Comparação do nível de dependência funcional pré e pós-operatório de idosos submetidos à artroplastia de quadril

Resumo

Introdução

Fraturas de colo do fêmur e osteoartrose no quadril afetam a independência funcional de idosos. A artroplastia de quadril (AQ) é uma cirurgia para tratar essas condições e a fisioterapia pode reduzir o nível de dependência funcional.

Objetivo

Comparar o nível de dependência funcional pré e pós-operatório de idosos submetidos à AQ, avaliar a associação entre dependência funcional e independência funcional e verificar se a idade está associada à pior dependência funcional destes pacientes.

Métodos

Estudo transversal, descritivo, quantitativo e de associação, onde voluntários idosos submetidos à AQ foram avaliados no pré e pós-operatório usando o índice de Katz e a Medida de Independência Funcional (MIF). A análise comparativa foi realizada com os testes estatísticos Wilcoxon pareado e correlação de Spearman. Uma regressão linear examinou a influência da dependência funcional na independência pós-operatória (p < 0,05).

Resultados

Quarenta e oito pacientes foram avaliados tanto no pré quanto no pós-operatório por meio do índice Katz, observando-se uma redução da dependência funcional após o procedimento de AQ. A avaliação da MIF demonstrou que houve aumento da independência funcional no pós-operatório, demonstrando que o procedimento cirúrgico associado à fisioterapia precoce, enquanto o paciente ainda está hospitalizado, promoveu a independência funcional. Além disto, houve uma relação diretamente proporcional entre nível de dependência e idade.

Conclusão

A dependência funcional reduziu após a cirurgia de AQ e aumentou a independência em idosos. A dependência funcional impactou a independência após a cirurgia e a idade influenciou a dependência funcional.

Artroplastia; Idoso; Estado funcional; Quadril; Fisioterapia

Abstract

Introduction

Femur fractures and hip osteoarthritis affect the functional independence of older adults. Hip arthroplasty (HA) is a surgery to treat these conditions and physiotherapy can reduce functional dependence levels.

Objective

Compare pre- and postoperative functional dependence in older adults submitted to HA, assess the association between functional dependence and independence, and whether age is associated with greater functional dependence in these patients.

Methods

A quantitative cross-sectional descriptive comparative study with older adult volunteers submitted to HA evaluated before and after surgery using the Katz index and Functional Independence Measure (FIM). Comparative analysis was performed via Wilcoxon’s matched pairs test and Spearman’s correlation. Linear regression was applied to assess the influence of functional dependence on postoperative independence (p < 0.05).

Results

Forty-eight patients were evaluated in the pre- and postoperative stages using the Katz index, which demonstrated reduced functional dependence after HA. The FIM assessment indicated greater post-operative functional dependence, demonstrating the surgical procedure combined with early physiotherapy while patients were hospitalized promoted functional independence in older adults. Additionally, there was a directly proportional relationship between dependence level and age.

Conclusion

Functional dependence declined after HA, which improved independence in older adults. Functional dependence affected postoperative independence and age influenced functional dependence.

Arthroplasty; Older adults; Functional status; Hip; Physiotherapy

Introdução

Os idosos são constantemente expostos a condições que levam à redução da capacidade funcional, como as fraturas de colo do fêmur e a osteoartrose do quadril, condições que impactam diretamente a independência e repercutem de maneira negativa na qualidade de vida.¹ Pacientes idosos vítimas de fratura de colo do fêmur e/ou com quadro de osteoartrose de quadril podem apresentar aumento da dependência funcional devido à redução da amplitude de movimento, força muscular, quadro álgico e restrição ao leito.²

A artroplastia de quadril (AQ) é um procedimento cirúrgico para tratar as fraturas de colo do fêmur e/ou osteoartrose de quadril, que consiste na substituição da porção proximal do fêmur e/ou acetábulo, caracterizando-se como artroplastia parcial do quadril (APQ) ou artroplastia total do quadril (ATQ), respectivamente.³

O pós-operatório de AQ, associado à redução física e cognitiva que os idosos podem apresentar em decorrência do processo natural de envelhecimento, pode contribuir para uma intensificação dos déficits funcionais.⁴,⁵ Os idosos em processo de hospitalização podem ter a capacidade funcional comprometida de forma permanente ou temporária, visto que a internação é um evento complexo que compromete a autonomia e pode contribuir para o declínio cognitivo.⁶ Dessa forma, o fisioterapeuta, profissional que faz parte da equipe multiprofissional, tem papel importante na reabilitação do paciente idoso, seja no pré ou pós-operatório de AQ, atuando principalmente na reabilitação precoce desses pacientes, retirada segura do leito e prevenção de complicações, como a síndrome do imobilismo.⁷

