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Estudo epidemiológico da síndrome da cauda equina

Resumos

OBJETIVO: O objetivo primário deste estudo é analisar as características e desfechos dos casos internados por síndrome da cauda equina (SCE) em nosso serviço. Secundariamente, este trabalho servirá de base para outros estudos comparativos visando um entendimento maior da doença e de sua epidemiologia. MÉTODOS: Estudo retrospectivo dos prontuários das internações por SCE no IOT-HCFMUSP no período de 2005 a 2011 com diagnósticos de SCE e bexiga neuropática. As seguintes variáveis foram analisadas: sexo, idade, etiologia da doença, nível topográfico da lesão, tempo de história da lesão até o diagnóstico, presença de bexiga neurogênica, tempo entre o diagnóstico da SCE e a cirurgia, reversão do déficit ou da bexiga neurogênica. RESULTADOS: Por tratar-se de uma doença rara, não conseguimos estabelecer correlações estatisticamente significativas entre as variáveis analisadas e os desfechos da doença. Porém, este estudo evidenciou deficiências do nosso sistema público de saúde quanto ao manejo desses pacientes. CONCLUSÃO: O trabalho mostra que apesar de bem definidas as bases para conduta da SCE, observamos um número maior de sequelas causadas pela patologia, do que visto na literatura. O atraso no diagnóstico e, a partir deste, do tratamento definitivo, foi a causa para o alto número de sequelas. Nível de evidência iv, série de casos.

Cauda equina; Deslocamento do disco intervertebral; Bexiga urinaria neurogênica


OBJECTIVE: The primary purpose of this study was to determinate the characteristics and outcomes of the patients admitted at our clinics diagnosed with cauda equina syndrome (CES). Secondarily, this study will serve as a basis for other comparative studies aiming the better understanding of this condition and its epidemiology. METHODS: We conducted a retrospective study by reviewing the medical records of patients diagnosed with CES and neurogenic bladder between 2005 and 2011. The following variables were analyzed: gender, age, etiology, topographic level of the lesion, time between disease onset and diagnosis, presence of neurogenic bladder, time between diagnosis and surgery, neurological damage and neurogenic bladder persistence. RESULTS: Considering that CES is a rare condition, we were not able to establish statistic correlation between the analyzed variables and the outcomes of the disease. However, this study brought to light the inadequacy of our public health system in treating that kind of patient. CONCLUSION: The study shows that despite the well-defined basis for managing CES, we noted a greater number of patients with sequels caused by this condition, than it is seen in the literature. The delayed diagnosis and, consequently, delayed treatment, were the main causes for the results observed. Level of evidence iv, case series.

Cauda equina; Intervertebral disc displacement; Urinary bladder, neurogenic


ARTIGO ORIGINAL

Estudo epidemiológico da síndrome da cauda equina

Fernando Augusto Freitas Fuso; André Luiz Natálio Dias; Olavo Biraghi Letaif; Alexandre Fogaça Cristante; Raphael Martus Marcon; Tarcísio Eloy Pessoa de Barros Filho

Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT-HCFMUSP)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, 333 - 1º. Andar Cerqueira Cesar 05403-010. São Paulo, SP. Brasil fusoortop@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: O objetivo primário deste estudo é analisar as características e desfechos dos casos internados por síndrome da cauda equina (SCE) em nosso serviço. Secundariamente, este trabalho servirá de base para outros estudos comparativos visando um entendimento maior da doença e de sua epidemiologia.

MÉTODOS: Estudo retrospectivo dos prontuários das internações por SCE no IOT-HCFMUSP no período de 2005 a 2011 com diagnósticos de SCE e bexiga neuropática. As seguintes variáveis foram analisadas: sexo, idade, etiologia da doença, nível topográfico da lesão, tempo de história da lesão até o diagnóstico, presença de bexiga neurogênica, tempo entre o diagnóstico da SCE e a cirurgia, reversão do déficit ou da bexiga neurogênica.

RESULTADOS: Por tratar-se de uma doença rara, não conseguimos estabelecer correlações estatisticamente significativas entre as variáveis analisadas e os desfechos da doença. Porém, este estudo evidenciou deficiências do nosso sistema público de saúde quanto ao manejo desses pacientes.

CONCLUSÃO: O trabalho mostra que apesar de bem definidas as bases para conduta da SCE, observamos um número maior de sequelas causadas pela patologia, do que visto na literatura. O atraso no diagnóstico e, a partir deste, do tratamento definitivo, foi a causa para o alto número de sequelas. Nível de evidência iv, série de casos.

Descritores: Cauda equina. Deslocamento do disco intervertebral. Bexiga urinaria neurogênica.

