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EXPECTATIVAS E CRENÇAS DE DOUTORANDOS SOBRE O GÊNERO PROJETO DE TESE

EXPECTATIONS AND BELIEFS OF DOCTORAL STUDENTS THE GENRE THESIS PROJECT

RESUMO

O objetivo deste artigo é discutir as crenças e percepções de doutorandos das áreas de Linguística, Literatura e História em relação ao conhecimento de gênero envolvidos na elaboração de projetos de tese submetidos a seleção para ingresso em curso de doutorado. A pesquisa se apoia nos pressupostos teóricos e metodológicos dos Estudos Retóricos de Gêneros (ERG), especialmente na visão de que os gêneros possuem uma realidade sociorretórica (MILLER, 1984; DEVITT, 2004) e sociocognitiva (BERKENKOTTER; HUCHIN, 2016; TSENG, 2012), a qual pode ser percebida através das expectativas genéricas e crenças dos usuários de um gênero específico. Em função de projetos de pesquisa, em geral, incluindo projetos de tese, caracterizarem-se como um gênero ocluso, as crenças e expectativas diferem bastante entre os doutorandos acerca das práticas de leitura e de escrita de projetos, tendo sido observadas formas um tanto inusitadas, não esperadas na literatura que tematiza práticas de leitura e escrita de deste gênero. Por outro lado, também reconhecemos crenças similares, como a percepção de que projetos de tese podem ser vistos como um “trampolim operacional e prospectivo” para o gênero tese de doutorado, de modo que o seu processo de elaboração envolve ações retórico-discursivas prospectivas para o desenvolvimento de ideias e ações esboçadas em termos de planejamento.

Palavras-chave:
projeto de tese; crenças; projeto de pesquisa

ABSTRACT

The purpose of this article is to discuss the beliefs and perceptions of doctoral students in the areas of Linguistics, Literature and History, in relation to genre knowledge involved in the elaboration of thesis projects undergone to selection for admission to a doctoral course. The research is based on the theoretical and methodological assumptions of Rhetorical Studies of Genres, especially in the views that genres have a socio-rhetorical (MILLER, 1984; DEVITT, 2004) and socio-cognitive reality (BERKENKOTTER; HUCHIN, 2016; TSENG, 2012), which can be perceived through the generic expectations and beliefs of users of a specific genre. Probably due to projects being an occluded genre, beliefs and expectations differ greatly among doctoral students about the practices of reading and writing projects, having been observed quite unusual forms, and not expected in the literature that deals with projects, on practices of reading and writing projects, as well as strategies consistent with the literature on the genre of research project. On the other hand, we also recognize similar beliefs, such as the perception that thesis projects can be seen as an operational and prospective springboard for the doctoral thesis genre, so that its elaboration process involves prospective rhetorical-discursive actions for the development of ideas and actions outlined in terms of planning.

Keywords:
thesis project; beliefs; research design

INTRODUÇÃO

O projeto de pesquisa (doravante PP) é um gênero comumente presente no ambiente acadêmico, sendo usado como um dos pré-requisitos avaliativos para a concessão de financiamento para pesquisa e ingresso em cursos de pós-graduação no Brasil. No contexto da pós-graduação, os PP são previstos em editais de seleção, os quais indicam, em geral, quais seções devem ser contempladas no texto do projeto, a extensão máxima do texto, além de orientações gerais sobre temáticas aceitas pelos programas de pós-graduação. Os PP fazem parte de uma cadeia de gêneros que inclui editais, arguições, entrevistas, recursos, e-mails, avisos, para citar alguns, os quais, em conjunto e de modo interligado, engatam a atividade de seleção de propostas de investigação ou de ingresso em um curso (TARDY, 2003TARDY, C. M. A genre system view of the funding of academic research. Written Communication, Sage Journals, v. 20. n. 1, p. 7-36, 2003. Disponível em: https: https://doi.org/10.1177/0741088303253569>. Acesso em: 03 de outubro de 2023.
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).

Os PP1 1 Ao mencionarmos projetos de pesquisa (PP), estaremos nos reportando a projetos no sentido mais geral sem especificar um contexto particular, seja a nível institucional ou em relação aos interlocutores. Ao falarmos de projetos de tese (PT) estaremos nos reportando aos projetos submetidos a seleção de pós-graduação a nível de doutorado. Já a menção a projeto de dissertação (PD) refere-se a projetos submetidos a seleção de pós-graduação a nível de mestrado. podem ser considerados gêneros oclusos2 2 Gêneros oclusos, na esfera acadêmica, são aqueles que oferecem algum tipo de suporte ao processo de publicação da pesquisa, contudo permanecem escondidos do público, sem integrarem o sistema de gêneros responsável pelo registro da pesquisa (Swales, 1996). Os projetos de pesquisa em geral e os projetos de tese em particular são aqui considerados gêneros oclusos pelo fato de, em geral, não serem publicados ou ficarem em acesso livre à comunidade de leitores no Brasil. Há casos particulares de instituições que permitem acesso aberto a projetos, mas se trata de uma prática rara. , na acepção de Swales (1996)SWALES, J. M. Occluded genres in the academy. Academic writing, v. 45, p. 58, 1996., pelo fato de desempenharem um papel importante, como um evento deflagrador3 3 Evento deflagrador é algum acontecimento que ocasiona, requer ou engata a criação de um texto de um certo gênero. Pode ser um fato empírico, como o corte da luz elétrica, ou um evento discursivo, como uma entrevista concedida por um político. (PARE; SMART, 1994), no sistema de atividades que envolve a realização de pesquisas acadêmicas, mas, a despeito de sua importância e centralidade, não circularem publicamente. Este caráter ocluso tem o potencial de gerar dúvidas, entre pesquisadores iniciantes e pós-graduandos, sobre como agir retoricamente e discursivamente durante o processo de elaboração de um PP. De fato, o conhecimento retórico e discursivo sobre este gênero tem se mostrado restrito a um grupo reduzido de pesquisadores experientes e que participa de comitês de agências de fomento e de programas de pós-graduação, o que pode dificultar, de certo modo, a incorporação de pesquisadores novatos ao ambiente de pesquisa. Em face disso, investigações sobre PP revestem-se de relevância acadêmica, tendo em vista o potencial de trazer à luz conhecimentos tácitos sobre este gênero.

Investigações sobre o funcionamento sociorretórico dos PP podem contribuir para melhorar e diversificar o acesso à realização de pesquisas, contudo o próprio caráter ocluso dos PP, por sua vez, tem dificultado a realização de investigações sobre este gênero, uma vez que os textos empíricos dos projetos, não tendo circulação pública, são de difícil acesso também a pesquisadores que buscam investigar gêneros no contexto acadêmico. Pesquisas prévias têm objetivado descrever a organização retórica dos PP de pesquisadores experientes (CONNOR; MAURANEN, 1999CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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), e de mestrandos (JUCÁ, 2006JUCÁ, D. C. N. A organização retórico-argumentativa na seção de justificativa no gênero textual projeto de dissertação. 2006. 109f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006.) fazendo uso do modelo CARs, de Swales (1981;SWALES, J. M. Aspects of article introductions. Birmingham: The University of Aston, 1981 1990SWALES, J. M. Genre analysis: English in academic and researching settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.), e têm mostrado que os projetos possuem um conjunto de passos e movimentos retóricos também presentes em artigos científicos, além de outros específicos dos PP. Contudo, o uso de um modelo descritivo construído com base numa seção textual de um outro gênero, no caso a introdução de artigo científico, parece-nos dificultar o reconhecimento daquilo que é particular e característico dos PP, o que sugere quão importante é buscar reconhecer as características textuais e contextuais que respondem pelas particularidades de PP, levando em conta as crenças e expectativas de usuários autênticos do gênero. Investigações existentes têm se ocupado principalmente de descrever a organização retórica de PP inteiros de várias áreas (CONNOR; MAURANEN, 1999CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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), de seções de projetos de uma área específica, caso da Justificativa em projetos de mestrandos (JUCÁ, 2006;JUCÁ, D. C. N. A organização retórico-argumentativa na seção de justificativa no gênero textual projeto de dissertação. 2006. 109f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006. AUTOR, 2018) e da Identificação do problema de pesquisa (OLIVEIRA; ALEXANDRE, 2020OLIVEIRA, J. S. L.; ALEXANDRE, L. R. B. Como mestrandos de Linguística agem retoricamente quando elaboram sua identificação do problema de pesquisa. LETRAS EM REVISTA, v. 11, n. 01, 2020. Disponível em: https://ojs.uespi.br/index.php/ler/article/view/235>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
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), ambos da área de Linguística, ou a interrelação entre diferentes passos retóricos de projetos de pesquisadores da área de Linguística (AUTOR 1, ANO) e de Química (AUTOR 1; AUTOR 2, ANO). Embora estas pesquisas se mostrem relevantes ao proporcionar o reconhecimento das escolhas retóricas mais convencionais em áreas específicas, elas não investigam aquilo que Bazerman (2005, p. 31)BAZERMAN, C. Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo, Cortez Editora, 2005. considera como o “reconhecimento psicossocial dos gêneros”, ou seja, não buscam entender o que os atores sociais acreditam que sejam os gêneros que eles usam ou precisam usar.

