Sintomas de depressão, ansiedade e estresse em estudantes da saúde e impacto na qualidade de vida^*

Resumos

Objetivo:

avaliar a associação entre qualidade de vida e presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse em estudantes universitários da área da saúde.

Método:

estudo transversal que incluiu 321 estudantes de cursos de graduação da área da saúde. A qualidade de vida foi mensurada por meio da escala da Organização Mundial da Saúde, versão abreviada, nos domínios físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente, e os sintomas avaliados pela escala de depressão, ansiedade e estresse. Foi realizada análise multivariada utilizando regressão linear robusta para avaliar a associação entre qualidade de vida e sintomas apresentados.

Resultados:

observou- se associação negativa entre qualidade de vida e sintomas de depressão em todos os domínios, enquanto os sintomas de ansiedade apresentaram associação negativa no domínio meio ambiente, e os sintomas de estresse tiveram associação negativa no domínio psicológico. A gravidade dos sintomas associou-se de forma desfavorável com a qualidade de vida, ou seja, quanto maior a gravidade dos sintomas, menor a média dos escores em todos os domínios.

Conclusão:

sintomas de depressão, ansiedade e estresse mostraram-se prevalentes e com impacto negativo na qualidade de vida dos estudantes, principalmente na presença de sintomas depressivos. A diminuição dos escores foi significativamente associada à gravidade dos sintomas.

Descritores:
Qualidade de Vida; Estudantes de Ciências da Saúde; Estudantes; Saúde Mental; Depressão; Ansiedade

Objetivo:

evaluar la asociación entre la calidad de vida y la presencia de síntomas de depresión, ansiedad y estrés en estudiantes universitarios del área de la salud.

Método:

estudio transversal que incluyó a 321 estudiantes de carreras del área de la salud. La calidad de vida se midió mediante la escala de la Organización Mundial de la Salud, versión abreviada, en los dominios físico, psicológico, relaciones sociales y ambiente, y los síntomas se evaluaron por la escala de depresión, ansiedad y estrés. Se realizó un análisis multivariante por medio de regresión lineal robusta para evaluar la asociación entre la calidad de vida y los síntomas presentados.

Resultados:

se observó una asociación negativa entre la calidad de vida y los síntomas de depresión en todos los dominios, mientras que los síntomas de ansiedad tuvieron una asociación negativa en el dominio ambiente, y los síntomas de estrés tuvieron una asociación negativa en el dominio psicológico. La gravedad de los síntomas se asoció desfavorablemente con la calidad de vida, es decir, cuanto mayor la gravedad de los síntomas, menores las puntuaciones medias en todos los dominios.

Conclusión:

los síntomas de depresión, ansiedad y estrés fueron prevalentes e impactaron negativamente en la calidad de vida de los estudiantes, especialmente en presencia de síntomas depresivos. Las puntuaciones disminuidas se asociaron significativamente con la gravedad de los síntomas.

Descriptores:
Calidad de Vida; Estudiantes del Área de la Salud; Estudiantes; Salud Mental; Depresión; Ansiedad

Objective:

to evaluate the association between quality of life and presence of symptoms of depression, anxiety, and stress in college students in the health area.

Method:

cross-sectional study that included 321 students from undergraduate courses in the health area. Quality of life was measured using the World Health Organization scale, abbreviated version, in the physical, psychological, social relations and environment domains, and symptoms were assessed by the depression, anxiety and stress scale. Multivariate analysis was performed using robust linear regression to evaluate the association between quality of life and symptoms.

Results:

a negative association was observed between the quality of life and depression symptoms in all domains, while anxiety symptoms showed a negative association in the environment domain, and stress symptoms had a negative association in the psychological domain. Symptom severity was unfavorably associated with quality of life, that is, the greater the symptom severity, the lower the mean scores in all domains.

Conclusion:

symptoms of depression, anxiety, and stress were prevalent and had a negative impact on students’ quality of life, especially in the presence of depressive symptoms. The decrease in scores was significantly associated with the severity of symptoms.

Descriptors:
Quality of Life; Students, Health Occupations; Students; Mental Health; Depression; Anxiety

Destaques:

(1) O rastreio mostrou alta prevalência de ansiedade, estresse e depressão.

(2) A gravidade dos sintomas esteve relacionada a uma pior qualidade de vida.

(3) Depressão foi o sintoma de maior impacto na qualidade de vida.

(4) Contribuição ao delineamento de estratégias de rastreio em estudantes da saúde.

Introdução

A qualidade de vida (QV) é um conceito que emerge, na contemporaneidade, como um importante indicador das condições de saúde e efeitos de tratamentos e intervenções, fundamentando-se na percepção do indivíduo sobre os variados aspectos de sua vida dentro de um campo abrangente e complexo(1). A QV dos estudantes universitários é uma temática que tem sido cada vez mais discutida no âmbito da saúde e da educação, considerando a importância que essa população assume no contexto social e da saúde pública(2).

Os universitários da área da saúde, com frequência, vivenciam mudanças significativas ao ingressarem na universidade, principalmente quando necessitam afastar-se do ambiente familiar e migrar para outras cidades, enfrentando um período de transição que pode trazer impactos em sua saúde e QV(3-4). Algumas especificidades durante a vivência acadêmica podem impactar negativamente em sua saúde física e mental como, por exemplo, a carga horária elevada em atividades de ensino, sobrecarga de tarefas acadêmicas e estágios curriculares no âmbito hospitalar e da atenção primária com enfrentamento de situações estressoras, estando muitas delas relacionadas com a morte e processo de morrer(5).

