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A COR DO SINAL: CIRCULAÇÃO DE DISCURSOS RACISTAS EM SINAIS DA LIBRAS

THE COLOR OF THE SIGN: CIRCULATION OF RACIST DISCOURSES IN BRAZILIAN SIGN LANGUAGE

RESUMO

Este trabalho objetiva investigar os discursos materializados nos sinais em Libras utilizados para designar pessoas brancas e pessoas negras. Inscrevemos esta pesquisa nos estudos da Análise Dialógica do Discurso. Enquanto recorte metodológico, realizamos a busca dos sinais mencionados em quatro plataformas virtuais: Google, Youtube, Signbank e Dicionário de Libras do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines). Como resultados, foi possível identificar que, nos sinais de pessoa branca, circulam valores que as colocam enquanto grupo étnico dominante e socialmente valorados, ao passo que os sinais para designar pessoas negras integram a lógica opressora do racismo, construindo-as enquanto grupo social subalterno.

Palavras-chave
Análise Dialógica do Discurso; Discurso; Libras; Sentidos; Racismo

ABSTRACT

This work aims to investigate the discourses materialized in signs in Brazilian Sign Language used to designate white people and black people. We inscribed this research in Dialogical Discourse Analysis studies. As a methodological approach, we searched for the aforementioned signs on four virtual platforms: Google, Youtube, Signbank and National Institute of Education for the Deaf (Ines) Libras Dictionary. As results, it was possible to identify that, in the signs of white people, values circulate that place them as a dominant and socially valued ethnic group, while the signs to designate black people integrate the oppressive logic of racism, constructing them as a subordinate social group.

Keywords
Dialogical Discourse Analysis; Speech; Brazilian Sign Language; Meanings; Racism

MINHA RESPONSABILIDADE/NOSSA RESPONSABILIDADE

O fazer pesquisa implica sempre em posicionamentos sócio-políticos-ideológicos de respostas às múltiplas vozes que circulam socialmente nos eixos de tempo-espaço-pessoa. Essas respostas produzem sentidos que estão sob a égide de nossa responsabilidade, isto é, nos tornam responsáveis acerca daquilo que produzimos, seja na dimensão do campo científico, seja em outros espaços da vida humana. Em todos os espectros da vida e da pesquisa somos responsáveis por nossos atos, respondemos na “unidade da culpa e da responsabilidade” (Bakhtin, 2006BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Arte e responsabilidade. In: Bakhtin, M. Estética da criação verbal. BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Introdução e tradução do russo de Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2006., p. 33). E é a partir do reconhecimento da nossa responsabilidade ética, enquanto pesquisadores, que somos movidos a escrever este artigo.

Os caminhos percorridos por esta investigação possuem como eixo centralizador das questões aqui aventadas: o racismo e sua circulação na e por meio da Libras. Diante disso, julgamos necessário ressaltar que somos homens brancos e não nos inscrevemos, portanto, nos lugares sociais daqueles que sofrem cotidianamente os efeitos opressores do racismo. Assim, é a partir do reconhecimento de que ocupamos o lugar social das pessoas brancas que, intencionalmente ou não, gozam dos privilégios criados e sustentados pelo racismo estrutural, que falamos. Ainda nessa direção, salientamos que, integrando, nós, o grupo de pessoas LGBTQIAPN+, que também sofre com as opressões que deslocam aqueles que fogem à norma para lugares de subalternidade, compreendemos que não podemos lutar contra os investimentos LGBTfóbicos, desconsiderando a interseccionalidade existente entre as questões de raça, gênero e classe (Quijano, 2005QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. Buenos Aires: CLACSO, 2005.).

Nesse sentido, é válido mencionar que a compreensão de lugar de fala1 1 Para mais informações sobre este conceito, conferir os trabalhos de Troi et al (2020) e Ribeiro (2019). não se configura enquanto um selo de autorização de fala, mas em um conceito que localiza os sujeitos em posições enunciativas que revelam os lugares que estes ocupam nas estruturas assimétricas de poder (Troi et al, 2020TROI, Marcelo de. de; ASSIS, Dayane Nayara de; NOGUEIRA, Gilmaro. Apresentação: navegando por lugares múltiplos. In. NOGUEIRA, GIlmaro; ASSIS, Dayane Nayara de; TROI, Marcelo de(Orgs). Lugar de fala: conexões, aproximações e diferenças. ed. 1. Salvador: Editora Devires, 2020.). Esse entendimento nos ajuda a compreender que ao falarmos de lugar de fala, estamos falando, sobretudo, de uma “experiência encarnada” (Sanches, 2020SANCHES, Julio Cesar. O lugar de fala é uma experiência encarnada. In. NOGUEIRA, GIlmaro; ASSIS, Dayane Nayara de; TROI, Marcelo de (Orgs). Lugar de fala: conexões, aproximações e diferenças. ed. 1. Salvador: Editora Devires, 2020., p. 43). As dores e violências que sofremos colocam nossos corpos no centro dos debates, uma vez que é, também, na dimensão dos traumas e violências sofridos que elaboramos e construímos nossas narrativas, que recortamos a realidade e que sentimos “o mundo e no mundo” (Sanches, 2020SANCHES, Julio Cesar. O lugar de fala é uma experiência encarnada. In. NOGUEIRA, GIlmaro; ASSIS, Dayane Nayara de; TROI, Marcelo de (Orgs). Lugar de fala: conexões, aproximações e diferenças. ed. 1. Salvador: Editora Devires, 2020., p. 44).

Embora as dores que nos atravessam sejam diversas e com intensidades distintas, elas também nos aproximam. Por não integrarmos os grupos privilegiados, estamos inscritos em um constante terreno de enfrentamentos (Santos, 2020SANTOS, Tais Felipe Silva dos. Contribuições para pensar a transidentidade: lugar de fala e ética. In. NOGUEIRA, GIlmaro; ASSIS, Dayane Nayara de; TROI, Marcelo de (Orgs). Lugar de fala: conexões, aproximações e diferenças. ed. 1. Salvador: Editora Devires, 2020.). Desse modo, mesmo com nossas singularidades, estabelecemos relações proximais que não devem ser hierarquizadas, mas aproximadas, de modo que coletivamente possamos pensar em formas de resistências, pois as nossas dores também nos unem. É nodal que nossas ações também se orientem em direção ao fortalecimento de grupos sociais dos quais não fazemos parte, porém, sem jamais buscar protagonizar as falas de seus corpos. Assim, mesmo não ocupando o lugar de fala de uma pessoa negra, nem surda, tencionamos neste trabalho, a partir do nosso lugar, contribuir para os movimentos antirracistas na e por meio da Libras.

A arquitetônica estrutural do racismo tem atualizado suas formas e instrumentos de produção, sustentação e legitimação de controle e opressão. Medviédev (2019, p. 49) observa que a realidade ideológica pode ser realizada nos usos de “palavras, nas ações, na roupa, nas maneiras, nas organizações das pessoas e dos objetos, em uma palavra, em algum material em forma de um signo determinado”. Como resultado desses usos, as palavras, objetos, roupa etc.,“tornam-se parte da realidade que circunda o homem” (2019, p. 49). Tais materiais, inseridos e utilizados num dado contexto social, atuam enquanto signos ideológicos, apontando para os valores que circulam e estruturam a vida em sociedade, para as concepções de mundo dos indivíduos e para as relações de determinados grupos e/ou de dadas esferas específicas da atividade humana. Nesse sentido, compreendemos que os sinais da Libras também se configuram enquanto signos ideológicos que refletem e refratam a realidade social dos seus sinalizantes e o entrecruzamento de seus horizontes de valores, visto que “em todo signo ideológico cruzam-se ênfases multidirecionadas” (Volóchinov, 2017, p.113).

