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Sobrecarga de familiares cuidadores de idosos com doença de Alzheimer: um estudo comparativo

Resumos

OBJETIVO:

comparar a sobrecarga do cuidador familiar principal com a do secundário do idoso com doença de Alzheimer e identificar qual dimensão gera maior impacto.

MÉTODO:

estudo comparativo, realizado em Maringá, Paraná, com 20 cuidadores primários de idosos com Alzheimer e 20 secundários. Os dados foram coletados em maio e junho de 2012, utilizando-se a Escala de Avaliação da Sobrecarga de Familiares de Pacientes Psiquiátricos, e os resultados foram analisados estatisticamente pelo teste de Mann-Whitney e análise de variância.

RESULTADOS:

a sobrecarga objetiva global e em cada subescala foi significativamente maior no grupo de cuidadores principais; a sobrecarga subjetiva não diferiu entre os grupos. Comparando-se as subescalas, a assistência cotidiana ao paciente exerceu maior influência para a sobrecarga objetiva em ambos os grupos, e a preocupação com o idoso foi a dimensão que mais influenciou a sobrecarga subjetiva de cuidadores principais e secundários.

CONCLUSÃO:

as diferenças de sobrecarga entre os grupos reforça a necessidade de planejamento de ações de saúde para cada tipo de cuidador, visando reduzi-las.

Cuidadores; Doença de Alzheimer; Família


OBJECTIVE:

to compare the overload of the main and secondary family carers of patients with Alzheimer's Disease, and identify which dimension generates most impact.

METHOD:

a comparative study conducted in the city of Maringá, State of Paraná, with 20 primary carers of elderly patients with Alzheimer's Disease and 20 secondary caregivers. The data was collected in May and June 2012, using the Scale for Assessment of Overload of Members of Psychiatric Patients' Families (FBIS-BR), and the results were analysed using the Mann-Whitney test and analysis of variance.

RESULTS:

the global objective overload, and also in each subscale, was significantly greater in the group of main caregivers; the subjective overload showed no difference between the groups. Comparing the subscales, the routine assistance provided to the patient had greater influence on objective overload in both groups, and the concern with the elderly patient was the dimension that had most influence on the subjective overload of main caregivers and also of secondary caregivers.

CONCLUSION:

the differences in overload between the different groups reinforces the need for planning of health care actions for each type of caregiver, seeking to reduce these differences.

Caregivers; Alzheimer Disease; Family


OBJETIVO:

comparar la sobrecarga del cuidador familiar principal con la del secundario del anciano con Enfermedad de Alzheimer e identificar cual dimensión genera mayor impacto.

MÉTODO:

estudio comparativo, realizado en Maringá, Paraná, con 20 cuidadores primarios de ancianos con Alzheimer y 20 secundarios. Los datos fueron recolectados en mayo y junio de 2012, utilizando la Escala de Evaluación de la Sobrecarga de Familiares de Pacientes Psiquiátricos (FBIS-BR), y los resultados fueron analizados estadísticamente por la prueba de Mann-Whitney y análisis de variancia.

RESULTADOS:

la sobrecarga objetiva global, y en cada subescala, fue significativamente mayor en el grupo de cuidadores principales; la sobrecarga subjetiva no difirió entre los grupos. Comparando las subescalas, la asistencia cotidiana al paciente ejerció mayor influencia para la sobrecarga objetiva en ambos grupos, y la preocupación con el anciano fue la dimensión que más influenció la sobrecarga subjetiva de cuidadores principales y secundarios.

CONCLUSIÓN:

las diferencias de sobrecarga entre los grupos refuerza la necesidad de planificación de acciones de salud para cada tipo de cuidador, objetivando reducirlas.