A atuação do fisioterapeuta também é importante no período pré-operatório de AQ. Antes da realização do procedimento cirúrgico, o fisioterapeuta deve avaliar o paciente para conhecer seu nível de funcionalidade prévio a fim de traçar metas para o período de reabilitação pós-operatória.⁸ O fisioterapeuta também pode, em conjunto com a equipe multiprofissional, munir o paciente de informações sobre o procedimento cirúrgico, posicionamento adequado no leito, posturas a serem evitadas no pós-operatório e período de reabilitação, executando a prática de educação na saúde.⁹ Uma revisão sistemática que incluiu estudos da Europa, América do Norte, Austrália e Ásia identificou que a reabilitação iniciada antes da realização do procedimento de AQ é uma conduta favorável e que repercute no pós-operatório de maneira significativa em aspectos como função, dor, qualidade de vida e tempo de internação hospitalar.¹⁰

Dessa forma, a partir do processo de identificação do nível de dependência funcional prévio ainda no pré-operatório, bem como o de retirada precoce do leito e início do programa de reabilitação durante a internação hospitalar, a atuação do fisioterapeuta deve contribuir para a rápida recuperação do paciente idoso submetido à AQ. Sabe-se que a recuperação rápida e eficaz reduz o tempo de internação e promove maior rotatividade de leitos, reduzindo as despesas hospitalares aos sistemas de saúde e diminuindo as chances de instalações de condições associadas ao maior tempo de hospitalização.¹¹ Este fato chama atenção para que o indivíduo idoso submetido à AQ retorne à sociedade o mais funcional possível e que os profissionais estejam munidos de instrumentos fidedignos para a identificação de déficits que devam receber especial atenção no processo de reabilitação de AQ.⁴,⁸

A partir disto, visto a necessidade de se discutir esse tema nessa população, o presente estudo teve por objetivo comparar o nível de dependência funcional de idosos submetidos à AQ entre os períodos pré e pós-operatório, avaliar a associação entre dependência funcional e independência funcional, o impacto desses desfechos e verificar se a idade está associada à pior dependência funcional destes pacientes.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, descritivo, quantitativo e de associação, desenvolvido na enfermaria traumato-ortopédica do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU-UFMA), na cidade de São Luís. As coletas de dados ocorreram entre os meses de dezembro de 2016 e maio de 2017.

Os voluntários e/ou seus acompanhantes foram esclarecidos sobre os objetivos e riscos do estudo e confirmaram sua participação mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Entre os critérios de inclusão adotados, destaca-se: voluntários idosos (≥ 60 anos), de ambos os sexos, sub-metidos a cirurgias eletivas de ATQ, APQ e/ou revisão. Foram excluídos do estudo indivíduos que realizaram qualquer outro procedimento cirúrgico associado e/ou que tenham sido submetidos à reabordagem cirúrgica durante a internação. Enquanto internados, os idosos recebiam o tratamento preconizado pela equipe de fisioterapeutas da unidade, que incluía desde a educação em saúde, passando pela mobilização precoce, até o treino de marcha.⁹

A coleta de dados foi dividida em duas etapas, pré e pós-operatória. No pré-operatório, os pacientes passaram por uma avaliação inicial com coleta de informações relacionadas aos aspectos sociodemo-gráficos e nosológicos em forma de entrevista, bem como por uma avaliação do nível de dependência funcional e mensuração da independência funcional. Esta avalição inicial foi conduzida um dia antes da realização do procedimento cirúrgico.