Em face destas questões, o objetivo deste artigo é identificar e discutir expectativas e crenças de doutorandos de três subáreas da grande área de Humanidades4 4 A CAPES, em sua proposta de classificação das áreas do conhecimento, usa a categoria Colégio como o rótulo mais abrangente para agrupar as áreas cujos objetos de pesquisa possuam afinidades ou aproximações. Um desses colégios é o de Humanidades, o qual inclui três grandes áreas: Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas e Linguística, Letras e Artes, no interior das quais figuram diversas de subáreas mais específicas. Tal classificação permite observar que o que se chama de Humanidades inclui uma diversidade de cursos tanto com objetos mais convergentes mais distantes. Embora reconhecendo que tal categorização é problemática, decidimos adotá-la aqui por duas razões: 1) Nos ERG, há uma orientação metodológica no sentido de reconhecer práticas das comunidades discursivas, especialmente quanto ao modo como rotulam gêneros e comunidades; 2) Na universidade onde foram realizadas as pesquisas aqui divulgadas os três cursos aqui sob análise se encontram alojados no Centro de Ciências Humanas e Letras. sobre o conhecimento de gêneros e práticas de pesquisa, leitura e escrita envolvidos no processo de elaboração de um tipo de projeto mais específico, o projeto de tese (doravante PT), o qual é requerido em processos de submissão a ingresso em curso de pós-graduação a nível de doutorado. Reconhecer, interpretar e discutir essas crenças e expectativas é fundamental para analisar o quão próximas ou distantes são elas em relação ao que a literatura sobre gêneros e projetos já tem discutido e também em relação ao discurso institucional materializado através de editais de seleção de pós-graduação e de manuais de elaboração de projetos (BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. MOTA-ROTH; HENDGES, 2010).

1. PERCURSO METODOLÓGICO

Seguindo procedimentos metodológicos dos Estudos Retóricos de Gêneros (doravante ERG), serão descritas e discutidas, neste artigo, as expectativas e crenças relacionadas aos propósitos retórico-discursivos, às temáticas e às práticas de leitura e escrita relacionadas à elaboração de PT, comparando-as com a literatura sobre PP e sobre gêneros acadêmicos. Apoiamo-nos, parcialmente, na proposta de análise de gêneros a partir do contexto (ASKEHAVE; SWALES, 2001ASKEHAVE, I.; SWALES, J. M. Genre identification and communicative purpose: A problem and a possible solution. Applied Linguistics, v. 22, n. 2, p. 195-212, 2001. Disponível em: https://doi.org/10.1093/applin/22.2.195>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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), especificamente no que diz respeito à identificação de crenças e expectativas de usuários de uma comunidade discursiva, no caso membros da comunidade acadêmica das áreas de História, Linguística e Literatura de uma universidade pública brasileira.

As crenças são concebidas aqui como a adesão a algum conhecimento percebido como convictamente verdadeiro, o que as caracteriza como de natureza subjetiva (PEHKONEN; PIETILA, 2003PEHKONEN, E.; PIETILA, A. On relationships between beliefs and knowledge in mathematics education. Paper presented at the CERME 3: Third conference of the European society for research in mathematics education, Bellaria, Italy, 2003.), além de fundadas em julgamentos decorrentes das experiências vividas (RAYMOND; SANTOS 1995RAYMOND, A. M.; SANTOS, V. Preservice elementary teachers and self-reflection: how innovation in Mathematics teacher preparation challenges mathematics beliefs. Journal of Teacher Education, 46(1), 58-70, 1995. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0022487195046001010>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
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). De um modo mais específico, importará observar as crenças epistêmicas, ou seja, aquelas crenças que trazem indícios em relação ao modo como atores sociais demonstram adesão a critérios, parâmetros e valores que lhes possibilitam refletir e produzir conhecimento (MAGGIONI; VANSLEDRIGHT; ALEXANDER, 2009MAGGIONI, L.; VANSLEDRIGHT, B.; ALEXANDER, P. Walking on the borders: a measure of epistemic cognition in history. The Journal of Experimental Education. v. 77, n. 3, p. 187-213, p. 2009. Disponível em https://doi.org/10.3200/JEXE.77.3.187-214>. Acesso em: 12 de setembro de 2023.
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), especificamente em relação à produção de conhecimento que toma como parâmetro a proposição de uma investigação científica orientada por um PT. Ou seja, discutiremos, de modo mais específico, as crenças epistêmicas dos doutorandos sobre um gênero em particular, em relação ao seu funcionamento retórico e suas funções sociais, incluindo suas visões sobre regularidades nas práticas de leitura e regularidades nos processos de escrita (PARÉ; SMART, 1994PARÉ, A.; SMART, G. Observing genres in action: Towards a research methodology. In: FREEDMAN, A.; MEDWAY, P. (Ed.). Genre in the new rhetoric. Londres: Taylor & Francis, p. 146-154, 1994.).

A noção de expectativa foi desenvolvida por Devitt (2004, p. 78)DEVITT, A. J. Writing genres. Southern Illinois University Press, 2004. 268 p. ao entender que “o gênero mostrará como muitas pessoas no grupo agem ou se espera que elas ajam e no que muitos de seus membros acreditam, ou agem como se eles acreditassem, ou pensam que eles devem acreditar”. Devitt (2004)DEVITT, A. J. Writing genres. Southern Illinois University Press, 2004. 268 p. supõe haver uma mescla entre comportamento e expectativas quando as pessoas usam gêneros em suas comunidades discursivas, e que tal suposição contribui para que as decisões sobre práticas de linguagem se orientem pelas crenças sobre o que é esperado fazer retoricamente em dado contexto. Essa noção se mostra relevante para se analisar os PT pelo fato de os participantes de uma seleção de pós-graduação tenderem a elaborar seus PT orientando-se pelas expectativas que eles imaginam que os avaliadores da banca mantêm como critérios de avaliação dos textos. Contudo, em função do caráter ocluso dos PT, as expectativas dos candidatos podem distanciar-se de comportamentos efetivamente esperados por um comitê de avaliação de um contexto específico.

Pelo fato de esta pesquisa se situar nos ERG, atenção será dada às expectativas dos participantes sobre o PT enquanto uma “estrutura retórica dinâmica que pode ser manipulada de acordo com as condições de uso” (BERKENKOTTER; HUCKIN, 1995, p. 3BERKENKOTTER, C.; HUCKIN, T. N. Genre knowledge in disciplinary communication: Cognition/culture/power. Hillsdale, NJ: Erlbaum, 1995.). Como os gêneros admitem uma realidade sociocognitiva e são reconhecidos psicossocialmente (BAZERMAN, 2005BAZERMAN, C. Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo, Cortez Editora, 2005.), torna-se relevante reconhecer e discutir as expectativas e crenças dos usuários sobre os gêneros (DEVITT, 2004DEVITT, A. J. Writing genres. Southern Illinois University Press, 2004. 268 p.), já que, em geral, as pessoas agem sociorretoricamente de acordo com suas expectativas genéricas e com as expectativas genéricas dos seus interlocutores nas situações retóricas em que se inserem. Com base neste quadro teórico, buscaremos identificar e discutir crenças compartilhadas entre doutorandos e também crenças de caráter mais individual quando elas se mostrarem proveitosas para comparação com dados de pesquisas prévias.

Os dados provêm de uma série de entrevistas semiestruturadas feitas com 6 doutorandos da área de Linguística, 5 de História do Brasil e 6 de Literatura de programas de pós-graduação de uma universidade pública brasileira5 5 Os projetos de pesquisa, aprovados por comitê de ética, possuem as seguintes identificações: CAAE: 44099921.3.0000.5214; CAAE: 44556721.5.0000.5214; CAAE: 46177821.0.0000.5214 . Os critérios de seleção dos participantes foram: terem sido aprovados em processo seletivo para curso de doutorado, com obtenção de, no mínimo, nota 7,0 na avaliação do PT e estarem cursando o primeiro ou segundo ano do curso de doutorado. Através de contato com a coordenação dos três cursos de pós-graduação, solicitou-se os e-mails dos candidatos aprovados seleções para cursos de doutorado, sendo que, de 30 doutorandos convidados, 17 aceitaram participar da pesquisa. Tendo em vista que as investigações ocorreram durante a pandemia de COVID-19, todas as entrevistas foram realizadas de modo remoto através da plataforma Google Meet e do aplicativo WhatsApp. A fim de preservar o anonimato dos participantes, eles serão identificados por siglas alfanuméricas, no padrão DLt1 (doutorando de Literatura 1), DLg1 (doutorando de Linguística 1), DHt (doutorando de História 1). Essa forma de identificação foi adotada para preservar o anonimato dos participantes, condição reforçada pelos doutorandos para a sua participação na pesquisa.

