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A soberba e os letrados portugueses do século XVIII

Soberba and the Portuguese Scholars of the 18th Century

La soberbia y los letrados portugueses del siglo XVIII

RESUMO

O artigo investiga as mudanças no campo semântico da palavra “soberba” nas letras portuguesas do século XVIII. Inicialmente, apresento a palavra como conceito religioso presente nas obras de clérigos que publicaram em português na primeira metade do século. Soberba definia o pecado do “anjo mau” que rompeu com a autoridade divina. Na segunda parte, analiso como esse significado religioso foi tratado na produção lexográfica portuguesa ao longo século. Por último, averiguo a presença do termo nos textos que orientaram as reformas educacionais em Portugal, nos quais é possível observar a secularização de seu significado. Porém, o sentido do termo não se alterou completamente: os reformadores se apropriaram da rede de sentidos religiosa tradicional, mas alteraram algumas de suas acepções.

Palavras-chave
soberba; História das Palavras; letrados portugueses; educadores; ética cristã

ABSTRACT

The article investigates changes in the semantic field of the word soberba in Portuguese writing of the eighteenth century. It first presents the word as a religious concept appearing in the works of clerics who published in Portuguese in the first half of the century. Soberba defined the sin of the “bad angel” who broke with divine authority. The article then analyzes how this religious meaning was viewed in the Portuguese lexicographic production throughout the century. Finally, it investigates the presence of the term in the texts that guided the educational reforms in Portugal, in which it is possible to observe the secularization of its meaning. However, the meaning of the term did not change completely: the reformers appropriated the traditional religious network of senses, but altered some of its meanings.

Keywords
Soberba; Word History; Portuguese Scholars; Educators; Christian Ethics

RESUMEN

El artículo investiga los cambios en el campo semántico de la palabra soberbia en las letras portuguesas del siglo XVIII. Inicialmente, presento la palabra como concepto religioso presente en las obras de clérigos que publicaron en portugués en la primera mitad del siglo. Soberbia definía el pecado del “ángel malo” que rompió con la autoridad divina. En la segunda parte, analizo cómo ese significado religioso fue tratado en la producción lexicográfica portuguesa a lo largo del siglo. Por último, investigo la presencia del término en los textos que orientaron las reformas educacionales en Portugal, en los cuales es posible observar la secularización de su significado. Sin embargo, el sentido del término no se alteró completamente: los reformadores se apropiaron del sentido religioso tradicional, pero alteraron algunas de sus concepciones.

Palabras Clave
soberbia; Historia de las Palabras; letrados; portugueses; educadores; ética cristiana

Introdução

As palavras podem ter mais de um sentido dentro do mesmo contexto histórico, mas existe um limite para esse leque de possibilidades e o reconhecimento desse campo semântico limitado viabiliza sua inteligibilidade. Para entender o que os participantes de um contexto estão tentando dizer, parece-me fundamental decifrar a rede de sentidos mobilizada pelos seus discursos. Neste artigo, investigo as redes de sentido da palavra “soberba” nos discursos religiosos e seculares das letras portuguesas do século XVIII. O objetivo é indicar a tendência de ressignificação da palavra do campo discursivo religioso para o laico e, neste último caso, conferindo particular atenção a autores que se aproximaram das Luzes. Privilegiei obras dedicadas à orientação da conduta dos indivíduos, pois definir e evitar o comportamento soberbo foi preocupação importante, seja para os pregadores preocupados com a formação do cristão, seja para os educadores laicos.

Em termos metodológicos, este artigo, em alguma medida, aproxima-se da “histórica dos conceitos” de Reinhart Koselleck (2012)KOSELLECK, Reinhart. Futuro e passado. Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2012.. Mas repito: em alguma medida. Não investigo exatamente um “conceito”, ainda que, no século XVIII, por vezes a palavra portuguesa “soberba” possa aparecer como tal. Para Koselleck, “todo conceito se prende a uma palavra, mas nem toda palavra é um conceito social e político”, pois este “contém uma exigência de generalização” e, ao mesmo tempo, é “polissêmico” e “homogeneizante”. O conceito totaliza as circunstâncias político-sociais e empíricas nas quais a palavra é usada, articulando sua “multiplicidade de significados”. Assim, reúne a diversidade semântica da experiência histórica e as “características objetivas teóricas e práticas em uma única circunstância”. Polissêmico, ele reúne “diferentes totalidades de sentido” (KOSELLECK, 2012, p. 108-109KOSELLECK, Reinhart. Futuro e passado. Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2012.).

A história dos conceitos aborda estados sincrônicos e suas alterações em eixos diacrônicos. Assim, ajuda a decifrar a “duração das experiências passadas”, tornando visíveis as “disjunções entre antigos significados lexicais, referentes a um fato ou circunstância não mais existentes,” bem como novos significados de uma mesma palavra. Avaliando essas diferenças ao longo do tempo, ela evidencia a “estratificação dos significados de um mesmo conceito em épocas diferentes” (KOSELLECK, 2012, p. 114-115KOSELLECK, Reinhart. Futuro e passado. Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2012.).

Exponho essa “estratificação” no caso da palavra “soberba”, colocando em relevo as permanências e continuidades de seus sentidos. Entretanto, no processo de sua ressignificação ao longo do século XVIII português, talvez ela tenha deixado de ter a função totalizante verificável nos discursos religiosos que analisaremos adiante e, inserida na estratégia discursiva dos reformadores educacionais, esteja a serviço de operações intelectuais distintas das do clero de orientação tomista.

Certamente a palavra “soberba” operou como conceito na teologia escolástica, pois reuniu em uma definição precisa a “multiplicidade de significados” atribuída ao pecado “espiritual” do “anjo caído”, o primeiro de todos os pecados. Tinha, portanto, uma importância decisiva para a ética cristã. Entre os reformistas das Luzes portuguesas, no entanto, a palavra integrou as novas estratégias educacionais e, aos poucos, seu sentido teológico rigoroso e homogeneizante diluiu-se. De um pecado terrível (a negação da superioridade e da onipotência divina), “soberba” passou a nomear uma conduta reprovável e politicamente perigosa, mas passível de ser corrigida ou evitada. Então, pôde ser concebida como objeto da nascente “economia geral do poder”, cujas as “tecnologias” (aqui, “tecnologias” educacionais) apresentavam-se como estratégias de controle e condução dos homens (FOUCAULT, 2008, p. 155-165FOUCAULT, Michel. Segurança, território, população. Curso dado no Collège de France (1977-1978). São Paulo: Martins Fontes, 2008.). Ainda que continuasse a comportar acepções derivadas do conceito teológico, a palavra foi cada vez mais utilizada para designar condutas potencialmente ameaçadoras para a ordem monárquica. O uso da palavra “soberba” é uma das veredas pelas quais podemos pensar como as novas “tecnologias” educacionais do século XVIII assimilaram e ressignificaram as estratégias de formação da conduta do clero católico.

Soberba na ética cristã

A soberba foi tematizada pela ética cristã desde os primórdios do cristianismo. Contudo, para evitar uma digressão extensa, pretendo apenas apresentar algumas referências da presença da soberba no pensamento cristão.

Tomás de Aquino (1225-1274) utiliza a palavra com rigor, contribuindo para transformá-la em conceito, ou seja, reúne sua polissemia semântica em uma totalidade de sentido. Na questão 63 da primeira parte da Suma teológica, examina o pecado e a queda do “anjo mau” (o diabo). Como todas as criaturas racionais, ele pode pecar. Peca-se de duas maneiras: inclinando-se para uma coisa má, por ignorância ou erro, ou escolhendo “algo bom em si, mas não ordenado à devida medida ou regra”. O anjo peca dessa segunda maneira, pois sua “natureza espiritual não se afeiçoa aos bens próprios do corpo, mas só aos que podem ser encontrados nos espíritos”. Ele erra não porque sua vontade o conduz para o que não é um verdadeiro bem, inferioridade inconcebível para os anjos, mas porque tenta alcançar o bem desconsiderando os desígnios de Deus. O “primeiro pecado” do “anjo mau” é a soberba, ou seja, “não se submeter ao superior naquilo que lhe é devido” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. II, p. 239-240TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). Veremos que a conceituação da Suma teve enorme relevância no contexto português e, provavelmente, em toda a Europa cristã.