Apesar do jovial reconhecimento das línguas de sinais, o acolhimento de pesquisas em torno delas por parte da academia tem favorecido a identificação da circulação de discursos opressores nessas línguas viso-espaciais (Oliveira, 2020OLIVEIRA, Carlos Alberto Matias de. O eu no enunciado do outro: a voz do intérprete durante o ato interpretativo do par linguístico Libras/Português. 154 f. 2020. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2020. Disponível em: https://www.repositorio.ufal.br/handle/riufal/6751. Acesso em 02 de dez. de 2023.
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; Oliveira, Stella, 2022OLIVEIRA, Carlos Alberto Matias de; STELLA, Paulo Rogério. Questões de Alteridade: reflexões acerca do lugar discursivo do tradutor e intérprete de libras e língua portuguesa. Curitiba: Appris, 121 p., 2022.). Um movimento necessário, considerando que ainda prevalecem no campo acadêmico, pesquisas que orbitam questões de inclusão, bilinguismo e descrição linguísticas dissociadas de questões que tratam de classe, gênero e raça. Esse silêncio em torno de questões que oprimem grupos minoritarizados, não as colocando enquanto pautas nos debates científicos, sobretudo do racismo, expressa a herança da branquitude que busca proteger e preservar os privilégios e poderes da opressão. Cida Bento (2022)BENTO, Cida. O pacto da branquitude. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. observa que o pacto da branquitude é uma aliança que expulsa, reprime e esconde qualquer indício que evidencie as ainda existentes práticas racistas.

Diante disso, as questões que nos inquietam e orientam este trabalho são: 1. Quais são os sinais em Libras utilizados para designar pessoas brancas e pessoas negras?; 2. Quais discursos são reiterados nos e por meio dos sinais identificados? De modo a responder às questões levantadas, são traçados os seguintes objetivos: i) identificar os sinais em Libras utilizados para designar pessoas brancas e pessoas negras e ii) analisar os discursos circulantes nos e por meio dos sinais identificados. Compreendemos que a análise dos sinais da Libras poderá verificar a existência de realidades racistas, visto que o sinal, na condição de palavra, de signo ideológico, “é o indicador mais sensível das mudanças sociais” (Volóchinov, 2017, p. 106).

Assim, além desta introdução, seccionamos este artigo da seguinte maneira: na primeira seção, Aspectos metodológicos, apresentamos a sistemática de operacionalização metodológica. Após esse percurso, a segunda seção, Do racismo ao sinal, do sinal ao racismo: as cores/discursos dos sinais de pessoa branca, debruça-se sobre a análise dos dados coletados, buscando compreender os discursos engendrados e reiterados nos sinais identificados. A terceira seção, Do racismo ao sinal, do sinal ao racismo: as cores/discursos dos sinais de pessoa negra, ocupa-se da análise dos sinais utilizados para designar pessoas negras e as redes de sentidos estabelecidas por tais sinais. Na quarta seção, O caráter reacionário do signo ideológico: por uma resposta de resistência, refletimos sobre a necessidade de respostas de resistência frente aos discursos opressores detectados. Por fim, tecemos algumas Considerações ainda que não finais.

1. ASPECTOS METODOLÓGICOS

No tocante à forma de operacionalização deste trabalho, foram realizados movimentos de busca de sinais em Libras para se referir às pessoas negras e pessoas brancas em quatro plataformas virtuais. Isto fizemos, porque os produtos relacionados a essa língua se encontram em sua maioria no formato de vídeos e imagens. Selecionamos como espaços de investigação, as plataformas Google e Youtube, visto que são atualmente os principais locais de busca, publicação e divulgação de imagens e vídeos. Além disso, também foi elegido o site do Dicionário de Libras do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), por ser o único Instituto de referência em nível nacional, envolvendo a Libras e as pessoas com surdez. E, por fim, o banco de sinais SignBank, uma plataforma virtual de armazenamento e identificação de sinais da Libras. O SignBank é vinculado ao Inventário Nacional de Libras, um projeto de mapeamento e registro de sinais utilizados no Brasil, coordenado pela Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com outras universidades federais. Destaque-se, que o SignBank também integra o Global Signbank, uma ampla plataforma de armazenamentos de diversas línguas de sinais utilizadas em outros países.

Para fins de descrição dos sinais aqui identificados, foi utilizada a tabela de configurações de mãos de Nascimento (2009)NASCIMENTO, Sandra Patrícia de Faria do. Representações lexicais da língua de sinais brasileira: uma proposta lexicográfica. 2009. 290 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade de Brasília, Brasília, 2009. Disponível em: http://icts.unb.br/jspui/handle/10482/6547. Acesso em 15 de dez. de 2023.
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. Sendo assim, as configurações serão identificadas por números, e não por nomes. Quanto as palavras-chave utilizadas nas plataformas Google e Youtube, seguimos os termos: sinal em Libras para negro/a; sinal em Libras para branco/a. Enquanto que nas plataformas do Signbank e do Dicionário do Ines utilizou-se as palavras: negro/a; branco/a; pessoa negra; pessoa branca. Importa salientar que não foram realizadas entrevistas com sinalizantes da Libras, em busca de uma possível resposta acerca do impacto dos sinais identificados na vida de seus usuários.

Por este ser um trabalho introdutório, neste primeiro momento focalizamos apenas os aspectos da significação dos sinais, isto é, dos significados relativamente estabilizados, dos significados dicionarizados (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017.). O nível da significação é a porta de entrada para acessarmos os sentidos produzidos no nível do tema, isto é, daqueles produzidos no instante do ato comunicativo e que levam em consideração os aspectos extraverbais singulares e irreiteráveis (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017.). Tal recorte não impede a análise e identificação de discursos, pois é também nos e por meio dos elementos da língua que é possível ter acesso a certos reflexos “do acontecimento da inter-relação entre os falantes” (Volochinov, 2019, p. 137). Decerto, esse percurso metodológico reconhece as especificidades e os limites do campo de investigação selecionado, considerando que cada gênero de produção, circulação e recepção de discursos é capaz de dominar “somente determinados aspectos da realidade, ele possui certos princípios de seleção, determinadas formas de visão e de compreensão dessa realidade, certos graus na extensão de sua apreensão e na profundidade de penetração nela” (Medviédev, 2012MEDVIÉDEV, Pável Nikoláievith. Os elementos da construção artística. In: Medviédev, P. N. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma poética sociológica. Trad. Sheila C. Grillo; Ekaterina V. Américo. São Paulo: Contexto, 2012. p.193-207., p.196).

2. DO RACISMO AO SINAL, DO SINAL AO RACISMO: OS DISCURSOS NOS SINAIS PARA DESIGNAR PESSOAS BRANCAS

Abreu e Souza (2021)ABREU E SOUZA, Rafael de. Materialidades discriminatórias: racismo concretizado no cotidiano. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia. Pelotas, v. 9, n. 1, p. 64-91, jan-jun, 2021. Disponível em: https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/article/view/1092. Acesso em: 27 nov. 2023
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observa que, em sociedades racistas, as classificações acerca de grupos minoritarizados tendem a ocorrer a partir da ótica daqueles que oprimem. Nesse jogo de opressão, os opressores classificam a si a partir de centros de valores considerados positivos, colocando, por outro lado, o(s) outro(s) em pólos diametralmente opostos. O grupo dominante, ao se denominar como pessoas boas, categorizam o(s) outro(s) como ruins; ao se classificarem como civilizados, colocam os outros como não civilizados (Abreu e Souza, 2021ABREU E SOUZA, Rafael de. Materialidades discriminatórias: racismo concretizado no cotidiano. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia. Pelotas, v. 9, n. 1, p. 64-91, jan-jun, 2021. Disponível em: https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/article/view/1092. Acesso em: 27 nov. 2023
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). Diante dessa percepção, iniciamos esta análise pelos sinais identificados para designar o grupo que ocupa os lugares socialmente privilegiados, as pessoas brancas, para, a partir disso, verificar a existência de proximidades e relações semânticas com os sinais utilizados para se referir a pessoas negras.

