Acessibilidade / Reportar erro

Nódulos benignos da mama: uma revisão dos diagnósticos diferenciais e conduta

Benign breast masses: a review on diagnosis and management

Resumos

Os nódulos mamários benignos são responsáveis por até 80% das massas palpáveis. Seu diagnóstico diferencial é amplo, envolvendo os cistos mamários, os fibroadenomas, os tumores filóides, os papilomas, os lipomas, os hamartomas e os adenomas, entre outros. O fibroadenoma é a neoplasia mamária mais comum em pacientes menores de 35 anos e os cistos são mais freqüentes na perimenopausa. O diagnóstico diferencial entre nódulos sólidos ou císticos poderá ser feito por meio da punção aspirativa com agulha fina ou pela ultra-sonografia, sendo terapêutica para os últimos. Neste artigo serão revisados os aspectos diagnósticos diferenciais entre estes tumores e as novas abordagens terapêuticas.

Neoplasias mamárias; Neoplasias mamárias; Diagnóstico diferencial; Doenças mamárias


The benign mammary tumors are responsible for up to 80% of the clinical masses. Its differential diagnosis is wide, involving mammary cysts, fibroadenomas, phyllodes tumors, papillomas, hamartomas, and adenomas, among others. The fibroadenoma is the most common mammary neoplasia in patients under 35 years old, while the cysts are more frequent in the perimenopause. The differential diagnosis among solid or cystic nodules can be made through the fine-needle aspiration or by ultrasound, being therapeutic for the last ones. In this article, the differential diagnostic aspects will be revised between these tumors, as well as the new therapeutic approaches.

Breast neoplasms; Breast neoplasms; Differential diagnosis; Breast diseases


ARTIGOS REVISÃO

Nódulos benignos da mama: uma revisão dos diagnósticos diferenciais e conduta

Benign breast masses: a review on diagnosis and management

Afonso Celso Pinto NazárioI; Mychely Fernandes RegoII; Vilmar Marques de OliveiraIII

IProfessor Livre-Docente da Disciplina de Mastologia e Chefe do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil

IIDoutora em Ciências pela Disciplina de Mastologia do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil

IIIProfessor Doutor da Disciplina de Ginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – São Paulo (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Afonso Celso Pinto Nazário Rua Nova York, 603, apto. 73-L – Brooklin CEP 04560-001 – São Paulo/SP E-mail: nazarioafonso@hotmail.com

RESUMO

Os nódulos mamários benignos são responsáveis por até 80% das massas palpáveis. Seu diagnóstico diferencial é amplo, envolvendo os cistos mamários, os fibroadenomas, os tumores filóides, os papilomas, os lipomas, os hamartomas e os adenomas, entre outros. O fibroadenoma é a neoplasia mamária mais comum em pacientes menores de 35 anos e os cistos são mais freqüentes na perimenopausa. O diagnóstico diferencial entre nódulos sólidos ou císticos poderá ser feito por meio da punção aspirativa com agulha fina ou pela ultra-sonografia, sendo terapêutica para os últimos. Neste artigo serão revisados os aspectos diagnósticos diferenciais entre estes tumores e as novas abordagens terapêuticas.

Palavras-chaves: Neoplasias mamárias/diagnóstico; Neoplasias mamárias/terapia; Diagnóstico diferencial; Doenças mamárias

ABSTRACT

The benign mammary tumors are responsible for up to 80% of the clinical masses. Its differential diagnosis is wide, involving mammary cysts, fibroadenomas, phyllodes tumors, papillomas, hamartomas, and adenomas, among others. The fibroadenoma is the most common mammary neoplasia in patients under 35 years old, while the cysts are more frequent in the perimenopause. The differential diagnosis among solid or cystic nodules can be made through the fine-needle aspiration or by ultrasound, being therapeutic for the last ones. In this article, the differential diagnostic aspects will be revised between these tumors, as well as the new therapeutic approaches.