Mas qual foi a condenável insubmissão do “anjo mau” e que bem buscava? Ele pretendeu “ser como Deus por semelhança (per similitudinem)”. Não há pecado quando um ser racional deseja ser semelhante a Deus “segundo a devida ordem, isso é, tê-la de Deus” pela “graça”. Peca-se, porém, quando se quer essa semelhança “como por virtude própria (quasi propria virtute), e não pela virtude de Deus”. O fim pretendido, a “bem-aventurança” de assemelhar-se a Deus, é de fato um bem; o erro do “anjo mau” não está aí. O pecado encontra-se na soberba de chegar à “bem-aventurança (...) pelas próprias forças, desviando seu desejo da bem-aventurança sobrenatural, que é dada pela graça de Deus” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. II, p. 242-243TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). Nota-se que o problema não se encontra no objetivo de ser semelhante ao Pai Eterno, mas na tentativa de alcançar isso de modo independente, sem auxílio ou consentimento divino. Enfim, “o pecado dos demônios foi a soberba (superbia), cujo motivo é a grandeza (cuius motivum est excellentia)” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. II, p. 251TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). Na tradição escolástica, a soberba caracteriza-se pelo desejo de autonomia absoluta.

Na questão 162 da segunda seção da parte II, a Suma retorna à temática, evidenciando sua importância ética e teológica. Com precisão, define a soberba como “pretender, por vontade própria, pôr-se sobre aquilo que é”, o que contraria a “reta razão”, para qual cada um deve “buscar o que lhe é proporcional”. O soberbo deseja assemelhar-se a Deus “de maneira perversa” e sem reconhecer a igualdade aos outros homens (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. VII, p. 401-402TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). O soberbo entrega-se ao “apetite desordenado da própria excelência (inordinatus appetitus propriae excellentiae)” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. VII, p. 404TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.), pois ambiciona todos os bens (materiais e simbólicos) do mundo terreno e, assim, glorificar-se independente do reconhecimento divino. Conforme salienta Tomás de Aquino em outras passagens, a soberba é o primeiro dos pecados ou até mesmo o “mais grave” deles, “pois nos outros pecados o homem se afasta de Deus” por ignorância ou fraqueza, mas quando é soberbo, o pecador “não quer se submeter a Ele e à sua lei” – “é o desprezo de Deus” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. IV, p. 451-452TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). Com maior frequência, esse erro diabólico manifesta-se em “pessoas eminentes e principais” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. VII, p. 414-415TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.). Enfim, soberba é “a rainha de todos os vícios” (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. VII, p. 419TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.).

A Suma também opõe a soberba à humildade, virtude que consiste em reprimir “o apetite para que ele não busque grandezas além da reta razão”, ou seja, não almeje “coisas superiores a nós” e se mantenha restrito às possibilidades da condição humana (TOMÁS DE AQUINO, 2013, v. VII, p. 385-389TOMÁS DE AQUINO. Suma teológica. Edição bilíngue. São Paulo: Loyola, 2013. 8 v.).

A Suma teológica orientou por muito tempo os autores católicos, mesmo quando seus objetivos eram distintos dos de Tomás de Aquino. Sem esclarecer as referências tomistas, é difícil compreender as conexões semânticas que interessam a este estudo. A partir delas, ampliam-se as possibilidades de bem interpretar a palavra. Partindo da conceituação tomista, vejamos alguns exemplos de como o tema aparece no universo clerical português.

Expressivo autor oratoriano de textos piedosos, Manuel Bernardes (1644-1710) tratou da soberba em contexto histórico e linguístico bem distinto do da Suma teológica, mas sem abandonar as referências tomistas. Não se encontra em Bernardes a preocupação com definições conceituais. Suas obras procuram contribuir para as meditações religiosas e orações dos leitores, visando a salvação de suas almas e a consciência dos próprios pecados. Oferecem narrativas e reflexões que visam orientar o cristão e favorecer a edificação moral. Bernardes parece afinado com a piedade mais pessoal posterior ao século XVI (LEBRUN, 1991LEBRUN, François. As Reformas: devoções comunitárias e piedade pessoal. In: ARIÈS, Philippe; CHARTIER, Roger (Org.). História da vida privada: da Renascença ao século das Luzes. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. v. 3. p. 71-111.). Ele segue a ortodoxia tomista com o objetivo de expurgar da vivência espiritual dos fiéis os traços de heresia (SARTIN, 2013SARTIN, Philippe Delfino. A tentação e a contemplação: Manuel Bernardes (1644-1710) e o Oratório de Lisboa. 2013. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013. Disponível em: https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/113/o/D2013-36.pdf. Acesso em: 18 abr. 2024.
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). Para tal, narra casos que sirvam de exemplos morais.

Publicado em 1730, após a morte do autor, Estímulo prático para servir o bem e fugir do mal apresenta, entre outras narrativas edificantes, a vida de uma religiosa que, a princípio muito casta, desdenhava Maria Madalena e seus pecados carnais. Todavia, acabou por se entregar cegamente a um “amor profano” e saiu do mosteiro, levando uma vida pouco honrosa desde então. Ainda quando religiosa, sem nenhuma humildade, ela fazia pouco da santa e acabou por se desgraçar. Bernardes define seu infeliz percurso como um “exemplo” de como o “vício da soberba espiritual” pode nascer de “todas as virtudes”, em especial da castidade: “como o casto se vê livre de uma servidão, que a tantos têm presos, presume de si como de anjos, e designa-se de outros como de brutos” (BERNARDES, 1730, p. 64BERNARDES, Manoel. Estimulo pratico para seguir o bem, e fugir do mal. Exemplos selectos das virtudes, e vicios ilustrados com reflexoens. Lisboa: Antonio Pedrozo Galram, 1730.). A soberba aparece como pecado cuja gravidade é mais difícil de ser notada do que a dos pecados carnais (como os de Maria Madalena), pois muitas vezes nasce de virtudes que se pervertem em vícios.

Não vou explorar a curiosa conexão estabelecida por Bernardes entre soberba e luxúria, o que nos levaria a uma longa digressão. Limito-me a notar como a soberba está, assim como em Tomás de Aquino, associada ao desejo de “excelência”, a princípio virtuoso, mas que se manifesta de modo desordenado e acaba por provocar a exaltação viciosa da própria virtude. Como vimos, trata-se do pecado dos altivos e insubmissos: “pela soberba o homem se rebela contra Deus, e não reconhece como superior, naquele tanto que se ensoberbece” (BERNARDES, 1730, p. 67BERNARDES, Manoel. Estimulo pratico para seguir o bem, e fugir do mal. Exemplos selectos das virtudes, e vicios ilustrados com reflexoens. Lisboa: Antonio Pedrozo Galram, 1730.). Quebra-se, assim, a ordem e a hierarquia divinas, possibilitando a perversão da virtude em vício. Da desventura da religiosa, Bernardes (1730, p. 69)BERNARDES, Manoel. Estimulo pratico para seguir o bem, e fugir do mal. Exemplos selectos das virtudes, e vicios ilustrados com reflexoens. Lisboa: Antonio Pedrozo Galram, 1730. retira uma importante lição: “menos aborrece Deus a um pecador humilde (como Maria Madalena), do que a um casto soberbo” – o primeiro acaba por se submeter à ordem divina e reconhece os próprios erros, enquanto o segundo, a princípio honorável, comete pecado pior ao se rebelar contra a supremacia do Pai Eterno. Madalena obteve a “graça” de Deus, a verdadeira fonte da bem-aventurança, enquanto a infeliz soberba tinha apenas méritos vulneráveis e frágeis, como revelou seu percurso.