O sinal apresentado na figura 01 é realizado com as duas mãos, ambas com a configuração de número 52 (Nascimento, 2009NASCIMENTO, Sandra Patrícia de Faria do. Representações lexicais da língua de sinais brasileira: uma proposta lexicográfica. 2009. 290 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade de Brasília, Brasília, 2009. Disponível em: http://icts.unb.br/jspui/handle/10482/6547. Acesso em 15 de dez. de 2023.
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)3 3 Assim como já mencionado, as configurações de mãos apresentadas estão baseadas na tabela de configuração de mãos proposta por Nascimento (2019). , palma da mão-dominante virada para-cima e palma da mão-base virada para-baixo, com movimento reto proximal da mão dominante, iniciando no punho da mão-base, direcionando para frente. A figura 02 apresenta uma variação de ponto de articulação em relação ao sinal da figura 01, esta variação do sinal é realizada com as duas mãos, ambas também com a configuração de número 52, com movimento da mão-dominante contra-lateral e proximal, porém, com ponto de articulação iniciando no ombro e para-frente até o punho da mão-base.

Figura 01
Sinal de pessoa branca no site do Ines, Signbank, Google e Youtube

Figura 02
Variação do sinal de pessoa branca no site do Signbank, Google e Youtube

Figura 03
Sinal de branco em LSA

Fischer et al (2022) destacam que este sinal em Libras para branco faz referência ao sinal de limpo, ressaltando que em Língua de Sinais Argentina (LSA) o sinal de branco também é oriundo do sinal de limpo, conforme pode ser observado na Figura 03:

O Youtuber Carlos Cristian, em seu canal Carlos Cristian Libras6 6 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=f7N2sil2ZQI. Acesso em 15 de nov. de 2023. , afirma que o sinal de branco (figura 02) também já foi utilizado para se referir a limpeza/limpo. Isso coaduna com o observado por Fischer et al (2022) acerca de uma possível origem para o sinal de branco. Diante dessas afirmações, consideramos válido investigar os sinais em Libras utilizados atualmente para designar limpo e/ou limpeza, a fim de verificar possíveis teias semânticas apontadas pelos autores. Em tal busca, foi encontrado um sinal (figura 04) que aponta para um elo entre o sinal de branco e o sinal de limpo, conforme figura 04:

Figura 04
Sinal de Limpeza no Youtube

O sinal da figura 04 é realizado com o mesmo movimento e o mesmo ponto de articulação do sinal de branco (figura 02), com variação apenas na configuração da mão-dominante (número 31). Ademais, outro sinal foi encontrado (figura 05) para o sinal de limpar/limpeza/limpo, com variação de ponto de articulação em relação à figura 04 e alteração de configuração e orientação da mão em relação ao sinal de branco da figura 01.

Figura 05
Sinal de limpar no Signbank e Youtube

Este sinal é realizado com as duas mãos, a mão-dominante com a configuração de número 31 e a mão-base com a configuração de número 52; movimento alternado e repetido direcionado para a frente. Parece-nos que os elementos motivacionais desse sinal apontam para a ideia de retirar algo, ausência de, vazio, nulidade, remover etc. Essa percepção apoia-se na recorrência dessa configuração de mão e movimento em outros sinais da Libras inscritos nesse campo semântico, tais como nos sinais de vazio (figura 06), deserto (figura 07), careca (figura 08) e neutralidade (figura 09), conforme as figuras abaixo:

Figura 06
Sinal de vazio

Figura 07
Sinal de deserto

Figura 08
Sinal de careca

Figura 09
Sinal de neutralidade

Levantamos suspeitas de que a configuração de mão e o movimento nos contextos apresentados acima, implicam um tipo de morfema13 13 Destacamos que não é objeto deste trabalho realizar afirmações acerca do uso dessa configuração e movimento enquanto um morfema em Libras. Contudo, consideramos válido apontar para uma possível existência de morfema, considerando a recorrência desses parâmetros e sua relação com as questões construídas nesta pesquisa. em Libras que cria um campo semântico do que podemos traduzir como ausência de: de água (sinal de deserto - figura 07), de cabelo (sinal de careca - figura 08), de posicionamento (sinal de neutralidade - figura 09). Essa mesma configuração de mão foi identificada em outro sinal utilizado para designar pessoa branca, este encontrado no Dicionário de Libras do Ines, como observado na figura 10:

Figura 10
Sinal de pessoa branca no site do Ines

Seguindo a compreensão de que esse possível morfema em Libras () pode ser traduzido como ausência de, o sinal da figura 12 parece apontar para a construção de que uma pessoa branca é alguém com ausência de, que nesse caso, pode indicar a ausência de cor e/ou de sujeira, visto que como supracitado, o sinal de branco (figura 02) faz referência ao sinal de limpo/limpeza. Esse tipo de associação e designação de pessoas brancas, enquanto possivelmente sujeitos limpos, leva-nos a compreender, contradiscursivamente, que pessoas não-brancas não seriam consideradas limpas, marcando-as, consequentemente, como pessoas sujas. Com vistas ao aprofundamento dessa asserção, faz-se necessário situar as relações entre limpeza-pessoa branca e sujeira-pessoa negra, visto que o sinal da Libras não é um invólucro destituído de sentido, mas está preenchido de valores sócio-históricos.

Figura 11
Sinal de pessoa branca no Google e Youtube

Figura 12
Sinal de leite na plataforma Signbank

Jesus (2022)JESUS, Victor de. O cheiro do racismo na cultura político-afetiva higienista brasileira: o saneamento do corpo-dejeto. Psicologia & Sociedade, ed. 34. p. 01-16, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-0310/2022v34257400. Acesso em 27 de dez de 2023.
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observa que um dos mecanismos da construção discursiva do racismo é a mobilização de palavras como forma de segregar e situar os sujeitos em lugares marginalizados. É um jogo de linguagem que ocorre de duas maneiras: de um lado, termos considerados estimados e valorizados socialmente vêm sendo utilizados para designar e constituir pessoas brancas, tais como limpeza, pureza, higiene, salubridade e asseio (Jesus, Penha, 2023JESUS, Victor de; PENHA , Sonia Rodrigues da. O discurso do lixo: uma análise psicanalítica e sociopolítica dos mecanismos simbólicos do racismo brasileiro. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/As, v.16, n. Edição Especial, 2023. Disponível em: https://abpnrevista.org.br/site/article/view/1574. Acesso em 11 de jan. de 2024.
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). De outro lado, a população negra é historicamente apresentada e representada no imaginário coletivo a partir de palavras antônimas àquelas associadas à branquitude, tais como “sujas, fedidas, imundas e/ou, ainda, o lixo da sociedade” (Jesus, 2022JESUS, Victor de. O cheiro do racismo na cultura político-afetiva higienista brasileira: o saneamento do corpo-dejeto. Psicologia & Sociedade, ed. 34. p. 01-16, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-0310/2022v34257400. Acesso em 27 de dez de 2023.
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, p. 02). São práticas discursivas racistas que possuem endereços ideológicos e vêm sendo perpetuadas no eixo do espaço-tempo, promovendo assimetrias sociais e ações opressoras, como dominação racial e “racismo estrutural a nível simbólico” (p. 02).

Segundo Nascimento (2017), no século XVI, o Pe. Antônio Vieira afirmava que o batismo cristão era uma maneira de limpar a raça negra. Outras expressões de cunho racistas-higienistas foram criadas e disseminadas, como caatinga de crioula, que mais tarde viria a ser cheiro do corpo, hoje mais conhecida como cecê (JESUS, 2022JESUS, Victor de. O cheiro do racismo na cultura político-afetiva higienista brasileira: o saneamento do corpo-dejeto. Psicologia & Sociedade, ed. 34. p. 01-16, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-0310/2022v34257400. Acesso em 27 de dez de 2023.
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). Karasch (2000)KARASCH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro (1808-1850). Companhia das Letras, 2000. e Silva (1988) destacam que foi criada uma espécie de triangulação racista entre sujeira, população negra e serviços de saneamento. Tal movimento buscou relacionar expressões como carregar água, retirar o lixo e os excrementos com coisa de escravo e serviço de preto. Não é à toa que tais trabalhos estão tipificados como lugares de menos valor e repulsivos.