Cuidadores; Enfermedad de Alzheimer; Familia


Introdução

Em decorrência do processo de envelhecimento populacional, observa-se aumento expressivo de doenças crônico-degenerativas, dentre as quais destacam-se as demências, e a mais prevalente é a Doença de Alzheimer (DA)( 11. Almeida KS, Leite MT, Hildebrandt LM. Cuidadores familiares de pessoas portadoras de Doença de Alzheimer: revisão da literatura. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet]. 2009 [acesso 25 ago 2012]; 11(2): 403-12. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v11/n2/v11n2a23.htm.
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2. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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- 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. ). A DA caracteriza-se por ser uma doença cerebral, crônico-degenerativa, progressiva e irreversível, tem início insidioso, é marcada por perdas graduais da função cognitiva e distúrbios do comportamento e do afeto( 11. Almeida KS, Leite MT, Hildebrandt LM. Cuidadores familiares de pessoas portadoras de Doença de Alzheimer: revisão da literatura. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet]. 2009 [acesso 25 ago 2012]; 11(2): 403-12. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v11/n2/v11n2a23.htm.
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, 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. - 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. ), comprometendo a integridade física, mental e social do idoso, o que exige cuidados cada vez mais complexos, quase sempre vinculados à dinâmica familiar( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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). Assim, destaca-se a importância da família no processo de prestação de cuidados a esse idoso, pois, à medida que a doença progride, aumenta a demanda por cuidados e supervisão constante, papel desempenhado, na maioria das vezes, por um familiar( 11. Almeida KS, Leite MT, Hildebrandt LM. Cuidadores familiares de pessoas portadoras de Doença de Alzheimer: revisão da literatura. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet]. 2009 [acesso 25 ago 2012]; 11(2): 403-12. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v11/n2/v11n2a23.htm.
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, 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98.

5. Arruda MC, Alvarez AM, Gonçalves LHT. O familiar cuidador de portador de Doença de Alzheimer participante de um grupo de ajuda mútua. Cienc Cuid Saude. 2008;7(3):339-45.
- 66. Inouye K, Pedrazzani ES, Pavarini SCI, Toyoda CY. Life quality perception for the elderly with dementia and his/her caregiver: evaluation and correlation. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(2):187-93. ).

Essa condição de dependência do doente pode comprometer todos os integrantes da família( 11. Almeida KS, Leite MT, Hildebrandt LM. Cuidadores familiares de pessoas portadoras de Doença de Alzheimer: revisão da literatura. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet]. 2009 [acesso 25 ago 2012]; 11(2): 403-12. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v11/n2/v11n2a23.htm.
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), de modo particular aqueles que assumem diretamente o cuidado. Nesse sentido, há dois tipos de cuidadores: o cuidador principal - que tem a total ou a maior parte das responsabilidades pelos cuidados do idoso no domicílio, e o secundário - familiar, voluntário e ocupacional que presta auxílio em atividades complementares( 77. Falcão SVD, Bucher-Maluschke FNSJ. Cuidar de familiares idosos com a doença de alzheimer: uma reflexão sobre aspectos psicossociais. Psicol Estud. 2009;14(4):777-86. ).

Estudos recentes mostram que as modificações que ocorrem na vida do cuidador podem ocasionar sobrecargas físicas, emocionais, financeiras( 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. , 66. Inouye K, Pedrazzani ES, Pavarini SCI, Toyoda CY. Life quality perception for the elderly with dementia and his/her caregiver: evaluation and correlation. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(2):187-93. , 88. Diel L, Forster LMK, Kochhann R, Chaves MLF. Sociodemographic profile and level of burden of dementia patients' caregivers who participate in a support group. Dement Neuropsychol. 2010;4(3):232-7.

9. Simonetti JP, Ferreira JC. Estratégias de coping desenvolvidas por cuidadores de idosos portadores de doença crônica. Rev Esc Enferm USP. 2008;42(1):19-25.
- 1010. Morais HCC, Soares AMG, Oliveira ARS, Carvalho CML, Silva MJ, Araujo TL. Sobrecarga e modificações de vida na perspectiva dos cuidadores de pacientes com acidente vascular cerebral. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(5):944-53. ) e, também, interferem nas relações sociais e de lazer( 88. Diel L, Forster LMK, Kochhann R, Chaves MLF. Sociodemographic profile and level of burden of dementia patients' caregivers who participate in a support group. Dement Neuropsychol. 2010;4(3):232-7.

9. Simonetti JP, Ferreira JC. Estratégias de coping desenvolvidas por cuidadores de idosos portadores de doença crônica. Rev Esc Enferm USP. 2008;42(1):19-25.
- 1010. Morais HCC, Soares AMG, Oliveira ARS, Carvalho CML, Silva MJ, Araujo TL. Sobrecarga e modificações de vida na perspectiva dos cuidadores de pacientes com acidente vascular cerebral. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(5):944-53. ). A sobrecarga do cuidador pode acarretar doenças agudas e crônicas e, consequentemente, o uso de diversas medicações, tornando-o tão doente quanto o idoso com Alzheimer( 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. ). O cuidador, geralmente, não está preparado para assumir todo o cuidado e as responsabilidades que lhe são exigidas, precisando ser devidamente preparado para assumi-las( 1111. Nogueira PC, Rabeh SAN, Caliri MHL, Dantas RAS, Haas VJ. Sobrecarga do cuidado e impacto na qualidade de vida relacionada à saúde de cuidadores de indivíduos com lesão medular. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(6):1048-56. ), e, ainda, necessita de apoio para desempenhar essa tarefa.

