Resumo
Políticas de incentivo à caminhada têm sido utilizadas para aumentar a vitalidade e a segurança urbana, alcançadas através de intervenções no ambiente construído, melhorando a acessibilidade. Tais condições podem aumentar o potencial de uso do transporte não motorizado e do público, refletindo na qualidade de vida. Aqui se busca avaliar a influência do ambiente construído sobre as viagens por modalidades sustentáveis através da aplicação de dois índices de caminhabilidade, o Índice ACC e o Walk Score®, na cidade de Niterói, Brasil. Constata-se que Índice ACC apresentou um melhor desempenho, sinalizando que determinadas especificidades locais não foram compreendidas pelo índice Walk Score®.
Palavras-chave: Ambiente construído; Índice de caminhabilidade; Mobilidade sustentável; Niterói
Abstract
Policies to encourage walkability have been used to increase the urban vitality, achieved through interventions in the urban environment, These conditions can increase the potential sustainable modalities trips, directly reflecting over the quality of life. In order to observe such influence, this article intends to apply two walkability indexes, the ACC Index and the Walk Score, in the city of Niterói, Brazil, and to verify if the estimates of these two indexes are adherent to local standards of mobility. As a result, the ACC Index performed better, signaling that certain local specificities were not understood by the Walk Score®.
Keywords: Built environment; Walkability index; Sustainable mobility; Niterói
Introdução
A caminhabilidade tem sido considerada como um dos pilares não só para uma mobilidade sustentável (Dörrzapf et al., 2019) mas também para uma cidade sustentável, além de exigir a “proximidade” de atividades, para que estas sejam alcançadas a pé, e de valorizar a escala local, elementos predominantes nos discursos urbanos contemporâneos (Litman, 2009; Gehl, 2010).
Apesar da preocupação com a caminhada já existir há algum tempo por parte dos pesquisadores (Jacobs, 1961; Fruin, 1971), o termo caminhabilidade só começou a ser observado em artigos científicos no início dos anos 90 (D’Arcy, 2013), sendo que alguns autores consideram que foi o trabalho elaborado por Bradshaw, em 1993, ao desenvolver um indicador para as “cidades caminháveis”, quem introduziu este conceito. Entretanto, esse termo é raramente definido nos dicionários, mas, por outro lado, encontra-se na literatura uma multiplicidade de definições conflitantes sobre a caminhabilidade, os fatores contribuintes e os métodos de avaliação (Forsyth, 2015).
Verifica-se na literatura um reconhecimento quanto ao uso da caminhabilidade como um instrumento fundamental para o desenvolvimento urbano (Litman, 2009; Gehl, 2010), em particular na escala local, como nos bairros, cujo planejamento vem sendo cada vez mais enfatizado (Moroke et al., 2019). Inclusive Choguill (2008) afirma que “nenhuma cidade pode ser considerada sustentável se seus componentes, como os bairros, não o forem”.
O desafio é dispor de ferramentas para avaliar a caminhabilidade, considerando a abrangência, complexidade e perspectiva interdisciplinar que envolvem este conceito, que costuma expressar o quão amigável e convidativo para o pedestre é o ambiente construído na vizinhança (Talen & Koschinsky, 2013; Moura et al., 2017). Portanto a caminhabilidade abrange características objetivas vinculadas ao ambiente construído, mas também características qualitativas e subjetivas, como segurança e conforto, percebidas pelas pessoas no ato da caminhada (Jacobs, 1961; Ewing et al., 2006; Rosenberg et al., 2009).
Nesse sentido, distintas contribuições metodológicas vêm sendo desenvolvidas e disponibilizadas por meio de índices, que propõem um ferramental de análise das condições de caminhabilidade, segundo diferentes abordagens (Rosenberg et al., 2009; Vale et al., 2016). De uma maneira geral, eles baseiam-se nas cinco dimensões do ambiente construído citadas em Cervero et al. (2009), pressupondo-se condições idealizadas de acessibilidade que deverão favorecer e estimular o uso da caminhada. Determinados índices utilizam apenas algumas das cinco dimensões, como o Walk Score® (Walk Score, 2019). Outros contemplam todas as cinco dimensões, inclusive a distância à estação de transporte público, considerando que a sua presença incentiva as viagens a pé para realizar a atividade de “transporte”. Também há os que utilizam os 5 “C’s Layout”, que configuram os atributos para promover a caminhabilidade (Conectividade, Conveniência, Conforto, Convivência e Clareza) e se relacionam com o ambiente construído (Moura et al., 2017; ITDP, 2018). Ainda há aqueles que, além da caminhada, incluem outras modalidades sustentáveis, e são direcionados às áreas de entorno de estações de transporte público de maior capacidade, em conformidade com o conceito DOTS - Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (Institute for Transportation and Development Policy - ITDP, 2014; Singh et al., 2018).
Os índices disponíveis têm tido diversas aplicações na formulação de políticas e mesmo no planejamento urbano em vários países e continentes, dentre os quais se destacam os Estados Unidos, Canadá, Austrália, Hong Kong, Japão, também na Europa e na América Latina, inclusive no Brasil (Koohsari et al., 2018; Motomura et al., 2018; Pitilin et al., 2018).