Nessa perspectiva, a inserção em um contexto de alta complexidade durante a formação acadêmica pode contribuir para maior vulnerabilidade no desenvolvimento de transtornos mentais, notadamente quadros de estresse, ansiedade, depressão e ideação suicida, que afetam de modo significativo seu rendimento acadêmico e saúde global(6). Ademais, existem indícios de que estudantes da área da saúde apresentam uma QV mais baixa quando comparados com a população geral e estudantes de outras áreas do conhecimento e de faixas etárias semelhantes, em especial, no aspecto psicológico(7).

As especificidades que envolvem o processo de formação na área da saúde, associadas a outros fatores individuais que influenciam negativamente a saúde mental dos estudantes, como carga genética e rede de apoio familiar, podem guardar relação com a elevada prevalência de transtornos mentais nessa população, notadamente depressão e transtornos de ansiedade, podendo acometer mais de 30% desses universitários(8-10). Em estudantes universitários brasileiros, por exemplo, há indícios de que a depressão seja um dos principais preditores de uma pior QV com impacto negativo no desempenho acadêmico e nas suas perspectivas futuras tanto no contexto profissional como pessoal(11).

De forma geral, observa-se que existe uma lacuna na literatura, sobretudo no Brasil, no que se refere a estudos multicêntricos que avaliem a relação entre QV e sintomas de depressão, ansiedade e estresse em estudantes universitários da área da saúde, englobando diferentes cursos, tendo em vista que grande parte desses estudos limitam-se, geralmente, a um único curso ou instituição(12-14). Neste contexto, grande parte das investigações, tanto nacionais quanto internacionais, concentram-se na avaliação da QV de forma isolada sem elucidar sua relação com os aspectos de saúde mental(11,15).

A avaliação da QV e as características associadas a estudantes da saúde, principalmente aqueles relacionados à saúde mental poderão apontar indicadores para o planejamento de intervenções e cuidado oportuno, buscando-se evitar desfechos futuros desfavoráveis como, por exemplo, o suicídio(16). Assim, esta investigação tem como objetivo avaliar a associação entre QV e a presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse em estudantes da área da saúde.

Método

Tipo do estudo

Trata-se de um estudo transversal realizado com estudantes de cursos de graduação da área da saúde de instituições públicas de ensino superior de Minas Gerais.

Cenário em que aconteceu a coleta de dados

O estudo foi realizado em três Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) de Minas Gerais (MG), Brasil, sendo elas: Universidade Federal de São João Del-Rei (Campus Divinópolis e São João del-Rei - UFSJ); Universidade Federal de Ouro Preto (Ouro Preto - UFOP); e Universidade Federal do Triângulo Mineiro (Uberaba - UFTM). Esta investigação faz parte de um inquérito epidemiológico, multicêntrico, realizado com IFES de Minas Gerais, com o intuito de avaliar a prevalência de depressão, ansiedade e estresse entre estudantes universitários(17).

Período

Os dados foram coletados entre os meses de maio a dezembro de 2019.

População e amostra

Para a determinação da composição da amostra, considerou-se uma população elegível de 5.847 estudante das três instituições de ensino descritas. O cálculo amostral foi realizado, levando-se em conta os seguintes parâmetros: 30% de prevalência estimada para os transtornos de ansiedade e depressão(18), margem de erro de 3%, efeito de desenho 1,0 e nível de significância de 5%. O tamanho amostral necessário para atender a esses parâmetros foi de 306 estudantes, sendo calculado por meio do programa OpenEpi®.

Utilizou-se de amostragem estratificada proporcional por meio de sorteio aleatório com reposição, tomando-se como base a lista de alunos matriculados e o quantitativo proporcional de cada universidade. Para a reposição, considerou-se um quantitativo de 30% de estudantes, além do tamanho amostral calculado. Dessa forma, foram contatados 400 estudantes.

Critérios de seleção

A população do estudo foi constituída por estudantes de nove cursos de graduação presenciais da área da saúde, maiores de 18 anos e de ambos os sexos, que se encontravam regularmente matriculados nas três universidades na ocasião do estudo. Foram elegíveis aqueles matriculados nos seguintes cursos da área da saúde dessas instituições: Biomedicina, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Medicina, Nutrição, Psicologia e Terapia Ocupacional. Foram excluídos do estudo os estudantes que estavam em intercâmbio no momento da coleta de dados e aqueles que apresentaram respostas repetidas ao longo dos itens do questionário. Para cada estudante excluído ou que não respondeu ao questionário (recusa ou não resposta), foi realizado sorteio de reposição dentro do mesmo perfil.

Coleta de dados e instrumentos utilizados

Os dados foram coletados de forma online por meio de um questionário virtual, autoaplicado e confidencial, disponibilizado na plataforma online de formulários Google Forms e enviado por e-mail a cada aluno selecionado. O acesso a esse questionário foi possível por meio de smartphone, tablet ou computador.

Os participantes foram previamente informados: a) que o tempo médio gasto para resposta ao questionário era de 30 minutos; b) que não era obrigatório responder a todas as questões, ficando livres para não responderem àquelas que eles não se sentissem à vontade e; c) sobre a necessidade da leitura e assinatura virtual do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), composto por uma página de esclarecimento sobre o estudo e a solicitação de autorização para o uso dos dados, podendo o participante fazer o download do arquivo.

