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Indicativos de aplicabilidade das orientações de enfermagem no cotidiano de cuidadores de portadores de Alzheimer

Indicativo de aplicabilidad de las orientaciones del cuidado en lo cotidiano de los cuidadores de los portadores de Alzheimer

Resumos

Objetivamos descrever a orientação recebida pelo cuidador do portador de Alzheimer antes de sua participação no Pólo de Neurogeriatria; analisar a aplicabilidade das orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria no cotidiano do cuidado domiciliar; e identificar os mecanismos de enfrentamento e adaptação encontrados nesses cuidadores. Adotamos uma abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, descritivo-exploratório. Como técnica de coleta dos dados, utilizamos a entrevista semi-estruturada. Os sujeitos foram 15 cuidadores atendidos num Hospital Federal do Rio de Janeiro. Para tratamento dos dados, optou-se pela análise temática de conteúdo, obtendo-se três categorias: Orientações recebidas antes da participação no Pólo de Neurogeriatria; Orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria; Mecanismos de enfretamento e adaptação no contexto do cuidado familiar. Concluiu-se que os mecanismos de enfrentamento são utilizados para a adaptação à situação de sobrecarga, podendo ser amenizada pelo apoio educativo e emocional recebido nos grupos de orientação.

Cuidadores; Doença de Alzheimer; Saúde do idoso; Enfermagem geriátrica


Objetivamos describir la orientación recibida por el cuidador del portador de Alzheimer, antes de su participación en el Polo de Neurogeriatría; analizar la aplicabilidad de las orientaciones recibidas en el Polo de Neurogeriatría en lo cotidiano del cuidado domiciliar; e identificar los mecanismos de enfrentamiento y adaptación encontrados en los cuidadores. Adoptamos un abordaje cualitativo, del tipo estudio de caso, descriptivo y exploratorio. Como técnica de recolección de datos utilizamos la entrevista semiestructurada, los sujetos fueron 15 cuidadores atendidos en un Hospital Federal de Río de Janeiro. Para tratamiento de los datos, se optó por el análisis de contenido, del tipo temático, obteniéndose tres categorías: Orientaciones recibidas antes de la participación en el Polo de Neurogeriatría; Orientaciones recibidas en el Polo de Neurogeriatría; Mecanismos de enfrentamiento y adaptación en el contexto del cuidado familiar. Se concluye que los mecanismos de enfrentamiento son utilizados para adaptarse a las situaciones de sobrecarga, la que puede ser amenizada por el apoyo educativo y emocional recibido en los grupos de orientación.

Cuidadores; Enfermedad del Alzheimer; Salud del anciano; Enfermería geriátrica


We aimed to describe the instructions that Alzheimer patient caregivers receive before they participating in the Neuro-geriatrics Center; analyze the applicability of the instructions received at the Neuro-geriatrics Center in everyday home care; and identify the coping and adaptation mechanisms found in these caregivers. We adopted a qualitative approach, in this descriptive-exploratory case study. The chosen technique for data collection was the semi-structured interview. Subjects were 15 caregivers seen at a Federal Hospital in Rio de Janeiro. Data analysis was performed using thematic content analysis, and three categories were obtained: Instructions received before participating in the Neuro-geriatrics Center; Instructions received at the Neuro-geriatrics Center; Coping and adaptation mechanisms within the context of family care. It is concluded that the coping mechanisms are used to adapt to overload situations, which can be relieved through the educational and emotional support received in the orientation groups.

Caregivers; Alzheimer disease; Health of the elderly; Geriatric nursing


RELATO DE EXPERIÊNCIA

Indicativos de aplicabilidade das orientações de enfermagem no cotidiano de cuidadores de portadores de Alzheimer

Indicativo de aplicabilidad de las orientaciones del cuidado en lo cotidiano de los cuidadores de los portadores de Alzheimer

Rosimere Ferreira SantanaI; Katia dos Santos AlmeidaII; Nina Aurora Mello SavoldiIII

IDoutora em Enfermagem. Especialista em Psicogeriatria. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgico e da Pós-Graduação em Enfermagem Gerontológica da Universidade Federal Fluminense. Niterói, RJ, Brasil. rosifesa@yahoo.com.br