Outro autor de obras piedosas que tratou do tema foi o jesuíta piemontês Alexandre Perier (1651-1736), que atuou como missionário na América portuguesa e teve seu Desengano dos pecadores publicado em português em 1724. A repercussão do livro foi considerável em Portugal e recebeu outras edições ao longo do século XVIII (DILLMANN; FLECK, 2015DILLMANN, Mauro; FLECK, Eliane. “O demônio não é tão feio como se pinta”: representações do inferno e dos demônios na obra Desengano dos pecadores, do padre Alexandre Perier (1724). Diálogos (On-line), Maringá, v. 19, n. 3, p. 1161-1191, 2015. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/Dialogos/article/view/33736. Acesso em: 18 abr. 2024.
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). Perier não enfatizou a oração como Bernardes, mas seu texto também pode ser considerado um manual de devoção cujo principal objetivo era conduzir os fiéis à salvação. Para tal, ele insistiu na observância de condutas e princípios morais recomendados pela Igreja após o Concílio de Trento. O jesuíta alinha-se com os autores que, desde o século XV, atemorizam os fiéis com as terríveis punições infernais dos pecadores resistentes às prédicas clericais (DELUMEAU, 2009DELUMEAU, Jean. História do medo no Ocidente, 1300-1800. Uma cidade sitiada. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.). Seu texto visa mais o medo do que a consolação. Para salvar a alma, segundo o autor, era indispensável arrepender-se dos erros (DILLMANN; FLECK, 2014DILLMANN, Mauro; FLECK, Eliane. Escrita, práticas de leitura e circulação de manuais de devoção entre Portugal e Brasil nos séculos XVIII e XIX. História, histórias, Brasília, v. 2, n. 4, p. 44-60, 2014. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/hh/article/view/10808. Acesso em: 18 abr. 2024.
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).

Como era comum na literatura religiosa do período, o jesuíta piemontês apresenta a soberba como a “origem de todas as maldades”. Em capítulo inteiramente dedicado à “tormenta dos soberbos”, ele instrui o leitor sobre o caráter e os riscos desse pecado, que estão entre as piores ameaças para a salvação da alma. Seguindo uma longa tradição, define a soberba como “não reconhecer a Deus por soberano” ou “querer mostrar-se independente Dele” (PERIER, 1724, p. 165PERIER, Alexandre. Desengano dos pecadores, necessario a todo genero de pessoas, utilissimo aos missionarios e aso pregadores desenganados, que só desejam a salvacaõ das almas. Roma: António Rossis, 1724.). É fácil identificar a proximidade com a definição tomista. Perier considera que qualquer cristão pode reconhecer e abominar o erro de rebelar-se contra o Criador. No entanto, há uma forma de comportamento soberbo mais difícil de ser reconhecida e muito frequente entre os cristãos: “querer continuar pecando (referindo-se a outros pecados), com uma falsa confiança de que Deus não lhe faltará com o tempo de se confessar e poder fazer penitência”, o que é “presunção diabólica” (PERIER, 1724, p. 166PERIER, Alexandre. Desengano dos pecadores, necessario a todo genero de pessoas, utilissimo aos missionarios e aso pregadores desenganados, que só desejam a salvacaõ das almas. Roma: António Rossis, 1724.). Por que “diabólica”? Porque é semelhante à presunção de Lúcifer no momento de sua queda. Ele, “um espírito angélico”, “não duvidava da onipotência de Deus e da sua sabedoria infinita”, mas considerando-se a criatura “mais nobre, mais perfeita de todas”, formulou a quimérica ideia de que, sendo o Pai Eterno bom e misericordioso, “consentiria de tê-lo como igual no trono para sempre”, ou seja, presumiu que a bondade divina o livraria de qualquer punição. Da mesma maneira procede o pecador quando, confiando na bondade e na misericórdia divinas, “se arroja a pecar” na esperança de ser perdoado quando da confissão e da penitência (PERIER, 1724, p. 168-170PERIER, Alexandre. Desengano dos pecadores, necessario a todo genero de pessoas, utilissimo aos missionarios e aso pregadores desenganados, que só desejam a salvacaõ das almas. Roma: António Rossis, 1724.). O soberbo, nesse caso, não se limita a desafiar a autoridade do Senhor, mas também abusa de sua bondade, acreditando ser possível salvar a alma apenas com o gesto derradeiro de arrependimento, ou seja, projeta ludibriar o Juiz celestial e errar sem graves consequências.

Como Perier admite, essa representação da queda do anjo inspira-se no texto de Bernardo de Claraval (1090-1153), Os graus da humildade e da soberba. Ao tratar do “primeiro grau” da soberba, a curiosidade, Bernardo apresenta uma digressão sobre as razões que levaram Lúcifer, um anjo dotado de sabedoria, a ofender a Deus e tentar se igualar a Ele. Obviamente Lúcifer sabia que seus pensamentos e atos não podiam ser ocultados do Todo-Poderoso, mas concebeu que “Ele não quer nem pode ser privado de sua bondade, assim tampouco pode querer vingar-se do mal”. Maliciosamente, tentou abusar da “doçura divina”. Nisto se enganou, pois Deus é “doce e justo a uma só vez” e “a autêntica bondade funda-se na justiça, não na fraqueza”, não admitindo ser ofendida. Lúcifer foi punido, pois “sem a justiça a doçura não é virtude” (BERNARDO DE CLARAVAL, 2016BERNARDO DE CLARAVAL. Os graus da humildade e da soberba. Porto Alegre: Concreta, 2016.). Em Bernardo de Claraval, a soberba do “anjo mau” corresponde à malícia de pretender utilizar a benevolência do Criador contra sua soberania, produzindo um dilema pretensamente insolúvel capaz de neutralizar sua justiça. Não se trata apenas de rebeldia, mas também de perversidade e traição, pois recorre ao angelical conhecimento a respeito do caráter divino – uma “graça”, sem dúvida – para subverter a ordem suprema. Sua detestável malícia é comparável, portanto, às artimanhas daqueles que pensam em fazer dos sacramentos relativos à morte um álibi para pecar.

O curioso é que Perier, recorrendo à chave de leitura oferecida por Bernardo de Claraval, compara a relação Deus/pecador com a relação rei/súdito, conferindo sentido político para o comportamento soberbo. O pecador e Lúcifer, como vimos, abusam maliciosamente da bondade divina: mesmo reconhecendo seus pecados, continuam a pecar, presumindo o perdão divino. Ora, tal presunção seria como a do vassalo “que se atreve a afrontar a pessoa real de seu príncipe fiando na proteção de um seu patrono, que tem por seu amigo, que é valido e pode muito com o seu rei”. Esse vassalo malicioso desconsideraria que na corte há muitos cortesãos “com a mesma graça, favor e valimento e, estes como ofendidos e zelosos da honra do seu rei, logo se faziam vossos inimigos declarados, e lhe pediam se esquecesse da sua misericórdia, e triunfasse exemplarmente semelhante presunção e atrevimento” (PERIER, 1724, p. 173PERIER, Alexandre. Desengano dos pecadores, necessario a todo genero de pessoas, utilissimo aos missionarios e aso pregadores desenganados, que só desejam a salvacaõ das almas. Roma: António Rossis, 1724.). Como Deus, o rei não pode perdoar o súdito que premeditadamente erra contando com sua misericórdia, pois não deve permitir que a perversidade dos maus ofenda o poder soberano e a dignidade dos outros súditos. O poder, seja terreno ou divino, se desonrado pela malícia, deve aplicar a justiça que lhe serve de fundamento. Na formulação de Perier, a bondade e a misericórdia do soberano, como pregou Bernardo, jamais devem ameaçar a observância dessa justiça.

Nesses textos piedosos, o conceito tomista de soberba é decisivo para definir a rede de sentidos relativa ao termo, uma vez que conecta suas diferentes possibilidades de utilização discursiva. A palavra-conceito define a recusa em aceitar a submissão ao Criador. Na busca desordenada da própria “excelência”, o soberbo acredita que pode enfrentar Deus ou manipulá-Lo. Já quem aceita a sua superioridade expressa o verdadeiro amor que conduz à salvação. Os seres, por mais “excelentes” que possam ser, dependem da “graça divina” e precisam aceitar sua condição inferior sem rebeldia.