Ressalta-se a relevância do uso destes instrumentos para o planejamento e gestão das cidades para diagnosticar o sistema de mobilidade urbana, a fim de promover padrões de viagens mais sustentáveis, especialmente quando se observa a deficiência de dados, que é o caso da maioria das cidades brasileiras, pois a partir deste conhecimento, políticas públicas podem ser adotadas para proporcionar mais dignidade a grandes contingentes da população que só podem usar a caminhada como modo de locomoção.
Além disso, verifica-se a tendência de se utilizar os índices disponíveis na bibliografia desenvolvidos para contextos bem distintos dos existentes em nossas cidades, em particular aqueles que se mostram mais facilmente aplicáveis, como o Walk Score®. Entretanto, Hall & Ram (2018) constatam que 69% dos artigos consultados em sua revisão não confiam no Walk Score® como uma única medida de caminhabilidade, adicionando outras estimativas para melhor capturar as múltiplas dimensões da caminhabilidade.
Autores como Moura et al. (2017) afirmam que os índices de uma forma geral são sensíveis às especificidades locais e às características socioeconômicas, físicas e culturais dos seus distintos grupos de pedestres. O conceito de acessibilidade empregado nesses índices aborda duas fontes de mensuração, espacial e individual, que interagem entre si: a espacial (que envolve a separação física entre atividades cuja impedância a ser vencida depende do ambiente construído e do seu nível de integração entre transportes e uso do solo) e a individual (que determina a percepção da impedância e a capacidade física e financeira de superar tal impedância) (Horner, 2004; Kneib & Portugal, 2017). Essa preocupação é tratada por Steiniger et al. (2019) que confirmam as restrições de tais índices, como o Walk Score®, e a necessidade de ajustá-los, a partir de seu uso no Chile, podendo se estender ao contexto sul-americano.
Por outro lado, alguns índices de caminhabilidade estão sendo desenvolvidos no Brasil (ITDP, 2018; Motomura et al., 2018; Ruiz-Padillo et al., 2018), dos quais o Índice ACC - Ambiente Construído Caminhável, proposto por Grieco (2015), é adotado nesse artigo, de acordo com os seguintes critérios: considerar 5 dimensões do ambiente construído, usar indicadores objetivos; pela simplicidade da abordagem e por requerer informações relativamente mais fáceis de se obter.
A partir desse panorama, algumas questões são então realçadas: Será que índices elaborados em outros países são aderentes à realidade brasileira? Será que um índice desenvolvido no Brasil poderia oferecer estimativas mais compatíveis com os nossos padrões de viagens a pé? Será que tais índices são estimadores apenas das viagens a pé ou também contemplam as demais viagens por modalidades sustentáveis, como as feitas por transporte público?
O artigo pretende contribuir - mesmo que exploratoriamente - para responder tais questões, escolhendo dois índices a serem investigados: o Índice ACC, de origem brasileira, e o Walk Score®, desenvolvido nos EUA. A aplicação dos dois índices será apresentada em estudo de caso na cidade de Niterói, que faz parte da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Na medida em que os índices se caracterizam por expressar a qualidade do ambiente construído na promoção da caminhabilidade, suas estimativas devem refletir nas escolhas modais. Nesse sentido, após a sua aplicação apresentam-se e analisam-se comparativamente as estimativas dos dois índices, que, serão confrontadas com os padrões de viagens locais, observando-se a correspondência entre eles.
Procedimento metodológico utilizado
O Índice ACC se baseia nas 5 dimensões do ambiente construído, levando em conta as especificidades das cidades brasileiras. Já o índice Walk Score® é um aplicativo voltado para os padrões norte-americanos e caracteriza-se pela sua facilidade de utilização a partir de um dado endereço em distintos países, inclusive no Brasil. Para melhor se compreender a natureza de cada índice, procede-se a caracterização deles, estabelecendo-se suas diferenças, inclusive nas escalas de mensuração, justificando que estas sejam ajustadas, para simplificar e facilitar a análise comparativa entre os resultados da aplicação, seguindo esquema mostrado na Figura 1.
A partir desse conhecimento, selecionaram-se no estudo de caso 24 condomínios residenciais, e suas respectivas áreas de influência, distribuídos nos bairros de Icaraí, Santa Rosa e Região Oceânica na cidade de Niterói, Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). A escolha desses três bairros foi motivada pela facilidade de se obter informações disponibilizadas pela Niterói, Transporte e Trânsito (Nittrans) - órgão gestor de planejamento do trânsito e transporte em Niterói -, e também pelas diferenças de características encontradas, tanto no ambiente construído como no nível de renda e nos padrões de viagens, o que possibilitará uma melhor análise comparativa entre as estimativas dos índices e a mobilidade observada nos locais.