Para avaliar a dependência funcional, utilizou-se o índice de Katz, instrumento amplamente utilizado para realizar a avaliação funcional em gerontologia, o qual permite identificar a capacidade funcional do indivíduo em executar seis funções básicas de vida diária: banho, vestirse, ir ao banheiro, transferência, continência e alimentação. A partir da interpretação dos resultados, o paciente é classificado como independente, parcialmente dependente ou totalmente dependente. A soma da pontuação fornece um escore que varia de 0 a 6, onde 0 corresponde à independência nas seis funções avaliadas e 6 corresponde à dependência para todas as funções.¹²

Além disso, para identificar o nível de independência funcional, utilizou-se a Medida de Independência Funcional (MIF), outro instrumento que também é amplamente utilizado na pesquisa clínica gerontológica. A MIF é composta por 18 itens, com uma pontuação que varia entre 18 e 126. A soma dos pontos atribuídos a cada item fornece o escore total, onde quanto maior a pontuação, mais independente o idoso, sendo que o escore 7 corresponde à completa independência e o escore 1 corresponde à completa dependência.¹³

Após o procedimento cirúrgico, os instrumentos Katz e MIF foram reaplicados a fim de realizar uma análise comparativa entre os dois períodos, pré e pós-operatório. A reaplicação dos instrumentos se deu no terceiro dia de pós-operatório, visto que, pelo protocolo do local de desenvolvimento do estudo,⁹ os pacientes deveriam ter iniciado treino de marcha e isso minimizaria o risco de viés. Todas as avaliações e aplicações dos instrumentos foram feitas por um único fisioterapeuta treinado e com ampla experiência na aplicação dos instrumentos.

Realizou-se cálculo de tamanho amostral, baseado nos desfechos das medidas do índice de Katz e da MIF, entre os momentos pré e pós-AQ. O cálculo foi realizado considerando poder experimental de 95%, para p < 0,05. O tamanho do efeito encontrado foi de 1,18, α = 0,05 e β = 0,95, com base no estudo de Silva et al.,¹⁴ com percentual de desistências (dropout) de 20%, resultando em uma amostra mínima de 48 pacientes. A análise foi realizada no software G*Power Statistical Package, versão 3.1.3 (Franz Faul Universität, Kiel, Alemanha).

A normalidade dos dados foi realizada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov e as medidas descritivas foram apresentadas por meio de média e desvio padrão (dp), mediana (intervalo interquartil) para variáveis numéricas e de frequências (f) e proporções (%) para dados categóricos. Para as comparações entre as medidas do índice de Katz e MIF nos momentos pré e pós-operatório de AQ, utilizou-se o teste de Wilcoxon pareado. As associações entre essas medidas foram testadas por meio do teste de correlação de Spearman, sendo considerados os seguintes valores de r: 0 = nula; 0,1 a 0,3 = fraca; 0,4 a 0,6 = moderada; 0,7 a 1,0 = forte.¹⁵ Além disso, realizou-se regressão linear simples para compreender o quanto a dependência funcional influenciou a independência funcional no momento pós-operatório. Todas as análises foram realizadas utilizando o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS, versão 26) e o nível de significância considerado foi p < 0,05.

O estudo recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do HU-UFMA, sob o número de protocolo 1.824.946, CAAE 60389916.0.0000.5086.

Resultados

Um total de 48 pacientes foi avaliado tanto no pré quanto no pós-operatório, não havendo perdas amostrais. Os dados referentes à caracterização da amostra encontram-se dispostos na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos idosos submetidos à artroplastia de quadril (n = 48)

Variáveis	Medidas descritivas
Idade	72 ± 9
Sexo
Feminino	30 (62,5)
Masculino	18 (37,5)
Etnia
Branca	12 (25,0)
Parda	26 (54,0)
Preta	10 (21,0)
Renda
1 salário mínimo	40 (8,03)
2 salários mínimos	8 (17,0)
Comorbidades
Hipertensão arterial sistêmica	29 (60,0)
Diabetes mellitus	12 (25,0)
Esquizofrenia	1 (2,0)
Parkinson	1 (2,0)
Procedência
São Luís	18 (38,0)
Interior do Maranhão	29 (60,0)
Outros	1 (2,0)
Diagnóstico
Fratura do colo do fêmur	30 (63,0)
Osteoartrose do quadril	16 (33,0)
Soltura da prótese	2 (4,2)
Causas
Quedas	28 (58,0)
Outros	20 (42,0)
Medicamentos
Anti-hipertensivo	21 (67,0)
Antidiabético	10 (21,0)
Diurético	9 (19,0)
Neurológico*	9 (19,0)
Osteoporose	9 (19,0)
Parkinson	2 (4,0)
Procedimento cirúrgico
Artroplastia parcial de quadril	24 (50,0)
Artroplastia total de quadril	22 (45,8)
Revisão	2 (4,2)
Tempo de internação (dias)	5 (4 - 6)

• Nota: Dados expressos em frequência absoluta e percentual, exceto para idade (média e desvio padrão) e tempo de internação (mediana e intervalo interquartil). *Antidepressivos, psicotrópicos, neurológicos.