IIEnfermeira da Casa de Repouso e Centro de Convivência para 3ª Idade Vila do Sol. Enfermeira SAMU-192/SES. Professora do Curso Técnico em Enfermagem Silva e Souza. Pós-Graduada em Saúde da Família. Botafogo, RJ, Brasil. katia.almeida@hotmail.com

IIIMestre em Enfermagem. Professora da Universidade Estácio de Sá. Enfermeira da Educação Continuada do Instituto Fernandes Figueira - FIOCRUZ. Rio de Janeiro, Brasil. ninasavoldi@yahoo.com.br

Correspondência Correspondência: Rosimere Ferreira Santana Rua Dr. Celestino, 74 - Centro CEP 24020-091 - Niterói, RJ, Brasil

RESUMO

Objetivamos descrever a orientação recebida pelo cuidador do portador de Alzheimer antes de sua participação no Pólo de Neurogeriatria; analisar a aplicabilidade das orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria no cotidiano do cuidado domiciliar; e identificar os mecanismos de enfrentamento e adaptação encontrados nesses cuidadores. Adotamos uma abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, descritivo-exploratório. Como técnica de coleta dos dados, utilizamos a entrevista semi-estruturada. Os sujeitos foram 15 cuidadores atendidos num Hospital Federal do Rio de Janeiro. Para tratamento dos dados, optou-se pela análise temática de conteúdo, obtendo-se três categorias: Orientações recebidas antes da participação no Pólo de Neurogeriatria; Orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria; Mecanismos de enfretamento e adaptação no contexto do cuidado familiar. Concluiu-se que os mecanismos de enfrentamento são utilizados para a adaptação à situação de sobrecarga, podendo ser amenizada pelo apoio educativo e emocional recebido nos grupos de orientação.

Descritores: Cuidadores. Doença de Alzheimer. Saúde do idoso. Enfermagem geriátrica.

RESUMEN

Objetivamos describir la orientación recibida por el cuidador del portador de Alzheimer, antes de su participación en el Polo de Neurogeriatría; analizar la aplicabilidad de las orientaciones recibidas en el Polo de Neurogeriatría en lo cotidiano del cuidado domiciliar; e identificar los mecanismos de enfrentamiento y adaptación encontrados en los cuidadores. Adoptamos un abordaje cualitativo, del tipo estudio de caso, descriptivo y exploratorio. Como técnica de recolección de datos utilizamos la entrevista semiestructurada, los sujetos fueron 15 cuidadores atendidos en un Hospital Federal de Río de Janeiro. Para tratamiento de los datos, se optó por el análisis de contenido, del tipo temático, obteniéndose tres categorías: Orientaciones recibidas antes de la participación en el Polo de Neurogeriatría; Orientaciones recibidas en el Polo de Neurogeriatría; Mecanismos de enfrentamiento y adaptación en el contexto del cuidado familiar. Se concluye que los mecanismos de enfrentamiento son utilizados para adaptarse a las situaciones de sobrecarga, la que puede ser amenizada por el apoyo educativo y emocional recibido en los grupos de orientación.

Descriptores: Cuidadores. Enfermedad del Alzheimer. Salud del anciano. Enfermería geriátrica.

INTRODUÇÃO

O aumento da população idosa em todo o mundo aumenta igualmente a importância de dar atenção não só para a saúde física, mas também para a saúde mental da população com mais de 65 anos. A partir dessa idade, surgem afecções próprias do idoso e uma das mais devastadoras para os familiares é a demência do tipo Alzheimer, pois o impacto do diagnóstico para eles pode ser desalentador, devido à problemática de desconhecimento da doença, do que fazer, de como agir, de como entender a pessoa afetada e, sobretudo, de como entender os próprios sentimentos em relação ao papel de cuidador(1-4).

Encontramos na literatura o enfermeiro tendo um papel primordial no desenvolvimento e aplicação de tais orientações aos cuidadores(5-9). Porém, neste estudo, enfocaremos o seguinte objeto: A relação entre as orientações recebidas pelos cuidadores nos grupos de orientação coordenados pela enfermeira e a sua aplicabilidade no cotidiano de cuidado ao idoso com Alzheimer.

Entendemos que o cuidador deve ser orientado sobre as etapas de evolução da doença, as características de cada uma delas e os procedimentos adequados ao conjunto de ações que constituem o cuidado, tudo isso de acordo com sua realidade cotidiana(10). Torna-se indispensável a compreensão de que dia após dia a capacidade do portador da doença de Alzheimer de realizar alguma atividade diminui com a perda contínua das funções cognitivas. Daí que o lidar com o idoso que desenvolve Alzheimer requer não só as informações, como também a solidariedade do ato de cuidar(11).