Admitida a importância da conceituação tomista, é possível ir um pouco além na interpretação e notar um aspecto fundamental dessa rede de sentidos: o autocontrole é compreendido como fator decisivo para evitar a soberba e manter a necessária submissão que viabiliza a própria salvação, o objetivo para o qual foram escritos os textos analisados até aqui. Autocontrole, nesse caso, não significa a afirmação da autonomia do sujeito, livre na condução dos destinos do mundo e de si mesmo. É antes o autocontrole daquele que se investiga o tempo todo para descobrir a raiz do pecado em seu mundo interior. Trata-se de seguir o Pastor divino, acompanhar seus passos e recusar a tentação da completa autonomia. Para os autores até aqui citados, não basta observar por hábito as regras da ética cristã, pois a soberba, como alerta Bernardes, pode derivar das virtudes. Somos imperfeitos, sempre vulneráveis aos vícios; portanto, a investigação permanente de si, a consciência dos próprios erros e o arrependimento são indispensáveis para o cristão conquistar a salvação. Conhecendo-se e vigiando-se, ele aceitará sua dependência da “graça divina” e a submissão ao Senhor.

As definições a respeito da soberba presentes nos autores cristãos não apenas ajudam a elucidar o imaginário religioso do período, mas também oferecem um conjunto de indicações relativas às relações de poder e ao autocontrole – que, como veremos nas próximas páginas, foram apropriadas pelos educadores portugueses preocupados com a formação de cidadãos capazes de bem servir ao Estado. Domar a própria vontade em favor do poder soberano aparece nesses educadores como virtude essencial para a reforma e o sucesso da monarquia. Podemos identificar nesse preceito um ponto de intersecção entre a ética cívica e a religiosa. Antes de abordar essa apropriação, verifiquemos nos principais trabalhos lexográficos portugueses do século XVIII como a palavra é tratada. Talvez eles ofereçam alguns indícios de como se operou a migração da rede de sentidos do universo sagrado para o profano.

Soberba na produção lexográfica

Vimos que a soberba aparece em textos de orientação tomista como um pecado capaz de suscitar todos os outros. Um conceito de tanta importância não poderia deixar de estar presente nos dois grandes trabalhos lexográficos daquele século: o Vocabulário portuguez e latino de Raphael Bluteau (1638-1734), que veio a público em dez volumes in folio entre 1712 e 1728 (incluindo os dois “suplementos”), e o Diccionário da língua portuguesa de Antônio Morais Silva (1755-1824), lançado em dois volumes em 1789, mas com várias edições ao longo do século XIX. Para o historiador, o dicionário é um “objeto discursivo” produzido por “práticas reais em determinadas conjunturas sociais”. Isso implica considerar as palavras dicionarizadas como “resultantes de relações sociais e históricas” por vezes polêmicas e contraditórias. O dicionarista não apenas seleciona as palavras a serem dicionarizadas, ele também produz um discurso sobre elas a partir de sua perspectiva da realidade e de sua posição social (NUNES, 2010NUNES, José Horta. Dicionários: história, leitura e produção. Revista da Universidade Católica de Brasília, Brasília, v. 3, n. 1/2, p. 6-21, 2010.).

Antes de avançar, é necessário salientar que, além da referência religiosa, outras tradições discursivas também interferem na rede de sentidos da palavra. Destaco a frequente menção à soberba de Lúcio Tarquínio, último rei da Roma pré-republicana, a quem Tito Lívio dedicou algumas páginas em sua obra clássica (Ab urbe condita libri). Bluteau (1720, v. VII, p. 671-759BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Lisboa: Pascoal da Sylva, 1716-1721. 4 v.)1 1 A paginação dos volumes do Vocabulário é complexa. Nos quatro primeiros tomos publicados em Coimbra em 1712 e 1713, a numeração das páginas não se inicia no começo de cada volume: para cada letra, abre-se uma nova contagem. O volume III, por exemplo, tem uma paginação para as palavras iniciadas com a letra D e outra para as da letra E. Nos quatro últimos tomos, impressos em Lisboa entre 1716 e 1721, verifica-se uma única numeração para cada tomo. , por exemplo, citou Tarquínio como modelo de monarca soberbo. Tito Lívio, entre os parágrafos 47 e 59 do livro I, caracterizou o personagem como governante de “ambição desenfreada”, capaz de cometer os piores crimes para conquistar e manter o poder. Governava sem respeitar as leis e atemorizava constantemente os súditos (TITO LÍVIO, 1989TITO LÍVIO. História de Roma. São Paulo: Paumape, 1989. 2 v.). Apesar de admitir a importância da referência latina, neste artigo não terei espaço para tratá-la. Meu foco é outro: como a palavra adjetiva a rebeldia à autoridade divina ou civil. Convém assinalar, no entanto, como ela também pode representar a ambição excessiva do tirano.

Seguindo o modelo dos grandes dicionários franceses do final do século XVII (de Louis Moreri e Antoine Furetière), Bluteau combina a informação linguística com a enciclopédica em busca de uma “representação satisfatória dos diversos domínios do léxico”. No caso, “o dicionário deve ser como o índice de uma biblioteca, não apenas porque serve para decodificar a língua escrita, mas porque é uma súmula autorizada do conhecimento”. Devido a esta “orientação enciclopédica”, a palavra-lema de cada verbete “é entendida como pretexto para evocação de realidades e fatos, por vezes com relações remotas e circunstanciais” (SILVESTRE; VERDELHO, 2007, p. 153-155SILVESTRE, João Paulo; VERDELHO, Telmo. Dicionarística portuguesa. Inventário e estudo do patrimônio lexicográfico. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2007.). Ao longo da obra, Bluteau nem sempre é original e se apropria de autores que considera “autoridades” em cada campo do saber.

Clérigo da Ordem dos Teatinos, censor do Santo Ofício e, ao mesmo tempo, frequentador do ciclo cartesiano dos Condes de Ericeira durante o reinado de Dom João V, Bluteau não ignorava os progressos científicos do período, mas ao tratar de temas espinhosos, nunca superou os limites definidos pela Contrarreforma Católica. Concedendo muito espaço para a erudição humanista, teológica e filosófica, ele escreveu para a elite culta de Portugal, com quem conviveu em academias literárias, nas quais a regra era observar os consagrados preceitos de retórica e o tom moralizante das pregações religiosas. O Vocabulário, em boa medida, ofereceu recursos para a composição literária característica de ambientes como a Academia Real de História (criada em 1720) e os círculos eruditos que a precederam. Veremos que há uma considerável afinidade entre os sentidos da palavra “soberba” presentes no Vocabulário e nos textos religiosos analisados até aqui.

No trabalho de Bluteau, a soberba é definida como a “demasiada estima” que o homem tem de si mesmo, recusando-se a sujeitar-se a Deus, pois entende que tudo obteve apenas por seus próprios “merecimentos”. É um vício comum entre os “grandes” e um pecado que conduziu o “maior dos anjos” à queda. O soberbo “a si próprio adora” (BLUTEAU, 1720, v. VII, p. 670BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Lisboa: Pascoal da Sylva, 1716-1721. 4 v.). O verbete “Soberba”, como se pode notar, acompanha em grande medida os textos dos clérigos portugueses. Em ambos os casos, o pecado do soberbo conecta-se com a arrogância e a insolência. “Insolente”, no Vocabulário, é alguém “arrogante, soberbo” (BLUTEAU, 1713, v. VI, p. 149BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1713. 4 v.). “Arrogante”, por sua vez, é o “soberbo estimador de si próprio” que concebe “as coisas próprias maiores do que são” (BLUTEAU, 1712, v. I, p. 567BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1713. 4 v.). Como na tradição tomista, o soberbo atribui valor descabido para suas virtudes e seus méritos. Assim, acaba desafiando o superior a quem deve obedecer, como Lúcifer desafiou Deus. Segundo o verbete “Diabo”, o “peso de sua soberba” o fez cair no Inferno (BLUTEAU, 1713, v. III, p. 199BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1713. 4 v.). Apesar de comportar certa ambiguidade, pois também está associada a palavras menos pejorativas (“altivez”, por exemplo), a rede de sentido do termo implica na denúncia do vício daqueles que, vaidosamente, se recusam a aceitar a autoridade superior. O soberbo, segundo esses discursos, coloca sua própria dignidade acima de qualquer ordem soberana, seja ela divina ou terrena. Enfim, o teatino desenha uma rede de sentidos para a palavra muito similar àquela expressa pelos textos piedosos.