As entrevistas continham perguntas acerca das seguintes temáticas: elaboração escrita do PT, com foco nas seções de Identificação do problema de pesquisa, Justificativa e Fundamentação teórica; práticas de leitura de textos teóricos, de manuais de escrita acadêmica e de textos institucionais, como editais de seleção de pós-graduação; interação com pesquisadores experientes em elaboração de projetos; crenças e expectativas a respeito do gênero PT; relações entre PT e outros gêneros da esfera acadêmica; estilo e temática dos PT; processo de elaboração de um problema de pesquisa e autoavaliação do próprio projeto.

A discussão, de natureza qualitativa e interpretativista, segue a tradição de análise dos ERG, caracterizada por análises interpretativas globais e comparativas de falas de atores sociais vinculados a comunidades discursivas e culturas disciplinares específicas. Assim é que a discussão foi construída, enquanto processo e enquanto organização textual, tomando como ponto de partida os depoimentos dos doutorandos para, paralelamente, estabelecer relações com as ideias que circulam na literatura sobre gêneros, especialmente sobre PT. Num primeiro momento, foi feita uma leitura integral de todas as entrevistas e, de modo indutivo, procedeu-se a uma marcação de percepções que se mostravam recorrentes nos depoimentos de diferentes participantes e que se relacionavam aos seguintes aspectos de um PT: função social do gênero; funções da justificativa, do problema de pesquisa e da fundamentação teórica; estilo e temática dos textos; processos de composição e práticas de leitura. Recebeu especial atenção as crenças compartilhadas por participantes das três áreas. Contudo, percepções de caráter mais individual e enfatizadas nos depoimentos também foram selecionadas, mas apenas quando indicavam crenças dos participantes com potencial para serem usadas em discussões comparativas com expectativas presentes em estudos sobre PP e PT.

As opções acima justificam a opção por não haver uma seção específica para a discussão teórica, a qual fosse tomada como contendo pressupostos teóricos a orientar previamente e um tanto decisivamente a observação dos dados. Em vez disso, optou-se por uma estruturação temática do artigo, com a criação de 7 subtítulos os quais encapsulam as questões principais discutidas em cada seção seguinte, motivadas sempre pelos depoimentos.

2. UM TODO ORGÂNICO E HARMONICAMENTE CONECTADO

Nos depoimentos, doutorandos enfatizam a percepção de um PT como um gênero textual-discursivo marcado pela necessidade de articulação entre as seções dos projetos e as ideias nelas presentes. Isso aparece na fala de DLg1, quando demonstra acreditar que a relevância de um projeto reside no modo como se faz a articulação entre as diversas informações da proposta para que ela possa gerar alguma resposta ou discussão no interior de uma área. DLt2 também percebe o projeto como um todo orgânico, cujas seções, em sua crença, devem estar todas adequadas entre si, ao tempo em que supõe que falhas em uma seção tornam o projeto, como um todo, inconsistente. Aponta como uma característica dos projetos equilíbrio e sincronia entre a tese a ser defendida e o que é dito ao longo das seções do texto.

DLg1: Então você precisa saber conectar todas as partes, você precisa conectar tema, pergunta de pesquisa, objetivos, precisa apresentar uma fundamentação teórica que seja condizente com os seus objetivos e com seu tema e pensar também em uma metodologia que dê conta desses objetivos.

DLt2: Porque se você começa bem, você tem uma tendência a se dar bem na seção seguinte, agora se você começa com um problema que não é bem delimitado, então você não [vai] conseguir justificar bem, você vai ter um objetivo geral e específico que não vão estar muito bem, vai ter certa fragilidade e, do mesmo modo, você não vai conseguir contemplar as demais seções, que são a identificação do problema de pesquisa e a fundamentação teórica e aí? Como resolver isso metodologicamente?

Entre doutorandos de História aparece a compreensão do PT como um gênero com uma estrutura retórica cíclica e reiterativa, tendo como núcleo a problemática de pesquisa, uma visão congruente com a literatura sobre escrita de projetos:

DHt2: Um projeto tem que começar com a apresentação da problemática, ele tem que tá ali, embora a problemática vá reaparecer em vários outros lugares, né? Ela vai sendo reafirmada, vai dialogando com as outras partes.

DHt4: Aí você repete várias vezes pra poder realmente canalizar senão derrama e o teu projeto tem uma falha, tem um furo. Aí para evitar que isso aconteça, você realmente repete para chegar àquela conclusão esperada. Esse receio de tangenciar o tema talvez leve à repetição de informações ao longo de todas as seções do projeto de pesquisa.

Temos aqui o PT sendo visto como um gênero marcado por reafirmações e reiterações, de modo que a repetição de informações ao longo do projeto é tida como importante por DHt4 porque ela ajuda a não tangenciar o tema e a encaminhar certas informações para se chegar à conclusão esperada. Contudo, acreditar que uma conclusão é um tópico esperado para um PT aponta para certa indistinção entre as funções específicas deste gênero em relação a outros gêneros acadêmicos, como artigos, dissertações e teses, os quais são marcados pela existência bastante recorrente de uma seção de conclusões. Manuais sobre escrita de PP (BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. MOTA-ROTH; HENDGES, 2010) não defendem a necessidade de serem apresentadas conclusões em PP, recomendando em vez disso o planejamento de uma investigação para que conclusões sejam elaboradas num estágio posterior.

Há bastante consenso entre os doutorandos em imaginar que é uma função social do projeto indicar a relevância e a exequibilidade da proposta de pesquisa a ser realizada, deste modo revelando uma concepção de projetos em grande consonância com o discurso acadêmico sobre projetos (CONNOR; MAURANEN, 1999;CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010MOTTA-ROTH, D..; HENDGES; G. R. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.) e também com o discurso institucional presente em editais de programas de pós-graduação de diversas universidades brasileiras e de agências de fomento, como o CNPQ, nos quais a relevância social e exequibilidade de projetos são itens comumente presentes para guiar os processos avaliativos de PP.

Outra crença que aparece em depoimentos de doutorandos das três áreas é a ideia de projeto como um orientador da pesquisa, como um organizador de ideias e como um parâmetro para se avaliar se a pesquisa será relevante e viável.

DLt6: Você segue essa linha do que pra você seria inovador e aí o projeto te ajuda a organizar essas ideias, né. De todo esse detalhamento, então você organiza lá suas ideias no projeto, sem ele, como eu te falei no início, ele vai te dar um norte, sem ele não teria como. As ideias estão bagunçadas, assim como agora estão, como eu te disse vou reformular esse projeto, mas as ideias estão aqui no papel, então eu sei mais ou menos o que eu vou fazer, mas enquanto você não organiza no papel, não coloca no projeto, fica meio perdido.

DLg3: [O projeto] é um gênero que consegue, na verdade não o gênero, mas a pessoa que produz o projeto é... ao fazer o projeto ela consegue nesse gênero articular diferentes momentos da pesquisa né, que vão incluir desde a problematização né, até a proposta de um referencial teórico né, e uma metodologia que consiga dar conta desse problema né, pra ser discutido resolvido, ou apontado alguma lacuna em relação a ele.

DHt1: A função social de um projeto de pesquisa a meu ver seria justamente orientar, dá diretrizes de execução de uma proposta de pesquisa pensada previamente, isto é, é... seria como o planejamento da pesquisa pretendida, o planejamento esse que comunica, tanto o percurso que o candidato vai seguir, o pesquisador vai seguir, quanto os propósitos da pesquisa e o que ela almeja “né”, alcançar e propor como resultado.

Pareceu-nos recorrente a crença no PT como um metagênero, ou seja, como um gênero que regula, orienta, estabiliza a escrita (e a realização oral) de outros gêneros (GILTROW, 2002GILTROW, J. Meta-genre. In: R. COE; L. LORELEI; T. TESLENKO (eds.), The Rhetoric and Ideology of Genre: Strategies for Stability and Change. Creskill, New Jersey, Hampson Press, 2002, p. 187-205.), sendo tal crença congruente com a literatura sobre PP (CONNOR; MAURANEN, 1999;CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010MOTTA-ROTH, D..; HENDGES; G. R. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.). Contudo, importa aqui destacar que se trata de um metagênero num sentido bem particular, aquele de orientar a realização de uma práxis, de uma atividade, a qual será futuramente tomada como parâmetro para a elaboração de textos de outros gêneros (como tese, artigo, comunicação em evento, palestra e outros).