Keywords: Breast neoplasms/diagnosis; Breast neoplasms/therapy; Differential diagnosis; Breast diseases

Introdução

O achado de nódulo palpável na mama ou no rastreamento mamográfico é fator de impacto emocional para a maioria das pacientes, em parte pelo maior acesso às informações e campanhas de conscientização sobre o câncer de mama, afecção de alta freqüência, e cujo tratamento apresenta efeitos negativos na imagem pessoal e na sexualidade. Estima-se que tenham sido diagnosticados no Brasil 48.930 novos casos de câncer de mama em 2006, constituindo-se no tumor maligno mais comum entre as mulheres, excluindo-se os de pele não-melanoma¹. As pacientes buscam, em primeira instância, o auxílio do seu ginecologista. A este profissional não basta encaminhar ao especialista, mas muitas vezes, tranqüilizar a mulher e resolver o sintoma, uma vez que a maioria das afecções são benignas.

É importante ressaltar que até 80% dos tumores mamários palpáveis são alterações benignas e que não aumentam significativamente o risco para desenvolvimento do câncer de mama². A patologia benigna envolve entidades clínicas heterogêneas, com ampla variedade de sinônimos e discordância entre definições histológicas, para alguns autores sendo definidas como aberrações do desenvolvimento e involução normais da mama³. Contudo, é importante não generalizar nesta área, visto que corresponde à grande maioria das queixas mamárias e seu conhecimento mais detalhado evitará procedimentos invasivos em excesso ou falha no diagnóstico de eventual lesão maligna. Deve-se ter sempre como meta principal, pelo emprego racional dos métodos disponíveis, o diagnóstico de benignidade absoluta de um tumor, devendo-se reduzir a percentual mínimo a biópsia excisional para diagnóstico e identificar com precisão os casos em que o procedimento cirúrgico é indicado4.

Alterações funcionais benignas das mamas

O termo alterações funcionais benignas da mama define condição clínica caracterizada por dor e/ou nodularidade mamária que aparece no começo do menacme, inicia-se ou intensifica-se no período pré-menstrual e tende a desaparecer com a menopausa. Foi proposto em 1994, em reunião de consenso da Sociedade Brasileira de Mastologia, mas não é aceito por todos, principalmente pela redundância das expressões funcionais e benignas. Contudo, foi uma proposta na tentativa de unificar várias expressões inapropriadas, como displasia mamária, displasia cíclica, mastopatia fibrocística, doença cística, alteração fibrocística, entre outras, que confundiam e ainda confundem muitos ginecologistas e pacientes5.

O primeiro diagnóstico diferencial que deve ser feito em caso de nódulo palpável é justamente o pseudo-nódulo mamário, representado principalmente pelas alterações funcionais benignas da mama. Mulheres no menacme, na segunda fase do ciclo, freqüentemente se queixam e, por vezes, apresentam, de fato, nódulos palpáveis. De fato, o estímulo sinérgico do estradiol e progesterona na unidade ductal lobular terminal leva à proliferação do epitélio e do estroma, produzindo nodularidade e dor na fase pré-menstrual. No final da fase lútea, com a redução de níveis do estradiol e de progesterona, há regressão do epitélio lobular por apoptose e também do estroma intralobular, com melhora da sintomatologia no início do fluxo menstrual6.

Por isto, uma pergunta importante para a paciente é a data da última menstruação e, em caso de dúvida clínica, repetir o exame na primeira fase do ciclo. Estes nódulos geralmente apresentam-se com limites indistintos, podem ser uni ou bilaterais e são mais freqüentes nos quadrantes laterais, muitas vezes dolorosos. O ginecologista deve estar especialmente atento às nodularidades isoladas que persistem após dois a três fluxos menstruais, caracterizando os nódulos dominantes, os quais fazem parte do diagnóstico diferencial do câncer de mama, além do fibroadenoma7.

Cistos mamários

Frente a uma massa palpável em exame ginecológico de rotina, deve-se considerar como primeira opção, por sua fácil execução, desconforto mínimo e baixo custo, a punção aspirativa com agulha fina. Este procedimento será diagnóstico e terapêutico, em caso de cistos mamários.