Com estas informações, são feitas as estimativas referentes aos dois índices, verificando se há uma correspondência entre tais estimativas e se elas são compatíveis aos padrões de viagens praticados nas áreas pesquisadas. Deve-se esclarecer que o foco será no “transporte sustentável” e não na “mobilidade sustentável”, e que, apesar desses conceitos serem tratados muitas vezes como sinônimos, eles têm significados diferentes. Enquanto a “mobilidade sustentável” envolve uma maior complexidade e amplitude, incluindo as dimensões qualitativas e quantitativas das viagens (Holden, 2007), o “transporte sustentável” tende a destacar os modos de transporte sustentáveis (Mello & Portugal, 2017), como será feito neste artigo, representado pelas viagens a pé e pelas viagens que saíram a pé para utilizar o transporte público (Grieco et al., 2018).
Destaca-se que a pesquisa, realizada pela Nittrans (2011), utilizou a base residencial como produtor e atrator das viagens, considerando que o uso residencial é preponderante nos bairros de forma difusa, o que permite delinear um perfil da divisão modal da população que ali vive e circula pelo bairro. Além disso, a opção de utilizar as taxas de geração de viagens, pelos modos “a pé” e por “transporte público”, permite observar o quanto os moradores desses bairros utilizam esses modos de deslocamento, bem como entender a influência de ambientes urbanos caminháveis em escolhas modais mais sustentáveis.
Nesse contexto, com a intenção de verificar se as estimativas do Índice ACC e do Walk Score® correspondem ao potencial de geração de viagens realizadas a pé e por modalidades sustentáveis (representadas pela soma das viagens a pé e por transporte público), os seguintes indicadores foram considerados:
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Percentual de geração de viagens de automóveis, a pé e por modalidades sustentáveis, em relação ao total das viagens observadas;
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Taxa de geração de viagens de automóveis, a pé e por modalidades sustentáveis, que expressam quantas viagens são realizadas por unidade residencial (UR)/dia, refletindo o potencial de produção das viagens;
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Percentual das viagens a pé realizadas em menos de 30 minutos, tempo limite considerado como razoável e aceitável para a caminhada ou para a integração com o transporte público (Scovino et al., 2010; Walk Score, 2019).
Estes indicadores, baseados em dados fornecidos pela Nittrans (2011), serão analisados em conjunto com as estimativas dos dois índices, esperando-se que a avaliação quanto às condições de caminhabilidade no local melhore na medida em que aumenta a participação das viagens a pé e pelo transporte público. A seguir são realizadas as análises comparativas dos resultados de forma agregada na escala de cada bairro e desagregada referente a cada condomínio.
Caracterização dos índices
Índice ACC
Grieco et al. (2018) apresentam o Índice ACC, que tem o foco nas condições de acessibilidade de um bairro levando em conta o ambiente construído, considerando as características de cidades brasileiras. O índice é constituído por indicadores para cinco dimensões do ambiente urbano propostos por Cervero et al. (2009): Densidade; Diversidade; Desenho Urbano; Distância ao Transporte Público e Destinos Acessíveis.
O Índice ACC foi desenvolvido segundo uma concepção simples, baseada na proposta sugerida pela Transportation Association of Canada-TAC (2006), e estruturado em 3 categorias quanto ao Potencial de Viagens Sustentáveis (PVS) do ambiente construído: Baixo, Médio e Alto, de acordo com a situação em que se encontram os indicadores levantados em cada localidade.
A cada indicador se estabelecem parâmetros que buscam corresponder a sua propensão de promover viagens em modalidades sustentáveis, conforme três condições: Desfavoráveis, Moderadas e Favoráveis, às quais atribuem-se respectivamente os Valores de Referência (VR) 1, 2 e 3.
Na medida em que cada uma das dimensões do ambiente construído e seus indicadores podem influenciar diferentemente na geração de viagens, se adota um Fator de Importância (FI), que pode variar de cidade para cidade, dependendo das suas especificidades (Ewing & Cervero, 2010; Ewing et al., 2014). Isto exige levantamentos de campo respaldados estatisticamente ou mesmo consulta a especialistas e técnicos locais para atribuírem os valores de FI de cada dimensão que melhor expressem as características da área de estudo (Grieco et al., 2018).
A Tabela 1 apresenta as dimensões, os indicadores e suas métricas com os respectivos Valores de Referência (VRs) para a aplicação do índice, cujo resultado se enquadrará no intervalo do Índice ACC do Potencial de estímulo às Viagens por modalidades Sustentáveis (PVS), apresentado na Tabela 2. Ressalta-se que nesta proposta exploratória, considera-se que as dimensões terão a mesma importância (FI), e, portanto, assumiu-se um total de 100 pontos para FI, que foram distribuídos igualmente entre as 5 dimensões, ficando cada uma delas com 20 pontos.
Em seguida, o cálculo do Índice ACC deve ser determinado pelo resultado obtido da soma da multiplicação de cada fator de importância (FI) e os valores de Referência (VR) de cada dimensão:
sendo, nesta aplicação:
O resultado encontrado na Equação 1 se enquadrará no intervalo do potencial em gerar viagens por modalidades sustentáveis, como apresentado na Tabela 2.