Por outro lado, no Dicionário de Antônio Morais Silva, publicado décadas após a obra de Bluteau, não se verifica a mesma similaridade. Morais Silva nasceu no Rio de Janeiro e estudou em Coimbra, onde teve problemas com a Inquisição no final da década de 1770. Fugiu de Portugal e retornou nos anos 1780. Mais tarde, instalou-se em Pernambuco como senhor de engenho de açúcar. Nesse ponto, já havia publicado a primeira versão do Dicionário em 1789, obra que teve várias edições (MURAKAWA , 2006MURAKAWA, Clotilde. Léxico e gramática no Dicionário da língua portuguesa (1813) de António Morais Silva. Alfa, São Paulo, v. 50, n. 2, p. 55-67, 2006. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/download/1411/1112/3766. Acesso em: 18 abr. 2024.
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).

Segundo especialistas, Bluteau foi considerado “a grande fonte da dicionarística moderna do português” (SILVESTRE; VERDELHO, 2007, p. 178SILVESTRE, João Paulo; VERDELHO, Telmo. Dicionarística portuguesa. Inventário e estudo do patrimônio lexicográfico. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2007.), mas o Dicionário de Morais Silva renovou a lexicografia ao abandonar a perspectiva enciclopédica do Vocabulário e eliminar “a generalidade dos termos de história antiga, geografia e mitologia”. Morais Silva contrariou a “tendência cumulativa” e enciclopédica perceptível no Vocabulário, privilegiando a facilidade de manuseio do livro e a concisão dos verbetes: “perde-se o pendor didático das explicações, apresentando apenas exemplos para clarificar a definição, sem o intuito de servir de modelo para a escrita” (SILVESTRE; VERDELHO, 2007, p. 178SILVESTRE, João Paulo; VERDELHO, Telmo. Dicionarística portuguesa. Inventário e estudo do patrimônio lexicográfico. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2007.). Trata-se de uma obra funcional, sem as muitas referências eruditas do trabalho de Bluteau. Devido a essa característica, suas entradas sobre a rede de sentidos que nos interessa são, em geral, mais curtas e com menor número de referências à tradição literária e lexográfica.

Para compreender melhor as diferenças entre as duas obras, convém lembrar o contexto em que se insere o Dicionário de Morais Silva, o que também contribui para a análise dos textos educacionais analisados adiante. Na segunda metade do século XVIII, Pombal ensaiou uma significativa reforma do ensino público em Portugal, com a criação de aulas régias destinadas ao ensino das primeiras letras. Com diversas iniciativas em vários pontos do Império, o ministro pretendeu padronizar o currículo e controlar a educação, incluindo obviamente o ensino do português (BOTO, 2017BOTO, Carlota. Instrução pública e projeto civilizador: o século XVIII como intérprete da ciência, da infância e da escola. São Paulo: Ed. Unesp, 2017.). A título de exemplo, lembremos que foi proibido o ensino da “língua geral” aos indígenas – amplamente utilizada pelos jesuítas – para impor o aprendizado da língua portuguesa (ALMEIDA, 2008ALMEIDA, Anita Lima de. Aulas régias no império colonial portugués: o global e o local. In: CARMO, Laura do; LIMA, Ivana (Org.). História social da língua nacional. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2008. p. 65-90.). É possível afirmar que o ensino do português se transformou em questão de Estado: “o que a reforma teria buscado seria uma adaptação da palavra às novas necessidades” de Portugal (ALMEIDA, 2008, p. 74, grifo da autoraALMEIDA, Anita Lima de. Aulas régias no império colonial portugués: o global e o local. In: CARMO, Laura do; LIMA, Ivana (Org.). História social da língua nacional. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2008. p. 65-90.). As ações do ministro, especialmente após a expulsão dos jesuítas em 1759, respondiam, em alguma medida, às inquietações de letrados reformistas de meados do século (OSTHUS, 2006OSTHUS, Dietmar. “Como fazem as outras nações cultas e polidas”. O discurso normativo, as normas linguísticas e as Luzes. In: THIELMANN, Werner (Org.). Século das Luzes: Portugal e Espanha, o Brasil e a região do Rio da Plata. Frankfurt: Teo Ferrer de Mesquita, 2006. p. 53-66.).

Nota-se essas inquietações na primeira carta de Luís Antônio Verney (1713-1792) presente no Verdadeiro método de ensinar. Publicado em 1746, antes da ascensão de Pombal ao ministério, o texto, para escândalo dos críticos, propunha que o ensino da gramática portuguesa deveria anteceder o estudo do latim. “Referência teórica do pombalismo”, Verney “reputava como fundamental uma reforma que abrangesse, em Portugal, todo gênero de estudos” (BOTO, 2007, p. 100-101). O ensino de português e de sua gramática ocupa posição estratégica na obra. Em polêmica com os jesuítas, salientava que aprender bem a própria língua deveria ser o “princípio de todos os estudos” (VERNEY, 1746, v. I, p. 8VERNEY, Luís António. O verdadeiro metodo de estudar para ser útil à Republica e à Igreja. Valença: António Balle, 1746. 2 v.). Para ele, ensinar gramática a partir do latim, como nas escolas da Companhia de Jesus, parecia absurdo.

É de particular interesse para entender o contexto no qual se insere o Dicionário de Morais as observações do Verdadeiro método sobre ortografia. A língua portuguesa, segundo o texto, estava sendo “purgada” de suas imperfeições desde a Renascença. Assim, não era recomendável sempre seguir o que diziam os autores antigos sobre as palavras e as estruturas gramaticais (VERNEY, 1746, v. I, p. 43-46VERNEY, Luís António. O verdadeiro metodo de estudar para ser útil à Republica e à Igreja. Valença: António Balle, 1746. 2 v.). No sentido de contribuir para esse aperfeiçoamento do português, Verney critica o Vocabulário de Bluteau. Apesar de saudar a obra como um “grande serviço” aos portugueses, parece-lhe necessário corrigir seus dois “defeitos” principais: 1) não evidencia um “método”, pois as entradas são muito longas, apresentam várias alternativas de grafia das palavras e se perdem em digressões eruditas nem sempre úteis aos leitores jovens ou pouco instruídos; 2) Bluteau é “muito medroso”, hesita diante das opiniões divergentes dos principais autores do passado e se justifica demais. Assim, Verney aconselha a composição de outro dicionário mais fácil de utilizar, que evite longas explicações e “citações supérfluas”. A nova obra deve distinguir as palavras “boas”, “purgadas” pelo aperfeiçoamento da língua, das “plebeias e antigas”, dicionarizando apenas as primeiras. Bluteau, ao contrário, “ajuntou tudo” e seu trabalho “não ensina a falar bem português” (VERNEY, 1746, v. I, p. 55-58VERNEY, Luís António. O verdadeiro metodo de estudar para ser útil à Republica e à Igreja. Valença: António Balle, 1746. 2 v.).

Em Bluteau, falar bem o português significava reproduzir um modelo discursivo que oferecesse um cabedal de informações e fórmulas necessárias no mundo cortesão e clerical. Seu trabalho lexicográfico era dirigido ao erudito de posição social elevada, de quem se esperava o domínio das referências humanistas e cristãs tradicionais. Daí o caráter enciclopédico de seu Vocabulário. Começando a projetar a expansão da educação em Portugal, Verney preocupava-se com os jovens estudantes que precisavam aprender a escrever com clareza e objetividade, preparando-se para o cumprimento de múltiplas funções sociais. Ele não pensava em uma educação universal igualitária: sua proposta de dicionário não visava apenas os letrados da corte e da alta hierarquia da Igreja, mas sim a formação de “homens que sejam úteis para a República e Religião” (VERNEY, 1746, v. I, p. 1VERNEY, Luís António. O verdadeiro metodo de estudar para ser útil à Republica e à Igreja. Valença: António Balle, 1746. 2 v.). Para tal, a utilidade deveria substituir a inculcação de modelos éticos e estéticos tradicionais. Em vista desses novos objetivos, o acúmulo de sofisticadas referências eruditas seria descartado em favor da brevidade, do acesso fácil e preciso ao significado das palavras. Enfim, Verney projetava um dicionário mais adequado ao novo programa de ensino estatal e menos comprometido com a prédica moralizante do clero tomista.