3. APROXIMAÇÕES E INDISTINÇÕES ENTRE GÊNEROS DIFERENTES

Ao falar sobre a seção Justificativa, DLg5 indica um aspecto importante: esta seção ser um lugar discursivo com potencial para o aparecimento da autoria no sentido de um posicionamento mais pessoal, com a voz do autor do projeto se fazendo aparecer dissolvida no meio da teoria. Mas relata que apenas no projeto de doutorado se “sentia mais confianteprafazer isso” (DLg5) e que isso não ocorrera no projeto de mestrado. Essa fala sugere algo importante para ser avaliado por comissões responsáveis pela elaboração de editais de seleção: a indicação clara de expectativas diferenciadas para PD (doravante PD) e PT, diferenciação rara de aparecer, do nosso ponto de vista, em editais de seleção no Brasil na área de Linguística. Esta ausência de explicitação provoca, por parte de DLg4, uma suposição de que a diferença seria em relação a uma maior quantidade de dados de análise:

DLg4: Será que é só analisar mais dados? Você se pergunta muito em relação a isso, então, uma maneira de sanar as minhas dúvidas foi construir uma pesquisa com muitos dados pra ter muita coisa pra analisar e aí na entrevista perguntaram: mas você vai dar conta de fazer tudo isso no tempo que você tem e aí eu disse: vou com certeza.

DLg4, ao imaginar que resolveria a questão da diferença entre PD e PT prevendo uma quantidade maior de dados para investigar no doutorado, se depara com um novo problema na arguição: a banca questiona a sua capacidade de analisar uma grande quantidade de dados no tempo disponível para fazer uma tese. Parece então que a distinção entre PD e PT é um problema importante, ainda pouco enfrentado pelas instituições. Se os contextos de produção de uma dissertação e de uma tese são contextos parcialmente diferentes, seria de se esperar que PD e PT fossem associados a expectativas e características claramente diferenciadas. Diversas abordagens de estudos de gêneros têm sinalizado que o status de um gênero é tributário direto dos seus contextos de uso, o que inclui os papeis sociais desempenhados pelos autores (PARE; SMART, 1984; CARVALHO, 2005CARVALHO, G. de. Gênero como ação social em Miller e Bazerman: o conceito, uma sugestão metodológica e um exemplo de aplicação. Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, v. 1, p. 130-149, 2005.). Em face disso, a não explicitação de expectativas diferentes para PD e PT, por parte das instituições, provoca dúvidas entre os estudantes e, consequentemente, a aposta em expectativas de gênero que podem se revelar comunicativamente disfuncionais. Além disso, este contexto sugere que, enquanto metagênero, os projetos evocam situações conflitantes, oclusas e pouco esclarecidas sobre situações retóricas e gêneros, como já antevisto por Giltrow (2002)GILTROW, J. Meta-genre. In: R. COE; L. LORELEI; T. TESLENKO (eds.), The Rhetoric and Ideology of Genre: Strategies for Stability and Change. Creskill, New Jersey, Hampson Press, 2002, p. 187-205..

4. TENSÕES ENTRE UM ESTILO TEÓRICO-ENSAÍSTICO E UM ESTILO TÉCNICO-INSTRUMENTAL

Entre doutorandos das 3 áreas (DHt2, DLg4 eDLt4), o projeto é visto como uma forma de planejamento importante da pesquisa, um orientador, sistematizador e articulador das informações e das etapas posteriores da pesquisa, sugerindo uma concepção instrumental e técnica do PT.

DHt2: Eu acho muito complicado entrar sem já ter delimitado o que se vai pesquisar. Com o projeto de pesquisa já pronto na seleção, depois de aprovado eu já sei até quais matérias pegar que vão me ajudar na construção da tese.

DLg4: A função social de um projeto de pesquisa, ao meu ver, seria justamente orientar, dá diretrizes de execução de uma proposta de pesquisa pensada previamente, isto é, seria como o planejamento da pesquisa pretendida.

DLt4: No campo da literatura, para você delimitar um problema de pesquisa, que ele possa se sustentar, primeiramente você deve conhecer o que já foi discutido sobre isso aí. Então veja que o antecedente de pesquisa ele vai ser também um eixo gigante na construção desse objeto, então quando eu apresento o meu problema de pesquisa, ao mesmo tempo, eu preciso mostrar também como eu estou articulando isso com o meu antecedente de pesquisa e ao mesmo tempo a fortuna crítica em torno daquele objeto.

DLt4: demonstra muita clareza a respeito da relevância dos antecedentes de pesquisa ou fortuna crítica como um parâmetro para se avaliar se, de fato, o problema de pesquisa é válido, ou seja, ainda não investigado. DLt4 entende que o problema de pesquisa necessita ser articulado ao antecedente de pesquisa fazendo eco ao discurso da originalidade, ao dizer que se algo já foi discutido “não é mais uma questão”.

Contudo, esta visão técnica e instrumental dos projetos não apareceu plenamente consolidada na materialidade textual e retórica de alguns projetos analisados no contexto de submissão a ingresso em programas de pós-graduação (AUTOR, ANO; AUTOR1; AUTOR2, ANO; AUTOR1; AUTOR2, ANO; OLIVEIRA; ALEXANDRE, 2020OLIVEIRA, J. S. L.; ALEXANDRE, L. R. B. Como mestrandos de Linguística agem retoricamente quando elaboram sua identificação do problema de pesquisa. LETRAS EM REVISTA, v. 11, n. 01, 2020. Disponível em: https://ojs.uespi.br/index.php/ler/article/view/235>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
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). Em análises retóricas de 30 projetos para submissão a cursos de pós-graduação, nos anos de 2012, 2013 e 2014, na área de Linguística de uma universidade pública, ainda encontramos a marcante presença de um estilo mais ensaístico-teórico, ou seja, com presença significativa de conceituações teóricas, por vezes sobrepondo-se a um estilo técnico-instrumental. Passos retóricos de natureza teórica, como definindo conceitos e explicando fenômenos ocuparam posição proeminente em muitos projetos (AUTOR, ANO), enquanto passos de natureza mais procedimental e técnica, como indicar lacunas de pesquisa, relatar pesquisas prévias e indicar procedimentos de análise, aparecem em menor escala. Com base nestas análises, supomos que as características técnicas e instrumentais dos projetos poderiam merecer mais atenção nos cursos de metodologia, nos processos de orientação e também nos processos avaliativos de projetos.

5. FUNÇÃO DIAGNOSTICA DO PT

Uma ideia interessante, mencionada por DLg4, é acreditar que o projeto tem como uma de suas funções fazer um “diagnóstico prévio da área [disciplinar] e a partir daquele diagnóstico intervir de algum modo através daquela pesquisa”. Esta é uma crença que encontra consonância em investigações sobre PP e que reconhecem a existência de dois passos retóricos constitutivos deste gênero, qual seja: indicar lacunas no mundo da pesquisa e indicar problemas nos mundos (CONNOR; MAURANEN, 1999;CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. AUTOR, ANO). Conquanto estes dois passos retóricos sejam modos de fazer um diagnóstico de questões e problemas de uma dada área disciplinar, importa observar que a habilidade para diagnosticar tais problemas pressupõe um conhecimento razoavelmente aprofundado do estado da arte em dado campo do saber, sendo isso uma das causas da complexidade da elaboração de projetos de pesquisa, sobretudo por parte de pesquisadores iniciantes.

DHt2 manifesta discordância com uma prática em cursos da área de exatas, nas quais o PT é construído pelo aluno apenas quando este já ingressou na pós-graduação. DLt2 defende a obrigatoriedade do projeto no processo seletivo com o argumento de que o PT induz no aluno “consciência do que vai fazer, clareza sobre os caminhos (teóricos) a serem trilhados e certa clarividência” sobre o próprio objeto de estudo. DHt2 acredita que uma seleção de doutorado deveria ater-se tão-somente ao PT e à entrevista sobre ele: “O que adianta você tirar 10 na prova e ter um projeto que não vá bater bem com o orientador?”. Em outras palavras, o projeto, previamente construído, é visto como uma ferramenta essencial para colocar em sintonia orientador e orientando, assim proporcionando uma aproximação entre os interesses de investigação dos dois. Podemos observar aqui uma função de aculturação dos projetos no sentido de possibilitar ao candidato ajustar-se aos interesses de pesquisa da instituição onde pretende fazer pesquisa. No Brasil, este aspecto, hoje, se encontra plenamente dominante, com os editais de seleção condicionando o ingresso de novos pós-graduandos à aderência entre o que pretendem pesquisar e o que já se encontra sendo investigado no interior dos programas de pós-graduação.