E a partir disso, observamos a necessidade de desenvolvimento de modos de adaptação do cuidador a essa nova realidade, geradora de momentos por vezes críticos, o que nos leva a buscar, na Teoria da Adaptação de Callista Roy, o fundamento para explicar o cuidado direto ao cuidador familiar e indiretamente ao idoso com Alzheimer. Nessa teoria, temos o conceito de adaptação como eixo orientador da prática da Enfermagem, que considera a pessoa como um sistema aberto, continuamente mudando e tentando se adaptar à realidade. Para isso, usa mecanismos adaptativos que podem ser inatos e adquiridos, os quais fazem parte do subsistema cognitor são estímulos que o indivíduo recebe no seu contexto de vida que vão reforçar positivamente ou negativamente a sua saúde física e mental(12).

E, portanto, nos questionamos: Qual a percepção dos cuidadores de idosos portadores de Alzheimer em relação às orientações recebidas e sua aplicabilidade no seu cotidiano ao cuidar do idoso? Tendo em vista a compreensão da orientação recebida pelo cuidador familiar, foram traçados os seguintes objetivos: descrever a orientação recebida pelo cuidador do portador de Alzheimer antes de sua participação no Pólo de Neurogeriatria; analisar a aplicabilidade das orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria no cotidiano do cuidado domiciliar; e identificar os mecanismos de enfrentamento e adaptação encontrados nos cuidadores de idosos com Alzheimer.

MÉTODO

Para a realização desta pesquisa, adotou-se o estudo descritivo, de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso. A entrevista semi-estruturada com questões abertas e semi-abertas foi utilizada na produção de dados relativos à: características individuais; parentesco com o cliente; e tempo de acompanhamento do cliente; saberes sobre demência; sobre as orientações recebidas; local onde recebeu as orientações; se as orientações recebidas sobre demência os ajudaram a cuidar melhor do seu familiar.

Para organização e tratamento dos relatos, optou-se pela análise temática, uma das formas de tratar os dados na análise de conteúdo. Portanto, a operacionalização seguiu as etapas de transcrição literal das gravações, leitura flutuante, codificação das unidades de referência (UR), organização das freqüências das UR em quadros síntese, discriminação das UR em categorias temáticas, e nomeação das categorias emergentes dos conteúdos.

Nesse processo de classificação dos dados, foram organizadas três categorias: orientações recebidas antes de participar do Pólo de Neurogeriatria; orientações recebidas no Pólo de Neurogeriatria; Mecanismos de enfrentamento e adaptação no contexto do cuidado familiar. Os depoimentos são referenciados com pseudônimos, tais como: conhecimento, paciência, honestidade, confiança, humildade, esperança e coragem, segundo os ingredientes do cuidar de um estudo(12).

O cenário escolhido foi o Hospital da Lagoa, localizado na zona sul do Município do Rio de Janeiro, mais especificamente o Pólo de Neurogeriatria que funciona no ambulatório do hospital, propondo um modelo assistencial alternativo baseado nas necessidades de saúde da população(13). Este funciona com dois tipos de serviços um atende uma clientela aproximada de 200 idosos em consultas multiprofissionais e interconsultas. Já o outro estabelece um atendimento em Centro-dia para 15 idosos previamente selecionados do ambulatório, com Demência do Tipo Alzheimer em fases moderada ou inicial da doença, que possuem cuidador, e que possam se locomover até a instituição e se beneficiar com as atividades de suporte, estimulação e reabilitação cognitiva.

Os critérios de inclusão dos sujeitos foram: ser cuidadores familiares de idosos portadores de demência do tipo Alzheimer, serem freqüentadores semanais do Pólo de Neurogeriatria, e aceitarem participar do estudo. No entanto não tivemos critérios de exclusão dos sujeitos já que todos os participantes do cenário de estudo aceitaram integrar o estudo.