A fabricação de teorias eugenistas foi, também, uma das grandes responsáveis pela manutenção e impulsão do racismo nas mais diversas dimensões da vida humana. De acordo com Jesus (2022, p. 03)JESUS, Victor de. O cheiro do racismo na cultura político-afetiva higienista brasileira: o saneamento do corpo-dejeto. Psicologia & Sociedade, ed. 34. p. 01-16, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-0310/2022v34257400. Acesso em 27 de dez de 2023.
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, cortiços e favelas ocupados por pessoas negras foram classificados como “depósito de entulho humano, locais infecciosos, sujos, imundos, habitação de ratoneiros livres e insalubres - e perseguidos - pelos jornais, políticos e cientistas”. Campos (2012) salienta que, em decorrência das teorias eugenistas, os corpos, trabalhos e espaços considerados negros eram rechaçados por serem formatados como contaminantes, sujos e portadores de imundície.

Nesse ínterim, a cor branca foi/é extensamente atribuída como representação de “pureza de limpeza física, exterior, mas também no sentido de limpeza interior, inocência e integridade” (Pereira, 2011PEREIRA, Carla Patrícia de Araujo. A cor como espelho da sociedade e da cultura: um estudo do sistema cromático de design de embalagens de alimentos. 257 f. 2011. Tese (Doutorado em Design e Arquitetura) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16134/tde-19082013-111907/pt-br.php. Acesso em 25 de nov. de 2023.
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, p. 95). Pereira (2011, p. 95)PEREIRA, Carla Patrícia de Araujo. A cor como espelho da sociedade e da cultura: um estudo do sistema cromático de design de embalagens de alimentos. 257 f. 2011. Tese (Doutorado em Design e Arquitetura) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16134/tde-19082013-111907/pt-br.php. Acesso em 25 de nov. de 2023.
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salienta, ainda, que desde a antiguidade o branco tem sido símbolo da virgindade e que “a partir do século XIX, o vestido branco de casamento passou a ser usado como uma maneira de externar a pureza da conduta da mulher”. Essa percepção tem sido estendida até mesmo para os alimentos, “no início do século XX, a farinha refinada passou a ser clareada quimicamente para tornar-se ainda mais branca” (Pereira, 2011PEREIRA, Carla Patrícia de Araujo. A cor como espelho da sociedade e da cultura: um estudo do sistema cromático de design de embalagens de alimentos. 257 f. 2011. Tese (Doutorado em Design e Arquitetura) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16134/tde-19082013-111907/pt-br.php. Acesso em 25 de nov. de 2023.
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, p. 96).

Ante o espraiamento sócio-histórico apontado, compreendemos que os sinais das figuras 01, 02 e 10, ao vincular pessoas brancas à limpeza, apontam para dois vieses de sentido. O primeiro viés define pessoas brancas enquanto seres dotados de pureza, higiene e asseio, enaltecendo esse grupo étnico e os colocando em patamares superiores em relação a outras etnias. O segundo viés mobiliza redes semânticas que designam todos os outros não-brancos como desprovidos daqueles valores atribuídos às pessoas brancas. Esses dois movimentos respondem aos discursos racistas da branquitude, reiterando a construção de equações silogísticas: “negritude = negativo / negativo = mal ∴ negritude = mal e branquitude = positivo / positivo = bom ∴ branquitude = bom” (Abreu e Souza, 2021ABREU E SOUZA, Rafael de. Materialidades discriminatórias: racismo concretizado no cotidiano. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia. Pelotas, v. 9, n. 1, p. 64-91, jan-jun, 2021. Disponível em: https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/article/view/1092. Acesso em: 27 nov. 2023
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, p. 67). Cida Bento (2022BENTO, Cida. O pacto da branquitude. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022., p. 29) destaca que a branquitude criou uma identidade em comum utilizando os “africanos, os negros, como principal contraste”. De acordo com a autora, pessoas brancas categorizam pessoas negras em termos considerados inferiores e repulsivos, para, a partir disso (porém, não necessariamente nessa ordem), construírem a si com base em significações opostas, isto é, em valores considerados estimados, aceitos e reputáveis como positivos, morais, civilizados, entre outros.

Os sinais da Libras (e de outras línguas de sinais) ao serem inseridos em correntes de discursos, alcançam o status de signos ideológicos que não apenas apontam para a realidade, mas integram e constituem a própria realidade. Cada campo da criatividade ideológica cria seus próprios signos. O sinal não é autossuficiente, ele surge da situação cotidiana extraverbal e “mantém uma relação muito estreita com ela” (Volochinov, 2019, p. 117). Desse modo, os sinais em análise (figuras 1, 2 e 10) seguem o alinhamento racista ao qualificar pessoas brancas como símbolos do aceitável, marcando-os como seres limpos e, portanto, dignos da vida coletiva. A criação dessas valências semânticas promovem segregações raciais que instauram divisões espaciais, em que os considerados não-limpos, isto é, os não-brancos, não atendem aos requisitos da civilização e da vida em sociedade, devendo, portanto, sob o véu da naturalização, serem deslocados para os lugares da subalternidade.

O terceiro sinal encontrado para designar a pessoa branca é o da figura 11, que é realizado apenas com uma mão, configuração de mão inicial 12 e final número 02, ponto de articulação em frente ao tronco, com movimento direcional para baixo. Este sinal é o mesmo utilizado para se referir a leite, conforme pode ser observado na figura 12.

Embora este sinal (figura 11) possa apontar para uma semiologia cotidiana que associa pessoas brancas ao leite e pessoas negras ao café (Paula, Lopes, 2020PAULA, Luciane de; LOPES, Ana Caroline Siani. A eugenia de bolsonaro: leitura Bakhtiniana de um projeto de holocausto à brasileira. Revista Linguasagem, São Carlos, v. 35, n. 01, Dossiê Discurso em tempos de pandemia. p. 35-76, set. 2020. Disponível em: https://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/769. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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), faz-se necessário ressaltar que uma das práticas de promoção à eugenia tem sido justamente o uso do leite como forma de legitimar crenças de superioridade racial. Paula e Lopes (2020)PAULA, Luciane de; LOPES, Ana Caroline Siani. A eugenia de bolsonaro: leitura Bakhtiniana de um projeto de holocausto à brasileira. Revista Linguasagem, São Carlos, v. 35, n. 01, Dossiê Discurso em tempos de pandemia. p. 35-76, set. 2020. Disponível em: https://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/769. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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destacam o ato de tomar leite como um símbolo neonazista, inserido nos movimentos Alt Right17 17 Numa tradução livre: Direita Alternativa. Esse movimento refere-se a grupos de extrema direita, de posicionamentos racistas e fascistas, que pregam valores de superioridade racial, de gênero e nacionalidade. Para mais informações, conferir o trabalho de Gilroy (2018). , numa concepção de tomar branco, como forma de tornar branco. Os movimentos neonazistas têm, há muito, realizado manifestações de tomar leite como forma de chamar a atenção para um possível traço genético conhecido por ser mais comum em pessoas brancas, que é “capacidade de digestão de lactose em pessoas adultas” (Paula, Lopes, 2020PAULA, Luciane de; LOPES, Ana Caroline Siani. A eugenia de bolsonaro: leitura Bakhtiniana de um projeto de holocausto à brasileira. Revista Linguasagem, São Carlos, v. 35, n. 01, Dossiê Discurso em tempos de pandemia. p. 35-76, set. 2020. Disponível em: https://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/769. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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, p. 58). Tais esforços racistas tentam se apoiar numa pseudociência como forma de legitimar a superioridade racial de pessoas brancas.