Torna-se, portanto, pertinente estudar as diferenças existentes entre os grupos de cuidadores principais e os secundários, quanto à sobrecarga vivenciada na prestação de cuidados ao idoso com Alzheimer. Os impactos que advêm da prestação desses cuidados podem ter consequências negativas e positivas, o que explica a variabilidade que existente entre os cuidadores. Assim, a partir da avaliação do nível de sobrecarga dos diferentes grupos de cuidadores, pode-se contribuir para que os profissionais de saúde, em especial o enfermeiro, direcionem, de forma mais efetiva, a assistência a essas pessoas, particularmente durante as orientações de cuidado, subsidiando-os para o importante auxílio às famílias, à sua organização cotidiana e à divisão de tarefas de cuidado ao doente.

A análise da sobrecarga é um instrumento indispensável para o profissional e resulta em um diagnóstico que permite a realização de cuidado fundamental junto ao cuidador de idoso com Alzheimer. A importância do desenvolvimento de estudos comparativos, no âmbito do padrão de cuidados prestados ao idoso dependente, visa a criação de estratégias que permitam a melhoria da qualidade de vida de quem cuida e de quem é cuidado. Nesse sentido, o presente estudo teve por objetivos comparar a sobrecarga do cuidador familiar principal com o do secundário do idoso com doença de Alzheimer e identificar qual dimensão gera maior impacto na sobrecarga.

Método

O presente estudo comparativo foi realizado junto a participantes da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), sub-regional do município de Maringá, Paraná. Essa associação foi criada em 1993, com regionais em vinte e dois Estados, é entidade sem fins lucrativos, formada por familiares de idosos com DA e profissionais das áreas da saúde, humanas, sociais e voluntários.

Foram incluídos no estudo cuidadores familiares de idosos com o diagnóstico de DA que participam ou participaram das reuniões da Abraz nos últimos dois anos. As reuniões da Abraz são mensais e têm, em média, 13 participantes, entre familiares de idosos com Alzheimer, convidados e voluntários. A seleção dos participantes foi intencional e ocorreu a partir de consulta às atas com levantamento dos familiares que compareceram às reuniões dos últimos dois anos (n=68). Os contatos para a participação no estudo foram feitos pessoalmente com aqueles que compareceram nas duas últimas reuniões, quando os pesquisadores estavam presentes, e por telefone, sendo que, desses, seis foram excluídos por óbito do familiar doente, cinco não se conseguiu o telefone ou o endereço nos registros das reuniões, dez não foram localizados após três tentativas de contato e sete se recusaram. Assim, fizerem parte do estudo 40 sujeitos restantes, divididos em dois grupos, assim denominados: (a) GCUID A - constituído por 20 cuidadores familiares principais de idosos com DA e (b) GCUID B - composto por 20 cuidadores secundários de idosos com DA.

A coleta de dados ocorreu nos meses de maio e junho de 2012, mediante entrevista estruturada, previamente agendada, conforme a disponibilidade do entrevistado, e realizada nos domicílios, utilizando-se dois instrumentos: ficha de caracterização sociodemográfica do cuidador e a Escala de Avaliação da Sobrecarga de Familiares de Pacientes Psiquiátricos (FBIS-BR), traduzida e adaptada para a cultura brasileira, constituída por subescalas que avaliam, com base nos últimos 30 dias, cinco dimensões da sobrecarga dos familiares de pacientes psiquiátricos: a) assistência na vida cotidiana do paciente; b) supervisão de comportamentos problemáticos do paciente; c) gastos financeiros do familiar com o paciente; d) impacto nas rotinas diárias da família e e) preocupações do familiar com o paciente( 1212. Bandeira M, Calzavara MG, Varella A. Escala de Sobrecarga dos Familiares de Pacientes Psiquiátricos - FBIS-Br: Adaptação Transcultural para o Brasil. J Bras Psiquiatr. 2005;54(3):206-14. ).