Em alguma medida, o esboço de dicionário do Verdadeiro método de ensinar encontra sua efetivação no Dicionário de Morais Silva. Neste último, as entradas são bem mais curtas do que as de Bluteau, o que possibilita a rápida compreensão do sentido das palavras. As referências e exemplos para explicá-las diminuem consideravelmente. Morais Silva “deixa de apresentar os comentários etimológicos e enciclopédicos de Bluteau e passa a mostrar formulações breves, características de um dicionário de língua” (NUNES; SELIGMAN, 2003, p. 38NUNES, José Horta; SELIGMAN, Kátia. Discurso lexicográfico: as reedições do Dicionário da língua portuguesa de Morais. Alfa, São Paulo, v. 41, n. 1, p. 37-51, 2003. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/4231. Acesso em: 18 abr. 2024.
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).

Como exemplo, comparemos as entradas de “soberba” nas duas obras. Bluteau utiliza mais de 400 registros lexográficos (incluindo palavras, abreviações e números), enquanto Moraes Silva apresenta apenas 38! O texto do primeiro inclui duas citações em latim, algo inexistente no segundo, no qual consta apenas uma breve citação de Camões. Bluteau, como vimos, relaciona o “anjo mau” ao pecado da soberba, ao passo que Morais Silva não faz nenhuma referência a temáticas religiosas. Na entrada do Dicionário não há nada parecido com a breve história de cunho moral narrada no Vocabulário: certo doutor da Sorbone, tendo se ensoberbado com os aplausos recebidos por suas teses sobre a “Encarnação do Verbo”, foi castigado com a terrível perda de memória que o fez esquecer até das palavras do Padre Nosso (BLUTEAU, 1720, v. VII, p. 670BLUTEAU, Raphael. Vocabulário portuguez e latino. Lisboa: Pascoal da Sylva, 1716-1721. 4 v.). A redação do verbete de Bluteau acompanha a estratégia discursiva clerical acima analisada e define a palavra como grave desvio moral. Em Morais Silva, observa-se uma espécie de secularização, na qual o vínculo da palavra com a semântica cristã não é explicitamente recusado, mas a temática do pecado desaparece. Soberba é definida como “elevação, altura da coisa que fica superior a outra”, mas também exprime “orgulho, presunção, arrogância, vanglória” (SILVA, 1789, v. II, p. 406SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). Nenhuma alusão ao “anjo mal” e aos seus erros. Por sua vez, nas entradas “Diabo” e “Diabólico”, nenhuma reminiscência remete à soberba (SILVA, 1789, v. I, p. 434SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.).

Existe, contudo, certa semelhança entre as definições dos dois autores. Em ambos, a palavra indica o vício daqueles que ostentam uma superioridade insubmissa e “insolente” (SILVA, 1789, v. I, p. 724SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). O verbete “Arrogância”, em Morais Silva, acentua essa semelhança ao apresentar o vocábulo como sinônimo de soberba e definir o termo como “ação de arrogar-se, atribuir-se o que não pertence” (SILVA, 1789, v. I, p. 121SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). De maneira menos enfática, a passagem do verbete “Arrogância” do Dicionário indica um aspecto da rede de sentidos também presente no Vocabulário de Bluteau: a conexão entre soberba e a percepção enganosa de si mesmo, ou seja, ela nomeia um juízo distorcido sobre as próprias qualificações. Capta-se essa conexão no verbete “Brio”: brioso é “o soberbo, vaidoso”, “o que tem vaidade e soberba como fundamento ridículo” (SILVA, 1789, v. I, p. 198-199SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). A imodéstia despropositada leva a comportamentos risíveis. “Bufar” é um ato ridículo de “soprar, inchando as bochechas, do que o faz por soberba, ou vaidade” (SILVA, 1789, v. I, p. 201SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). Ainda no mesmo enquadramento, Morais Silva apresenta “fofo” como alguém que “fala sem saber da matéria, com soberba” (SILVA, 1789, v. I, p. 623SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). A palavra também é relacionada ao comportamento do pavão, pois o “apavonado” é alguém “soberbo e desvanecido com as louçainhas que o adornam” (SILVA, 1789, v. I, p. 92SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). O ridículo da soberba liga-se ao seu caráter vão, lembrado em diversos verbetes. Um exemplo: quem faz um “fero”, pronuncia “ameaça soberba, bravata, despeito, fanfarronice, ameaça vã” (SILVA, 1789, v. I, p. 609SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). “Vão” está associado ao “inútil, sem efeito; sem fundamento; vaidoso” (SILVA, 1789, v. II, p. 508SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). Percebe-se como essa rede de sentidos representa a soberba como uma infundada ou excessiva demonstração de superioridade. Trata-se de uma conduta na qual a aparência não corresponde ao real, deformando-o. O soberbo ilude-se, o que o torna risível, pois não reconhece seus limites e possibilidades.

Prova de certa permanência de significados encontramos nos antônimos da palavra presentes no Dicionário. Vejamos alguns exemplos. Para Moraes Silva (1789, v. I, p. 686)SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v., “humanidade” significa “benignidade compassiva, brandura de condição, lhaneza sem soberba”. Assim como a “humildade”, que consiste em obedecer aos superiores e não tratar com “soberba aos próximos”, ainda que signifique também “baixeza e vileza” (SILVA, 1789, v. I, p. 687SILVA, António Moraes. Diccionário da língua portuguesa. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 v.). As ambiguidades, como já assinalei, estão sempre presentes quando investigamos esses conjuntos de palavras. A dicotomia soberba/humildade remete à dicotomia altivez/ baixeza. A posição do termo nos polos valorativos virtude/vício pode variar; porém, é mais frequente encontrar a soberba no polo do vício e a humildade no da virtude. Sem dúvida, essa frequência corresponde aos imperativos da ética tradicional cristã, mas não apenas a ela, como tentarei demonstrar mais adiante.

Seja como for, é necessário notar algo importante: em nenhum dos verbetes citados, Morais Silva, diferente de Bluteau, recorre a referências religiosas explícitas. Algo havia mudado na sensibilidade e nas concepções dos letrados portugueses, e Morais Silva omite, conscientemente ou não, as múltiplas conexões piedosas da palavra, ainda que não descarte sua acepção moral. No Dicionário, não vemos muitas das formulações características dos clérigos portugueses do início do século, pois a soberba deixa de se conectar diretamente ao pecado e à ação diabólica. Observa-se certa diluição da totalidade conceitual proposta pelo pensamento tomista, pois Morais Silva depura da palavra de seu significado místico e transcendental. Deus e Lúcifer desaparecem de sua rede sentidos, assim como a noção de pecado e o problema da salvação. Agora, a palavra se refere apenas à dimensão humana, e nada mais. O dicionarista, simpático às Luzes, dessacraliza a soberba.

É possível resumir a comparação nos seguintes termos: em Bluteau são muitas as referências ao conceito tomista e aos mitos cristãos, como o do “anjo mau”; Morais Silva abandona as referências tradicionais, ainda que preserve sua acepção ética da palavra. Esta continua a nomear um erro grave a ser corrigido, mas sutilmente desaparece a lembrança da conduta demoníaca. O dicionarista responde assim às inquietações de autores que, como Verney, propunham para os portugueses uma formação intelectual menos referenciada pelos pressupostos tomistas e centrada nos desafios da existência terrena. Assim, Morais Silva insere a palavra no mesmo campo semântico dessacralizado dos educadores reformistas laicos.