Paula e Lopes (2020PAULA, Luciane de; LOPES, Ana Caroline Siani. A eugenia de bolsonaro: leitura Bakhtiniana de um projeto de holocausto à brasileira. Revista Linguasagem, São Carlos, v. 35, n. 01, Dossiê Discurso em tempos de pandemia. p. 35-76, set. 2020. Disponível em: https://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/769. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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, p. 61) ressaltam, ainda, uma matéria publicada em 1933 pela História da Agricultura do Estado de Nova York, em que o órgão afirma que “de todas as raças, os arianos parecem ter sido os bebedores mais pesados de leite e os maiores usuários de manteiga e queijo”. Tal afirmação buscava estabelecer ligações entre essa divisão de seres humanos com uma possível tolerância daquele povo à lactose. Situando esse movimento aqui no Brasil, os autores realizam uma análise dialógica acerca do uso do copo de leite na esfera política e midiática, destacando seu uso enquanto ato racista por movimentos bolsonaristas. O ato de tomar leite foi/é utilizado enquanto um signo ideológico eugênico-racista, associando o branqueamento como forma de pureza racial (Paula, Lopes, 2020PAULA, Luciane de; LOPES, Ana Caroline Siani. A eugenia de bolsonaro: leitura Bakhtiniana de um projeto de holocausto à brasileira. Revista Linguasagem, São Carlos, v. 35, n. 01, Dossiê Discurso em tempos de pandemia. p. 35-76, set. 2020. Disponível em: https://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/769. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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, p. 58). É necessário destacar que as tentativas de associação de digestão de lactose enquanto capacidade pertencente a pessoas brancas adultas não encontram base científica moderna, “não há evidências genéticas para apoiar nenhuma ideologia racista” (Malva, 2020MALVA, P. 2020. Bebida mais do que branca: o leite como símbolo do neonazismo. Aventuras na História. Publicado em 01/06/2020. Disponível em https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/bebida-mais-do-que-brancao-leite-como-simbolo-do-neonazismo.phtml. Acesso em 09 de dez. 2023.
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, p. 02).

O leite, utilizado com esse fim eugenista, torna-se um signo ideológico por excelência. Segundo Volochinov (2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 111), “somente aquilo que adquiriu um valor social poderá entrar no mundo da ideologia, tomar forma nele e consolidar-se”. A partir do momento em que um signo passa a fazer parte da “consciência verbalmente formalizada” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 101), sendo compreendido e ponderado, ele se torna um signo ideológico. Os valores racistas estão penetrados não no leite em si, enquanto substância, mas nos valores construídos nas ênfases sociais atribuídas a ele, no reconhecimento social por dada coletividade e, consequentemente, nos sentidos produzidos por ele.

A criação do sinal (figura 11) e seu uso implica que ele foi inserido na realidade ideológica e que está encharcado de valores, respondendo a outros signos e o fazendo “também com signos” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 95). A sua existência enquanto um item lexical da Libras indica que ele surgiu de processos de interação com outros signos já existentes, estabelecendo com eles, elos e ressonâncias verbo-visuais que apontam para as realidades que o circundam, uma vez que “o tema e a forma do signo ideológico estão ligados entre si de modo indissolúvel” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 112). O racismo é fundante na estrutura da vida em sociedade, e a língua ocupa uma posição central nas engrenagens dessa grande máquina social, produzindo diversas manifestações e expressões sígnicas que precisam ser discutidas e, se necessário, combatidas. Pois, como afirma Nascimento (2019, p. 23), não podemos ser ingênuos em pensar que a língua é neutra, “mas ela própria é um espaço de luta da racialidade porque é por meio dela em que se nomeia e se racializa”

O último sinal identificado (figura 13) é realizado com a mão-dominante em configuração de número 28 e mão-base 52, realizando movimento retilíneo para trás na palma da mão-base. Este sinal faz referência à tonalidade da cor da palma mão, a uma provável cor clara, como observado a seguir:

Figura 13
Sinal de pessoa branca apenas no Google e Youtube

Em seu uso cotidiano, pode-se afirmar que o sinal não aponta para a circulação de discursos racistas, uma vez que ele faz referência à tonalidade branca das palmas das mãos. Contudo, convém mencionar alguns aspectos históricos em que as palmas das mãos de pessoas negras protagonizam lugares de circulação de discursos racistas. Costa (2018) faz uma análise acerca da ridicularização de pessoas negras no conto As mãos dos pretos, de Luís Bernardo Honwana. Nessa análise são observados que o fato das pessoas negras possuírem a palma das mãos clara e a cor da pele escura se dá em razão de que os seus antecedentes “andavam com elas apoiadas ao chão, como os bichos do mato, sem as exporem ao sol, que lhes ia escurecendo o resto do corpo” (Costa, 2018, p. 8). Em outras partes do conto, esse traço ocorre porque “às escondidas, andavam sempre de mãos postas a rezar”, ou “Deus fez-lhes as mãos assim mais claras para não sujarem a comida que fazem para os seus patrões ou qualquer outra coisa que lhes mandem fazer e que não deva ficar senão limpa” (Costa, 2018, p. 9), dentre diversas outras razões racistas.

O que chama a atenção é a necessidade de procurar justificativas para explicar o porquê de as mãos de pessoas negras serem claras, como se o claro, o considerado limpo, fosse uma característica inerente apenas às pessoas brancas. Oliveira (2013)OLIVEIRA, Mirian Ribeiro. A ideologia racista de cor no discurso midiático filhas do vento. Calidoscópio, v. 11, n. 2, p. 116-123, maio-agosto, 2013. Disponível em: https://revistas.unisinos.br/index.php/calidoscopio/article/view/cld.2013.112.02. Acesso em 02 de dez. de 2023.
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faz uma análise de fragmentos do filme Filhas do Vento, em que em um de seus trechos, a palma da mão de pessoas negras também é colocada em questão. Ao falar da criação do homem, certo personagem afirma que “como não dava pra lavar o corpo inteiro, então eles só molharum (sic) as sola do pé e as palma das mão” (Oliveira, 2013OLIVEIRA, Mirian Ribeiro. A ideologia racista de cor no discurso midiático filhas do vento. Calidoscópio, v. 11, n. 2, p. 116-123, maio-agosto, 2013. Disponível em: https://revistas.unisinos.br/index.php/calidoscopio/article/view/cld.2013.112.02. Acesso em 02 de dez. de 2023.
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, p. 121). O branco é novamente associado à ideia de limpeza, em que apenas a sola do pé e as palmas das mãos seriam as únicas partes do corpo da pessoa negra consideradas limpas.

Percebe-se o branco não apenas como um dos espectros de cores, mas como um signo ideológico, pois seu uso no decurso do tempo mostra sua utilização enquanto uma arena de luta de classes, valorando positivamente corpos brancos em detrimento dos não-brancos. Como já nos alertava Volochinov (2017, p. 113)VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., “assim como o Janus, todo signo ideológico possui duas faces”. O branco, seja em sua materialidade sonora, escrita ou sinalizada, não aponta apenas para uma cor, mas refrata uma multiplicidade de sentidos; a realidade não é apenas refletida no signo, “mas também é refratada nele” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 112). E essas refrações têm construído centros de valores que ensejam no imaginário social uma naturalização discursiva de esmero social, moral, fisiológico etc., restrito às pessoas brancas.

Compreendemos importante realizar essas aproximações semânticas por considerar que os fatos históricos de associação e divisões de marcadores fenotípicos têm sido comuns enquanto formas de racismo. Todos os sinais até aqui identificados envidam a mesma pretensão: a construção da pessoa branca enquanto um ser limpo, higiênico, puro, gravitando outras adjetivações como pessoas abonadas, moralmente corretas, dignas etc. Percebe-se, portanto, traços de discursos eugênicos e de promoção da branquitude em tais sinais, contribuindo para a difusão e sustentação do racismo também em Libras.