Ressalta-se que o estudo teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital da Lagoa, pelo parecer nº 08/2005, de acordo com os preceitos da Resolução 196/96, do conselho Nacional de Saúde. Além de resguardados os direitos éticos dos Cuidadores durante todo o processo, culminando com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Orientações recebidas antes de participar do pólo de neurogeriatria

No Brasil, há ainda muito pouco esclarecimento quanto às demências e suas formas de tratamento, orientação e suporte ao idoso e seus cuidadores, podendo levar a desfechos desfavoráveis, como situação de violência doméstica, citados com cárcere privado, agressão física e psicológica, abuso financeiro e outros(14).

A única coisa que o médico me falou era que a doença não tinha cura, que ela podia ter lapsos de memória e que não era para deixar ela sozinha e que a tendência era piorar, agora como cuidar e as fases que ela iria ter, ele não me falou [...] ele me deu o manual do cuidador para eu ler e entender a doença (Coragem).

As Associações de Amigos e Parentes com Alzheimer(15-16) são autoras de divulgação e fazem parte das obras disponíveis para cuidadores familiares leigos, basicamente seguem uma perspectiva de manuais e relatos de experiência, difundidos inicialmente na cultura norte-americana. Podemos encontrar nessas, definições da Demência do Tipo Alzheimer como uma doença degenerativa que destrói as células do cérebro, lenta e progressivamente, afetando o funcionamento cognitivo, social e de personalidade(15). Portanto, termos técnico-científicos são incorporados pelo senso comum(17), como veremos nas falas dos cuidadores a seguir:

Entendi que é uma deficiência do cérebro, é como uma máquina que dá curto circuito e vai acabando aos pou-quinhos, pra mim é isso, uma deficiência que começa a dar no cérebro e vai acabando com tudo que você sabe, tudo que você aprendeu (Conhecimento).

Eu achava que demência era aquela pessoa que é louco! (Honestidade).

Percebemos nas falas dos sujeitos aderência ao modelo assistencial privatista que considera essencialmente a cura do corpo doente através do conhecimento clínico-biológico de uma doença(13). Revelando conhecimentos sobre a doença de Alzheimer como irreversível e progressiva, com possíveis alterações de personalidade, mas pouco trata da forma de lidar com essa problemática já que não é passível de cura.

Por isso interessa discutir os achados dentro do modelo assistencial alternativo que considera as particularidades dos cuidadores, e como singulares que são precisam ser ouvidos e suas necessidades detectadas e, a partir desta receber as orientações(13). Ressaltamos que as atividades do Pólo de Neurogeriatria de orientação em grupo a partir da demanda do cuidador, problematizando as situações-problemas, considerando o saber popular, o vivenciado pelo cuidador na realidade apresentada para que possam ser potencialmente aplicáveis àquele idoso-ambiente, conforme trataremos na próxima categoria(7,10).

Entendimento e aplicabilidade das orientações recebidas no pólo de neurogeriatria

O Pólo de Neurogeriatria é voltado para o atendimento integral ao idoso com síndrome demencial, realizado em equipe interdisciplinar que assiste o binômio idoso-família em: consultas individuais, interconsultas, avaliação neuro-psicológica, treinamento do cuidador e orientação familiar individual, grupo de suporte e apoio aos familiares e oficinas terapêuticas de reabilitação cognitiva.

Aqui eu vim conhecer o que era a doença, sobre cada uma das fases, se não fosse aqui, eu tinha ficado doente de novo (Coragem).

Não tem um dia que eu saia daqui sem aprender alguma coisa [...] aqui eu aprendi a ter paciência com as repetições e os esquecimentos [...] o bom do grupo é que às vezes alguém já passou pelo que eu tô passando e um vai ajudando o outro [...] se eu falto alguma semana eu sinto falta, isso aqui não deve acabar nunca (Confiança)!

Às vezes ela vem e enfia a mão suja na comida, se fosse antes eu falava que ela não poderia fazer isso porque está com a mão suja, e isso gerava uma discussão enorme, e aqui eu aprendi a como contornar esse tipo de situação, procurando caminhos para lidar com ela (Conhecimento).

Portanto o modelo assistencial desempenhado pelo Pólo de Neurogeriatria, revela pontos positivos na visão dos cuidadores. Apesar de serem poucos os atendidos, 15 indivíduos cuidadores e seus respectivos 15 idosos, 30 pessoas no total são atendidas por uma equipe mínima composta por uma enfermeira, uma fonoaudióloga, uma assistente social, uma técnica de enfermagem e um massoterapeuta, responsáveis por todas as atividades semanais e pelo ambulatório multiprofissional.