Para a mensuração da QV, utilizou-se o instrumento WHOQOL-bref (World Health Organization Quality of Life Scale), Escala de Qualidade de Vida da Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolvida pelo Grupo de QV. Trata-se de um instrumento genérico, composto por 26 questões englobando quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente. Os resultados dos domínios individuais são escalados em uma direção positiva, ou seja, quanto maior for a pontuação, melhor será a QV nos últimos 15 dias. No estudo de validação para o Brasil, esse instrumento apresentou características satisfatórias de consistência interna, validade discriminante, validade de critério, validade concorrente e fidedignidade teste-reteste(19).

A presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse foi avaliada por meio da DASS-21 (Depression, Anxiety and Stress Scale), Escala de Depressão, Ansiedade e Estresse, adaptada e validada para o Brasil, apresentando características adequadas de confiabilidade e validade no estudo de adaptação e validação(20). É composta por 21 frases afirmativas, subdivididas em três subescalas que avaliam, por autorrelato, os sintomas de ansiedade, depressão e estresse durante a última semana. Cada uma dessas subescalas é composta por sete questões, sendo as respostas obtidas de acordo com uma escala tipo Likert de 4 pontos (0 a 3). Os resultados de cada subescala são obtidos somando-se os escores de seus itens e multiplicando o total por dois. As pontuações geram as seguintes categorias de gravidade dos sintomas: “normal”, “leve/moderado”, grave/muito grave”.

Variáveis do estudo

As variáveis do estudo foram: a) indicadores de QV mensurados pela escala WHOQOL-bref, definidos como variável resposta e; b) sintomas de depressão, ansiedade e estresse avaliados pela DASS-21 como variáveis explicativas. As características sociodemográficas, hábitos de vida e saúde física foram variáveis utilizadas como ajuste para o modelo multivariado.

Tratamento e análise dos dados

A análise dos dados foi realizada por meio de estatística descritiva e inferencial, sendo utilizado software R (versão 4.0.5). Os resultados da avaliação da QV em cada domínio foram transformados em uma escala linear de 0 a 100. Foi realizada estatística descritiva com medidas de tendência central e dispersão bem como cálculo de frequência relativa. Na comparação entre a QV e os sintomas de depressão, estresse e ansiedade, foram utilizados o coeficiente de correlação de Spearman e o teste de Kruskal-Wallis; já nas comparações múltiplas foi utilizado o teste de Nemenyi.

Para a avaliação da associação entre a QV e os sintomas de depressão, ansiedade e estresse, foi realizada análise de regressão linear robusta, considerando que as variáveis não possuíam distribuição normal. As variáveis sociodemográficas, clínicas e hábitos de vida que se apresentaram significativas (p<0,20) na análise bivariada foram utilizadas como ajuste na análise multivariada, utlizando-se do método Backward. Todas as variáveis explicativas foram testadas para multicolinearidade. As respostas faltantes foram tratadas como missing, utilizando-se o método pairwise.

Na análise multivariada, foram incluídas, inicialmente, os sintomas de depressão, ansiedade e de estresse e, posteriormente, as variáveis de ajuste, uma a uma, em ordem crescente de p-valor da bivariada. As covariáveis com valor de p < 0,05 permaneceram no modelo final. Utilizou-se a variável curso como ajuste, independentemente do p-valor em função de sua relavância em outras investigações(3,5,7,11).

Assim, foi construído um modelo para cada domínio de QV. Para cada modelo, foram calculados os coeficientes (β) para cada variável de exposição e seu respectivo p-valor bem como o coeficiente de determinação (R²). Os resíduos de cada modelo foram analisados quanto às suas propriedades normais. Valores de beta (β) negativos indicam associação negativa com os escores da escala de QV (em unidades), enquanto valores positivos indicam associação positiva.

Aspectos éticos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFSJ/Campus Centro Oeste (parecer nº 3.490.510/2019) e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFOP (parecer nº 2.621.978/2018). Os participantes do estudo assinalaram, de forma virtual, sua concordância com o termo de consentimento livre e esclarecido e aprovado pelo Comitê de Ética. Essa investigação obedeceu a todas as prerrogativas legais de pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

Dos 400 estudantes que receberam o convite para participar do estudo, um estava em intercâmbio e dois apresentaram repostas repetidas ao longo dos itens do questionário (exclusões) bem como dois se recusaram a participar do estudo e 74 não responderam ao questionário sem apresentar justificativa. Sendo assim, participaram do estudo 321 estudantes dos cursos da área da saúde, distribuídos entre as três instituições: UFOP (28,9%), UFTM (37,0%) e UFSJ (33,9%). Em relação aos cursos que compuseram a amostra, obteve-se a seguinte distribuição: Medicina (27,10%), Farmácia (15,58%), Psicologia (13,08%), Enfermagem (11,21%), Educação Física (9,66%), Nutrição (10,59%), Fisioterapia (5,61%), Terapia Ocupacional (3,74%) e Biomedicina (3,43%). A Tabela 1 explicita as variáveis sociodemográficas, clínicas, de hábitos de vida e de saúde mental, sendo observado que a maioria era do sexo feminino (71%), solteira (92,8%), provenientes de famílias com renda igual ou superior a 04 salários mínimos (38,6%), apresentando média de idade de 24,0 anos (±4,04). Em relação aos hábitos de vida, verificou-se que grande parte informou fazer uso de bebidas alcoólicas (72,6%), sendo que o uso em excesso foi referido por uma parcela considerável (47,7%). Quase metade (45,5%) informou uso atual ou passado de drogas ilícitas, e uma parcela referiu ter iniciado o uso após o ingresso na universidade (23,7%). A maioria referiu praticar alguma atividade física (62,6%). Quase metade da população autoavaliou sua saúde como boa (49,2%). Sintomas graves ou muito graves de depressão, ansiedade e estresse foram encontrados em 20,7%, 31,5% e 23,4% dos estudantes respectivamente. A média de IMC foi de 24,01 (4,04).