A análise comparativa entre os períodos pré e pós-operatório do nível de dependência funcional e do nível de independência funcional são exibidos na Figura 1. A Figura 1A exibe a comparação do nível de dependência funcional através do Katz, onde observou-se redução da dependência funcional após o procedimento de AQ. A Figura 1B refere-se à análise da independência funcional por meio da MIF entre os períodos pré e pós-operatório, exibindo um aumento da independência funcional no pós-operatório.

Figura 1
Análise do índice de Katz e Medida de Independência Funcional (MIF) dos idosos pós-atroplastia de quadril.

Nota: p-valor teste de Wilcoxon pareado. Nível de signficância p < 0,05.

A Figura 2 exibe as associações do índice de Katz com a idade e com a MIF, para os períodos pré e pós-operatório. As Figuras 2A e C exibem a associação entre o Katz e a idade em ambos os períodos, mostrando associação diretamente proporcional, moderada e significante, destacando o p menor no pós-operatório e refletindo uma menor dependência funcional.

Figura 2
Associação do índice de Katz, idade e Medida de Independência Funcional (MIF) dos idosos pré e pós-atroplastia de quadril (AQ).

Nota: p-valor teste de Spearman. Nível de signficância p < 0,05.

As Figuras 2B e D mostram a associação entre o Katz e a MIF, onde observa-se uma associação inversamente proporcional, moderada e significante, refletindo menor dependência funcional no período pós-operatório e repercutindo em melhor independência funcional.

A Tabela 2 mostra o modelo de regressão linear simples, no qual verifica-se que a dependência funcional, avaliada pelo escore final do Katz após a AQ, teve uma influência de 28% (R² = 0,280) sobre a independência funcional (avaliada pela MIF) de idosos no pós-operatório de AQ.

Tabela 2
Análise da regressão linear para predizer a influência da dependência funcional, avaliada pelo índice de Katz, na independência funcional, avaliada pela Medida de Independência Funcional (MIF), de idosos no pós-operatório de artroplastia de quadril

Variável	β	EP	p	IC
MIF	-0,045	0,011	0,000	-0,066 a -0,024

• Nota: β = coeficiente beta; EP = erro padrão; IC = intervalo de confiança.
• R² ajustado = 0,280; F = 7,620.

Discussão

Este estudo teve como objetivo comparar o nível de dependência funcional entre os momentos pré e pós-operatório de idosos submetidos à AQ. Os resultados demonstram que os pacientes apresentaram menor dependência funcional e maior independência funcional no pós-operatório. Esses achados vão de encontro ao estudo de Piovani et al.,¹¹ que avaliaram a funcionalidade de idosos submetidos à AQ e concluíram que o procedimento cirúrgico reduziu de maneira significativa os pacientes classificados como dependentes e aumentou o número de pacientes semidependentes e independentes. Vale destacar, porém, que o instrumento utilizado pelos autores foi o índice de Barthel, diferentemente do presente estudo, onde foram utilizados o índice de Katz e a MIF.

A dependência funcional de idosos submetidos à AQ esta relacionada principalmente à perda de força e função.¹⁶ Os pacientes muitas vezes encontram-se restritos ao leito ou com redução da mobilidade funcional devido ao quadro clínico que os levou à indicação do procedimento cirúrgico.¹⁷ A reabilitação iniciada de maneira precoce, ainda na fase hospitalar, auxilia no reestabelecimento da capacidade funcional prévia à internação.¹⁸ Tendo em vista isso, a fisioterapia deve ser iniciada ainda na fase hospitalar, imediatamente após a realização do procedimento e/ou quando houver segurança para sua realização, no intuito de atingir um nível de independência suficiente para a execução de atividades de vida diária.¹⁹ Tal fato pode ter influenciado a redução da dependência funcional dos voluntários do presente estudo após a cirurgia de AQ, visto que o protocolo de fisioterapia do local do estudo objetivava, entre outros aspectos, a reabilitação precoce.⁹