Walk Score®
Com o slogan “Live where you love” ou seja, “viva onde você ama” e apresentado por uma página eletrônica, o índice Walk Score® trata de conferir pontuações para classificar graus de acessibilidade em endereços de diversas cidades ao redor do mundo. Como metodologia, descrita sucintamente a seguir com base no link https://www.walkscore.com/methodology.shtml, ela utiliza dados coletados em sites abertos, como o google, open street maps e sites oficiais de cada cidade, conferindo pontuações para a classificação da caminhabilidade, representando a facilidade de acesso às atividades cotidianas que um pedestre pode encontrar em tais áreas, como o acesso ao transporte público, facilidades para uso da bicicleta ou comércio próximo.
Elaborado por estudiosos e validado por um conselho de pesquisadores, o programa modela diversas vizinhanças através de software específico, analisando centenas de rotas, para verificar a conectividade e as amenidades que ocorrem nessas rotas, conferindo uma escala de pontuação para cada quesito (Walk Score, 2019). Considera nesse processo fundamentalmente as dimensões do ambiente construído associadas aos “destinos acessíveis”, à “densidade” populacional e ao “desenho urbano” e sua conectividade, expressa pela densidade de interseções e tamanho dos quarteirões.
Para a conectividade é conferida a pontuação máxima em rotas com amenidades num raio de 400 metros, ou 5 minutos de caminhada. Esta pontuação é reduzida, na medida em que a distância entre as amenidades aumenta, até um tempo de 30 minutos, considerado como o valor máximo.
A pontuação varia em um intervalo que classifica cada endereço conforme tabela 3.
Destaca-se que o Walk Score® é um aplicativo, disponibilizado gratuitamente, pontuando o quanto um determinado endereço é caminhável, utilizando como base as proximidades de vários tipos de atividades e conectividade de ruas. O índice, já avaliado positivamente nos EUA, Canadá e Japão, confirma que o Walk Score® pode ser uma ferramenta válida para estimar a capacidade de locomoção em vizinhanças, especialmente quando correlacionadas à conectividade e às atividades locais (diversidade e destinos acessíveis) (Koohsari et al., 2018), bem como em múltiplas localizações geográficas e contextos espaciais (Duncan et al., 2011). Entretanto se reconhece a necessidade de ajustes quando aplicado em países em desenvolvimento, conforme foi confirmado por Steiniger et al. (2019) no Chile. E apesar de algumas similaridades culturais e comportamentais, ainda se justifica sua aplicação em outros países em desenvolvimento, como o Brasil, até pela sua dimensão continental. Ressalta-se que no Brasil tal aplicativo não disponibiliza informações imobiliárias, mas fornece a pontuação do índice, que estima a caminhabilidade na área de vizinhança de um dado endereço.
Correspondência entre as escalas dos dois índices
Para simplificar e facilitar a comparação entre os dois índices, optou-se por fazer a correspondência entre as 3 categorias do Índice ACC (Alto, Médio e Baixo PVS) (Tabela 2) com as 5 categorias do Walk Score® (Tabela 3), sugerindo uma equivalência entre os valores (Paraíso do pedestre - entre 90 e 100; Caminhável - entre 50 a 89 e Dependente do automóvel - inferior a 50), como mostra a Tabela 4.
O caso de Niterói - características das áreas de estudo
A primeira etapa do estudo para a aplicação dos índices é o levantamento dos indicadores nos 24 condomínios residenciais e respectivos entornos distribuídos em três bairros da cidade de Niterói, Icaraí (12 condomínios), Santa Rosa (6) e Região Oceânica (6). O Município de Niterói se localiza, próximo da cidade do Rio de Janeiro, separados pela Baia de Guanabara, como apresentado na Figura 2.
Observa-se que os bairros de Icaraí e Santa Rosa possuem áreas semelhantes e localização muito próxima ao centro de Niterói, onde, além de representar o centro histórico do Município, concentra muitas atividades comerciais, financeiras e de serviços, e é o ponto de ligação, pelo sistema de barcas, com o Rio de Janeiro. Já a Região Oceânica com uma área significativamente mais extensa e mais distante do centro. Para mais informações e detalhes sobre os bairros, consultar Grieco (2015).
Para se ter uma visão de conjunto e uma base comparativa entre os três bairros selecionados, eles são descritos sucintamente, bem como apresentados na Tabela 5 os valores médios dos indicadores propostos no Índice ACC (Grieco et al., 2018), que caracterizam os respectivos ambientes construídos.
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Icaraí apresenta um desenho urbano caracterizado por terreno plano, quarteirões retangulares; com ruas arborizadas, calçadas com boa pavimentação, sem obstáculos, também oferece boa diversidade de atividades com lojas, restaurantes, mercados. Há bastante oferta de transporte público, com muitas opções de linhas de ônibus. Os condomínios pesquisados são de características verticais e multifamiliares com média de 11 pavimentos dotados de 1 a 2 vagas de garagem por unidade.