Tabela 1 -
Características sociodemográficas, clínicas, hábitos de vida e saúde mental dos estudantes da área da saúde das três Instituições Federais de Ensino Superior (n=321). Minas Gerais, Brasil, 2019

Variáveis	Categorias	n=321
		n (%)
Sociodemográficas
Universidade 01		93 (28,97)
Universidade 02		109 (33,96)
Universidade 03		119 (37,07)
Curso	Medicina	87 (27,1)
	Outros cursos	234 (72,9)
Período do curso	1 e 2	67 (20,87)
	3 a 6	152 (47,35)
	7 a 16	102 (31,78)
Cor da Pele	Branco	173 (53,89)
	Não branco	148 (46,11)
Sexo Biológico	Feminino	228 (71,03)
	Masculino	93 (28,97)
Identidade de Gênero	Cisgênero	318 (99,07)
	Transgênero	3 (0,93)
Orientação Sexual	Heterossexual	255 (79,44)
	Homossexual	33 (10,28)
	Outros*	33 (10,28)
Estado Civil†	Solteiro(a)	298 (92,83)
	Casado(a)	13 (4,05)
	Outro†	10 (3,12)
Possui filhos	Sim	17 (5,3)
Escolaridade do chefe da família	Analfabeto/Fundamental	57 (17,76)
	Médio	101 (31,46)
	Superior	163 (50,78)
Renda do chefe da família	Até 2 salários	100 (31,15)
	De 2 a 4 salários	97 (30,22)
	Mais de 4 salários	124 (38,63)
Trabalho remunerado	Sim	41 (12,77)
Bolsa universidade	Sim	87 (27,1)
Moradia	Sozinho	36 (11,21)
	Pais/Parentes	85 (26,48)
	Outros‡	200 (62,31)
Número de moradores no domicílio	1	41 (12,77)
	2 a 3	159 (49,53)
	4 a 5	75 (23,36)
	6 ou mais	46 (14,33)
Crença religiosa	Católica	134 (41,74)
	Evangélica	38 (11,84)
	Outras§	149 (46,42)
Idade	(Média e desvio padrão)	24,01 (4,04)
Hábitos de vida
Uso de bebida alcoólica	Sim	233 (72,59)
Uso de bebida em excesso||	Sim	134 (47,69)
Tabagismo	Sim	41 (12,77)
Uso de drogas ilícitas	Já usei ou uso	146 (45,48)
Consumo drogas após universidade	Sim	76 (23,68)
Intensificação do consumo após universidade	Sim	44 (15,22)
Atividade física¶	Sim	201 (62,62)
Clínicas
Histórico familiar de depressão	Sim	164 (51,09)
Histórico familiar transtorno de ansiedade	Sim	171 (53,44)
Uso de medicamento DCNT**	Sim	37 (11,53)
Uso de antidepressivos	Sim	47 (14,64)
Uso de benzodiazepínicos	Sim	31 (9,66)
Terapia psicológica	Já fiz/Faço	169 (52,65)
Autoavaliação da saúde	Muito boa	37 (11,53)
	Boa	47 (14,64)
	Regular	31 (9,66)
	Ruim	218 (67,91)
IMC††	(Média e DP)	23,1 (4,11)
Saúde mental
Sintomas de depressão	Normal	141 (43,93)
	Leve/Moderado	114 (35,51)
	Grave/Muito Grave	66 (20,56)
Sintomas de ansiedade	Normal	149 (46,42)
	Leve/Moderado	71 (22,12)
	Grave/Muito Grave	101 (31,46)
Sintomas de estresse	Normal	110 (34,27)
	Leve/Moderado	136 (42,37)
	Grave/Muito Grave	75 (23,36)

• ^*
  Bissexual, assexual;
• ^†
  Divorciado, união estável, outro;
• ^‡
  República, pensão, alojamento, cônjuge;
• ^§
  Sem crença, espírita, orientais budismo, judaica, afro brasileira, outra;
• ^||
  Total de doses ingeridas em uma única ocasião (total de cinco doses para os homens e quatro para as mulheres, em uma única ocasião);
• ^¶
  Praticar atividade física refere-se à prática de exercício ou qualquer atividade física, como esporte (por exemplo: futebol, tênis, corrida, natação etc.);
• ^**
  DCNT = Doença Crônica Não Transmissível;
• ^††
  IMC = Índice de massa corporal

Na Tabela 2, estão apresentados os resultados da análise bivariada da associação entre a QV e a presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse. Observou-se que as variáveis preditoras (depressão, ansiedade e estresse) mostraram-se significativamente associadas ao desfecho QV em todos os domínios (p-valor 0,05).