A independência funcional avaliada por meio da MIF mostrou uma diferença estatisticamente significante entre os momentos pré e pós-operatório, demonstrando o caráter positivo que o procedimento cirúrgico, juntamente à reabilitação precoce, promoveu à independência funcional desses idosos.¹⁶ O momento pré-operatório carece de cuidados que muitas vezes limitam a mobilidade do paciente idoso e que, em associação ao processo de hospitalização bem como ao tempo de espera pelo procedimento cirúrgico, podem contribuir para a instalação de quadro depressivo ou agravo dos déficits cognitivos.²⁰ Enquanto aguardam a realização do procedimento cirúrgico, alguns pacientes podem evoluir com restrição à movimentação, o que pode contribuir para o aumento da dependência funcional, imobilismo, exacerbação do quadro álgico e redução da qualidade de vida.²¹

Observou-se associação estatisticamente significan-te e moderada entre o nível de dependência funcional e a idade dos voluntários tanto no pré quanto no pós-operatório, refletindo a necessidade de maiores cuidados com pacientes idosos à medida que eles ficam mais longevos. Esse aumento da dependência funcional limita o paciente idoso para a realização de suas atividades de maneira segura e pode acabar por sobrecarregar familiares e cuidadores.²² O estudo de Artal et al.²³ procurou identificar os fatores de risco para mortalidade e recuperação funcional de pacientes internados com quadro de fratura do quadril. Os autores concluíram que a idade avançada, presença de comorbidades e o status funcional prévio estiveram associados ao desfecho mortalidade e que o prognóstico da recuperação funcional depende da idade, bem como do estado funcional prévio. Esse fato reitera a importância de se identificar o nível de dependência funcional de pacientes idosos ainda no momento pré-operatório.

Por outro lado, a associação entre a dependência e a independência funcional se mostrou estatisticamente significante, inversa e moderada, demostrando que quanto mais assistência os idosos necessitavam para realizar as atividades avaliadas pelo Katz, menos independência eles demonstravam na avaliação dos domínios da MIF. Ambos os instrumentos se complementam, visto que existem domínios não avaliados em um que são avaliados no outro, como aspectos cognitivos e de comunicação que são avaliados pela MIF, possibilitando compreender a funcionalidade do paciente idoso e tornando a avaliação mais completa.

É fato que deve-se estimular a independência funcional dos idosos em pós-operatório de AQ com a mobilização precoce, promovendo redução do quadro álgico, ganho de amplitude de movimento e treino de marcha precoce.²⁴ Dessa forma, como membro da equipe multidisciplinar que atua na recuperação desse paciente ainda na fase hospitalar, o fisioterapeuta tem papel importante para o reestabelecimento do status funcional prévio à internação.²⁵

A atenção com a dependência funcional de idosos deve receber destaque, haja vista que até mesmo o tipo de procedimento cirúrgico tem relação com a condição física prévia do paciente, onde a ATQ é indicada para pacientes mais independentes funcionais, enquanto a APQ é designada para pacientes com limitações para a execução de atividades funcionais.²⁶ No pós-operatório, a dependência funcional impactou em 28% a independência funcional dos voluntários, mostrando que mesmo com uma melhora da independência funcional, algum grau de dependência se mantém no pós-operatório de AQ. Isso corrobora a importância do profissional fisioterapeuta na reabilitação desses pacientes, atuando de maneira precoce, ainda na fase hospitalar, com exercícios de mobilidade e treino de força, no intuito de manter o status funcional prévio ao procedimento de AQ,¹⁶,²⁷ visto que pacientes submetidos à AQ apresentam déficits na funcionalidade do quadril e mecânica da marcha mesmo após vários anos de realização do procedimento.²⁸

Um adequado nível de prática regular de atividade física é importante para a prevenção da instalação de quadros como os de osteoporose e quedas.²⁹ No presente estudo, 19% dos avaliados faziam uso de medicamentos para osteoporose e 58% tiveram as quedas como causa que os levou a serem submetidos à AQ. Os pacientes idosos frequentemente têm sua independência funcional comprometida e, diante disto, podem estar mais suscetíveis a eventos adversos como as quedas e fraturas, necessitando de procedimentos como a AQ.³⁰ A fisioterapia na reabilitação do paciente em pós-operatório de AQ tem por objetivo otimizar a independência funcional desse indivíduo, tornando-o apto a realizar suas atividades de maneira segura, como executava antes do evento que o levou a ser submetido ao procedimento cirúrgico. A avaliação da dependência e independência funcional, bem como a reabilitação, é importante em ambos os momentos, pré e pós-operatório, para que metas sejam traçadas desde antes da cirurgia e uma rápida recuperação funcional seja alcançada após a cirurgia, objetivando alta precoce e rotatividade de leitos.³¹