A faixa etária em que mais comumente os cistos ocorrem é de 35 a 50 anos, coincidindo, pois, com a fase involutiva dos lóbulos mamários. Os cistos incidem em 7 a 10% da população feminina, podendo ser únicos ou múltiplos, uni ou bilaterais. Manifestam-se clinicamente como nódulos de aparecimento súbito, de contornos regulares, móveis e dolorosos. A consistência pode ser amolecida ou, quando o líquido intracístico encontra-se sob tensão, a sensação palpatória é fibroelástica. A maior parte dos cistos decorrem de processos involutivos da mama. Em alguns casos, entretanto, a parede do cisto pode sofrer metaplasia apócrina, com produção ativa de fluido, o que causa recidivas freqüentes7.

Os cistos são originados no ducto terminal da unidade lobular, definidos como estruturas com diâmetro maior que 3 mm, com comportamento biológico lábil, podendo aumentar ou desaparecer, independente de medidas terapêuticas. Provavelmente decorrem dos ciclos ovulatórios sucessivos, tão freqüentes nos dias de hoje pelo padrão de estilo de vida da mulher moderna, o que leva à manutenção do estímulo estroprogestativo sobre o lóbulo, resultando em doenças proliferativas, fibrose e formação de cistos mamários. De fato, a ativação constante do estroma pelos esteróides sexuais levaria à síntese crônica de colágeno e fibrose, que, ao obstruir os ductos e dútulos mamários, induziria à formação de microcistos e depois de macrocistos. Assim, fatores como menarca precoce, menopausa tardia, nuliparidade, oligoparidade ou primiparidade tardia e amamentação curta ou ausente são fatores agravantes na sua gênese7.

Vale a pena ressaltar que, durante a lactação, os cistos podem ser formados por conteúdo lácteo, sendo denominados galactoceles, ou ainda apresentar conteúdo purulento nos casos de abscessos organizados5.

A mamografia é obrigatória nas pacientes com mais de 40 anos, podendo dignosticar distintas alterações não palpáveis. A ultra-sonografia é o método mais sensível para o diagnóstico dos cistos mamários, com precisão de até 100%, detectando lesões a partir de 2 mm (Figura 1). Distingue ainda os cistos complicados (cistos com conteúdo espesso ou "debris" – pontos ecogênicos em suspensão) e os complexos (com septações espessas e/ou vegetações intracísticas)7.


A biópsia excisional pode ser indicada em caso de recidivas locais (mais de três) e deve ser realizada quando o conteúdo do aspirado for sanguinolento (afastar sempre acidente de punção) ou quando persistir massa palpável ou densidade mamográfica após remoção de todo o líquido (Quadros 1 e 2)5,7.



Fibroadenoma

O fibroadenoma é a segunda neoplasia mais freqüente da glândula mamária, precedida pelo carcinoma. É a afecção mamária benigna mais comum em mulheres com menos de 35 anos, assintomática em 25% dos casos e com múltiplas lesões em 13 a 20%8,9. Pode ocorrer desde a menarca até a senectude, mas é mais comum entre 20 e 30 anos de idade. Embora os esteróides sexuais sejam apontados como agentes promotores, fatores parácrinos entre o epitélio e o estroma parecem ser mais importantes no controle de seu crescimento, que é em geral autolimitado, não ultrapassando 3 a 4 cm de diâmetro10.

O diagnóstico é essencialmente clínico. Apresenta-se como tumor único ou múltiplo, móvel, bem delimitado, não fixo ao tecido adjacente, lobulado, de crescimento lento, com maior ocorrência no quadrante súpero-lateral. Em geral é indolor, exceto durante a gravidez e lactação, condições que podem estimular seu crescimento rápido e produzir dor por infarto. A consistência é fibroelástica, mas, nas pacientes de maior faixa etária, pode haver deposição de calcificação distrófica no nódulo ("calcificação em pipoca"), e o nódulo passa a ter consistência endurecida. É mais freqüente na terceira década e em mulheres negras, situação em que tendem à recorrência. O tamanho médio é de 2 a 3 cm, mas pode alcançar até 6 a 7 cm, caracterizando o fibroadenoma gigante. A bilateralidade é da ordem de 10 a 15% e focos múltiplos na mesma mama, de 5 a 10% dos casos. A freqüência de transformação maligna é muito baixa (0,1 a 0,3% dos casos), ocorrendo em faixa etária dos 40 aos 45 anos, isto é, 15 a 20 anos após a média de idade de ocorrência do fibroadenoma, sendo que o tipo histológico mais comumente envolvido é o lobular (65% dos casos)11.