Soberba na reforma educacional

Como evidencia o estudo dos dicionários e dos textos piedosos, recorreu-se com alguma frequência à palavra “soberba” para caracterizar comportamentos que feriam a autoridade superior divina ou humana. Entre os educadores reformistas, veremos que ela ainda se insere no mesmo registro, mas a dessacralização sinalizada em Morais Silva se mostra ainda mais evidente. Para demonstrar esse deslocamento de sentido, retomo um dos textos educacionais mais importantes do século XVIII português: Apontamentos para educação de um menino nobre, de Martinho de Mendonça Pina e Proença (1693-1743).

O autor foi homem de Estado e serviu a D. João V em diferentes funções: Intendente do Ouro em Minas Gerais, membro do Conselho Ultramarino e Guarda-Mor da Torre do Tombo, entre outros. Ele fazia parte do círculo da corte joanina mais empenhado na reforma da monarquia. Seu texto sobre educação foi publicado em 1734 (CAVALCANTI, 2010CAVALCANTI, Irenilda de Rangel Moreira. O comissário real Martinho de Mendonça: práticas administrativas na primeira metade do século XVIII. 2010. 443p. Tese (Doutorado em História Social Moderna) – Programa de Pós-Graduação em História Social, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010.). Trata-se de uma proposta educacional que almeja ensinar aos jovens da elite portuguesa (os “meninos nobres”) os “fundamentos da sociedade civil de que nasce a obrigação de obedecer ao soberano e expor a vida, quando convém, à República”. Para tal, é necessário aprender a vencer os “próprios apetites” e adquirir “amor à razão” (PROENÇA, 1734, p. 183-185PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734.). Mais uma vez, reencontramos o tema do autocontrole relacionado à rede de sentidos da palavra. Porém, aqui o tradicional preceito cristão relativo aos desejos e às emoções adquire sentido cívico.

Segundo os Apontamentos, o “menino nobre” deve contrariar os “apetites desordenados de soberba, ira, cobiça e outras paixões”, com o intuito de introduzir a “disciplina das virtudes” (PROENÇA, 1734, p. 14-15PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734.). Não surpreende que a soberba esteja no rol das paixões a serem controladas, recomendação tradicional da ética cristã. Entretanto, como no Dicionário de Morais Silva, ela não é tratada como pecado primordial. Na verdade, é sua dimensão social e política que preocupa o autor. Vejamos como ele a define:

Uma paixão, que se antecipa às outras, e que se pode dizer nasce com as crianças, é a soberba, desejo de independência e de poder fazer tudo a sua vontade (...) e querem depois submeter a sua vontade os que lhe são iguais em idade e condição, e tiranizar os que se consideram inferiores. (...) Quem não reconhece quanto convém moderar e domar essas primeiras inclinações, de que nascem depois grandes perturbações na vida civil, perde a melhor ocasião de inspirar facilmente a moderação e equidade (PROENÇA, 1734, p. 47-48PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734.).

Na passagem, a soberba é apresentada como uma espécie de inclinação natural, um “desejo” primitivo de agir conforme a própria “vontade”. Poderíamos indicar alguma aproximação com a ideia de pecado original, mas o autor não apresenta nenhuma referência religiosa explícita. Esse “desejo” de “poder” talvez dialogue com a representação do indivíduo egoísta e ávido que por vezes aparece nos autores contratualistas dos séculos XVII e XVIII. Recorde-se, por exemplo, uma famosa passagem de Hobbes (1974, p. 64)HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. São Paulo: Abril Cultural, 1974.: “assinalo (...) como tendência geral de todos os homens, um perpétuo e irrequieto desejo de poder e mais poder, que cessa apenas com a morte”. Seja como for, para Pina e Proença a soberba é um perigoso vício a ser combatido desde a infância. A maneira mais eficaz de fazê-lo é privar as crianças “de tudo que sem modéstia pedirem ou quiserem executar” (PROENÇA, 1734, p. 52PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734.). Também aconselha as impedir de “sujeitar despoticamente os camaradas e maltratá-los”, obrigando-as a tratar a todos com “afabilidade, benevolência e cortesia” (PROENÇA, 1734, p. 56PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734.).

Convém insistir que Pina e Proença escreve para orientar a educação do “menino nobre”, ou seja, do jovem que, no futuro, terá a responsabilidade de comandar. Se se permitir, desde a infância, a plena manifestação da vontade de poder dos principais servidores da monarquia, a “vida civil” será perturbada por uma elite que, quando a oportunidade for favorável, tiranizará seus concidadãos. Para promover o bem-público e a “equidade”, é importante cortar o mal pela raiz e acostumar a “nobreza” à “modéstia” e à “cortesia”; ou seja, não se pode dar livre curso às inclinações tirânicas. De resto, note-se o deslocamento sutil do sentido da palavra: o tema da salvação da alma desaparece, a representação cristã do pecado é enturvecida e aborda-se a soberba como problema da vida pública, do mundo secular.

A oscilação de sentido torna-se mais evidente em outra passagem dos Apontamentos. Ao tratar dos principais objetivos da educação do “menino nobre”, Pina e Proença (1734, p. 183-184)PROENÇA, Martinho de Mendonça de Pina e de. Apontamentos para a educação de hum menino nobre. Lisboa: Joseph Antonio da Sylva, 1734. anuncia a importância de

ensiná-lo a vencer os seus próprios apetites, inspirando-lhe um amor à razão, e boa ordem, ensinar-lhe os fundamentos da sociedade civil, de que nasce a obrigação de obedecer ao soberano, e expor a vida, quando convém à República, destruir-lhe os princípios da soberba e crueldade, inspirar-lhe um gênio suave, que sem baixeza se proporcione às pessoas com quem trata, sacrificando muitas vezes seu apetite e sua opinião a dos outros.

O conhecimento dos “fundamentos da sociedade civil”, que conduz à sujeição ao soberano, implica autocontrole capaz de “destruir” a soberba. O soberbo, segundo essa rede de sentidos laicizada, se entrega a seus próprios apetites e ignora ou despreza os princípios da convivência humana. Sendo assim, ele ameaça a “sociedade civil” e o soberano que a governa, ou seja, é um problema político. Nada é dito a respeito da ofensa a Deus. Para Pina e Proença, os “nobres” precisam colocar suas ambições sob a regulação do soberano. O ideal educacional do autor parece estar articulado com a concentração de poder em curso na corte de D. João V (1689-1750), processo que não representou a liquidação ou a marginalização da pequena ou da grande nobreza portuguesa, mas sim seu recrutamento para servir o monarca com a maior fidelidade possível (CUNHA; MONTEIRO, 2005, p. 211-216CUNHA, Mafalda Soares; MONTEIRO, Nuno. Governadores e capitães-mores do Império Atlântico português nos séculos XVII e XVIII. In: CARDIM, Pedro; CUNHA, Mafalda da; MONTEIRO, Nuno Monteiro (Org.). Optima Pars. Elites ibero-americanas do Antigo Regime. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2005. p. 191-252.).

A dimensão religiosa que caracteriza o conceito tomista de soberba turva-se na proposta educacional de Pina e Proença, na qual sobressai a dimensão política. Não ocorre a completa mudança de sentido da palavra, mas ela é colocada a serviço do programa de reforma da elite governante. Pina e Proença não recusa ou nega os sentidos da conceitualização tomista, mas os rearranja em novo contexto discursivo no qual os temas mais caros ao aconselhamento religioso (a salvação da alma, o arrependimento dos pecados, a submissão às doutrinas da Igreja etc.) são esquecidos em favor da afirmação da autoridade secular e da “equidade” cívica.

A mesma redefinição da rede de sentidos da palavra é observável nas Cartas sobre a educação da mocidade, de 1760, um dos textos que orientaram as reformas educacionais do período pombalino. Seu autor, Antônio Ribeiro Sanches (1699-1783), médico de viés ilustrado residente em Paris, projetou uma nova formação para o corpo dirigente português em vista de três objetivos: preparar esse corpo para as “novas necessidades do reino”; criar poderes simbólicos sob controle da monarquia; projetar estratégias para mudar os rumos da sociedade portuguesa e superar as estruturas educacionais religiosas (BOTO, 2017, p. 69BOTO, Carlota. Instrução pública e projeto civilizador: o século XVIII como intérprete da ciência, da infância e da escola. São Paulo: Ed. Unesp, 2017.). Para o autor, já na expansão ultramarina do século XVI, a conduta da “nobreza” foi bastante problemática: “era soberba, ociosa, e por consequência sepultada nos vícios de toda dissolução” (SANCHES, 1922, p. 106SANCHES, António Nunes Ribeiro. Cartas sobre a educação da mocidade. Coimbra: Impressa da Universidade, 1922.). As dificuldades na condução dos negócios do Império tinham, portanto, uma dimensão ética e seriam superadas pela reeducação da elite dirigente.