Mostrando-se congruente a um ponto de vista presente na literatura sobre projetos (BARROS, 2017;BARROS, J. de A. O projeto de pesquisa em história: da escolha do tema ao quadro teórico. Editora Vozes Limitada, 2017. MOTA-ROTH; HENDGES, 2010), DHt2 vê o PT como uma bússola, sem a qual um doutorando poderia ficar à deriva durante o curso, sem um rumo definido. Contudo, essa metáfora é vista de um modo bem mais particular, na medida em que aparece o argumento de que, com um projeto aprovado, os alunos conseguirão escolher com mais facilidade e critérios até mesmo as disciplinas a serem feitas durante o curso, ou seja, manifesta-se aqui a crença no potencial do projeto como orientador do percurso de ensino durante o curso, o qual, por sua vez, será decisivo para a construção da tese: “depois de aprovado eu já sei até quais matérias pegar que vão me ajudar na construção da tese” (DHt2).

Associamos essa fala à percepção de um propósito comunicativo para os projetos não registrada nos estudos sobre este gênero, qual seja um objetivo que ultrapassa a questão da pesquisa em si e se espraia para as atividades de ensino durante a realização posterior do curso de pós-graduação. Esse dado serve para reforçar a tese de Askehave e Swales (2001)ASKEHAVE, I.; SWALES, J. M. Genre identification and communicative purpose: A problem and a possible solution. Applied Linguistics, v. 22, n. 2, p. 195-212, 2001. Disponível em: https://doi.org/10.1093/applin/22.2.195>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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de que o reconhecimento dos propósitos comunicativos dos gêneros necessita recorrer a uma análise contextual que identifique para que finalidade os praticantes de um gênero usam os gêneros em sua vida prática ou acreditam para que usam. Muitos propósitos revelados no discurso das pessoas em suas vidas cotidianas são surpreendentes aos olhos de pesquisadores desconhecedores de realidades específicas, como o propósito aludido acima, o que pode ser tomado como um reforço para a ideia de que o reconhecimento dos propósitos de um gênero é uma tarefa altamente complexa de natureza sociocognitiva.

6. A TEMÁTICA DOS PROJETOS DE TESE

Entre doutorandos das três áreas aparece uma crença interessante sobre a temática dos projetos: a ideia de que os PT falam sobretudo sobre os seus próprios autores.

DLg6: A seção de fundamentação teórica é indispensável, porque é onde o candidato vai mostrar o quanto ele já conhece sobre o tema abordado e é capaz de selecionar pesquisas e estudos que discutem sobre esse tema, desde os mais clássicos até os mais recentes.

DHt1: A [etapa] do projeto de pesquisa eu acho ela a mais importante. Na nossa área, né? Na área de História. Porque é o lugar em que, principalmente no doutorado, os professores vão meio que ver a nossa carga teórica, a nossa carga de leitura relacionada ao tema pra fazer o desenvolvimento da tese e eu vejo isso como muito importante.

DLt5: O projeto é relevante sim. Acredito que não só o projeto, mas juntamente com a entrevista, eles mostram quem é o pesquisador, ele mostra como você escreve, se a sua forma de escrever é adequada ao meio acadêmico.

Ao falar sobre metodologia, teoria e cronograma, o autor de um PT estaria indiretamente falando sobre si mesmo, sobre seus saberes e sobre suas habilidades e competências. DLt5 enxerga como uma das funções de um PT mostrar quem é o pesquisador, quais suas habilidades discursivas e textuais e suas capacidades enquanto um pesquisador. Se nos apoiarmos na teoria dos atos de fala (AUSTIN, 1965AUSTIN, J. L. How to do things with words. New York: New York Press, 1965.) e fizermos uma associação dela com noção de propósito comunicativo (SWALES, 2004;SWALES, J. M. Research genres: Explorations and applications. Cambridge University Press, 2004. ASKEHAVE; SWALES, 2001ASKEHAVE, I.; SWALES, J. M. Genre identification and communicative purpose: A problem and a possible solution. Applied Linguistics, v. 22, n. 2, p. 195-212, 2001. Disponível em: https://doi.org/10.1093/applin/22.2.195>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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), poderíamos pensar o PT como tendo, dentre outros, um ato de fala ilocucionário global6 6 Ato de fala ilocucionário global significa, neste contexto, um ato de fala relacionado a um texto como um todo e não a enunciados curtos, geralmente falados, como foram estudados pela pragmática linguística. Trata-se de um ato ilocucionário (do ponto de vista do autor de um texto) e global porque associado ao um texto inteiro. Esta extensão do conceito já fora apresentada por Bazerman (2005) quando da discussão dos atos de fala em textos escritos longos. , de natureza indireta visando demonstrar as habilidades e competências do pesquisador vistas como relevantes para o desenvolvimento de uma pesquisa a nível de pós-graduação. Conquanto em PT, haja, de modo geral, desencorajamento ou restrição para se falar sobre si mesmo, de se usar a primeira pessoa do discurso, de contar histórias de vida, na visão dos doutorandos, aqui estaria em jogo, a despeito de tais restrições, comunicar à banca, embora indiretamente, que o autor do projeto é detentor de habilidades e saberes que o capacitam a angariar aprovação num processo seletivo.

Parece-nos, contudo, que essa visão impõe um desafio porque, em geral, não é muito bem-vinda o uso da primeira pessoa do singular no texto de PT, nem outros recursos estilísticos que remetam diretamente para a pessoa empírica ou discursiva ligada aos autores. Em face disso, os autores precisariam falar sobre si mesmos, mas sem poder fazer isso de modo explícito. Myers (1985 apud TARDY, 2003TARDY, C. M. A genre system view of the funding of academic research. Written Communication, Sage Journals, v. 20. n. 1, p. 7-36, 2003. Disponível em: https: https://doi.org/10.1177/0741088303253569>. Acesso em: 03 de outubro de 2023.
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) já havia tocado nesta questão ao enxergar a persuasão em projetos como sendo não ostentatória, como desafiando o escritor a persuadir “sem parecer persuadir”. A questão que emerge do discurso dos doutorandos relaciona-se a como falar sobre a primeira pessoa (o “eu”) expressando-se em terceira pessoa (o “ele”). Por isso, os autores falam sobre si de modo indireto através da linguagem usada; da quantidade, qualidade e atualidade das referências mencionadas e da forma como articulam os diversos tipos de informação ao longo do texto. E é também bastante provável que, conscientemente ou não, as bancas se apoiem nessas informações para fazer julgamentos sobre as potencialidades dos candidatos no processo seletivo.

DLt3 manifesta consciência acerca de expectativas genéricas das bancas em relação a um PT e isso o induz a construir o projeto de modo a atender a estas expectativas: “a banca espera ver também um diálogo entre as partes do texto que vão determinar o seu todo, um todo coeso, coerente e completo de sentido” (DLt3). Essas falas indicam uma crença numa completude de sentidos dificilmente confirmada na prática, tendo em vista a natureza dialógica e interacional dos textos já apontada nos estudos de texto e discurso. DLt3 acredita ainda que na seção de fundamentação teórica, o candidato vai demonstrar “o quanto ele já conhece sobre o tema abordado e é capaz de selecionar pesquisas e estudos que discutam sobre este tema, desde os mais clássicos até os mais recentes”. Ou seja, o modo escolhido pelo candidato para discutir a teoria é, por via indireta, uma forma de falar sobre si mesmo, sobre suas capacidades de fazer levantamento bibliográfico, de discutir os temas lidos e de mostrar o seu conhecimento sobre estes temas. Nessa mesma linha de raciocínio, supõe que o modo como a metodologia do projeto é descrita e detalhada será capaz de desvelar para a banca “a afinidade que ele [candidato] tem diante de perspectiva de pesquisa adotada” (DLg3), imaginando que até mesmo o cronograma, muitas vezes pouco valorizado pelos autores de projetos e também pelas bancas de avaliação, poderá conter atos de fala indiretos, dado que o cronograma é visto por ele com o potencial de “mostrar a organização que o candidato tem para estabelecer prazos para a prestação de conta das etapas da pesquisa” (DLg3).