3. DO RACISMO AO SINAL, DO SINAL AO RACISMO: AS CORES/DISCURSO DOS SINAIS PARA DESIGNAR PESSOAS NEGRAS

No processo de busca no site do Dicionário de Libras do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), na plataformas Google e Youtube foi encontrado com mais recorrência o seguinte sinal para a palavra negro/a, conforme a figura abaixo:

Este sinal é realizado com a configuração de mão número 17, ponto de articulação na têmpora direita e movimento rotacional curvo. A configuração de mão utilizada faz referência à ação de pegar/tocar o cabelo. De acordo com o canal do Youtuber “Carlos Cristian Libras”20 20 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=b6VvZ55LWDA&t=416s. Acesso em 06 de dez. de 2023. , o movimento realizado aponta para a textura considerada pixaim. Esse tipo de relação e construção da pessoa negra apoiados em supostas características físicas, não ocorre com ineditismo e/ou de forma desintencional, mas configura-se como uma prática comum dos movimentos racistas. Nogueira (1995)NOGUEIRA, Oracy. As Relações Raciais em Itapetinga. São Paulo: EDUSP, 1998 [1955]. 245 p. observa que as relações raciais no Brasil pautam-se em marcadores fenotípicos, e que a partir do paradigma branco, os demais grupos étnicos são estereotipados. O autor denomina essa prática como preconceito de marca, em que os traços de pessoas negras são associados à animalidade ou rusticidade (Nogueira, 1995NOGUEIRA, Oracy. As Relações Raciais em Itapetinga. São Paulo: EDUSP, 1998 [1955]. 245 p.).

Abreu e Souza (2020, p. 51)ABREU E SOUZA, Rafael de. Deixa meu cabelo em paz e outros contos sobre Arqueologia do Racismo à Brasileira. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia, Pelotas, v. 33, n. 2, p. 43-65, 2020. Disponível em: https://revista.sabnet.org/ojs/index.php/sab/article/view/743. Acesso em: 27 nov. 2023.
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salienta que o cabelo do tipo crespo é uma das materialidades que mais sofre com os efeitos do racismo, sendo os indivíduos negros frequentemente “tachados de sujos e feios”. De acordo com o autor, essa é uma experiência que começa desde cedo, sendo as mulheres as principais vítimas desse processo violento, uma vez que são submetidas a duros e constantes “rituais de manipulação” na infância (Gomes, 2002GOMES, Nilma Lino. Trajetórias escolares, corpo negro e cabelo crespo: reprodução de estereótipos ou ressignificação cultural?. Revista Brasileira de Educação, v. 21, p. 40-51, 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/D7N3t6rSxDjmrxrHf5nTC7r/abstract/?lang=pt. Acesso em 03 de dez. de 2023.
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, p. 42). Enquanto isso, o boné é muito utilizado por homens como instrumento de invisibilização do cabelo crespo, numa tentativa de escondê-lo, sendo até mesmo obrigados a raspar a cabeça (Abreu e Souza, 2020ABREU E SOUZA, Rafael de. Deixa meu cabelo em paz e outros contos sobre Arqueologia do Racismo à Brasileira. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia, Pelotas, v. 33, n. 2, p. 43-65, 2020. Disponível em: https://revista.sabnet.org/ojs/index.php/sab/article/view/743. Acesso em: 27 nov. 2023.
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). Abreu e Souza (2020)ABREU E SOUZA, Rafael de. Deixa meu cabelo em paz e outros contos sobre Arqueologia do Racismo à Brasileira. Tessituras: Revista de antropologia e arqueologia, Pelotas, v. 33, n. 2, p. 43-65, 2020. Disponível em: https://revista.sabnet.org/ojs/index.php/sab/article/view/743. Acesso em: 27 nov. 2023.
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narra episódios pelos quais passou, em que se referiam ao seu cabelo como “tonhonhóim”. Em outras situações seu cabelo “era equiparado a um local de armazenagem e descarte, para onde as coisas vão, mas não voltam, perdidas e fora da visão, como uma lixeira” (p. 51).

Lucena e Lima (2019) consideram que marcar o outro a partir de características fenotípicas ocorre também com outros grupos étnicos, como os indígenas, por exemplo. Essa prática é produto de uma narrativa e de um projeto necropolítico (Mbembe, 2018MBEMBE, Achille. Necropolítica. 3. ed. São Paulo: n-1 edições, 2018. 80 p.) que coloca pessoas brancas como não-marcadas, construindo-as como o padrão, o modelo, o ideal, o natural, o paradigma dominante. Desse ponto de vista, todos aqueles que não se enquadram no corpo natural da pessoa branca precisam ser marcados como diferentes. Gomes (2002)GOMES, Nilma Lino. Trajetórias escolares, corpo negro e cabelo crespo: reprodução de estereótipos ou ressignificação cultural?. Revista Brasileira de Educação, v. 21, p. 40-51, 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/D7N3t6rSxDjmrxrHf5nTC7r/abstract/?lang=pt. Acesso em 03 de dez. de 2023.
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afirma que em sociedades em que o racismo é estrutural e estruturante das relações humanas, a cor da pele e o cabelo são marcadores centrais, uma vez que são os traços fenotípicos mais visíveis da diferença racial e, por possuírem “uma forte dimensão simbólica, são vistos como símbolos de inferioridade” (Kobena, 1994KOBENA, Mercer. Black hair: style politics. In. KOBENA, Mercer. Welcome to the jungle: new positions in Black cultural studies. New York: Routledge. p. 97-128, 1994., p. 4).

Ademais, Silva (2018)SILVA, Franciane Conceição da. Feições do racismo no conto “Pixaim”, de Cristiane Sobral. Aletria: Revista de Estudos de Literatura, v. 28, n.4, p. 103-117, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.17851/2317-2096.28.4.103-117. Acesso em 16 de dez. de 2023.
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destaca que o termo pixaim é utilizado muitas vezes com sentido negativo, com o intuito de ofender, diminuir e agredir, integrando uma dinâmica racista que coloca o cabelo crespo no bojo dos cabelos considerados não-bons. Gomes (2008, p. 9) observa que “o cabelo da pessoa negra, visto como ruim, é expressão do racismo e da desigualdade racial que recai sobre esse sujeito”, ao passo que palavras como cabelo bom, arrumado, asseado e alinhado são amplamente conformadas como universais para se referir ao cabelo liso. Esse cotejamento de palavras utilizadas para se referir ao cabelo crespo versus cabelo liso nos permite perceber como a linguagem atua na construção de centros de valores que dialogam a todo o momento.

Diante desse cenário, compreendemos que o sinal da figura 14 percorre duas orientações de sentidos: num primeiro instante, apoia-se no estereótipo de que todas as pessoas negras possuem a mesma textura de cabelo, desconsiderando a pluralidade dos indivíduos em suas mais diversas expressões fenotípicas. Num segundo instante, a escolha da marcação a partir do tipo do cabelo crespo resgata os valores racistas construídos sócio-historicamente acerca dele, presentificando o passado e atualizando-o com os pontos de vistas atuais, “num movimento pendular entre o singular e o universal, o individual e o coletivo” (Brait, 2019BRAIT, Beth. Discursos de resistência: do paratexto ao texto. Ou vice-versa?. ALFA: Revista de Linguística, São Paulo, v. 63, n. 2, 2019. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/11452. Acesso em: 10 out. 2023.
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, p. 255). É um sinal que responde à lógica racista e seu sistema axiológico de construção da estética da população negra em moldes de fealdade.

Figura 14
Sinal de pessoa negra no site do Ines, Google e Youtube

Convém mencionar que a dimensão ética de responsabilização da formação e perpetuação desses sinais não deve ser atribuída apenas a sujeitos específicos ou ao tempo histórico atual. A responsabilidade é tanto individual quanto coletiva, visto que ao enunciar uma palavra e/ou sinal cristalizada/o com significados ofensivos, enunciamos não apenas a nossa posição no mundo, mas também as dos outros com os quais estabelecemos relações de assimilabilidade e responsividade (Bakhtin, 2017BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2017.). Embora nossos enunciados possuam nossas digitais, nossa marcação individual, eles também estão intercambiados com outros enunciados já-ditos, concordando com uns, discordando de outros, complementando e/ou refutando com eles. Conforme afirma Volóchinov (2017), todo enunciado é apenas mais um elo na complexa e organizada corrente de outros enunciados, reiterando enunciados anteriores e apontando enunciados por-vir.