Entre as limitações do estudo, destaca-se a utilização de entrevistas para a realização das avaliações, visto que nem todos os voluntários sabiam ler; no intuito de padronizar a coleta de dados, recorreu-se a este recurso. O tamanho amostral também não permite extrapolação dos dados para a população em geral que foi submetida à AQ, porém os resultados aqui apresentados dão margem a discussões.

Conclusão

Idosos submetidos à AQ apresentaram redução do nível de dependência funcional após a realização do procedimento cirúrgico, refletindo no aumento da independência funcional, que apresentou maiores valores no pós-operatório. Verificou-se associação inversa entre a dependência funcional e a independência funcional, tanto no pré quanto no pós-operatório, onde a dependência funcional impactou a independência funcional dos idosos no pós-operatório de AQ. Além disso, observou-se uma associação entre o nível de dependência funcional e a idade dos pacientes, onde os idosos mais longevos apresentaram maior dependência funcional.

Espera-se que futuros estudos possam nos guiar quanto aos fatores determinantes da dependência funcional desses pacientes e na delimitação de protocolos que auxiliem na rápida recuperação, bem como no reestabelecimento do status funcional prévio à cirurgia de AQ.

References

• ¹
  Sherrington C, Fairhall NJ, Wallbank GK, Tiedemann A, Michaleff ZA, Howard K, et al. Exercise for preventing falls in older people living in the community. Cochrane Database Syst Rev. 2019;1(1):CD012424. https://doi.org/10.1002/14651858.cd012424.pub2
  » https://doi.org/10.1002/14651858.cd012424.pub2
• ²
  Freitas Jr W, El Kadi S, Teixeira LS, Abreu AC, Almeida AB, Coelho DLM. Qualidade de vida em adultos e idosos após artroplastia de quadril. Rev Eletr Acervo Saude. 2022;15(12): e11036. https://doi.org/10.25248/reas.e11036.2022
  » https://doi.org/10.25248/reas.e11036.2022
• ³
  Enge Jr DJ, Castro AA, Fonseca EKUN, Baptista E, Padial MB, Rosemberg LA. Principais complicações da artroplastia de quadril: ensaio iconográfico. Radiol Bras. 2020;53(1):56-62. https://doi.org/10.1590/0100-3984.2018.0075
  » https://doi.org/10.1590/0100-3984.2018.0075
• ⁴
  Lewis SR, Macey R, Parker MJ, Cook JA, Griffin XL. Arthro-plasties for hip fracture in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2022;2(2):CD013410. https://doi.org/10.1002/14651858.cd013410.pub2
  » https://doi.org/10.1002/14651858.cd013410.pub2
• ⁵
  Oliveira DV, Souza AM, Ferreira AG, Antunes MD, Lovato NS, Nascimento Jr JRA. Evaluating the muscular strength, functional capacity, and risk of sarcopenia in elderly women who practice Mat Pilates. Fisioter Mov. 2019;32:e003222. http://dx.doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO22
  » http://dx.doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO22
• ⁶
  Martínez-Velilla N, Casas-Herrero A, Zambom-Ferraresi F, Sáez de Asteasu ML, Lucia A, Galbete A, et al. Effect of exercise intervention on functional decline in very elderly patients during acute hospitalization: a randomized clinical trial. JAMA Intern Med. 2019;179(1):28-36. https://doi.org/10.1001/jamainternmed.2018.4869
  » https://doi.org/10.1001/jamainternmed.2018.4869
• ⁷
  Sarpong N, Boettner F, Cushner F, Krell E, Premkumar A, Valle AGD, et al. Is there a difference in mobility and inpatient physical therapy need after primary total hip and knee arthroplasty? A decade-by-decade analysis from 60 to 99 years. Arch Orthop Trauma Surg. 2023;143(7):4455-63. https://doi.org/10.1007/s00402-022-04624-w
  » https://doi.org/10.1007/s00402-022-04624-w
• ⁸
  Zocche N, Azeredo TGK. Reabilitação fisioterapêutica em pacientes portadores de osteoartrose submetidos a artroplastia total de quadril (ATQ): revisão de literatura. Rev Saude AJES. 2019;5(10):47-58. http://www.revista.ajes.edu.br/index.php/sajes/article/view/327