Quando o aspecto palpatório não é típico, recorre-se à ultra-sonografia (Figura 2), que evidencia imagem nodular circunscrita, ovalada, hipoecóide, com margens bem definidas e com maior eixo paralelo à pele (diâmetro anti-radial – largura, maior que o radial – altura). Pode ocorrer reforço posterior e sombras laterais, características sugestivas de benignidade, classificadas como BI-RADSTM 312,13.


Por incidirem em mulheres na segunda e terceira décadas de vida, a mamografia não está indicada, pois o fibroadenoma apresenta a mesma textura radiológica do tecido mamário normal, que é exuberante nesta idade. Em faixas etárias mais elevadas, quando se indica a mamografia, apresenta-se como imagem nodular circunscrita, ovalada, de média densidade e eventualmente com calcificações grosseiras, com aspecto de "pipoca", aspecto que tipifica o achado mamográfico como BI-RADSTM 212,13.

A punção aspirativa com agulha fina é método diagnóstico importante (Figura 3), pois trata-se de uma das poucas lesões benignas da mama que está associada a diagnóstico citológico específico. Observam-se nos esfregaços grupos celulares epiteliais em dedo de luva, formando agrupamentos arborescentes e numerosos núcleos desnudos, muitas células ductais coesas em monocamadas e fragmentos de células estromais11.


A citologia, considerada isoladamente, tem valor elevado (70 a 90%). Já o tríplice diagnóstico (clínica, imagem e citologia) tem sensibilidade de 99,6%, com chance de falso negativo menor que 1%, que aumenta em mulheres com mais de 35 anos14,15. A punção aspirativa com agulha fina está especialmente indicada em faixas etárias mais elevadas ou quando se adota conduta expectante (não cirúrgica).

Além da forma clássica, o fibroadenoma pode se apresentar, mais raramente, nas formas juvenil, gigante, complexa e extramamária (localizações na bexiga, próstata, braço e pálpebra já foram descritos)16-19. Alguns estudos indicam o fibroadenoma como fator de risco para o desenvolvimento do carcinoma mamário, principalmente o fibroadenoma complexo, que é conceituado como aquele que possui alterações císticas, papilares, adenose esclerosante ou calcificações epiteliais no seu interior20,21.

Do ponto de vista etiopatogênico, acredita-se que o fibroadenoma seja originado do lóbulo mamário, apresentando estreita dependência hormonal, aumentando na lactação e regredindo na pós-menopausa, e não sofrendo transformação maligna. Apesar da sua estrogênio-dependência, não responde a terapêutica hormonal. Os anticoncepcionais hormonais orais podem ser empregados, descrevendo-se inclusive efeito protetor com diminuição do risco relativo de aparecimento desta afecção10,22.

O diagnóstico diferencial é feito com os pseudonódulos das alterações funcionais benignas, com o cisto mamário e com o carcinoma circunscrito. O cisto mamário em geral apresenta início súbito e dor, em mulheres com idade mais elevada. O termo carcinoma circunscrito é clínico e diz respeito a alguns tipos histológicos especiais (como o carcinoma mucinoso ou o medular), que apresentam comportamento biológico pouco infiltrativo, simulando no exame clínico e de imagem e o fibroadenoma. Além disto, a faixa etária é maior e a punção aspirativa com agulha fina ou grossa fecha o diagnóstico23.