A seguir é apresentado o segundo sinal identificado (figura 15) para designar pessoas negras, este disponível na plataforma SignBank:

Figura 15
Sinal de pessoa negra no SignBank

O sinal identificado é realizado com a configuração de mão número 38, tendo como ponto de articulação o lado direito da bochecha, com movimento para cima e para baixo. A configuração de mão e o movimento do sinal é semelhante a uma variação22 22 Considerando que existem outros sinais para o sinal de pintar em Libras. do sinal em Libras de pintura/pintar (figura 16 e figura 17) e desenhar (figura 18 e figura 19), como pode ser observado a seguir:

Figura 16
Sinal de pintar no Youtube

Figura 17
Sinal de pintar segundo Ferreira e Naves

Figura 18
Sinal de desenhar no Signbank

Figura 19
Sinal de desenhar no Ines

Ressaltamos dois contornos de interpretação que conduzem para a compreensão do sinal da figura 15. O primeiro é a categoria semântica informada no Signbank, ao nos fornecer o dado características físicas, indicando que o sinal estabelece relações com algum possível traço físico da pessoa negra. O segundo é a recorrência da configuração de mão e do movimento em sinais que instauram um campo semântico com significados relacionados a: desenhar, pintar, colorir, tingir. Diante disso, hasteamos suspeitas de que o sinal em tela (figura 15) aponta para a característica fenotípica cor da pele. Assim sendo, ele também dialoga com o sinal da figura 10, quando a pessoa branca seria aquela que não possui cor. Essa compreensão não é desprovida de sustentação, visto que utilizar a expressão racista pessoas de cor, para se referir a pessoas negras, é uma prática recorrente no Brasil (Brah, 2006BRAH, Avtar. Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, Campinas, n. 26, p.329-376, janeiro-junho de 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/j/cpa/a/B33FqnvYyTPDGwK8SxCPmhy/. Acesso em 29 de nov. de 2023.
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).

Sales Jr (2006SALES Junior. Ronaldo. Democracia racial: o não-dito racista. Tempo Social: Revista de Sociologia da USP, São Paulo v. 18, n. 2, p. 229-258, 2006. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/ts/article/view/12523. Acesso em 10 de dez. de 2023.
https://www.revistas.usp.br/ts/article/v...
) explica que processos associativos de cor de pele têm ocupado lugares centrais nas práticas de racismo, “a cor torna-se sinédoque das relações raciais” (p. 232). Pessoas negras têm sido reduzidas a partes do corpo, não se visualizando o indivíduo, mas seu valor enquanto grupo social, político e econômico. Leão (2020)LEÃO, Cleber Teixeira. Entre o visível e o invisível: a branquitude e as relações raciais nos conteúdos curriculares de ensino de história. 107 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Ensino de História. Porto Alegre, 2020. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/213391. Acesso em 22 de dez. de 2023.
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observa que a branquitude não se enxerga enquanto raça, mas como o normal, o natural, como os não-nomeados. Desse tipo de compreensão, os que possuem raça são os outros não-brancos e, portanto, estes possuem cor: pretos, pardos e amarelos. O branco é desenhado como o modelo estético ideal de humano, ao passo que os traços tidos como alheios são vastamente rebaixados. Leão (2020, p. 24)LEÃO, Cleber Teixeira. Entre o visível e o invisível: a branquitude e as relações raciais nos conteúdos curriculares de ensino de história. 107 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Ensino de História. Porto Alegre, 2020. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/213391. Acesso em 22 de dez. de 2023.
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ainda destaca que “os traços fenotípicos serviram para manter um distanciamento econômico e político, mantendo uma relação de poder e de desigualdade entre diferentes grupos humanos, entre brancos e não-brancos”. Nesse contexto racial, a cor adquire uma densidade ideológica de marcação da população negra a partir de paradigmas racistas. A presença desse marcador em Libras assinala a atualização dos mecanismos de sustentação do racismo, evidenciando que o sinal também atua como uma materialidade de preservação de “formas de visão e assimilação de determinados aspectos do mundo” (Bakhtin, 2017BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Para uma filosofia do ato responsável. 3. ed. Trad. Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João editores, 2017., p. 16).

Preliminarmente, poder-se-ia concluir que o sinal da figura 15 é esterilizado de ideologias, não evocando interesses sociais, inscrito apenas numa superfície semiótica de semelhança entre significante e significado, nos termos de Peirce (2003)PEIRCE, Charles. Semiótica. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2003.. Contudo, o referido sinal mostra-se como um fenômeno ideológico dado “no movimento do corpo” (Volóchinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p.94). A natureza visual da língua de sinais e seu considerado grau de iconicidade não a isenta de seu comprometimento com os referentes sócio-políticos no mundo. Contrariamente, seu aspecto icônico ressoa os embates sociais, estando “tematicamente orientados para a vida, para seus acontecimentos, problemas e assim por diante” (Medviédev, 2012MEDVIÉDEV, Pável Nikoláievith. Os elementos da construção artística. In: Medviédev, P. N. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma poética sociológica. Trad. Sheila C. Grillo; Ekaterina V. Américo. São Paulo: Contexto, 2012. p.193-207., p. 195). A iconicidade é uma expressão sígnica materializada verbo-visualmente e que revela os posicionamentos e vozes sociais em diferentes áreas de atividades. O horizonte social de cada grupo e de cada época acentua e enfatiza os signos iconicamente, acrescentando valores socialmente referendados. A íntima e tensa correlação entre o sinal em análise e as esferas ideológicas nos eixos do espaço e do tempo, permite-nos observar que a categorização de pessoas negras como pessoas de cor recupera faíscas racistas consubstanciadas verbo-visualmente.

Por fim, percebe-se que os dois sinais encontrados para designar pessoas negras (figuras 14 e 15) não apenas apontam para um tipo de cor de pele e de cabelo, num pretenso esvaziamento ideológico, mas orientam-se para as camadas valorativas que orbitam esses signos. Tais sinais estabelecem elos discursivos com os valores racistas que permanecem em fluxo desde o período da colonização. Note-se que em momento algum são detectados circuitos discursivos que magnetizam valores positivos, assim como ocorre com os sinais para classificar pessoas brancas. Pelo contrário, constata-se a satelizacão de fios ideológicos que se orientam para características físicas amplamente difundidas e difamadas como sórdidas. Se por um lado, os sinais para designar pessoas brancas as concebem como símbolos da limpeza, do asseio, do decente; por outro, os sinais para designar pessoas negras as fabricam a partir de adjetivos construídos de forma depreciativas, insultuosas e humilhantes. Ambas orientações estão tensamente articuladas, compondo um projeto holístico de colonialidade que reforça e eleva o ideário moderno-colonial do homem branco como o ser humano universal, ao mesmo tempo que rebaixa e desabona pessoas negras.

4. O CARÁTER REACIONÁRIO DO SIGNO IDEOLÓGICO: POR UMA RESPOSTA DE RESISTÊNCIA

Os valores produzidos na superestrutura, isto é, na camada superior produtora de sentidos26 26 De acordo com Stella e Brait (2022, p. 64), Volochinov “percebe duas camadas de circulação de discursos na ideologia do cotidiano: uma inferior e outra superior. A camada inferior diz respeito àqueles discursos que circulam na vivência do dia a dia, nas interações imediatas e rápidas pelas quais passamos constantemente”. Já a camada superior é formada “por esferas mais complexamente organizadas, por exemplo, a esfera literária, a imprensa, a esfera científica, estão mais próximas dos sistemas ideológicos constituídos e, consequentemente, exercem mais proximamente influência da base sobre a ideologia constituída”. , nutrem e balizam as infraestruturas, as camadas inferiores. Entretanto, os valores gerados nestas, também possuem capacidade de afetar aqueles relativamente estabilizados no nível das superestruturas, em processos contínuos de retroalimentação de significados (Volóchinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017.). Stella e Brait (2021)STELLA, Paulo Rogério; BRAIT, Beth. Tensão e produção de sentidos em Bakhtin e o círculo. Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, SC, v. 21, n. 1, p. 151-169, jan./abr. 2021. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ld/a/Vgpz5tcH8pPkqR3p3BGfHVy/?lang=pt&format=pdf. Acesso em 13 de dez. de 2023.
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refletem que os sentidos produzidos nos embates sociais em nível global, oriundos de centros geopolíticos dominantes, fomentam aqueles produzidos localmente. Os valores advindos de culturas centrais irradiam e expandem-se para os grupos periféricos, envolvendo-os discursivamente, impondo seus valores e causando transformações nos modos de expressão dos grupos localizados. Tais embates causam tensões entre os valores locais e os importados, geralmente produzindo, por consequência, o apagamento dos valores que circulam “localmente em favor de outros valores que apontam para os centros de poder” (Stella, 2021, p. 157).