Tabela 2 -
Análise bivariada por meio do modelo de regressão linear robusta, avaliando a associação entre a qualidade de vida e sintomas de depressão, ansiedade e estresse de acordo com os domínios da escala WHOQOL-bref^* dos estudantes da área da saúde das três Instituições Federais de Ensino Superior (n=321). Minas Gerais, Brasil, 2019

Sintomas		Valor-p †
		Domínio Físico	Domínio Psicológico	Relações Sociais	Meio Ambiente
Depressão	Normal	-	-	-	-
	Leve/Moderado	0,000	0,000	0,000	0,000
	Grave/Muito Grave	0,000	0,000	0,000	0,000
Ansiedade	Normal	-	-	-	-
	Leve/Moderado	0,000	0,000	0,049	0,002
	Grave/Muito Grave	0,000	0,000	0,000	0,000
Estresse	Normal	-	-	-	-
	Leve/Moderado	0,000	0,000	0,010	0,001
	Grave/Muito Grave	0,000	0,000	0,000	0,000

• ^*
  WHOQOL-bref = World Health Organization Quality of Life Scale;
• ^†
  Valor-p < 0,05

A correlação entre os sintomas de depressão, ansiedade e estresse e a QV está apresentada na Tabela 3. Observa-se que todos os domínios de QV foram significativamente (p-valor < 0,05) e negativamente (r < 0) correlacionados com a depressão, ansiedade e estresse, ou seja, quanto maior a gravidade de sintomas, menores tendem a ser os escores de QV em todos os domínios. A correlação mais forte observada (r = -0,68) foi entre o domínio psicológico e a depressão. Em contrapartida, a correlação mais fraca observada (r = -0,25) foi entre o domínio de relações sociais e a ansiedade.

Tabela 3 -
Correlação entre depressão, ansiedade e estresse e a qualidade de vida dos estudantes da área da saúde das três Instituições Federais de Ensino Superior (n=321) de acordo com os domínios da escala WHOQOL-bref^*. Minas Gerais, Brasil, 2019

	Escore Depressão r¹ † (valor-p)	Escore Ansiedade r¹ † (valor-p)	Escore Estresse r¹ † (valor-p)
Domínio Físico	-0,54 (0,000)	-0,45 (0,000)	-0,44 (0,000)
Domínio Psicológico	-0,68 (0,000)	-0,54 (0,000)	-0,56 (0,000)
Relações Sociais	-0,34 (0,000)	-0,25 (0,000)	-0,26 (0,000)
Meio Ambiente	-0,34 (0,000)	-0,31 (0,000)	-0,29 (0,000)

• ^*
  WHOQOL-bref = World Health Organization Quality of Life Scale;
• ^†
  r¹ = Coeficiente de correlação de Spearman

A comparação dos escores de QV na escala WHOQOL-bref de acordo com a gravidade dos sintomas de depressão, ansiedade e estresse é apresentada na Tabela 4. Observou-se diferença estatisticamente significativa (p-valor <0,001) dos escores de QV com a gravidade dos sintomas, ou seja, quanto maior a gravidade dos sintomas, menor a média dos escores de QV em todos os domínios, apresentando ainda o gradiente dose resposta. O menor escore de QV foi encontrado para o domínio psicológico na presença de depressão grave ou muito grave (QV=36,87) e na presença de estresse grave ou muito grave (QV=41,28).

Tabela 4 –
Média dos escores de qualidade de vida por domínios da escala WHOQOL-bref^* na presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse e resultado do teste de comparação em estudantes da área da saúde das três Instituições Federais de Ensino Superior (n=321). Minas Gerais, Brasil, 2019

Escalas	Domínios de QV †	Sintomas	Número	Média ‡	D.P. §
Depressão	Físico	Normal	141	73,02	13,52
		Leve, Moderado	114	61,12	13,26
		Grave, Muito Grave	66	51,52	16,23
	Psicológico	Normal	141	69,71	12,44
		Leve, Moderado	114	54,39	14,02
		Grave, Muito Grave	66	36,87	18,59
	Relações Sociais	Normal	141	68,97	18,18
		Leve, Moderado	114	59,36	20,60
		Grave, Muito Grave	66	52,02	22,79
	Meio Ambiente	Normal	141	67,09	13,82
		Leve, Moderado	114	58,96	12,99
		Grave, Muito Grave	66	52,89	18,16
Ansiedade	Físico	Normal	149	71,48	14,05
		Leve, Moderado	71	62,98	12,51
		Grave, Muito Grave	101	54,88	16,83
	Psicológico	Normal	149	66,58	15,18
		Leve, Moderado	71	57,69	14,48
		Grave, Muito Grave	101	44,02	19,27
	Relações Sociais	Normal	149	66,95	19,17
		Leve, Moderado	71	61,15	20,89
		Grave, Muito Grave	101	55,53	22,21
	Meio Ambiente	Normal	149	66,28	13,56
		Leve, Moderado	71	60,52	12,24
		Grave, Muito Grave	101	54,46	17,63
Estresse	Físico	Normal	110	72,14	13,16
		Leve, Moderado	136	64,42	15,05
		Grave, Muito Grave	75	52,90	16,15
	Psicológico	Normal	110	68,56	14,12
		Leve, Moderado	136	57,54	16,82
		Grave, Muito Grave	75	41,28	17,81
	Relações Sociais	Normal	110	67,65	18,23
		Leve, Moderado	136	61,15	21,38
		Grave, Muito Grave	75	55,56	22,53
Estresse	Meio Ambiente	Normal	110	66,22	13,04
		Leve, Moderado	136	60,64	14,90
		Grave, Muito Grave	75	55,21	17,71

• ^*
  WHOQOL-bref = World Health Organization Quality of Life Scale;
• ^†
  QV = Qualidade de vida;
• ^‡
  Kruskal-Wallis. Comparações múltiplas, todos p-valor < 0,001;
• ^§
  D.P. = Desvio padrão