Os idosos realizam as atividades de oficinas terapêuticas divididos em dois grupos, o mais preservado (fase inicial) e o menos preservado (fase moderada). Essas atividades ocorrem duas vezes por semana, num período de 2 horas, sendo 50 minutos para cada atividade nos idosos (oficina da palavra, oficina do corpo, oficina de jardinagem, oficina de beleza, oficina de jogos, oficina de memória). Essa participação dos idosos nas atividades de oficinas proporciona, aos cuidadores, uma possibilidade de oferecer algum tipo de atendimento para sua saúde e bem-estar, relatam que se sentem bem em ver os idosos integrando o serviço.

Nos 20 minutos restantes ocorre um lanche organizado pelos integrantes do Pólo de Neurogeriatria junto com a equipe integrante, esse objetiva promover o encontro, a socialização e a organização do grupo discutindo quais serão as atividades mensais, promovendo um espaço plural e acolhedor(7,10-11).

No grupo os cuidadores desenvolvem atividades conjuntas independentes da fase da doença. Esses alternam em duas atividades, grupo de orientação e suporte estimulando o encontro e socialização dos saberes fortalecendo o aprendizado mútuo do grupo para adaptarem a sua realidade concreta. E o outro objetiva o fortalecimento da auto-estima desses cuidadores e, principalmente para resgatar a necessidade de cuidarem de si para cuidarem do outro(7,10-11).

Sabemos que o custo-benefício desse tipo de modelo assistencial deve ser levado em conta. Estudos apontam que serviços alternativos oferecem aos idosos e suas famílias a possibilidade de prevenir institucionalizações precoces, hospitalizações e conflitos familiares(18). Nesse estudo os cuidadores apontam como positivas suas participações no Pólo de Neurogeriatria por proporcionarem conhecimentos e melhores condições de cuidar desse idoso dependente em casa. Porém revelam como pontos negativos a ínfima clientela atendida dentre os tantos que necessitam desse atendimento, principalmente devido à dificuldade de locomoção/transporte e, pelo custo econômico necessário para que os cuidadores permaneçam assíduos.

Portanto se impôs a necessidade de cuidados de enfermagem sistematizados, priorizando àqueles relacionados às atividades de vida diária e à prevenção de incapacidades e complicações nas atividades educativas oferecidas em grupo dos cuidadores, aproveitando ao máximo sua participação e integrando-os ao Pólo de Neurogeriatria com sua realidade doméstica.

As orientações me ajudaram no tipo de alimentação, o cuidado com o banho, hoje eu cuido do dinheiro dela e aprendi também a ter muita, muita paciência [...] você tem que compreender que ela não faz as coisas por querer (Honestidade).

Aqui eu aprendi a cuidar da mamãe, por exemplo, em termos de casa, os cuidados com o tapete, corrimão no banheiro e também aprendi que a doença tem altos e baixos (Esperança).

Quando eu recebo a orientação eu sei como aplicar, tem momentos que é o inverso, acontece, e eu tenho que chegar a alguém para me orientar (Humildade).

Assim o grupo proporcionou aquisição de conhecimentos e habilidades para o cuidador aplicá-los durante a progressão da doença, orientando à adaptação dos cuidados ao conseqüente aumento da dependência do idoso; a instrumentalização desse familiar para o cuidado prático; e o estímulo a cuidar de sua saúde e auto-estima.

Pudemos perceber ainda, durante as entrevistas, que a experiência de cuidar é também percebida como uma doação que envolve não só um sentimento de dever profissional e humano, mas também como responsabilidade em fazer o melhor possível pelos idosos. Assim, a responsabilidade, o esforço, a doação fazem parte da vida desses cuidadores que mesmo com tantas dificuldades têm o conforto de saber que estão oferecendo uma velhice digna a esses idosos, oferecendo cuidados que vão além do tecnicismo, um cuidado que envolve atenção, bom humor, bom relacionamento, segurança e carinho(10-11).

Portanto esse modelo assistencial alternativo utiliza-se de tecnologias leves, da relação, do acolhimento, da criação do vinculo, da produção da resolutividade e da criação de maiores graus de autonomia no modo das pessoas andarem a vida(13). Enfim, construindo um espaço de intercessão entre cliente e profissional valorizando tanto as questões objetivas como subjetivas desses sujeitos podemos potencializar o entendimento e à aplicabilidade de nossas orientações no cotidiano de nossos clientes.