A indicação cirúrgica é baseada na idade da paciente e nas dimensões do nódulo. O tratamento é cirúrgico em tumores com diâmetros maiores que 2 cm e consiste na exérese simples. O objetivo principal é evitar deformidade futura, pois embora o crescimento do fibroadenoma seja lento, é progressivo. Neste sentido, o nódulo é abordado por incisões estéticas segundo as linhas de força da mama, dando-se preferência às periareolares ou no sulco inframamário. Quando os nódulos localizarem-se longe da aréola e se utilizar anestesia local, é melhor praticar incisão circumareolar sobre o nódulo, evitando tunelizações, que, além de produzirem dor, podem provocar hematomas23.

Em tumores menores, nas pacientes com menos de 25 anos, pode ser feito o acompanhamento clínico, com controle clínico e/ou ecográfico semestral, sendo indicada exérese nos casos de crescimento progressivo e ansiedade da paciente. Nos fibroadenomas múltiplos e pequenos, optamos, da mesma forma, pelo controle, evitando-se assim múltiplas incisões sobre o tegumento cutâneo. Já nas mulheres com mais de 35 anos, a conduta deverá ser sempre cirúrgica (Quadro 1)23.

É importante ressaltar opções terapêuticas menos invasivas, como a mamotomia, em que, por meio de dispositivo gerador de vácuo acoplado a sonda de calibre 8 a 14, removem-se completamente tumores de tamanho intermediário, em até 87,5% dos casos para tumores com 1,5 cm, e 71,4% em tumores de até 2 cm24,25. Há ainda a crioablação, método que, por meio de temperaturas extremamente baixas (chegando a -196°C), provoca necrose do tumor, o qual é reabsorvido em até 95% do seu tamanho ao final de 12 meses26,27. Este método deverá ser sempre realizado após a biópsia percutânea com agulha grossa (core-biopsy), para diagnóstico de certeza da natureza benigna da lesão.

O rastreamento mamográfico vem detectando grande número de nódulos assintomáticos sugestivos de fibroadenomas. O diagnóstico mamográfico conclusivo só é feito em caso de macrocalcificações no interior da lesão ("calcificações em pipoca" – BI-RADSTM 2). Nos demais casos, a chance de malignidade é de 2%, devendo ser realizado acompanhamento destes nódulos, categorizados como BI-RADSTM 3. O seguimento pode ser precedido pela punção aspirativa com agulha fina e é realizado por 6, 12 e 24 meses, para confirmar a estabilidade da lesão (Quadro 2). Após este período, preconiza-se a conduta expectante, independente da faixa etária13,23.

Tumor filóides

O tumor filóides ou filodes (cystosarcoma phyllodes) apresenta-se como tumor móvel, lobulado e indolor. É muito raro, correspondendo a 2% dos tumores fibroepiteliais da mama, sendo mais comum após os 40 anos2. Na maioria das vezes (80% dos casos) é benigno. Entretanto, apresenta alta tendência de recidiva local e pode sofrer degeneração maligna sarcomatosa.

A característica peculiar deste tumor é a grande celularidade do estroma, comparada à do fibroadenoma, e por isto também é denominado fibroadenoma hipercelular. O epitélio pode ser hiperplásico, com ou sem atipias. Para definição de benignidade ou malignidade, consideram-se no componente estromal a contagem mitótica, atipias celulares e comprometimento das margens11.

A principal diferença clínica entre o tumor filóides e o fibroadenoma, é o seu crescimento rápido e a capacidade de atingir grandes volumes, por vezes ocupando toda a mama (Figura 4). A consistência é elástica e a adenopatia axilar não é incomum, mas é de natureza inflamatória. A associação com fibroadenoma ocorre em 30% dos casos. Ao contrário do fibroadenoma, a bilateralidade e a multicentricidade são excepcionais. Embora tumores mais volumosos, endurecidos e com ulcerações sugiram formas malignas, os parâmetros clínicos não são suficientes para diferenciar as variantes benignas das malignas do tumor filóides11.