  » http://www.revista.ajes.edu.br/index.php/sajes/article/view/327
• ⁹
  Serviço de Traumato-Ortopedia do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão. Artroplastia de quadril: manual de instruções ao paciente [cited 2023 Jan 31]. Available from: https://www.gov.br/ebserh/pt-br/hospitais-universitarios/regiao-nordeste/hu-ufma/saude/area-do-paciente/ANEXO1CARTILHAATQ.pdf
  » https://www.gov.br/ebserh/pt-br/hospitais-universitarios/regiao-nordeste/hu-ufma/saude/area-do-paciente/ANEXO1CARTILHAATQ.pdf
• ¹⁰
  Widmer P, Oesch P, Bachmann S. Effect of prehabilitation in form of exercise and/or education in patients undergoing total hip arthroplasty on postoperative outcomes - A systematic review. Medicina (Kaunas). 2022;58(6):742. https://doi.org/10.3390/medicina58060742
  » https://doi.org/10.3390/medicina58060742
• ¹¹
  Piovani AB, Vaceli JVS, Camilo GVC, Bugiga JS, Pádua VB, Santos DR, et al. Funcionalidade pré e pós-operatória em pacientes submetidos à artroplastia de quadril. Braz J Develop. 2023;9(5):15149-59. https://doi.org/10.34117/bjdv9n5-047
  » https://doi.org/10.34117/bjdv9n5-047
• ¹²
  Mendes SO, Ponte AS, Palma KAXA, Silva CGL, Delboni MCC. Validade e confiabilidade da escala índice de Katz adaptada. Res Soc Dev. 2020;9(4):e183942630. http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2630
  » http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v9i4.2630
• ¹³
  Oliveira MR, Konzen VM, Fleig TCM, Signori LU. Impacto sobre a capacidade funcional e cognitiva em idosos após um ano de institucionalização. Fisioter Bras. 2019;20(2):139-46. https://doi.org/10.33233/fb.v20i2.2792
  » https://doi.org/10.33233/fb.v20i2.2792
• ¹⁴
  Silva JCA, Cavalcante TB, Santos NMC, Nascimento RKG, Costa ACLF, Miranda JS. Análise comparativa do nível de dependência funcional de idosos submetidos a artroplastia de qua-dril: estudo transversal. Rev Pesq Fisio. 2018;8(4):463-70. https://doi.org/10.17267/2238-2704rpf.v8i4.2090
  » https://doi.org/10.17267/2238-2704rpf.v8i4.2090
• ¹⁵
  Dancey C, Reidy J. Estatística sem matemática para psicologia. 5 ed. Porto Alegre: Penso; 2013. 608 p.
• ¹⁶
  Chen X, Li X, Zhu Z, Wang H, Yu Z, Bai X. Effects of progressive resistance training for early postoperative fast-track total hip or knee arthroplasty: a systematic review and meta-analysis. Asian J Surg. 2021;44(10):1245-53. https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2021.02.007
  » https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2021.02.007
• ¹⁷
  Labanca L, Ciardulli F, Bonsanto F, Sommella N, Di Martino A, Benedetti MG. Balance and proprioception impairment, assessment tools, and rehabilitation training in patients with total hip arthroplasty: a systematic review. BMC Musculoskelet Disord. 2021;22(1):1055. https://doi.org/10.1186/s12891-021-04919-w
  » https://doi.org/10.1186/s12891-021-04919-w
• ¹⁸
  Prinsloo RM, Keller MM. Physiotherapy in an advanced rehabilitation pathway for patients after hip and knee arthroplasty: a proposal. S Afr J Physiother. 2021;77(1):1565. https://doi.org/10.4102/sajp.v77i1.1565
  » https://doi.org/10.4102/sajp.v77i1.1565
• ¹⁹
  Jäppinen AM, Hämäläinen H, Kettunen T, Piirainen A. Patient education in physiotherapy in total hip arthroplasty (THA) - The perspective of physiotherapists. Physiother Theory Pract. 2020;36(8):946-55. https://doi.org/10.1080/09593985.2018.1513617
  » https://doi.org/10.1080/09593985.2018.1513617
• ²⁰
  Santos BP, Amorim JSC, Poltronieri BC, Hamdan AC. Associação entre limitação funcional e déficit cognitivo em pacientes idosos hospitalizados. Cad Bras Ter Ocup. 2021;29:e2101. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO2101