O modelo ajustado pelas variáveis sociodemográficas, clínicas, hábitos de vida e curso é mostrado na Tabela 5. Observou-se que os sintomas de depressão mostraram impacto na diminuição da QV em todos os domínios da escala: 1. Domínio físico: sintomas de depressão leve/moderada (β:-5,99) e de depressão grave/ muito grave (β:-12,26). 2. Domínio psicológico: sintomas de depressão leve/moderada (β:-9,11) e de depressão grave/muito grave (β:-22,45). 3. Domínio relações sociais: sintomas de depressão leve/moderada (β:-6,18) e de depressão grave/muito grave (β:-12,31). 4. Domínio meio ambiente: sintomas de depressão leve/moderada (β:-4,22) e depressão grave/muito grave (β:-9,09). No mesmo sentido, sintomas de estresse grave/muito grave (β:-6,47) foram associados a uma diminuição dos escores de QV no domínio psicológico, ao mesmo tempo que sintomas de ansiedade grave/muito grave (β:-5,90) tiveram associação negativa no domínio meio ambiente. A variável curso, utilizada independentemente do p-valor, teve pouca influência no modelo.

Tabela 5 -
Modelo final ajustado da associação entre a qualidade de vida e sintomas de depressão, ansiedade e estresse de acordo com os domínios da escala WHOQOL- bref^* dos estudantes da área da saúde das três Instituições Federais de Ensino Superior (n=321). Minas Gerais, Brasil, 2019

Variáveis		Domínios de qualidade de vida
		Físico †		Psicológico ‡		Relações Sociais §		Meio Ambiente ||
		β ¶	Valor-p	β ¶	Valor-p	β ¶	Valor-p	β ¶	Valor-p
D**	Normal	-	-	-	-	-	-	-	-
	Leve/Moderado	-5,99	0,002	-9,11	0,000	-6,18	0,025	-4,22	0,018
	Grave/Muito Grave	-12,26	0,000	-22,45	0,000	-12,31	0,002	-9,09	0,002
A††	Normal	-	-	-	-	-	-	-	-
	Leve/Moderado	-2,10	0,267	-0,13	0,944	-1,41	0,662	-3,76	0,051
	Grave/Muito Grave	-3,31	0,192	-2,91	0,291	-2,32	0,549	-5,90	0,015
E‡‡	Normal	-	-	-	-	-	-	-	-
	Leve/Moderado	0,19	0,923	-2,75	0,120	0,60	0,821	1,11	0,537
	Grave/Muito Grave	-4,00	0,151	-6,47	0,031	0,78	0,855	2,38	0,432
R²§§		44,27%		51,18%		18,83%		31,47%

• ^*
  WHOQOL-bref = World Health Organization Quality of Life Scale;
• ^†
  Variáveis de ajuste por domínios (P-valor <0,20 na bivariada): sexo, moradia, número de moradores domicílio, uso de medicamento DCNT, uso de benzodiazepínicos, autoavaliação da saúde e curso;
• ^‡
  Variáveis de ajuste por domínios (P-valor <0,20 na bivariada): escolaridade do chefe da família, uso de antidepressivos, autoavaliação da saúde e curso;
• ^§
  Variáveis de ajuste por domínios (P-valor <0,20 na bivariada): renda do chefe da família, moradia, uso de bebida alcoólica, autoavaliação da saúde e curso;
• ^||
  Variáveis de ajuste por domínios (P-valor <0,20 na bivariada): renda do chefe da família, autoavaliação da saúde e curso;
• ^¶
  β = Indica coeficiente β padronizado;
• ^**
  D = Depressão;
• ^††
  A = Ansiedade;
• ^‡‡
  E = Estresse;
• ^§§
  R² = Coeficiente de determinação

Discussão

Sintomas de depressão, ansiedade e estresse são fenômenos interligados e que transitam entre afeto negativo, desconforto emocional e alterações fisiológicas(6,20). Nesta investigação, observou-se que, aproximadamente, 50% dos estudantes da área da saúde apresentaram sintomas de depressão, ansiedade e estresse, de gravidade leve a muito grave, e mais de 20% apresentaram sintomas graves dessas condições. Sintomas de depressão mostraram-se associados a uma mais baixa QV em todas as dimensões com maior impacto no domínio psicológico, ao passo que os sintomas de ansiedade se associaram à mais baixa QV no domínio meio ambiente e os sintomas de estresse no domínio psicológico.

Os resultados deste estudo multicêntrico evidenciam um cenário peculiar, pois indicam que os estudantes dos cursos de graduação da área da saúde das instituições pesquisadas apresentam uma carga elevada de sintomas de depressão, ansiedade e estresse com potencial interferência em sua QV. Esses achados são inovadores, tendo em vista que o impacto e a relação entre saúde mental e QV em estudantes de cursos da saúde até o momento não estavam bem elucidados.

Sintomas depressivos são considerados o preditor psicológico mais frequentemente associado à baixa QV observada em estudantes de cursos de graduação da área da saúde, principalmente entre alunos de enfermagem e medicina na maioria dos domínios da escala WHOQOL-bref(2,9,11,21). Esse achado foi também demonstrado nesta investigação, sendo observada diminuição dos escores de QV em todos os domínios e com gradiente dose resposta importante, pois houve redução significativa da QV de acordo com a gravidade dos sintomas. Somando-se a isso, a correlação mais forte foi constatada entre o domínio psicológico e os sintomas de depressão, indicando o impacto dessa condição de saúde mental na QV dos estudantes. O domínio psicológico engloba as emoções, imagem corporal e autoestima, estando estritamente relacionado à percepção do indivíduo sobre si e o meio em que vive(19).