No discurso de DLg5, apareceu a concepção de projeto como uma forma de autopromoção do candidato, como uma forma de persuadir a banca a respeito das capacidades do autor do projeto para realizar a investigação bem como sobre o seu domínio em relação ao conhecimento acadêmico: “mostrar a capacidade do candidato de organizar uma pesquisa, de pensar uma pesquisa, né, saber se ele tem essa capacidade de articular os elementos do projeto e tem uma pesquisa consistente” (DLg5). Em perspectiva parecida, DHt1 crê que a etapa do projeto é a mais importante da seleção, “porque é o lugar em que [...] os professores vão meio que ver a nossa carga teórica, a nossa carga de leitura relacionada ao tema pra fazer o desenvolvimento da tese”. Vemos aqui algo bastante salutar sobre o tema, no sentido axiológico (BAKHTIN, 1979BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética da criação verbal. S. Paulo, Martins Fontes, 1979 [1953].), de um PT, qual seja: fazer um retrato sobre as habilidades e potencialidades dos próprios autores. Embora, a vida dos autores não apareça como tema explícito na materialidade textual.

Essa crença se encontra em consonância com a literatura sobre projetos, em específico com a pesquisa de Tseng (2012, p. 2262)TSENG, M. Toward a metapragmatic analysis of self-review in research grant proposals: From relevance to metarelevance. Intercultural Pragmatics, v. 9, n. 3, p. 335- 360, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.1515/ip-2012-0020>. Acesso em: 10 de setembro de 2023.
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, na qual há o entendimento de que os projetos produzidos por pesquisadores para agências de fomento incorporam uma performance específica visando a autopromoção da competência do pesquisador, a qual se baseia em informações sobre o currículo do pesquisador, que pode incluir financiamento de projetos, prêmios recebidos, listagem e quantidade de publicações e de participações em atividades acadêmicas. Contudo, em grande parte das orientações dos editais para elaboração de PT submetidos a programas de pós-graduação no Brasil, não há espaço direto, no texto do PT, para a indicação das atividades acadêmicas e bibliográficas realizadas pelo autor do projeto, o que acrescenta um desafio a mais para a função de autopromoção, necessitando esta ocorrer de um modo indireto7 7 O mais comum nas seleções feitas nas áreas de humanidades é haver um etapa posterior à análise de projetos, a qual se centra na análise do currículo do candidato. Contudo, trata-se de uma fase independente da fase de análise de projetos. . Se para os projetos voltados para pesquisadores experientes, a autopromoção se vincula às experiências bem-sucedidas já vivenciadas pelo autor, nos projetos para candidatos a pós-graduação, a autopromoção se volta para potencialidades futuras, as quais são indiretamente indicadas através das capacidades de leitura, escrita e reflexão crítica manifestas no texto do projeto (e na arguição subsequente). Nessa lógica, o texto escrito do projeto funciona como um retrato das capacidades cognitivas, teóricas e procedimentais do candidato, uma espécie de ato de fala global sobre as capacidades e habilidades do autor do projeto.

7. PROCESSOS DE COMPOSIÇÃO DOS TEXTOS

DLtl, que se define como autodidata, manifesta crença no caráter particular e individual de cada projeto, o que leva DLt1 a evitar ler projetos de outros autores, de modo a “não correr o risco de reproduzir equívocos” cometidos por outros autores, demonstrando preferência por uma descoberta pessoal acerca da construção de um projeto, a exemplo de: “experiências mesmo de escrita, escrita mesmo artística e acabo trazendo isso para a minha escrita acadêmica” (DLt1).

Provavelmente, o valor da criatividade individual – típica da esfera literária – se apresente recontextualizada, nesse caso, para um gênero técnico-acadêmico, como o é o PT. De certo modo, o ideal romântico da idiossincrasia do artista, da busca por um estilo pessoal parece guiar o processo de escrita do PT quando DLt1 entende que deveria criar o seu projeto de um jeito diferente do que havia encontrado ao fazer buscas nos sites de programas de pós-graduação de universidades. Aqui temos um caso de reconfiguração de valores de uma cultura disciplinar quando o estilo dos gêneros literários, mais tipicamente fundado na individualidade criadora e mais refratário a convenções retóricas, é recontextualizado para o processo de composição de um gênero mais tipicamente técnico-acadêmico e de estilo mais convencional e compartilhado entre membros da comunidade discursiva, como é o caso de um PT.

Ao enunciar: “eu posso acabar dizendo que eu acabei fazendo do jeito que eu achava que era melhor pra mim e para o meu jeito de fazer”, DLt1 aponta para uma mixagem de dois tipos de escrita – a artística e a acadêmica – e manifesta a crença em que características do estilo literário possam ser transmutados sem mais problemas para o estilo acadêmico. Em outras palavras, o que queremos destacar aqui é que pode ser bastante problemático pensar em limites precisos, na cultura disciplinar de literatura, entre o estilo artístico e o estilo acadêmico. Contudo, consideramos importante considerar que as diversas culturas disciplinares também são atravessadas por valores dominantes da cultura acadêmica e administrativa e pode haver dissenso entre tais valores. Ao discutir a criatividade envolvida na história dos gêneros, Devitt (2004)DEVITT, A. J. Writing genres. Southern Illinois University Press, 2004. 268 p. entende que estes dependem de escolhas e que estas escolhas são associadas a incentivos poderosos e punições associadas. E provável que o caso acima envolva uma aposta arriscada, com prováveis “punições associadas”, como uma avaliação, por parte da banca, de desconhecimento do estilo do gênero PT e uma eventual não aprovação do projeto em processos seletivos. Contudo, não se pode descartar a possibilidade de que na área disciplinar de literatura haja certo malestar com as convenções de estilo técnico-científico de PT, o que levaria a incentivar o estilo criativo de DLt1 ao invés de apenas puni-lo, ou seja, valores da cultura disciplinar de literatura possivelmente estão orientando a crença de DLt1 a respeito do envolvimento fortemente individual na construção do projeto.

Em perspectiva oposta, DLg3 segue caminho diferente ao ter optado por acessar o PT de um colega e ter feito isso em decorrência de sua insegurança sobre como proceder tendo em vista nunca ter feito um PT em sua vida e pelo desejo de observar a construção feita por outra pessoa. DLg3 relata que compreendeu, com a leitura do projeto de um colega, duas opções importantes: a) “estabelecer essa conexão com algo que já tá sendo pesquisado [para] mostrar que o tema é relevante”; b) “mostrar que tem abertura, ou seja, que você, apesar dos trabalhos que já têm sido feitos, você consegue é... pesquisar um pouco mais, tem mais coisas a serem respondidas” (DLg3). Não há da parte dele motivação nenhuma para inovar ou adotar um estilo mais pessoal, mas o reconhecimento de que as convenções de gênero já legitimadas coletivamente e institucionalmente são o guia mais apropriado para a criação de um novo exemplar do mesmo gênero. Em termos hipotéticos se poderia pensar que DLg3 faz coro a uma crença presente na cultura disciplinar de Linguística de pensar a construção de textos como um processo que se guia por convenções retóricas compartilhadas entre os pesquisadores.

DLt4: E um processo de causa e efeito, porque se você começa bem, você tem uma tendência a se dar bem na seção seguinte, agora se você começa com um problema que não é bem delimitado, então você não [vai] conseguir justificar bem, você vai ter um objetivo geral e específico que não vão estar muito bem, vai ter certa fragilidade e, do mesmo modo, você não vai conseguir contemplar as demais seções, que são a identificação do problema de pesquisa e a fundamentação teórica e aí?

DLg3: [O projeto] é um gênero que consegue, na verdade não o gênero, mas a pessoa que produz o projeto é... ao fazer o projeto ela consegue nesse gênero articular diferentes momentos da pesquisa né, que vão incluir desde a problematização né, até a proposta de um referencial teórico né, e uma metodologia que consiga dar conta desse problema né, pra ser discutido resolvido, ou apontado alguma lacuna em relação a ele.

DLt4 supõe que a escrita de um projeto inclui um processo de causa e efeito, de modo que se o pontapé inicial da pesquisa – o problema, por exemplo – não for adequadamente configurado, o restante da proposta pode apresentar muitas inconsistências. Na mesma linha de raciocínio, DLg3 manifesta a crença de que o processo de composição de projetos gira em torno da atividade de integração e de articulação de diversos tipos de informações (pesquisas prévias, justificativas para a pesquisa, relevância, contribuições e lacunas), mas que farão sentido quando interrelacionadas entre si.

DHt1: A primeira coisa que eu faço do projeto são os objetivos, não o geral, mas os específicos, que têm que se ligar ao que vai ser falado na metodologia, justificativa e problemática de pesquisa.