O diagnóstico é clínico e a mamografia é inespecífica. A punção aspirativa com agulha fina e a biópsia percutânea com agulha grossa apresentam baixo valor preditivo, provavelmente pelo fato de o tumor ser bastante volumoso e apresentar com freqüência, em seu interior, áreas de infarto hemorrágico, o que dificulta o diagnóstico. A biópsia com agulha grossa (core biopsy ou mamotomia) pode diferenciar o tumor filóides do carcinoma, mas, com freqüência, não discrimina a variedade benigna da maligna, sendo necessária a avaliação anátomo-patológica de todo o tumor O diagnóstico diferencial principal é com o fibroadenoma juvenil, que também atinge grandes dimensões, mas apresenta consistência fibroelástica e incide, em geral, na adolescência16,23.

O tratamento cirúrgico consiste na tumorectomia com retirada de 1 a 2 cm de tecido mamário peritumoral macroscopicamente normal, para garantir margens cirúrgicas livres e diminuir a taxa de recorrência. Obviamente, nos tumores muito volumosos, que comprometem toda a glândula mamária, pratica-se a mastectomia total ou a adenomastectomia, com reconstrução plástica imediata. A linfadenectomia axilar é desnecessária, uma vez que, quando a forma histológica for maligna, a disseminação faz-se por via hematogênica28. Nesta condição, o prognóstico é sombrio, não havendo resposta com emprego da radio, quimio ou hormonioterapias.

Papiloma

O papiloma intraductal é neoplasia epitelial benigna que se desenvolve no lúmen de grandes e médios ductos subareolares, não formando massa palpável. O potencial de malignidade é baixo (risco relativo de 1,3). O seu principal sintoma é a descarga papilar hemorrágica, espontânea, uniductal e unilateral. O fluxo pode ser intermitente, com períodos de remissão, em função de necrose e eliminação de parte do papiloma junto com a secreção; entretanto, ao se regenerar a partir de sua porção basal, volta a produzir manifestação clínica. É mais freqüente entre os 30 e 50 anos. Em pacientes com mais de 50 anos, com esta queixa, deve-se sempre afastar o diagnóstico de carcinoma papilífero e o ductal28.

O papiloma em geral é único e, no diagnóstico clínico, é importante a pesquisa do "ponto-gatilho", que consiste na pressão dos pontos cardinais do complexo aréolo-papilar com dedo indicador, com o intuito de identificar qual ducto está comprometido.

A neoplasia não é impalpável e, quando há tumor associado ao fluxo, decorre do ducto cisticamente dilatado pela obstrução que o papiloma provoca. A citologia do fluxo apresenta baixo valor preditivo de malignidade (30% de resultados falsos-negativos) e eventualmente apresenta alguma utilidade se há dúvida quanto à natureza hemática da secreção, oportunidade em que se pode identificar hemácias no esfregaço28.

A mamografia fornece poucos subsídios, mas é realizada em função da faixa etária, pois o papiloma é mais prevalente nas quarta e quinta décadas. A ductografia apresenta baixo valor preditivo, além do risco potencial de infecção e de disseminação de células neoplásicas, tendo caído em desuso29.

O tratamento consiste na exérese seletiva do ducto, também designada microductectomia, pela incisão transareolopapilar ou periareolar. A identificação do ducto comprometido é feita pela pesquisa do "ponto-gatilho", que é cateterizado e dissecado distalmente. Quando não se identifica o ponto-gatilho, a ultra-sonografia pode ser útil. De fato, o conteúdo sólido no interior do ducto dilatado pode ser identificado quando se utilizam transdutores de alta freqüência, além de ser possível precisar a distância da lesão em relação ao mamilo, o que auxilia na extensão da ressecção cirúrgica29.

É importante salientar que as lesões papilares são causa de falso-positivo no exame intra-operatório, o que deve ser evitado, sendo mais seguro aguardar o resultado por parafina30. Por outro lado, os papilomas múltiplos são raros e a secreção é sintoma menos comum nesta afecção, sendo o tumor a sua principal manifestação clínica. O potencial maligno é moderado, com risco relativo de 3,728.