O domínio psicológico apresentou a diminuição mais significativa dos escores, principalmente na presença de sintomas graves de depressão. Outras investigações que envolveram estudantes de cursos de graduação da saúde sugeriram que o domínio psicológico foi impactado de forma determinante na presença de sintomas depressivos com redução significativa dos escores de QV(14-15,21-22). Apesar das divergências indicadas pela literatura, alguns fatores são apontados como contribuintes para o desenvolvimento de sintomas depressivos e piora da QV ao longo do processo de formação em saúde, tais como a presença de ansiedade, estresse, sexo feminino e dificuldades econômicas(8,16,21,23).

A diminuição da QV, observada em estudantes da saúde, principalmente no domínio psicológico possui relação estreita com a elevada prevalência de sintomas de depressão nessa população de acordo com algumas evidências(8-9,14,16). Esses estudantes experimentam maior prevalência de sintomas de depressão, em especial, sintomas graves, quando comparados com outras áreas do conhecimento, considerando as especificidades de seu processo de formação como, por exemplo, os desafios e a responsabilidade que envolvem o cuidar da vida humana, inclusive, em seu processo de morte e processo de morrer(7,24). Essa elevada carga de sintomas depressivos pode ocasionar impacto negativo na QV, possuindo fatores de risco complexos relacionados às características individuais (traços de personalidade, por exemplo) e do ambiente acadêmico(25). Em consonância com os achados deste estudo, estima-se que mais de 30% dos estudantes dessa área tanto no âmbito nacional quanto internacional apresentam sintomas moderados a graves de depressão(9-10), podendo ocorrer variação de acordo com as diferentes regiões geográficas e faixas etárias, evidenciando relação inversa com a QV(23).

Esse cenário mostra-se cada vez mais alarmante no âmbito das instituições de ensino superior e da saúde pública, tendo em vista o impacto negativo desses sintomas na saúde física e mental dos estudantes com desfechos desfavoráveis, sobretudo diminuição significativa da performance acadêmica, ruptura do convívio social, ideação suicida e aumento do risco de suicídio(6,14), podendo se refletir na QV e na prestação de serviços de saúde por esses futuros profissionais(2,9,15,22). Acredita- se que a prevalência desses sintomas esteja relacionada, pelo menos, parcialmente ao ambiente de aprendizagem, considerando a sobrecarga de atividades de ensino, pressão por rendimento elevado, contato com situações desafiadoras nos campos de prática, distância de familiares e baixa autoestima(8,14). Paradoxalmente, estudos de metanálise sugeriram que o ambiente de aprendizagem, por si só, não se apresenta como o aspecto preponderante para a elevada carga de sintomas depressivos nessa população, porém, influencia o processo de formação, contribuindo para diversos impactos negativos na saúde e QV desses estudantes em médio e longo prazos(11,18). Constatou-se elevada prevalência de sintomas de ansiedade entre os estudantes desta investigação, evidenciando-se sintomas leves e moderados em 21.1% e sintomas graves e muito graves em 31.4% com diminuição dos escores de QV, principalmente na presença dos sintomas graves. Esse achado pode ser corroborado pela estimativa feira em metanálise recente em que cerca de um em cada três estudantes de medicina apresentou sintomas de ansiedade com prevalência global de 33.8%, mostrando-se maior que na população geral, podendo impactar substancialmente a QV(26). Outra investigação, que incluiu estudantes de cursos da saúde, mostrou que os sintomas de ansiedade foram os mais prevalentes, acometendo 74.6% dos estudantes com participação importante de estressores relacionados ao ambiente acadêmico no seu desenvolvimento(6). No Brasil, a prevalência de sintomas de ansiedade em estudantes da saúde encontra-se, também, acima de 50%, contribuindo para a piora da QV(24,27). Embora essa condição seja tão debilitante e comum quanto a depressão, ainda é pouco discutida e diagnosticada entre estudantes universitários(27-29).

Observou-se que os sintomas de ansiedade estiveram associados negativamente à QV no domínio meio ambiente. O domínio meio ambiente envolve questões que se referem a recursos financeiros, segurança e proteção, ambiente físico e oportunidades de recreação e lazer(19). Estudantes com sintomas de ansiedade geralmente experimentam sensação de insegurança, tensão e medo, privando-se de atividades que promovem bem-estar, podendo ocasionar prejuízo à vida acadêmica, dificuldades de interação social, piora funcional global, pensamentos suicidas e depressão(15,17,22).

A gravidade dos sintomas de ansiedade resultou em diminuição dos escores de QV. Apesar da lacuna existente na literatura em relação a essa associação em estudantes da saúde, há indicativos da influência negativa da ansiedade na QV desses estudantes com mais baixa QV na presença de sintomas moderados e graves(15). Investigação realizada com estudantes de medicina da Malásia mostrou que aqueles com sintomas de ansiedade apresentaram significativa diminuição da QV nos domínios psicológico e meio ambiente da escala WHOQOL-bref(22), resultado consistente com a presente investigação. Ademais, essa relação mostra-se complexa, pois existem outros determinantes envolvidos nesse processo, tais como aspectos individuais, hábitos de vida, características sociodemográficas e do ambiente de aprendizagem, impactando no aumento da prevalência e da gravidade dos sintomas e, por conseguinte, na QV desses estudantes(12,24-25).