Mecanismos de enfrentamento e adaptação no contexto do cuidado familiar

As atividades desenvolvidas pelo cuidador podem levá-lo a desequilíbrios psicológicos e físicos, passando ele a apresentar vários sentimentos como angústia, sentimento de culpa, inversão de papéis, ira e agressividade(2). O conteúdo expresso a seguir pode exemplificar os sentimentos gerados no cuidador:

Eu nunca ia imaginar que a mamãe iria ficar com essa doença, eu fico imaginando como minha mãe vai ficar, eu fico apavorada, mas eu vou conseguir (choro)[...]levar até o final porque eu só quero dar uma velhice digna pra ela, porque ela se sacrificou muito por mim [...] eu sei que vai chegar o dia que ela não vai se lembrar de mim, ou pode me rejeitar. (choro) porque você não consegue raciocinar, saber que aquele prato de comida que tá ali na sua frente é pra você comer, e você não sabe pra que serve [...] que isso gente..isso dói, dói; eu tô aprendendo na marra e aprender na marra é muito difícil [...] dá um desânimo, mas eu vou continuar (Confiança)!

Podendo, ainda, os familiares sentirem-se limitados, com sentimentos de desespero, raiva e frustração que se, alternam com a culpa de não estar fazendo o bastante por um parente amado(5-8).

O que eu aprendi muito é viver o dia de hoje e cuidar bem desse dia de hoje sem pensar no que pode acontecer (Esperança).

Quando eu cheguei aqui, eu cheguei desesperada, porque eu nunca tinha tomado conta de uma pessoa com Alzheimer [...] é muito gratificante pra mim quando eu levo ela ao médico e ele diz que ela está bem cuidada [...] (com lágrimas nos olhos) isso é muito gratificante! (Humildade).

Nesse sentido, as mudanças ocorridas na vida dos cuidadores atingem seus sentimentos, o dia-a-dia e suas atividades que são significativamente alterados; alguns familiares distanciam-se da vida sócio-familiar à medida que a doença progride, em razão de preconceitos, sentimentos de culpa e desconhecimento sobre a doença de Alzheimer. Há uma sobrecarga emocional e de atividades gerando uma transformação na vida daquele que se compromete a assumir a tarefa de cuidador.

E na tentativa de representação gráfica da aproximação com a Teoria de Callista Roy (Figura 1), observarmos que os estímulos que o cuidador recebe, como a sobrecarga de trabalho, falta de lazer, dificuldades econômicas, pouco tempo para si, falta de revezamento, repouso inadequado, não ter com quem compartilhar os problemas, abandono do emprego, abandono dos outros familiares, falta de suporte físico e emocional, podem trazer como conseqüências ou impacto na vida desse cuidador: estresse, ansiedade, fadiga, instabilidade emocional, irritabilidade, empobrecimento, auto-estima diminuída, isolamento, desunião. Todos esses fatores podem afetar tanto a saúde física quanto a mental, de acordo com os mecanismos de defesa que ele adquire para adaptação ao cuidado do idoso com Alzheimer.


Assim, ao proporcionarmos orientações que permitam a esses cuidadores conhecimento e habilidades aplicáveis a sua realidade cotidiana também estimulamos a adaptação de mecanismos reguladores de enfrentamento necessários ao ato de cuidar de um idoso com demência. Contudo, os temas discutidos no grupo devem partir da situação experenciada para que sejam valorizados e problematizados a partir da fala desses sujeitos e, a partir daí as orientações são planejadas conjuntamente pelo grupo para garantir sua aplicabilidade na realidade cotidiana.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com relação ao entendimento sobre a doença, observa-se que os cuidadores têm uma compreensão do processo da demência no idoso diferente um do outro, de acordo com seu nível cultural e do seu tempo de convivência da participação do Pólo de Neurogeriatria. O entendimento da doença tem sido gradativamente aprimorado de acordo com a participação das reuniões no Pólo. As orientações recebidas sobre a doença são através de dinâmicas de grupo, o que facilita a adesão e a melhor compreensão. Podemos inferir que o linguajar, a metodologia educativa e os recursos didáticos do Pólo de Neurogeriatria que utiliza oficinas de trabalho com o corpo, jogos cognitivos, arte terapia, socialização entre cuidadores e passeios, levam a uma interação do cuidador com o profissional e facilitam o entendimento da doença e das questões relativas ao cuidado.