DHt4: Eu sempre começo pelos objetivos geral e específicos, para mim, são eles que dão a estruturação do teu trabalho, embora para chegar aos objetivos tem que fazer uma revisão de literatura, né, que aproxima mais com a apresentação da problemática, mas pra mim primeiro tem que ficar claro os objetivos, depois dos objetivos é que eu paro para escrever a apresentação da problemática. Porque a problemática tá intimamente ligada com os objetivos, então pra mim tem que ser primeiro isso, aí depois eu passo para o que ele pede primeiro e faço na ordem.

DHt1 e DHt4 afirmam iniciar seu PT pelos objetivos, porque acreditam que eles têm um potencial para a estruturação do projeto como um todo, possibilitando realizar conexões adequadas dos objetivos com itens da metodologia, da justificativa e da problemática de pesquisa. Essa prática de construção textual se mostra bastante aderente a resultados de análise textual com projetos de pesquisa em Linguística, em Literatura e em História, nos quais um dos passos retóricos mais recorrentes é o passo Indicando objetivos da pesquisa, os quais, são também reiterados em diversas seções ao longo dos projetos (AUTOR, ANO; OLIVEIRA, 2022OLIVEIRA, J. S. L. de. Estratégias retóricas de projetos de pesquisa de doutorandos em História: a construção do problema de pesquisa. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Piauí, Centro de Ciências Humanas e Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras. Teresina (PI), 2022., PORTO, 2022PORTO, A. J. P. A construção retórica e o contexto de produção em projetos de pesquisa de doutorado em literatura. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2022.).

Embora essa prática de escrita de começar o projeto pelos objetivos se diferencie, em parte, de outros discursos de especialistas sobre o processo de construção de projetos, em que aparece a recomendação de se tomar como ponto de partida a definição de problema de pesquisa (ARAÚJO; DIEB; COSTA, 2017ARAÚJO, J.; DIEB, M.; COSTA, S. M. O QNP e as dificuldades de construção do objeto de pesquisa: uma experiência de aprendizagem mediada sobre o gênero projeto de pesquisa. DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, v. 33, n. 3, p. 729-757, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-445097873044367046>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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), parece-nos que começar pelo problema de pesquisa oferece mais desafios para jovens pesquisadores, pelo fato de pressupor um sólido conhecimento da realidade social e/ou dos avanços científicos alcançados por sua área de pesquisa nos últimos tempos. Ou seja, estabelecer uma problemática de pesquisa exige uma razoável experiência de leitura de teorias e de relatos de pesquisa associados a uma avaliação crítica do objeto dessas leituras. Entre olhar criticamente pelo retrovisor para instaurar uma problemática e olhar prospectivamente para a frente para estabelecer objetivos futuros, a preferência desses jovens pesquisadores tem recaído sobre a segunda opção (começar pelos objetivos), quando se trata de escolher o ponto de partida para a proposição de uma nova pesquisa. Dados de análise textual (OLIVEIRA, 2022OLIVEIRA, J. S. L. de. Estratégias retóricas de projetos de pesquisa de doutorandos em História: a construção do problema de pesquisa. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Piauí, Centro de Ciências Humanas e Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras. Teresina (PI), 2022.) mostram como, em alguns casos, há mesmo certa fusão entre problema de pesquisa e objetivo de pesquisa, com o autor anunciando que irá abordar o problema, mas, no fim das contas, termina por centrar-se bem mais no objetivo de pesquisa.

8. UMA PRÁTICA DE LEITURA INUSITADA

Provavelmente, devido ao caráter ocluso dos projetos, DLt4 relata ter feito muitas leituras de introduções de tese por considerar que nelas poderia encontrar informações relevantes do projeto anteriormente proposto e que serviria como ponto de partida para a tese:

DLt4: Para a feitura do projeto eu lia muito as introduções dos trabalhos, das teses da minha área, eu prestava muita atenção na introdução, porque eu acho que ela é o momento que o pesquisador partilha o que foi elaborado no projeto, aquilo que foi arquitetado, então ali eu buscava justamente esses elementos”.

DLt4 manifesta a crença em um funcionamento articulado de um sistema de gêneros envolvendo teses (seção de introdução) e PT. Contudo, relata ter encontrado, em muitos trabalhos, pouca coisa relevante pelo fato de muitas introduções de tese não apresentarem uma adequada articulação entre os elementos importantes que nortearam a pesquisa divulgada posteriormente, contrariando, portanto, sua crença. Reconhecemos, nessa prática de leitura, uma tentativa de acessar informações não disponíveis na esfera acadêmica, já que projetos de pesquisa, em geral, não circulam em espaços públicos e são de difícil acesso. Foi tal situação que levou DLt4 a analisar introduções de tese que pudessem revelar, ainda que de um modo indireto, informações de um projeto que servira em outro contexto ao planejamento para uma tese. Estamos diante um tipo de leitura um tanto detetivesca, complexa e com poucas garantias no sentido de oferecer os resultados procurados, situação revelada por DLt4 ao constatar que, no fim das contas, tais leituras exerceram uma influência negativa e não positiva, como antes havia esperado.

Um caso como esse indicia algo problemático em relação ao papel dos projetos de pesquisa no universo acadêmico: por um lado, os programas de pós-graduação exigem que os candidatos a uma vaga nos cursos exibam um desenvolvido e arguto letramento acadêmico no momento de propor uma proposta de pesquisa; por outro lado, grande parte dos programas de pós-graduação não dispõem de políticas de acesso a projetos autênticos e bem-sucedidos e não oferecem feedback qualitativo sistemático e transparente sobre como avaliam os projetos submetidos, como vemos quando os processos avaliativos divulgam apenas uma nota numérica referente à avaliação do projeto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No geral, as pesquisas com PP têm se ocupado em descrever a organização retórica de projetos de pesquisadores (CONNOR; MAURANEN, 1999;CONNOR, U.; MAURANEN, A. Linguistic Analysis of Grant Proposals: European Union Research Grants English for Specific Purposes, Vol. 18, No. 1, pp. 47-62, 1999. Disponível em https://doi.org/10.1016/S0889-4906(97)00026-4>. Acesso em: 20 de agosto de 2023.
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TARDY, 2003TARDY, C. M. A genre system view of the funding of academic research. Written Communication, Sage Journals, v. 20. n. 1, p. 7-36, 2003. Disponível em: https: https://doi.org/10.1177/0741088303253569>. Acesso em: 03 de outubro de 2023.
https: https://doi.org/10.1177/074108830...
) e de pós-graduandos (JUCÁ, 2006;JUCÁ, D. C. N. A organização retórico-argumentativa na seção de justificativa no gênero textual projeto de dissertação. 2006. 109f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006. AUTOR, ANO; OLIVEIRA, 2022OLIVEIRA, J. S. L. de. Estratégias retóricas de projetos de pesquisa de doutorandos em História: a construção do problema de pesquisa. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Piauí, Centro de Ciências Humanas e Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras. Teresina (PI), 2022.), tendo revelado características sociorretóricas importantes dos projetos, porém, sem observar e discutir as crenças e expectativas dos autores sobre os projetos que leem ou escrevem. Já a análise aqui relatada apresenta uma contribuição complementar importante para a compreensão do PT ao revelar como os projetos são pensados de uma perspectiva sociocognitiva, a partir do reconhecimento de crenças e expectativas, compartilhadas entre doutorandos, sobre o PT, as quais não foram discutidas em estudos anteriores. Tais dados podem ser úteis para se avaliar que tipos de orientação sociorretórica podem ser oferecidas em cursos de escrita acadêmica e em diretrizes para elaboração de PT no contexto dos processos de seleção de pós-graduandos de modo a evitar práticas de leitura ou escrita pouco funcionais, tendo em vista os valores e crenças das culturas disciplinares e da cultura acadêmica.

Outra relevância da pesquisa é apresentar indícios do quão complexos são os PT e de como tal complexidade não se mostra inteiramente numa análise textual, mas requer análises que considerem a dimensão sociocognitiva dos gêneros. Nesse sentido, essa pesquisa oferece mais evidências para as ideias defendidas no interior dos ERG (BERKENKOTTER; HUCHIN, 2016; TSENG, 2012;TSENG, M. Toward a metapragmatic analysis of self-review in research grant proposals: From relevance to metarelevance. Intercultural Pragmatics, v. 9, n. 3, p. 335- 360, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.1515/ip-2012-0020>. Acesso em: 10 de setembro de 2023.
https://doi.org/10.1515/ip-2012-0020...
BAZERMAN, 2005BAZERMAN, C. Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo, Cortez Editora, 2005.) de que os gêneros possuem uma importante realidade sociocognitiva, por vezes de difícil percepção e reconhecimento, mas funcionando sociorretoricamente como um conhecimento que orienta o modo como os participantes de uma comunidade produzem ou interagem com os textos empíricos. Foi possível, nas análises, discutir como algumas crenças (a exemplo de supor que a função social do projeto é indicar a relevância e a exequibilidade da proposta de pesquisa a ser realizada) condizem com o que é difundido na literatura sobre projetos e em manuais de escrita de projetos, ao passo que outras (a exemplo da suposição de que projetos precisam conter conclusões) não encontram ressonância na literatura.