A presença de sintomas de estresse apresentou-se associada negativamente à QV no domínio psicológico bem como evidenciou-se elevada prevalência de sintomas moderados e graves. Estresse pode ser definido como um estado de excitação ou tensão excessiva, não específico, resultante da ineficácia ou esgotamento das estratégias de enfrentamento, guardando uma complexa e estreita relação com a depressão e ansiedade(30). Estudantes que experimentam níveis elevados e persistentes de estresse são mais suscetíveis à diminuição da performance acadêmica, alterações no estado de saúde geral e desenvolvimento de sintomas depressivos graves(4,25,31). Assim, como demonstrado por esta investigação, níveis elevados de estresse estão associados a uma pior QV com maior impacto no domínio psicológico, ocasionando diminuição significativa dos escores de acordo com a gravidade dos sintomas(6,32-33).

Essa condição tem se mostrado comum entre estudantes de cursos de graduação da área da saúde. Observou-se prevalência de estresse de 42.3% de sintomas leves e moderados e 23.3% de sintomas graves e muito graves, possivelmente impactando na percepção de QV. Estudos realizados com estudantes da área da saúde tanto em âmbito nacional quanto internacional, apontam que o estresse é considerado o problema de saúde mental mais prevalente entre esses estudantes, chegando a acometer mais da metade deles(6,13,18). Além disso, existem indicativos de que a prevalência de sintomas de estresse moderado e grave é maior entre estudantes da saúde quando comparados a outras áreas do conhecimento(32).

Neste estudo, alguns aspectos sociodemográficos, principalmente sexo feminino e classe econômica foram utilizados como variáveis de ajuste na associação entre sintomas de depressão, ansiedade e estresse e Q V. Esses aspectos sociodemográficos demonstram possível influência na piora da saúde mental e da QV em estudantes de cursos de graduação da área da saúde. Estudos observacionais(12,22,28,34), de metanálise(8,11) e longitudinais(23,25), realizados com estudantes da saúde, indicaram que estudantes do sexo feminino apresentaram diminuição significativa dos escores de QV nos domínios físico e psicológico, quando comparadas aos do sexo masculino. Esse achado é devido, possivelmente, à elevada frequência de transtornos mentais em estudantes do sexo feminino(18,24,27). Já as tensões e dificuldades relacionadas aos aspectos econômicos (renda e condições de moradia, por exemplo), também podem afetar a saúde mental e QV desses estudantes(11,21,28). Nesse contexto, na presente investigação, mesmo ajustando por características socioeconômicas, demográficas e de saúde física, os sintomas de ansiedade, depressão e estresse foram negativamente associados a uma pior QV em todos as dimensões.

Este estudo possui algumas limitações que merecem discussão. A primeira delas está relacionada ao delineamento transversal, no qual não é possível estabelecer relações causais quanto à influência das variáveis na QV. Sugere-se, dessa forma, o desenvolvimento de estudos de delineamento longitudinal para elucidar melhor as relações causais entre os fatores apontados e a QV. Outra questão está relacionada à possibilidade de viés de informação, pois ao abordar temas polêmicos ou sensíveis, o estudante pode ter apresentado respostas socialmente aceitáveis, porém esse fato pode ter sido minimizado, considerando a não identificação pessoal e não obrigatoriedade de resposta às questões. A generalização dos resultados também deve ser analisada com cautela, tendo em vista que a amostra não corresponde à totalidade de instituições de ensino públicas do Estado.

Mesmo considerando suas limitações, os achados deste estudo são relevantes e apresentam um contexto preocupante. Estudantes da área da saúde apresentaram elevada frequência de sintomas de depressão, ansiedade e estresse com impacto negativo em todos os domínios da QV. Sendo assim, à luz dos achados, este estudo pode ser útil aos gestores das universidades públicas ao servir de parâmetro para o planejamento e implementação de estratégias de identificação oportuna de estudantes com sintomas de depressão, ansiedade e estresse e, de acordo com resultado do rastreio, realizar encaminhamento para tratamento e acompanhamento ao longo do processo de formação. Ademais, os achados podem fornecer subsídios para a possível revisão dos currículos e programas dos cursos de graduação da saúde, tendo como intuito planejar e implementar estratégias que promovam o bem-estar, resiliência e, por conseguinte, melhorem a QV dos estudantes.

Conclusão

Neste estudo, a presença de sintomas de depressão, ansiedade e estresse apresentou associação negativa com a QV. Sintomas de depressão associaram-se, de forma inversa, à QV em todos os domínios de QV, observando-se diminuição significativa dos escores com maior impacto no domínio psicológico. Considerando-se que essas condições podem levar à diminuição do rendimento acadêmico e do convívio social, além de declínio importante da saúde mental e risco de suicídio, espera-se contribuir para a área de gestão educacional com o delineamento de estratégias de rastreio oportuno e de estratégias de melhora da QV dessa população.

Agradecimentos

Agradecemos a Gabriela Lemes David pela colaboração na fase de coleta de dados.

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• *
  Artigo extraído da tese de doutorado “Avaliação da qualidade de vida de estudantes de graduação da área da saúde em instituições federais de ensino superior: estudo multicêntrico”, apresentada à Universidade Federal de São João Del-Rei, Divinópolis, MG, Brasil. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001, Brasil.

• Como citar este artigo

  Freitas PHB, Meireles AL, Ribeiro IKS, Abreu MNS, Paula W, Cardoso CS. Symptoms of depression, anxiety and stress in health students and impact on quality of life. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2023;31:e3885. [cited ano mês dia]; Available from: URL . https://doi.org/10.1590/1518-8345.6315.3885
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Editado por

Editora Associada:

Sueli Aparecida Frari Galera

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Abr 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  23 Maio 2022
• Aceito
  06 Nov 2022