Todavia, embora os sentidos produzidos e sustentados por classes dominantes possuam maior poder de controle e agenciamento, sempre haverá forças transgressoras de resistência que promovem uma espécie de desequilíbrio nas forças centrípetas de centralização e dominação, dado que “o signo ideológico é sempre um pouco reacionário” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 113). Diante das orientações ideológicas racistas observadas nos sinais aqui analisados, percebemos como pressurosos, movimentos opositores em resposta às dinâmicas de opressão na e por meio da Libras. Dito isso, destacamos que não está no escopo deste trabalho a proposição de outros sinais em substituição àqueles analisados. Entendemos que este primeiro passo de investigação e identificação de malhas discursivas racistas já incide numa resposta ética em favor de possibilidades de movimentos de resistência e de pressão nas superestruturas.

É apenas mediante o processo de tomada de consciência que podemos elaborar formas de resistir e lutar. A compreensão do funcionamento da linguagem possibilita respostas, uma vez que as formas do enunciado “desempenham o papel essencial na tomada de consciência e na compreensão da realidade” (Medviédev, 2012MEDVIÉDEV, Pável Nikoláievith. Os elementos da construção artística. In: Medviédev, P. N. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma poética sociológica. Trad. Sheila C. Grillo; Ekaterina V. Américo. São Paulo: Contexto, 2012. p.193-207., p.198). Mobilizar a linguagem para discutir as bases das estruturas sociais evoca vozes de resistências, denunciando e expondo formas de sofrimentos (Brait, 2019BRAIT, Beth. Discursos de resistência: do paratexto ao texto. Ou vice-versa?. ALFA: Revista de Linguística, São Paulo, v. 63, n. 2, 2019. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/11452. Acesso em: 10 out. 2023.
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). É um ato político que possibilita o desmonte das perversas formas de violências e homicídios de corpos não-brancos, não-heterossexuais, não-cristãos, não-ricos, entre outros corpos considerados não-padrões. Conforme Brait (2019, p. 257)BRAIT, Beth. Discursos de resistência: do paratexto ao texto. Ou vice-versa?. ALFA: Revista de Linguística, São Paulo, v. 63, n. 2, 2019. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/11452. Acesso em: 10 out. 2023.
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, é por meio da linguagem que os acontecimentos devem ser falados, para que, desse modo, possam ganhar existência, ser compreendidos e combatidos.

É preciso desnaturalizar o olhar construído e condicionado sócio-historicamente pelos poderes dominantes instituídos. É preciso estar alerta, pois “a classe dominante tende a atribuir ao signo ideológico um caráter eterno e superior à luta de classes, apagar ou ocultar o embate das avaliações sociais em seu interior, tornando-o monoacentual” (Volochinov, 2017VOLOCHINOV, Valentin Nikoláievitch. Marxismo e filosofia da linguagem - Problemas Fundamentais do Método Sociológico na Ciência da Linguagem. Tradução, notas e Glossário: Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio Introdutório: Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, [1929] 2017., p. 113). É preciso compreender que os sinais (da Libras e de outras línguas de sinais) também são signos que acompanham e comentam todo ato ideológico. Como apontado aqui, alguns desses sinais aparentemente neutros e de uso comum, carregam e (re)produzem discursos perniciosos que estão a serviço de interesses racistas e da manutenção do status quo. Como lembra Djamila Ribeiro (2019, p. 30), para

pensar soluções para uma realidade, devemos tirá-la da invisibilidade. Portanto, frases como ‘eu não vejo cor’ não ajudam. O problema não é a cor, mas seu uso como justificativa para segregar e oprimir. Vejam cores, somos diversos e não há nada de errado nisso - se vivemos relações raciais, é preciso falar sobre negritude e também sobre branquitude.

Bakhtin (1997, p. 290), há muito nos explica que toda compreensão de um enunciado é sempre acompanhada de uma atitude responsiva ativa e que “cedo ou tarde, o que foi ouvido e compreendido de modo ativo encontrará um eco no discurso ou no comportamento subsequente do ouvinte”. Que possamos, portanto, responder de forma ética e com responsabilidade (Bakhtin, 2017BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2017.), ecoando nossas vozes nos mais longínquos horizontes do tecido social, de modo a provocar rupturas nas estruturas que diariamente violentam e matam identidades e corpos de pessoas negras.

CONSIDERAÇÕES AINDA QUE NÃO-FINAIS

A ancoragem ética deste artigo teve por horizonte a verificação de quais discursos circulam na formação dos sinais em Libras utilizados para designar pessoas negras e brancas. Os encadeamentos verbo-visuais percebidos apontam para valorações distintas entre os sinais, mas com relações dialógicas entre si. A vinculação de pessoas brancas a sentidos de limpeza, pureza e higienismo declara a circulação de discursos de sustentação do racismo, ao posicioná-las em lugares de poder, privilegiados, de conforto e não nomeados, dos quais “se pode atribuir ao outro aquilo que não se atribui a si mesmo” (Piza, 2007, p.71).

Os sinais utilizados para designar pessoas negras, também, respondem aos discursos da branquitude, acionando valores racistas que promovem a construção desse grupo étnico a partir de características estereotipadas e aviltantes. São sinais que alocam pessoas negras e brancas em polos opostos de escassez e privilégios, respectivamente, articulando sofisticadamente elementos lexicais verbo-visuais como formas de associação semântico-objetal (Bakhtin, 2016BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas: Paulo Bezerra. Notas do signo ideológico é sempre um pouco reacionário. São Paulo: Martins Fontes, [1979] 2016.). Se faz diligente compreender que o primeiro lugar de desenvolvimento do poder colonial é a língua (Nascimento, 2019). É na e por meio dela que os sentidos são criados, reiterados e disseminados, construindo o modo como os seres humanos se relacionam e organizam o mundo.

Situados em um posicionamento ético que se propõe a contribuir para os movimentos antirracistas, esperamos que as discussões substanciadas neste artigo possam fomentar pesquisas por-vir, engajados numa luta coletiva de resistência em favor da existência das mais variadas formas de alteridade. Que tenhamos em mente que a língua é um lugar de sofrimento para muitos de nós, e que se desejamos nos mover em prol de um mundo menos desigual, precisamos romper com as estruturas opressoras que nos matam cotidianamente.

Como nos lembra Pistori (2023)PISTORI, Maria Helena Cruz. Racismo e a constituição de um signo ideológico de resistência. Bakhtiniana: Revista de Estudos do Discurso, n. 18, v. 2, p. 98-123, 2023. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/Bakhtiniana/article/view/59610. Acesso em 15 de nov. de 2023.
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, ao posicionar os sujeitos em polos desiguais de poder, estes não são levados de forma passiva, mas são provocados a resistir e a reagir, em resposta aos investimentos de dominação. Desse modo, que mais pesquisas, que mais respostas possam ser dadas em direção ao enfrentamento de atos opressores, seja em Libras ou em qualquer outra língua. Que não sejamos indiferentes às dores que não nos tocam, pois cada um dos nossos atos são singulares e estão sob nossa responsabilidade, o não-álibi no nosso existir é o que constitui a base da nossa existência (Bakhtin, 2017BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Notas sobre literatura, cultura e ciências humanas. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2017.). Mais do que compreender as dinâmicas de poder, é preciso reagir, é preciso disputá-los, e a língua é o espaço dessas lutas, “a língua também cria o sujeito que, ao enunciar o mundo, se enuncia” (Nascimento, 2019, p. 19).

DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA

Os dados públicos utilizados na pesquisa estão disponíveis nos endereços eletrônicos citados, permitindo amplo e irrestrito acesso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    12 Abr 2024
  • Aceito
    18 Jul 2024
  • Publicado
    24 Jul 2024
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