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O bairro de Santa Rosa apresenta um traçado das ruas influenciado pelo relevo, com grandes quarteirões alongados e irregulares; calçadas razoavelmente pavimentadas, pouca ou nenhuma arborização. As edificações são altas com condomínios semelhantes aos de Icaraí; o uso do solo é misto, entretanto com predomínio do uso residencial, com oferta de comércio e serviços que atendem, sobretudo, à população local. O bairro é bem servido por diversas linhas de transporte municipais e intermunicipais.
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A Região Oceânica possui densidade relativamente baixa, tendo nas áreas planas longas quadras retangulares e calçadas razoavelmente arborizadas. A área das encostas é ocupada por ruas que seguem a topografia, formando condomínios horizontais, de casas unifamiliares isoladas e, com quadras grandes, ruas estreitas e acesso reduzido, normalmente com uma só saída. O uso do solo é disperso e basicamente residencial e unifamiliar, com exceção da via arterial principal, que atravessa todo o bairro, onde se localizam todas as atividades comerciais e de serviços e se concentrando o sistema de transporte servido de poucas linhas.
Segundo Grieco et al. (2018), as médias dos indicadores foram calculadas a partir do levantamento na área de influência de cada condomínio (definida por um raio de 500 metros) por ser uma distância confortável de caminhada às atividades essenciais e ao transporte; a renda média dos responsáveis pelos domicílios foi incluída apenas para melhor caracterização do perfil dos bairros, já que não entra no cálculo dos índices, que só utilizam indicadores do ambiente construído. Sabe-se, contudo, que indicadores socioeconômicos, como a renda, têm grande influência nas taxas de mobilidade (Mello, 2015).
Apresentação e Análise dos Resultados: Relação entre as estimativas dos Índices e as viagens por modalidades sustentáveis
Os indicadores selecionados refletem os padrões de mobilidade praticados nas áreas investigadas, servindo de base comparativa com as estimativas dos dois índices. Essa análise será feita inicialmente de forma agregada, levando em conta os resultados da aplicação dos índices, assim como os valores médios dos indicadores selecionados para cada bairro (Tabela 6). Nesta análise foram também incluídos a taxa de mobilidade dos bairros (englobando todas as viagens diárias, por todos os modos/por unidade residencial-UR); a taxa de viagens específica por automóveis por UR e o percentual de viagens a pé realizadas em menos de 30 minutos.
A seguir, de maneira desagregada, a análise abrange os percentuais de geração de viagens a pé e por modalidades sustentáveis observados em cada um dos condomínios. O primeiro percentual pode indicar quão caminhável é a vizinhança de cada condomínio, que será confrontado com as estimativas do Índice ACC (Figura 3) e do Walk Score® (Figura 4). O mesmo será feito para o segundo percentual que acrescenta o uso do transporte público no local, configurando o que denominamos como modalidades sustentáveis (ver Figuras 5 e 6). Cabe ressaltar que o transporte público em Niterói é baseado fundamentalmente no ônibus.
Análise agregada por bairro dos índices e os padrões de viagens
Os resultados das estimativas dos dois índices são apresentados na Tabela 6, juntamente com os dados do padrão de mobilidade para os três bairros investigados.
As estimativas dos dois índices - de acordo com a Tabela 6 e conforme já esperado em função das características dos três bairros - apresentam a mesma classificação: Icaraí é o bairro que apresenta o melhor ambiente construído para a caminhada, seguido por Santa Rosa e por último a Região Oceânica. O Índice ACC classifica o PVS (Potencial de Geração de Viagens Sustentáveis) de Icaraí como alto, o de Santa Rosa como médio e o da Região Oceânica como baixo. Entretanto, ao se ajustar este resultado à escala do Walk Score®, verifica-se que a classificação dos dois índices se diferencia no caso da Região Oceânica, que é classificada como “Dependente do carro” para o Índice ACC e “Razoavelmente caminhável” para o Walk Score®. O que indica que o Índice ACC se mostrou, nesta aplicação, mais severo para ambientes construídos menos amigáveis aos pedestres.
Por outro lado, essa classificação também se mostra coerente com os padrões de viagens apresentados na Tabela 6. Icaraí, classificado como “Paraíso do Pedestre”, se sobressai com 2,5 vezes a porcentagem das viagens a pé e supera em 12,59% a porcentagem das viagens por modalidades sustentáveis realizadas em Santa Rosa. Já este bairro, classificado como “Muito caminhável”, tem 3,4 vezes a porcentagem das viagens a pé e supera em 38,83 % a porcentagem das viagens por modalidades sustentáveis realizadas na Região Oceânica. Outro fator a realçar nesses padrões de viagens que favorecem Icaraí e Santa Rosa, se dá pela alta proporção de deslocamentos a pé realizados em menos de 30 minutos, o que sugere uma maior proximidade entre atividades, contrariamente à Região Oceânica. O que justifica ser este bairro classificado como “Razoavelmente caminhável” pelo Walk Score® e mais ainda corretamente como “Dependente do carro” pelo Índice ACC, de acordo com esta análise comparativa entre eles.