Outros tumores

Como a mama é normalmente constituída também por tecido adiposo, não é surpreendente que o lipoma seja relativamente freqüente. O lipoma que contém estruturas ductais é chamado de adenolipoma, e quando possui componentes vasculares e cartilagem madura, é denominado angiolipoma e condrolipoma, respectivamente30. Já o hamartoma é lesão pouco observada, com perfil mamográfico peculiar de lesão circunscrita contendo gordura. Apresenta-se como nódulo de dimensões variadas (1 a 20 cm), amolecido e móvel. Esta afecção tem margens bem definidas, mas não possui cápsula verdadeira (Figura 5). É achado tipicamente benigno (BI-RADSTM 2) e não é obrigatória sua enucleação31.


Devem ainda ser destacados os adenomas mamários, classificados em adenoma tubular e da lactação. São clinicamente semelhantes aos fibroadenomas (Figura 6), porém, do ponto de vista microscópico, são tumores epiteliais benignos com estroma normal em relação a sua função de sustentação14.


Considerações finais

As doenças mamárias benignas compõem grande maioria das queixas mamárias do dia-a-dia do ginecologista. É importante saber distingui-las com acurácia, evitando iatrogenias, ao indicar procedimentos cirúrgicos desnecessários e dispendiosos para pacientes com nódulos sólidos à ecografia. Por meio dos métodos diagnósticos atuais, seja por mamografia, ultra-sonografia, citologia ou biópsia com agulha grossa, pode-se propor com segurança o acompanhamento clínico da grande maioria destas afecções e indicar com precisão os casos que deverão ser excisados cirurgicamente.