Assim, o grupo de familiares orientado pela enfermeira se dá a partir do método de problematização, gerando um tema para cada discussão entre os cuidadores e o profissional. Esse método de ensinar-cuidar proporciona uma valorização do sujeito cuidador, em relação às suas dúvidas sobre a doença e o cuidado, deixa-o motivado a participar das discussões favorecendo o seu aprendizado através da problematização. Alguns cuidadores citaram que nos momentos de consultas médicas, antes de procurar o Pólo, as orientações eram passadas de modo superficial sem preocupação se realmente o cuidador está compreendendo a mensagem enviada, levando a permanecer com as suas indagações e dúvidas sem um esclarecimento adequado ao seu nível de entendimento.

Verificou-se que esse aprendizado e sua aplicabilidade são um processo contínuo no qual todos relatam que, em cada reunião de que eles participam, ocorrem esclarecimentos da maneira de cuidar e aplicar esses cuidados: na alimentação, no banho, com as medicações, segurança doméstica. É importante ressaltar que os aprendizados dos cuidados recebidos através das reuniões não se limitam apenas aos cuidados físicos, mas há um enfoque ao relacionamento terapêutico.

Já nos mecanismos de enfrentamento para se adaptar a essa situação crítica estão relacionadas a dificuldades em nível econômico, sobrecarga devido à responsabilidade de cuidar sem revezamento com outros cuidadores, tendo conseqüentemente pouco tempo para o seu autocuidado, sacrificando seu tempo de descanso, lazer, vida social, vida familiar e afetiva. O maior impacto relatado pelos cuidadores nesse contexto é o risco de adoecimento. Principalmente aqueles associados ao estresse, gerando uma instabilidade emocional, ansiedade, depressão, labilidade emocional, e possível perda do controle de suas emoções.

Os cuidadores também precisam de ajuda e acompanhamento, pois se sentem muito sozinhos e com uma sobrecarga de trabalho muito grande. O Pólo de Neurogeriatria é um momento no qual eles podem partilhar o impacto desse contexto na vida deles. É nesse momento que eles sentem a solidariedade de outros cuidadores que vivenciam a mesma problemática, assim como o conforto através das orientações recebidas. Favorecendo para que eles elaborem mecanismos e estratégias que venham fortalecê-los para o seu enfrentamento e melhor adaptação a essa realidade.

Portanto, o Pólo de Neurogeriatria tem sido para esses cuidadores uma referência para o fortalecimento de seus mecanismos de enfrentamento no seu cotidiano ao assistir os idosos com Alzheimer. É através dessas reuniões que eles se sentem acolhidos, confortados, fortalecidos e estimulados a cada dia mais a prestarem os cuidados com afetividade, valorizando o idoso em suas dimensões: física, mental, social, cultural e espiritual.

Consideramos que a temática exposta ressaltou a importância da criação dos Pólos de Neurogeriatria, e a atuação da enfermeira, numa necessidade de ampliação desses no sistema de saúde pública, considerando o grande crescimento da população idosa. Na prática de cuidar, as estratégias educativas utilizadas no grupo de familiares, pelo método de problematização, destacou a participação ativa dos sujeitos, assim como a valorização de suas necessidades e desejos, gerando temas do interesse dos sujeitos e favorecendo a conscientização, motivação e futuras transformações. No ensino, carecemos ainda de formação profissional visando a formação de recursos humanos para cuidar de idosos e preparar cuidadores familiares. Esperamos que as Faculdades de Enfermagem considerem os resultados deste estudo como uma necessidade contemporânea. Para a pesquisa, entendemos que o estudo se mostra viável para futuras aplicações do modelo da adaptação de Callista Roy, atentando para a redução do estresse dos cuidadores, no uso de suas atividades dos mecanismos de enfrentamento, e assim, promovendo condições de saúde físicas e mentais, bem-estar e conforto àqueles que cuidam.

Recebido: 25/10/2007

Aprovado: 31/07/2008

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  • Correspondência:

    Rosimere Ferreira Santana
    Rua Dr. Celestino, 74 - Centro
    CEP 24020-091 - Niterói, RJ, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      31 Jul 2008
    • Recebido
      25 Out 2007
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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