No que diz respeito às relações entre os resultados das estimativas dos dois índices com os dados dos padrões de viagens, verifica-se que há uma correspondência entre eles em termos ordinais, confirmando-se a mesma sequência dos bairros, ou seja: as taxas e porcentagens das viagens a pé e por modalidades sustentáveis são mais favoráveis à Icaraí, seguido por Santa Rosa e Região Oceânica.
Em termos escalar, levando em conta o intervalo entre os valores, tal correspondência também se verifica na relação entre as estimativas dos dois índices com a porcentagem de viagens a pé e principalmente com a porcentagem de viagens por modalidades sustentáveis. Entretanto, o mesmo não ocorre com respeito às taxas de geração de viagens a pé e de viagens por modalidades sustentáveis. Estas taxas acentuaram ainda mais a diferença de Icaraí, talvez pela sua maior mobilidade e ter uma renda média cerca de 1,5 superior ao dos outros dois bairros (Tabela 5). Ressalta-se que Santa Rosa e Região Oceânica, apesar de apresentarem rendas médias similares, se distinguem pelas taxas de viagens e pela mobilidade. Santa Rosa com maior peso nas viagens a pé (quase o triplo) e a Região Oceânica pelo uso do automóvel (com taxa 4,3 vezes superior). Pode ser que o ambiente construído disperso e as maiores distâncias entre atividades incentivem mais viagens por automóvel, influenciando no aumento de mobilidade em termos de quantidade, mas não de qualidade.
Análise desagregada por condomínio dos índices e os padrões de viagens
Pretende-se aqui estabelecer as relações entre as estimativas dos dois índices e os padrões de viagens para cada um dos condomínios. Nessa análise por condomínio, se inclui os padrões de viagens representativos da RMRJ, o que fornece uma referência espacial mais abrangente e na qual se insere o município de Niterói. Além disso, para facilitar a compreensão visual, estas relações serão apresentadas graficamente nas Figuras 3 a 6.
Nesse sentido, as relações serão estruturadas em dois conjuntos. O primeiro que relaciona as estimativas dos dois índices com a proporção de viagens a pé (Figuras 3 e 4) e o segundo com a proporção de viagens por modalidades sustentáveis (Figuras 5 e 6), em todos os casos, os condomínios estão diferenciados de acordo com o bairro em que se localizam e também se registra na linha horizontal o valor médio da porcentagem de viagens da RMRJ.
(i) Relações entre as estimativas dos dois índices com a proporção de viagens a pé
Para estabelecer estas relações, tem-se que, dos 24 condomínios, o Índice ACC classificou 12 deles na categoria de melhor caminhabilidade, também denominada como “Alto PVS” ou “Paraíso do pedestre”, sendo 11 em Icaraí e 1 em Santa Rosa (ver Figura 3), enquanto o Walk Score® classificou 14 deles (11 em Icaraí e 3 em Santa Rosa), na Figura 4. Em ambos os índices, essa classificação envolveu condomínios apresentando entre 34% e 70% de suas viagens a pé. Observa-se a quase totalidade dos condomínios com mais de 40% das viagens a pé, sugerindo que há uma similaridade das estimativas de ambos os Índices no caso dos locais com ambiente construído altamente favorável à caminhada.
Em relação a categoria de “Médio PVS” ou “Muito Caminhável”, foram identificados 6 condomínios pelo Índice ACC (5 em Santa Rosa e 1 em Icaraí) e 8 condomínios pelo Walk Score® (3 em Santa Rosa, 4 na Região Oceânica e 1 em Icaraí), sendo que este último resultado - pela presença acentuada da Região Oceânica - difere do que se esperava na análise agregada. No Índice ACC, os condomínios se encontravam entre 25% e 51%, enquanto no Walk Score®, 3 dos 7 condomínios apresentaram um percentual muito baixo de viagens a pé (≤ 5%), que contraria o que se espera de um local caminhável (Caccia L. & Pacheco P., 2019).
Quanto a pior categoria em termos de caminhabilidade - denominada como “Baixo PVS” ou “Dependente do Automóvel” - foram identificados 6 condomínios pelo Índice ACC (todos da Região Oceânica) e 2 condomínios pelo Walk Score® (apenas 2 dentre os 6 na Região Oceânica). No Índice ACC, um dos condomínios tinha 15% de viagens a pé e os demais menos do que 6%, enquanto no Walk Score®, os 2 condomínios tinham menos de 4% das viagens a pé.
Tais resultados apontam que as estimativas do Índice ACC e do Walk Score® são similares nos locais com um ambiente altamente favorável à caminhada, representada nesse estudo por condomínios com mais de 35% ou 40% das viagens a pé, que inclusive superam a média observada na RMRJ que corresponde a 29,36%, como também superam a de cidades consideradas altamente caminháveis, como Zurique (31%) e Amsterdã onde a mobilidade ativa se destaca com 32% para bicicleta e 29% para a caminhada (Caccia & Pacheco, 2019). Entretanto, tais estimativas tendem a se afastar na medida em que se verifica uma redução desta percentagem das viagens a pé, se acentuando para valores inferiores a 6% ou 15%, como é o caso da Região Oceânica.