Recebido: 14/03/2007

Aceito com modificações: 04/04/2007

  • 1
    Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer (INCA) [homepage da Internet]. Estimativa 2006. Incidência de câncer no Brasil. [citado 2007 Jan 12]. Disponível em: http://www.inca.gov.br/estimativa/2006/
  • 2. Boff RA, Wisintainer F. Mastologia moderna: abordagem multidisciplinar. Caxias do Sul: Mesa Redonda; 2006.
  • 3. Dixon JM, Mansel RE. ABC of breast diseases: congenital problems and aberrations of normal breast development and involution. BMJ. 1994;309(6957):797-800.
  • 4. Veronesi U, Luini A, Costa A, Andreoli C. Mastologia oncológica. Rio de Janeiro: Medsi; 2002.
  • 5. Barros AC, Silva HMS, Dias EN, Nazário ACP, Figueira Filho ASS. Mastologia: condutas. Rio de Janeiro: Revinter; 1999.
  • 6. Navarrete MA, Maier CM, Falzoni R, Quadros LG, Lima GR, Baracat EC, et al. Assessment of the proliferative, apoptotic and cellular renovation indices of the human mammary epithelium during the follicular and luteal phases of the menstrual cycle. Breast Cancer Res. 2005;7(3):R306-13.
  • 7. Nazario ACP, Araújo Neto JT. Alterações funcionais benignas da mama. In: Baracat EC, Lima GR. Guia de ginecologia. São Paulo: Manole; 2005. p. 629-33. (Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar).
  • 8. Alle KM, Moss J, Venegas RJ, Khalkhali I, Klein SR. Conservative management of fibroadenoma of the breast. Br J Surg. 1996;83(7):992-3.
  • 9. Greenberg R, Skornick Y, Kaplan O. Management of breast fibroadenomas. J Gen Intern Med. 1998;13(9):640-5.
  • 10. Simomoto MM, Nazario AC, Gebrim LH, Simões MJ, Baracat EC, De Lima GR. Morphometric analysis of the epithelium of mammary fibroadenomas during the proliferative and secretory phases of the menstrual cycle. Breast J. 1999;5(4):256-61.
  • 11. Rosen PP. Rosen's breast pathology. 2nd ed. Philadelphia: Lippincott-Raven; 2001. p. 143-55.
  • 12. Stavros AT, Thickman D, Rapp CL, Dennis MA, Parker SH, Sisney GA. Solid breast nodules: use of sonography to distinguish between benign and malignant lesions. Radiology. 1995;196(1):123-34.
  • 13. Tabar L, Dean PB, Tot T. Teaching atlas of mammography. 2nd ed. New York: Thieme Medical; 2001.
  • 14. Rosen PP, Hoda SA. Breast pathology: diagnosis by needle core biopsy. 2nd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2006. p. 69-83.
  • 15. Houssami N, Cheung MN, Dixon JM. Fibroadenoma of the breast. Med J Aust. 2001;174(4):185-8.
  • 16. Mies C, Rosen PP. Juvenile fibroadenoma with atypical epithelium. Am J Surg Pathol. 1987;11(3):184-90.
  • 17. Dent DM, Cant PJ. Fibroadenoma. World J Surg. 1989;13(6): 706-10.
  • 18. Pantanowitz L, Lyle S, Tahan SR. Fibroadenoma of the eyelid. Am J Dermatopathol. 2002;24(3):225-9.
  • 19. Solomon GJ, Shin SJ, Romanzi LJ. A 65-year-old woman with a "hemorrhoid". Fibroadenoma of the anogenital region. Arch Pathol Lab Med. 2006;130(2):e30-2.
  • 20. Dupont WD, Page DL, Parl FF, Vnencak-Jones CL, Plummer WD Jr, Rados MS, et al. Long-term risk of breast cancer in women with fibroadenoma. N Engl J Med. 1994;331(1):10-5.
  • 21. Pick PW, Iossifides IA. Ocurrence of breast carcinoma within a fibroadenoma. A review. Arch Pathol Lab Med. 1984;108(7): 590-4.
  • 22. Narvaiza DG, Nazário ACP, Alberti VN, Lima GR. Cell proliferation in normal breast tissue during artificial menstrual cycle regulated by oral contraceptives by the expression of proliferating cell nuclear antigen (PCNA). Prelimary results. Breast J. 1998;4 Suppl 1:110.
  • 23. Nazário ACP, Narvaiza DC. Neoplasias benignas da mama. In: Baracat EC, Lima GR. Guia de ginecologia. São Paulo: Manole; 2005. p. 653-7. (Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar).
  • 24. Kemp C. Biópsia percutânea com agulha grossa vácuo-assistida por ultra-sonografia (mamotomia). In: Kemp C, Baracat FF, Rostagno R, editores. Lesões não palpáveis da mama: diagnóstico e tratamento. Rio de Janeiro: Revinter; 2002. p. 115-29.
  • 25. Fine RE, Whitworth PW, Kim JA, Harness JK, Boyd BA, Burak WE Jr. Low-risk palpable breast masses removed using a vacuum-assisted hand-held device. Am J Surg. 2003;186(4):362-7.
  • 26. Caleffi M, Duarte Filho D, Borghetti K, Graudenz M, Littrup PJ, Freeman-Gibb LA, et al. Cryoablation of benign breast tumors: evolution of technique and technology. Breast. 2004;13(5):397-407.
  • 27. Kaufman CS, Littrup PJ, Freman-Gibb LA, Francescatti D, Stocks LH, Smith JS, et al. Office-based cryoablation of breast fibroadenomas: 12-month follow up. J Am Coll Surg. 2004;198(6):914-23.
  • 28. Bland KI, Copeland III EM. The breast: comprehensive management of benign and malignant diseases. 3rd ed. Philadelphia: W.B. Saunders; 2004.
  • 29. Puglisi F, Zuiani C, Bazzocchi M, Valent F, Aprile G, Pertoldi B, et al. Role of mammography, ultrasound and core biopsy in the evaluation of papillary breast lesions. Oncology. 2003;65(4):311-5.
  • 30. Haagensen CD. Disease of the breast. 3rd ed. Philadelphia: W.B. Saunders; 1986.
  • 31. Daya D, Trus T, D'Souza TJ, Minuk T, Yemen B. Hamartoma of the breast, an underrecognized breast lesion. A clinicopathologic and radiographic study of 25 cases. Am J Clin Pathol. 1995;103(6):685-9.
  • Correspondência:
    Afonso Celso Pinto Nazário
    Rua Nova York, 603, apto. 73-L – Brooklin
    CEP 04560-001 – São Paulo/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Jul 2007
    • Data do Fascículo
      Abr 2007

    Histórico

    • Aceito
      04 Abr 2007
    • Recebido
      14 Mar 2007
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br