  » https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO2101
• ²¹
  Martins NPR, Silqueira SMF, Souza LME, Souza CPM, Soares SM, Matos SS. Qualidade de vida de idosos internados em uma unidade de clínica médica de um hospital público. Rev Esc Enferm USP. 2020;54:e03573. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018032903573
  » https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018032903573
• ²²
  Romero DE, Maia LR, Muzy J, Andrade N, Szwarcwald CL, Groisman D, et al. O cuidado domiciliar de idosos com dependência funcional no Brasil: desigualdades e desafios no contexto da primeira onda da pandemia de COVID-19. Cad Saude Publica. 2022;38(5):e00216821. https://doi.org/10.1590/0102-311X00216821
  » https://doi.org/10.1590/0102-311X00216821
• ²³
  Artal MM, Chacón OR, Martínez-Alonso M, Godoy MS, Atance JM, Gutiérrez RG. Fractura de cadera em el paciente anciano: fractores prognóstico de mortalidade y recuperación funcional al año. Rev Esp Geriatr Gerontol. 2018;53(5):247-54. https://doi.org/10.1016/j.regg.2018.04.447
  » https://doi.org/10.1016/j.regg.2018.04.447
• ²⁴
  Zhong M, Liu D, Tang H, Zheng Y, Bai Y, Liang Q, et al. Impacts of the perioperative fast track surgery concept on the physical and psychological rehabilitation of total hip arthroplasty: a prospective cohort study of 348 patients. Medicine (Baltimore). 2021;100(32):e26869. http://dx.doi.org/10.1097/MD.0000000000026869
  » http://dx.doi.org/10.1097/MD.0000000000026869
• ²⁵
  Colibazzi V, Coladonato A, Zanazzo M, Romanini E. Evidence based rehabilitation after hip arthroplasty. Hip Int. 2020;30(2_suppl):20-9. https://doi.org/10.1177/1120700020971314
  » https://doi.org/10.1177/1120700020971314
• ²⁶
  Guyen O. Hemiarthroplasty or total hip arthroplasty in recent femoral neck fractures? Orthop Traumatol Surg Res. 2019;105(1S):S95-101. https://doi.org/10.1016/j.otsr.2018.04.034
  » https://doi.org/10.1016/j.otsr.2018.04.034
• ²⁷
  Dust P, Corban J, Sampalis J, Antoniou J, Bergeron SG. Patient functional status as an indication for primary total hip arthroplasty: a systematic review and meta-analysis. J Arthroplasty. 2022;37(2):390-7. https://doi.org/10.1016/j.arth.2021.08.016
  » https://doi.org/10.1016/j.arth.2021.08.016
• ²⁸
  Cezarino L, Vieira W, Silva J, Silva-Filho E, Souza F, Scattone R. Gait and functionality following unilateral and bilateral hip replacement. Fisioter Mov. 2019;32:e003230. https://doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO30
  » https://doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO30
• ²⁹
  Oliveira DV, Trelha CS, Lima LL, Antunes MD, Nascimento Jr JRA, Bertolini SMMG. Physical activity level and associated factors: an epidemiological study with elderly. Fisioter Mov. 2019;32:e003238. http://dx.doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO38
  » http://dx.doi.org/10.1590/1980-5918.032.AO38
• ³⁰
  Paula JGF, Gonçalves LHT, Nogueira LMV, Delage PEGA. Correlação entre independência funcional e risco de quedas em idosos de três instituições de longa permanência. Rev Esc Enferm USP. 2020;54:e3601. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018054103601
  » https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018054103601
• ³¹
  Marchisio AE, Ribeiro TA, Umpierres CS, Galvão L, Rosito R, Macedo CAS, et al. Reabilitação acelerada versus reabilitação convencional na artroplastia total do quadril (ARTHA): um ensaio clínico randomizado, duplo cego. Rev Col Bras Cir. 2020;47:e20202548. https://doi.org/10.1590/0100-6991e-20202548
  » https://doi.org/10.1590/0100-6991e-20202548

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  19 Abr 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  27 Ago 2023
• Revisado
  11 Fev 2024
• Aceito
  19 Fev 2024