INTRODUÇÃO

A síndrome da cauda equina (SCE) classicamente caracteriza-se pela compressão das raízes nervosas lombares, sacrais e coccígeas distais ao término do cone medular na altura das vértebras L1 e L2.1 Apesar de se tratar de uma doença de baixa incidência na população, girando em torno de 1 para 33000 a 1 para 100000 habitantes,2 suas sequelas ainda geram altos custos para a saúde pública.

Os sinais clínicos característicos da patologia são: dor lombar intensa frequentemente acompanhada de ciática, anestesia em sela,1-3 disfunção esfincteriana e sexual e fraqueza de membros inferiores.1,4 Para o diagnóstico, não é obrigatória a presença de todos esses sinais simultaneamente.1 A história clínica e exame neurológico levam à necessidade de confirmação diagnóstica através de exames complementares como tomografia computadorizada (TC), e o padrão-ouro, ressonância magnética (RM).1 A RM é mandatória para a determinação da topografia da compressão e da etiologia.

Dentre as causas de compressão, destacam-se hérnia discal extrusa3 (Figuras 1A-B, 2A-B) lesões tumorais (Figura 3), fraturas vertebrais,5-7 estenoses do canal,8 infecções,9,10 pós-manipulação cirúrgica, pós-anestesia espinhal, espondilite anquilosante e ferimentos por arma de fogo. Trata-se de uma urgência ortopédica e seu tratamento de eleição continua sendo a descompressão cirúrgica,8,11-13 que, se realizada antes de 48 horas do início dos sintomas,14 reduz os danos neurológicos2,12,13 e melhora o prognóstico do paciente.




O objetivo primário deste estudo é analisar as características dos casos e desfechos dos pacientes internados por SCE pelo Grupo de Coluna do IOT-HCFMUSP. Secundariamente, este trabalho servirá de base para outros estudos comparativos visando um entendimento maior da doença e de sua epidemiologia.

MÉTODOS

Foi realizado estudo retrospectivo dos prontuários das internações por síndrome da cauda equina (SCE) no IOT-HCFMUSP no período de 2005 a 2011. Foram pesquisados todos os prontuários com diagnósticos classificados pelo Código Internacional de Doenças (CID) com os códigos G834 e N310/N311/N312, respectivamente, síndrome da cauda equina e bexiga neuropática. Os pacientes foram selecionados por critérios de conveniência.

Destes prontuários, foram excluídos todos aqueles que apresentaram como causas, lesões medulares acima do nível da vértebra T12. Foram incluídos os pacientes com diagnóstico de SCE confirmada após: história clínica e exame neurológico detalhados na admissão e investigação com tomografia computadorizada e ressonância magnética de coluna lombossacra. Todos os casos da amostra tinham bem documentados em prontuário, o exame físico inicial e pós-operatório e a evolução da doença.

Os pacientes da amostra tiveram as seguintes variáveis analisadas: sexo, idade, etiologia da doença, nível topográfico da lesão, tempo de história da lesão até o diagnóstico, nível do déficit neurológico (considerado o último nível topográfico normal com relação à força e sensibilidade), presença de bexiga neurogênica, tempo entre o diagnóstico da SCE e o procedimento cirúrgico, reversão do déficit ou da bexiga neurogênica.

Em nosso serviço, o atendimento clínico, a complementação com exames de imagem (RM e TC) e o tratamento dessa patologia - descompressão de urgência - têm bases muito bem estabelecidas e padronizadas. Os desfechos (variáveis) foram analisados pelas descrições da anamnese e exame físico neurológico inicial (admissão no Pronto Socorro); do primeiro dia pós-operatório; e das consultas dos retornos ambulatoriais de duas semanas e de 90 a 120 dias após a alta hospitalar. Os dados foram submetidos à análise.

RESULTADOS

Dos 19 pacientes incluídos no estudo, a grande maioria dos pacientes levou mais de 48 horas, após o início dos sintomas, para ser referenciada ao nosso serviço. (Tabela 1)

As etiologias mais prevalentes evidenciadas em ordem decrescente e sua respectiva porcentagem estão contidas na Tabela 2.

A distribuição entre gêneros foi de sete casos (37%) do sexo maculino e 12 casos (63%) do sexo feminino. Os pacientes apresentaram idade média de 44,16 +/- 12,83 anos em uma amplitude de 22 a 64 anos de idade.

A relação dos níveis topográficos acometidos apresentou a distribuição mostrada na Tabela 3.

As relações entre o tempos do início dos sintomas, do diagnóstico e da cirurgia estão demostradas na Tabela 4.

Após cirurgia de descompressão, avaliamos a evolução do déficit e da bexiga neurogênica no primeiro dia de pós-operatório, no retorno ambulatorial de duas semanas e em retorno ambulatorial de até 120 dias. Nas avaliações, consideramos melhora, qualquer recuperação neurológica em relação ao déficit inicial e a resolução completa da bexiga neurogênica. Obtivemos os resultados encontrados na Tabela 5.