(ii) Relações entre as estimativas dos dois índices com a proporção de viagens por modalidades sustentáveis
Para estas relações, mostradas nas Figuras 5 e 6, observa-se que, dos 12 e 14 condomínios incluídos na mais alta classificação respectivamente pelos índices ACC e Walk Score®, ambos apresentam a mesma variação, entre 76% a 90,38% de viagens sustentáveis. Estes percentuais superam, significativamente, a média da RMRJ (48,75%) e quando comparadas com cidades brasileiras do porte de Niterói (500 mil habitantes), que apresentam em média 67% de viagens por modalidades sustentáveis (Associação Nacional de Transporte Públicos - ANTP, 2018). Com isso, pode-se reconhecer a similaridade do comportamento dos dois índices, quando a área de influência com características mais adequadas à caminhabilidade.
Relação entre as estimativas do Índice ACC e a % de Viagens por Modalidades Sustentáveis para cada bairro.
Relação entre as estimativas do Walk Score® e a % de Viagens por Modalidades Sustentáveis para cada bairro.
Já as estimativas consideradas de médio potencial englobam conjuntos ligeiramente diferentes entre os índices; o Índice ACC enquadra 6 condomínios e o Walk Score® contempla 7 condomínios; entretanto o Índice ACC considera condomínios que variam entre 64% e 84% de viagens por modalidades sustentáveis, enquanto no Walk Score®, a variação é maior, entre 27% e 80%, indicando um conjunto mais disperso, que se estende a percentuais bem menores, com mais da metade inferior à média da RMRJ. Tais resultados revelam que existem diferenças entre as tendências das estimativas dos dois índices nessa classificação.
Para os condomínios classificados como “Baixo PVS” ou “Dependente do Automóvel”, o Índice ACC forma um conjunto de 6 condomínios, todos na Região Oceânica, com viagens por modalidades sustentáveis que variam de 27% a 43% (Figura 5), portanto com valores inferiores à média da RMRJ. Já o Walk Score® caracteriza com dependente do automóvel, apenas 2 condomínios na Região Oceânica (Figura 6), variando entre 27% a 31%, com valores também inferiores à média da RMRJ.
Ao se aplicar o teste de Qui Quadrado, verifica-se que há 99,95% de chances de haver uma correspondência entre as estimativas dos dois índices para ambientes construídos altamente favoráveis à caminhada (alto PVS), chegando 45,01% para ambientes moderadamente caminháveis (médio PVS). No entanto, esta correspondência se mostrou estatisticamente inexistente para o total de condomínios investigados e para aqueles com baixo PVS, o que confirma os resultados da análise qualitativa. De acordo com eles, e pela facilidade de aplicação, o Walk Score® pode ser utilizado como uma “proxy”, mas reconhecendo suas limitações, especialmente para locais com ambientes construídos menos amigáveis à caminhada expressos por uma participação relativamente menor de viagens a pé.
Com isto, verifica-se que entre as estimativas dos índices há similaridades, porém o Walk Score® tende a pontuar valores maiores em relação ao Índice ACC, nos ambientes construídos menos amigáveis e dispersos que podem inibir o uso tanto do transporte público quanto do modo a pé, não considerando a qualidade da infraestrutura, as distâncias ao acesso ao transporte, sua integração e mesmo a falta de atividades básicas nas áreas de influência.
Conclusões
Os resultados deste estudo indicam as potencialidades da aplicação dos índices de caminhabilidade, sensíveis às especificidades locais, especialmente no que se refere às características do ambiente construído e sua relação com a escolha modal. O procedimento utilizado, pela sua simplicidade, mostrou-se exequível e possível de ser reproduzido em cidades brasileiras, permitindo confrontar seus resultados com os aqui observados. Além de incentivar o uso dos índices de caminhabilidade no planejamento urbano e especificamente em nossos bairros, como uma alternativa às abordagens tradicionais, tipicamente caracterizadas pelo seu viés favorável ao tráfego motorizado individual em detrimento das modalidades mais sustentáveis, como a caminhada.
As estimativas dos dois índices, obtidas de forma agregada, apresentaram uma correspondência com o que se esperava, de acordo com as características do ambiente construído para cada um dos três bairros investigados, que indicam Icaraí com um desenvolvimento mais próximo do conceito DOTS, a Região Oceânica com uma ocupação mais espraiada e Santa Rosa numa situação intermediária. Essa correspondência entre as estimativas dos dois índices também se confirma, em termos ordinais, com os padrões de viagens verificados no local, ou seja: as taxas e porcentagens das viagens a pé e por modalidades sustentáveis são mais favoráveis à Icaraí, seguido por Santa Rosa e Região Oceânica. Tais resultados agregados por bairro apontaram que os índices, no geral, apresentaram uma compatibilidade com as condições de caminhabilidade.
Por outro lado, em termos escalar, considerando o intervalo entre os valores e respectivas classificações do ambiente construído, tal correspondência se mantem em Icaraí mas não nos outros dois bairros, com a diferença se acentuando na Região Oceânica, que se caracteriza por um ambiente construído menos amigável à caminhada. Esse bairro foi classificado pelo Walk Score® como “Razoavelmente caminhável” e pelo Índice ACC como “Dependente do carro”, sendo esta categoria mais sintonizada com o esperado e com os padrões de viagens observados na região.
