa atitude praxiológica, acreditamos que a conexão da interculturalidade crítica com a prática docente “representa a construção de um novo espaço epistemológico que inclui os conhecimentos subalternizados e os ocidentais, numa relação tensa, crítica e mais igualitária” (Oliveira; Candau, 2010, p.27).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pretendemos, com o debate aqui proposto, incitar na escola um agir pedagógico transgressor, de ruptura e de inclusão, pois, ao conectar as habilidades e práticas sociais desenvolvidas em torno do Letramento Cartográfico Digital Crítico com a visão de luta e resistência da Pedagogia Decolonial, esperamos promover um trabalho na escola que não omita os saberes que já são tidos socialmente como hegemônicos - os que já são foco curricular de nossa escola tradicional -, mas que, ao mesmo tempo, nos engajemos na tarefa de levantar as vozes de outras narrativas que são desprivilegiadas e, muitas vezes, apagadas da nossa construção sócio-histórica e cultural.

A ideia é, cada vez mais, tensionar na escola o passado e o presente com o propósito de fazer emergir as histórias e identidades subalternizadas pelo poder colonial, provocando a inserção no currículo escolar desses temas. Desse modo, acreditamos que trabalhar com o Letramento Cartográfico Digital Crítico pode contribuir com tal missão, pois auxiliará os alunos a compreender a função social da cartografia, em simultaneidade com o desenvolvimento de expertises para utilizar de forma ativa e consciente as ferramentas da tecnologia e da internet e, nesse conjunto, criticamente, produzir contradiscursos que descontruam imposições hegemônicas, abrindo espaço para outras narrativas.

Entendemos que o entrelaçamento dessas duas teorias (LCDC e Pedagogia Decolonial) produz como síntese uma ferramenta educacional que contribui para desvelar as raízes da opressão e desumanização dos povos historicamente colonizados, pois permite identificar, entender e infiltrar em suas estruturas, além de atuar sobre elas a partir de outras epistemologias e outros pontos de vista.

Finalizando, cremos que esse tipo de trabalho ajuda professores e alunos a refinarem o olhar, os sentidos e a sensibilidade na direção de enxergar, ver e escutar a opressão sofrida por povos e comunidades subalternizadas, aprendendo qual é o seu lugar, em qual lado da balança eles se encontram. Falando mais especificamente, esperamos que a proposta didática aqui apresentada possa contribuir para que os atores envolvidos entendam que monumentos históricos são muito mais que armações de concreto, pois são representações sociais e refletem relações de poder e para que percebam que a história e o espaço podem e devem ser transformados/ressignificados a partir do olhar dos invisibilizados.

DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA

Declaro, para devidos fins, no que diz respeito ao artigo “Pedagogia decolonial em interface com os estudos do letramento: decolonizando monumentos históricos”, de minha autoria, submetido à revista Trabalhos em Linguística Aplicada, que os dados públicos utilizados na pesquisa estão disponíveis nos endereços eletrônicos citados, permitindo amplo e irrestrito acesso.