DISCUSSÃO

A SCE ainda permanece uma doença muitas vezes negligenciada nos serviços de urgência, o que acarreta grandes custos sociais e financeiros. No nosso estudo a maioria dos pacientes 79% (n=15) buscou ou foi referenciada para o nosso serviço com tempo muito superior às 48 horas preconizadas. (Figura 3)

Sua patogênese permanece em investigação.1 As duas hipóteses principais giram em torno da compressão mecânica ou da isquemia à cauda equina. Os dados encontrados neste estudo mostram que a principal etiologia encontrada foi por hérnia de disco 69% (13), seguido por tumor 16% (3), trauma 10% (2) e vascular 5% (1). Na realidade essas etiologias combinam de alguma forma mecanismos compressivos e/ou isquêmicos.

Uma vez que a etiologia mais prevalente foi patologia discal, consequentemente, a faixa etária média 44,16 +/- 12,83 anos da nossa amostra corresponde àquela em que mais se observa a ocorrência de hérnias de disco,1,6 assim como a maior prevalência dos níveis topográfico e neurológico encontrados L4-L5-S1 68,4% (13).1,6

Encontramos na nossa casuística de SCE causada por hérnia discal, uma diferença entre os sexos, homens 37% (7) mulheres 63% (12), porém não estatisticamente significante, o que vai ao encontro com a distribuição entre gêneros dessa etiologia na literatura.1,14-16

Observamos um grande atraso de tempo entre o início dos sintomas e o diagnóstico definitivo da SCE (tempo mediano: 11+/-24 dias, amplitude: 2-90 dias). Acreditamos que ainda há grande confusão dos profissionais de saúde com relação aos sinais e sintomas clássicos da doença o que impede o rápido diagnóstico. O Sistema Público de Saúde ainda sofre com baixa disponibilidade de recursos diagnósticos complementares nos serviços de atendimento primário de saúde, mais uma causa potencial de atraso. Soma-se a isso o baixo nível socioeconômico de diversos pacientes, o que eventualmente retarda a busca por ajuda médica. Podemos ainda citar a superlotação dos Serviços de Saúde Públicos e a longas filas de espera como possíveis agravantes desta situação.

A descompressão cirúrgica de urgência,17,18 ainda que o tempo limite exato para a cirurgia seja debatido por diferentes autores,12,14 continua sendo o tratamento mais eficaz. Esta é a única maneira segura de impedir a progressão da lesão e seus déficits permanentes.19,20

No nosso serviço o atendimento dos pacientes é baseado em um protocolo bem definido, com pronto acesso a investigação radiológica complementar. Ainda assim os pacientes desta amostra não foram submetidos de forma satisfatória à descompressão cirúrgica de urgência (tempo mediano entre o diagnóstico e cirurgia: 4+/-6 dias, amplitude: 1-25 dias). A principal explicação possível para o atraso na condução cirúrgica dos casos deve-se ao grande volume de procedimentos do nosso centro cirúrgico, que compreende outras especialidades ortopédicas, além de cirurgia de coluna.

No que tange às sequelas neurológicas, nas quais se incluem déficit motor e sensitivo permanentes e bexiga neurogênica, observamos no nosso trabalho a persistência do déficit inicial em 40% (6) e da bexiga neurogênica em 85% (13) dos pacientes submetidos a procedimento de descompressão. Devido ao restrito número de casos, não obtivemos correlações estatisticamente significantes entre as variáveis, porém observamos uma tendência a um melhor prognóstico dos pacientes operados com tempo próximo ao tempo ideal preconizado.

CONCLUSÃO

O trabalho mostra que apesar de muito bem definidas as bases para conduta da SCE, observamos em nosso meio um número maior de sequelas causadas pela patologia, do que mostra a literatura. O atraso na realização do diagnóstico e, a partir deste, da realização do tratamento definitivo, foi a causa para o alto número de sequelas.

Futuros estudos multicêntricos com um número maior de pacientes poderão ampliar os conhecimentos sobre a SCE, e evidenciar a importância para o Sistema Público de Saúde em otimizar recursos para o atendimento adequado desta doença.

Artigo recebido em 08/08/2012

Aprovado em 12/12/2012

Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito de interesses referente a este artigo.

Trabalho realizado no LIM 41 - Laboratório de Investigação Médica do Sistema Músculo-Esquelético do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP. Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, 333 - 1º. Andar
    Cerqueira Cesar 05403-010. São Paulo, SP. Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      08 Ago 2012
    • Aceito
      12 Dez 2012
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