Nesse sentido, este estudo constatou que os dois índices possuem algumas particularidades que são realçadas, quando se verifica o percentual de viagens a pé e por modalidades sustentáveis de forma desagregada para cada um dos condomínios. Assim, levando em conta as relações entre as estimativas dos dois índices e a proporção de viagens a pé, percebe-se que os dois índices apresentaram estimativas similares no caso de locais com ambiente construído altamente favorável à caminhada e classificado como “Paraíso do pedestre”, abrangendo condomínios com mais de 35% e chegando a 70% das viagens a pé. Portanto, bem acima da média da RMRJ, que corresponde a 29,36%, bem como a de outras cidades identificadas como altamente caminháveis. Entretanto, as estimativas do Walk Score®, da mesma maneira que na análise agregada, tendem a se afastar das do Índice ACC, superestimando as notas, na medida em que há uma redução dessa percentagem das viagens, se acentuando para valores inferiores a 6% ou 15%, como é o caso da Região Oceânica. Quanto à análise desagregada, que contempla a proporção de viagens por modalidades sustentáveis para cada um dos condomínios, comportamento similar ocorre.
Nesse contexto, e a partir dos resultados estabelecidos neste estudo, segundo uma abordagem qualitativa, nota-se que as estimativas do Índice ACC refletiram melhor os padrões de viagens locais que as do Walk Score®. Portanto, apesar de algumas similaridades observadas entre as estimativas dos dois índices, há diferenças significativas que podem sinalizar que determinadas especificidades locais não são compreendidas pelo Walk Score®.
Por outro lado, cabe realçar que os resultados sugerem que os dois índices de caminhabilidade - resguardando as diferenças observadas entre eles no caso estudado - tendem a representar ambientes que estimulam não só a caminhada, mas também o uso de modalidades sustentáveis, que incluem o transporte público. E essa concepção de se estender às modalidades sustentáveis, pressupõe que a formulação do índice deve realçar não só a distância de acesso ao transporte público, mas a sua disponibilidade e qualidade, fundamentais em nossas cidades, tipicamente desiguais espacialmente e mal atendidas por este serviço coletivo.
Os resultados ainda confirmam o papel do ambiente construído no incentivo de uma escolha modal mais sustentável. De acordo com os dados levantados, o bairro mais espraiado (Região Oceânica), em relação aos outros dois mais compactos, gera por dia uma média de 4,17 a 4,67 viagens a mais, feitas de automóveis por unidade residencial. Estes dados reforçam as experiências registradas em outros estudos (Cervero & Arrington, 2008; Ewing & Cervero, 2010; García-Palomares, 2010), que apontam que um ambiente construído do tipo DOTS tende a reduzir em mais de 28 % as viagens de automóveis.
Na medida em que Icaraí tem uma renda média superior e que Santa Rosa tem renda similar à da Região Oceânica, pode-se considerar, nestes casos, que a influência do ambiente construído sobre as escolhas modais é maior que a renda.
Assim, o uso de índices de caminhabilidade pelos planejadores e gestores pode contribuir na identificação e hierarquização de localidades que requerem possíveis intervenções nas políticas de uso do solo, resultando na valorização de comunidades mais vibrantes, igualitárias e sustentáveis.
Além disso, o evento do COVID-19 e as medidas tomadas para o isolamento social explicitaram a necessidade de planejar bairros com atividades e serviços que atendam às necessidades da comunidade local, contribuindo para aumentar a resiliência de uma cidade quanto a sua saúde e o próprio direito a vida. O que se torna mais crítico no caso do Brasil, cujas cidades, caracterizadas por suas desigualdades sociais e espaciais, têm na periferia uma população mais vulnerável e dependente das áreas mais centrais, precisando percorrer tempos excessivos de viagens geralmente feitas em veículos lotados.
O Índice ACC, pela sua configuração de abordar as cinco dimensões do ambiente construído, facilita diagnosticar o tipo de intervenção que deve ser feita. Entretanto, reconhece-se que cada localidade tem suas especificidades e a concepção simples do Índice ACC requer aprimoramentos, principalmente pela multiplicidade de variáveis e a complexidade que envolve a caminhabilidade.
Por fim, é desejável que se incentive e se desenvolvam índices de caminhabilidade comprometidos com a realidade local e devidamente validados e ajustados. E nesse processo, além do uso das estimativas dos índices e sua relação com os padrões de viagens, é fundamental incluir a participação e percepção dos usuários que vivem no local, valorizando a experiência do caminhar que é um fator preponderante para a valorização e segurança dos lugares.
Agradecimentos
Pelo apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, da Rede Ibero-Americana de Estudo em Polos Geradores de Viagens (http://redpgv.coppe.ufrj.br) e do Niterói, Transporte e Trânsito - NITTRANS.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
08 Out 2021 -
Data do Fascículo
2021
Histórico
-
Recebido
16 Ago 2020 -
Aceito
20 Dez 2020