  • 1
    Afirmamos “reavivar” porque o movimento Black Lives Matter foi criado anos antes do brutal assassinato de Floyd. No dia 13 de julho de 2013, o movimento começou com a hashtag #BlackLivesMatter. Isso aconteceu nas redes sociais, por causa da morte de um jovem negro. Trayvon Martin, 17, morreu após ser baleado por George Zimmerman, um policial branco. A polêmica nas redes sociais teve início porque o policial foi absolvido pela justiça. Entretanto, a nacionalização do movimento começou em 2014 com manifestações de rua. Essas manifestações aconteceram após a morte de dois jovens negros: Michael Brown, 18, em Ferguson e Eric Gamer, 43, em Nova Iorque. Em 2016, o movimento BLM chegou ao Brasil, África do Sul e Austrália. As ações de protesto aconteciam nas ruas e nas redes sociais.
  • 2
    Bandeirantes como Borba Gato desbravaram territórios no interior do país e capturaram e escravizaram diversos indígenas e negros. Segundo historiadores, muitos mataram indígenas em confrontos que acabaram por dizimar etnias. Também estupraram e traficaram mulheres indígenas, além de roubar minas de metais preciosos nos arredores de aldeias, segundo o livro “Vida e Morte do Bandeirante”, de Alcântara Machado.
  • 3
    No original: Es más bien un tema que progresivamente adquiere relevancia mundial pues la colonización se ha vuelto y ya ha sido desde mucho tiempo el modus operandi mismo de la globalización. Pudiera aún decirse que el problema del siglo XXI será en gran parte el problema de la colonización en la forma del empobrecimiento continuo de poblaciones racializadas, de la invasión de sus territorios por parte de un nuevo imperialismo que busca hacer de los mismos piezas claves en el triunfo de la expansión de la lógica del capital en todo el mundo, y de la creación de murallas de contención entre las zonas privilegiadas y el antes llamado Tercer Mundo
  • 4
    No original: pedagogías que dialogan con los antecedentes crítico-políticos a la vez que parten de las luchas y praxis de orientación de-colonial. Pedagogías que enfrentan lo que Rafael Bautista ha referido como “el mito racista que inaugura la modernidad […] y el monólogo de la razón modernooccidental”; pedagogías que esfuercen por transgredir, desplazar e incidir en la negación ontológica, epistémica y cosmogónica-espiritual que ha sido -y esestrategia, fin y resultado del poder de la colonialidad. Es decir, “pedagogía(s) de colonial(es)”.
  • 5
    No original: orientan rupturas, transgresiones, desplazamientos e inversiones de los conceptos y prácticas impuestas y heredadas. Y por el otro lado, como el componente céntrico y constitutivo de lo decolonial mismo, su conductor; lo que da camino y empuje a los procesos de desenganche y desprendimiento, y lo que conduce a situaciones de de(s)colonización.
  • 6
    No original: Son parte integral de cómo y dónde me posiciono política, epistémica, ética y estratégicamente. Son parte integral también de las transgresiones, indisciplinamientos, rupturas y desplazamientos que me obligan a mirarme críticamente, a aprender a desaprender para reaprender a pensar, actuar, sentir y caminar decolonialmente, a nivel individual y en colectividad.
  • 7
    Em seus textos Walsh deixa claro que é fundamental fazer a distinção entre multiculturalidade, interculturalidade e interculturalidade crítica. De acordo com Walsh (2007), o termo multiculturalidade aponta para a universalidade de culturas, pretende “manter a unidade na diversidade” (p.54) e seu uso em políticas públicas implica em “fazer visível uma geopolítica que tende a fazer desaparecer e escurecer as histórias locais” (p.54). Já interculturalidade, entendido por Walsh (2009) como um termo neoliberal e colonial representa a interrelação entre culturas, referindo-se, frequentemente, “ao contato e ao conflito entre a cultura do Ocidente com a cultura de outras civilizações” (Walsh, 2007, p.50).
  • 8
    No original: Permite considerar la construcción de nuevos marcos epistemológicos que pluralizan, problematizan y desafían la noción de un pensamiento y conocimiento totalitario, único y universal desde una postura política y ética, que siempre mantiene como presente las relaciones del poder a las que han sido sometidos estos conocimientos. Así alienta nuevos procesos, prácticas y estrategias de intervención intelectual, que podrían incluir, entre otras, la revitalización, revaloración y aplicación de los saberes ancestrales
  • 9
    No original: como herramienta pedagógica que cuestiona de manera contínua la racialización, subalternización, inferiorización y sus patrones de poder, visibiliza maneras distintas de ser, vivir y saber, y busca el desarrollo y creación de comprensiones y condiciones que no sólo articulan y hacen dialogar las diferencias en un marco de legitimidad, dignidad, igualdad, equidad y respeto, sino que también -y a la vezalientan la creación de modos “otros” de pensar, ser, estar, aprender, enseñar, soñar y vivir que cruzan fronteras.
  • 10
    No original: la lucha y acción tanto en contra de los patrones de poder que pretenden negar, controlar o dominar el ser, estar, saber, pensar, sentir y vivir, como al favor de la construcción de prácticas y posibilidades distintas, prácticas y posibilidades “muy otras”.
  • 11
    No original: parten con frecuencia de la identificación y reconocimiento de un problema, anuncian la disconformidad con y la oposición a la condición de dominación y opresión, organizándose para intervenir; el propósito: derrumbar la situación actual y hacer posible otra cosa. (Walsh, 2013, p.29)
  • 12
    No original: la memoria colectiva ha sido un espacio entre otros donde se entreteje en la práctica misma lo pedagógico y lo decolonial. La memoria colectiva es la reafirmación de lo que la tradición nos enseña, de lo que el ancestro enseña. Justamente es memoria colectiva porque está en todo el colectivo […] es un saber colectivizado; es el afianzamiento, la verificación, la que nos permite continuar”. (Walsh, 2013, p.26-27)
  • 13
    No original: El colonialismo no se contenta con apretar al pueblo entre sus redes, con vaciar el cerebro colonizado de toda forma y de todo contenido. Por una especie de perversión de la lógica, se orienta hacia el pasado […], lo distorsiona, lo desfigura, lo aniquila. (Walsh, 2009, p.21)
  • 14
    No original: mecanismo, estrategia y acción de lucha, rebeldía, resistencia, desobediencia, insurgencia, ruptura y transgresión ante la condición impuesta de silenciamiento, ante los intentos de silenciar y, también, ante los mismos silencios -impuestos y estratégicos acumulados. Los gritos reúnen silencios y reclaman -se apoderan de nuevas voces secuestradas, subjetividades negadas, cuerpos, naturaleza y territorios violados y despojados. (Walsh, 2020, p.153)

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    25 Jul 2022
  • Aceito
    15 Dez 2023
  • Publicado
    18 Jun 2024
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