Ao ampliar as visões presentes nos depoimentos dos doutorandos e correlacioná-las com resultados de pesquisa sobre PP e PT, diríamos que estamos diante de um gênero que funciona como um “trampolim operacional e prospectivo” para outros gêneros, de modo que o processo de composição de um PT inclui ações retórico-discursivas prospectivas, no sentido de estruturar ideias e procedimentos que servirão ao mesmo autor do PT, em um momento futuro e aplicados a outros gêneros, para o desenvolvimento de ideias e ações esboçadas em termos de planejamento no PT inicial.

Nesse sentido, um PT difere de gêneros da esfera acadêmica que não possuem este caráter operacional e de planejamento, mas uma natureza mais conclusiva e organizadora do final de um processo, o que se materializa na presença de uma seção intitulada de conclusões ou de considerações finais, cujo propósito comunicativo é oferecer ao leitor uma visão global e sintetizadora de discussões previamente realizadas. Os PT, como sessão final, em vez de conclusão, exibem um cronograma e esta configuração indica que um PT é um gênero-meio, ou seja, estruturado para a realização de atividades procedimentais, práticas e textuais-discursivas futuras. Esse reconhecimento das diferenças entre PT e outros gêneros também se mostra muito relevante para o contexto acadêmico, na medida em que sinaliza características retóricas, discursivas e interativas que deveriam ser observadas nas atividades de orientação e escrita, contribuindo para uma aprendizagem situada do gênero PT.

A ideia de acabamento como um modo de responder a outros indicando o quão se quer exaurir semanticamente um tema (BAKTIN, 1979) é bem apropriada para ser aplicada aos PP, tendo em vista a presença de um acabamento bem particular em face de as ideias presentes em um PT poderem ser pensadas como estrategicamente provisórias, ou como problemáticas, ou como lacunares. Em PT, há expectativas de que o autor consiga oferecer um tratamento adequado à provisoriedade de algumas ideais e hipóteses, as quais aguardarão uma análise posterior para serem confirmadas ou refutadas, inteira ou parcialmente. O desafio, para pós-graduandos, é indicar uma provisoriedade, mas com conhecimento daquilo que é mais relativamente sólido numa área disciplinar e que possibilita antever questões em aberto.

Em geral, de um pesquisador iniciante tem sido mais comumente esperado e exigido que se demonstre um domínio de conhecimentos acerca das teorias, obras e ideias mais consensuais e sólidas dos autores, o que ocorre comumente em avaliações escolares, artigos, dissertações e TCCs. Em um PT, em contrapartida, já se espera que esse conhecimento seja abordado de modo crítico e colocado sob suspeita. Contudo, a habilidade para abordar deste modo o conhecimento é de complexa execução, especialmente para pesquisadores iniciantes, e isso, em parte, explica a complexidade do ensino e da aprendizagem da elaboração de projetos.

Uma implicação importante decorrente dos dados aqui analisados diz respeito ao fato de os PT, ao mesmo tempo, compartilharem algumas características retóricas e contextuais com outros gêneros da esfera acadêmica e apresentarem características que lhes são específicas. Contudo, para alguns doutorandos, é como se convenções retóricas gerais da esfera acadêmica se sobrepusessem a convenções retóricas específicas de projetos, não parecendo trivial, para os doutorandos, perceber tais distinções, o que tem o potencial de dificultar escolhas retóricas, discursivas e de abordagem temática no momento da escrita de um PT.

No discurso dos doutorandos, foi comum o recurso a metáforas para abordar a visão deles sobre o gênero, estratégia já anteriormente adotada por Swales (2004)SWALES, J. M. Research genres: Explorations and applications. Cambridge University Press, 2004.. Uma das metáforas interessantes foi enunciada nos seguintes termos: o projeto “é o momento em que a gente diz que pedra é diamante” (DHt5). Essa metáfora pode ser interpretada como uma alusão a uma ação sociorretórica dos PT: transformar algo trivial em alguma coisa de grande valor, digna de ser investigada cientificamente. A metáfora é bem sugestiva ao dar a entender que pesquisadores estão em busca de temas preciosos e raros, mas seu caráter precioso e raro depende de uma construção retórico-discursiva do autor do projeto. Ou seja, o tema, em sua natureza empírica, pode até ser trivial (uma pedra no meio da rua). Entretanto, tem potencial para adquirir o status de uma pedra preciosa (um diamante) a depender da construção discursiva realizada no PT.

  • 1
    Ao mencionarmos projetos de pesquisa (PP), estaremos nos reportando a projetos no sentido mais geral sem especificar um contexto particular, seja a nível institucional ou em relação aos interlocutores. Ao falarmos de projetos de tese (PT) estaremos nos reportando aos projetos submetidos a seleção de pós-graduação a nível de doutorado. Já a menção a projeto de dissertação (PD) refere-se a projetos submetidos a seleção de pós-graduação a nível de mestrado.
  • 2
    Gêneros oclusos, na esfera acadêmica, são aqueles que oferecem algum tipo de suporte ao processo de publicação da pesquisa, contudo permanecem escondidos do público, sem integrarem o sistema de gêneros responsável pelo registro da pesquisa (Swales, 1996SWALES, J. M. Occluded genres in the academy. Academic writing, v. 45, p. 58, 1996.). Os projetos de pesquisa em geral e os projetos de tese em particular são aqui considerados gêneros oclusos pelo fato de, em geral, não serem publicados ou ficarem em acesso livre à comunidade de leitores no Brasil. Há casos particulares de instituições que permitem acesso aberto a projetos, mas se trata de uma prática rara.
  • 3
    Evento deflagrador é algum acontecimento que ocasiona, requer ou engata a criação de um texto de um certo gênero. Pode ser um fato empírico, como o corte da luz elétrica, ou um evento discursivo, como uma entrevista concedida por um político.
  • 4
    A CAPES, em sua proposta de classificação das áreas do conhecimento, usa a categoria Colégio como o rótulo mais abrangente para agrupar as áreas cujos objetos de pesquisa possuam afinidades ou aproximações. Um desses colégios é o de Humanidades, o qual inclui três grandes áreas: Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas e Linguística, Letras e Artes, no interior das quais figuram diversas de subáreas mais específicas. Tal classificação permite observar que o que se chama de Humanidades inclui uma diversidade de cursos tanto com objetos mais convergentes mais distantes. Embora reconhecendo que tal categorização é problemática, decidimos adotá-la aqui por duas razões: 1) Nos ERG, há uma orientação metodológica no sentido de reconhecer práticas das comunidades discursivas, especialmente quanto ao modo como rotulam gêneros e comunidades; 2) Na universidade onde foram realizadas as pesquisas aqui divulgadas os três cursos aqui sob análise se encontram alojados no Centro de Ciências Humanas e Letras.
  • 5
    Os projetos de pesquisa, aprovados por comitê de ética, possuem as seguintes identificações: CAAE: 44099921.3.0000.5214; CAAE: 44556721.5.0000.5214; CAAE: 46177821.0.0000.5214
  • 6
    Ato de fala ilocucionário global significa, neste contexto, um ato de fala relacionado a um texto como um todo e não a enunciados curtos, geralmente falados, como foram estudados pela pragmática linguística. Trata-se de um ato ilocucionário (do ponto de vista do autor de um texto) e global porque associado ao um texto inteiro. Esta extensão do conceito já fora apresentada por Bazerman (2005)BAZERMAN, C. Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo, Cortez Editora, 2005. quando da discussão dos atos de fala em textos escritos longos.
  • 7
    O mais comum nas seleções feitas nas áreas de humanidades é haver um etapa posterior à análise de projetos, a qual se centra na análise do currículo do candidato. Contudo, trata-se de uma fase independente da fase de análise de projetos.
  • DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA
    Esta pesquisa não contém dados públicos possíveis de serem disponibilizados, uma vez que as entrevistas semiestruturadas realizadas podem comprometer a privacidade dos participantes da investigação se mostradas de modo integral.

REFERÊNCIAS

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DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA

Esta pesquisa não contém dados públicos possíveis de serem disponibilizados, uma vez que as entrevistas semiestruturadas realizadas podem comprometer a privacidade dos participantes da investigação se mostradas de modo integral.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2024

Histórico

  • Recebido
    12 Nov 2023
  • Aceito
    20 Maio 2024
  • Publicado
    21 Maio 2024
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