Infelizmente, segundo Ribeiro Sanches (1992), o mundo doméstico da “nobreza” perenizou seus vícios até o século XVIII. A conquista da África lhe possibilitou um expressivo contingente de escravos. Ora, o convívio com a escravidão impediu que os jovens nobres cultivassem a “humanidade”, ou seja, o “amor de conservar os seus semelhantes”. Um “senhorzinho”, podendo agredir impunimente seus escravos e servidores, torna-se “soberbo, inumano, sem ideia alguma de justiça, nem da dignidade que tem a natureza humana” (SANCHES, 1922, p. 89-90SANCHES, António Nunes Ribeiro. Cartas sobre a educação da mocidade. Coimbra: Impressa da Universidade, 1922.). O autor mobiliza a rede de sentidos tradicional (soberba x humanidade) para submeter à crítica não apenas a escravidão, mas o próprio processo de expansão portuguesa, conduzido por homens de costumes opressivos e prejudiciais ao pleno desenvolvimento das potencialidades dos governados. Estes, desumanizados, eram reprimidos e humilhados por quem deveria promover seu progresso individual e coletivo. Não se trata de uma crítica exclusivamente moral, ainda que também o seja, pois a soberba do corpo dirigente do Império compromete a própria eficiência do Estado e solapa seu futuro.

Em outra passagem, Ribeiro Sanches afirma que os filhos dos nobres portugueses são educados em casas luxuosas, nas quais seus mestres eclesiásticos os instruem apenas nos “mistérios da fé”. Demonstram “ânimo depravado, sem humanidade, porque não conheciam igual, sem subordinação”, posto que, além dos mestres, convivem apenas com escravos e gente servil, manifestando “soberba, vanglória, sem conhecimento da vida civil, nem com a mínima ideia do bem comum” (SANCHES, 1922, p. 171-173SANCHES, António Nunes Ribeiro. Cartas sobre a educação da mocidade. Coimbra: Impressa da Universidade, 1922.). Como em Pina e Proença, a soberba, alimentada desde a infância pela tirania doméstica, impede que os dirigentes da monarquia conheçam as regras elementares da convivência social, ou seja, eles não estão preparados para sua tarefa fundamental: governar os outros homens e promover as suas faculdades. Sua educação, favorecendo a soberba, produz uma elite “inumana”, injusta, incapaz de reconhecer a “dignidade” daqueles que governam, ou seja, governam de modo brutal.

Em Ribeiro Sanches, o afastamento das referências religiosas é ainda maior do que em Pina e Proença. Para o primeiro, os mestres eclesiásticos são incapazes de cultivar a “humanidade” entre os jovens da elite portuguesa. O conhecimento dos “mistérios da fé” não ajuda na compreensão do “bem comum”. Insinua-se, inclusive, que a soberba não pode ser inibida por uma educação conduzida por clérigos. O autocontrole desliga-se completamente da experiência religiosa.

O uso da palavra e de sua rede de sentidos é parte da estratégia discursiva de Ribeiro Sanches para denunciar os vícios dos estratos superiores da sociedade portuguesa. O hábito escandaloso de submeter os inferiores à brutalidade e à humilhação prejudica o governo da monarquia. Percebe-se que a rede de sentidos ainda preserva vários traços da tradicional ética cristã, mas Ribeiro Sanches avança para uma crítica que visa à dessacralização dos modelos de conduta dos responsáveis pelo Estado. Trata-se de afiná-los com a “humanidade” laica das Luzes.

Como é possível notar, a palavra “soberba” foi apropriada pelos reformistas portugueses e constitui elemento de defensa do “novo padrão de exercício da soberania portuguesa, distinto das concepções e formas de poder corporativo” (KANTOR, 2014, p. 465KANTOR, Irís. Novas expressões da soberania portuguesa na América do Sul: impasses e repercussões do reformismo pombalino na segunda metade do século XVIII. In: FRAGOSO, João; GOUVÊA, Maria de Fátima (Org.). O Brasil colonial, 1720-1821. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2014. v. 3. p. 463-482.). Sua rede de sentidos participou da estratégia de afirmação da autoridade monárquica e de controle da conduta de seus grupos dirigentes. O conceito religioso converteu-se em léxico político a serviço da reforma educacional.

Considerações finais

O estudo do universo semântico da palavra “soberba” ajuda a entender os complexos intercâmbios, no contexto português, entre os religiosos fiéis à ortodoxia católica e os reformadores simpáticos às Luzes. As diferenças são claras. Para os religiosos, importa apresentar a soberba como pecado similar ao do “anjo mau”, insolência possibilitada pelo livre-arbítrio e pela desordem do amor-próprio. Para se redimir da culpa e salvar a própria alma, o soberbo precisa realizar uma profunda revisão interior e arrepender-se. Para os reformadores, a soberba é defeito derivado da natural inclinação egoísta manifesta desde a infância, que o meio social e a educação acentuam ou reprimem. No primeiro caso, está em causa a ordem divina e o arrependimento diante de Deus; no segundo, a “vida civil” e os dispositivos educacionais seculares. Nas obras dos reformistas, recomenda-se medidas preventivas que orientem a juventude, pois não se trata de redimir os pecados dos membros da comunidade cristã, mas de instaurar procedimentos regulares que garantam o progresso e a segurança do Estado. A salvação eterna fica em segundo plano ou é esquecida; o foco é o “bem comum” e a estabilidade da monarquia – insinua-se o novo horizonte ético dessacralizado.

As semelhanças, no entanto, também são notáveis. Os reformadores portugueses não abandonam completamente a semântica tradicional do vocábulo: “soberba” continua a opor-se à “humanidade”; ainda significa a insubordinação maliciosa contra o poder soberano; permanece associada à vanglória e à rebeldia dos estratos superiores, dos “nobres”. As reformas educacionais propostas não dispensam as velhas armas do arsenal da ética cristã, assimilam parte da rede de sentidos legada pelo tomismo, mas selecionam e reinterpretam em vista de seus objetivos.

Até que ponto esse esforço de apropriação não retirou da palavra sua força expressiva? Os reformadores não diminuíram sua relevância? Em seus textos, soberba era ainda um conceito homogeneizante que “contém uma exigência de generalização”? Em vez de nomear o “pecado dos demônios” e a primeira inobservância da ordem divina, a palavra, nas páginas de Ribeiro Sanches e Pina e Proença, ou mesmo nas de Morais Silva, designa um vício perigoso, mas passível de controle quando se ministra a formação adequada. Esmaeceu a vivacidade da perversão demoníaca e da “graça” divina. Na ética dos reformadores, soberba deixou de exprimir um dos maiores problemas humanos, mas não era insignificante. Essa oscilação de sentido sinaliza uma nova percepção do poder: o Estado insinua-se e Deus, discretamente, sai de cena. Todavia, ainda é necessário evitar a rebeldia dos insolentes.

  • 1
    A paginação dos volumes do Vocabulário é complexa. Nos quatro primeiros tomos publicados em Coimbra em 1712 e 1713, a numeração das páginas não se inicia no começo de cada volume: para cada letra, abre-se uma nova contagem. O volume III, por exemplo, tem uma paginação para as palavras iniciadas com a letra D e outra para as da letra E. Nos quatro últimos tomos, impressos em Lisboa entre 1716 e 1721, verifica-se uma única numeração para cada tomo.

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Editoras responsáveis: Hanna Sonkajärvi e Luiza Larangeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    28 Jul 2022
  • Aceito
    08 Nov 2022
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