As cinco dimensões da escala permitem a avaliação das sobrecargas objetiva e subjetiva. A objetiva é determinada a partir da frequência de assistências e supervisões do familiar no cuidado cotidiano ao paciente e da frequência de alterações na rotina de sua vida; a sobrecarga subjetiva é determinada pelo grau de incômodo sentido pelo familiar ao exercer o papel de cuidador e das suas preocupações com o paciente( 1212. Bandeira M, Calzavara MG, Varella A. Escala de Sobrecarga dos Familiares de Pacientes Psiquiátricos - FBIS-Br: Adaptação Transcultural para o Brasil. J Bras Psiquiatr. 2005;54(3):206-14. ). Como a FBIS-BR não possui ponto de corte preestabelecido, seguiram-se as recomendações dos validadores, sendo a sobrecarga determinada pelo valor da mediana dos escores em cada subescala, com exceção da C que aborda aspectos relacionados aos recursos financeiros( 1212. Bandeira M, Calzavara MG, Varella A. Escala de Sobrecarga dos Familiares de Pacientes Psiquiátricos - FBIS-Br: Adaptação Transcultural para o Brasil. J Bras Psiquiatr. 2005;54(3):206-14. ).

Para a análise dos dados, foi utilizado o software Statistica, versão 8.0, e, constatada a distribuição não normal dos dados (teste Kolmogorov-Smirnov), relativos às características da amostra e dos escores de sobrecarga, foi utilizado o teste de Mann-Whitney, seguido do teste de correlação de Spearman (r), nos casos em que os grupos apresentaram características diferentes. Foi utilizada a análise de variância (Anova) e o teste de comparações múltiplas de Kruskal-Wallis para identificar qual dimensão exerceu maior impacto na sobrecarga. Em todas as análises o nível de significância considerado foi de 5%.

O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer no29372). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias.

Resultados

Os participantes do GCUID A eram majoritariamente do sexo feminino (n=19), com idade entre 31 e 71 anos - média de 52,7 anos - e ocupavam a posição de filho (a) (n=10), esposa (n=7), irmã (n=2) e nora (n=1). A média de tempo como cuidador era de sete anos, com o mínimo de três e máximo de onze anos. Desses cuidadores, apenas nove recebiam ajuda de outros familiares na prestação de cuidados ao idoso - principalmente filhas, irmã, cunhada e sobrinha.

Os cuidadores do GCUID B tinham idade entre 22 e 75 anos - média de 48,6 anos - em sua maioria eram mulheres (n=17), e ocupavam a posição de filhas(os) (n=8), esposas (n=8), nora (n=2) e neta (n=2) do doente. O tempo como cuidador secundário era de quatro anos e três meses, com o mínimo de um e máximo de seis anos.

Na comparação entre os grupos, constatou-se não haver diferença estatisticamente significativa em relação à idade, mas os grupos diferem em relação ao tempo dispensado ao cuidado. Salienta-se que 14 pares de cuidadores (um cuidador primário e um secundário) eram familiares de um mesmo idoso com doença de Alzheimer, totalizando 28 cuidadores. Os outros 12 eram familiares de 12 idosos distintos.

Ao se analisar os dados, observa-se, na Tabela 1, diferença estatisticamente significativa (p=0,005) entre as medianas dos escores de sobrecarga objetiva global entre os grupos de cuidadores, sendo maior para o grupo GCUID A. O mesmo foi observado em relação às suas três subescalas (p=0,008, 0,034 e 0,004, respectivamente para as subescalas A, B e D).

Tabela 1
Medianas dos escores globais e das subescalas de sobrecarga objetiva e subjetiva da escala FBIS-BR e valor de p nos grupos de cuidadores

A sobrecarga referente à assistência ao paciente na vida cotidiana (subescala objetiva A) foi maior (p=0,004) para os cuidadores primários (GCUID A), pois esses realizavam ou auxiliavam com maior frequência as atividades de banho, administração de medicamentos, tarefas domésticas, gerência da renda e cuidados médicos do que o GCUID B.

Em relação à supervisão dos comportamentos problemáticos (subescala objetiva B), a sobrecarga foi maior (p=0,034) para o GCUID A que, em função da convivência cotidiana com o idoso, vivenciavam mais frequentemente situações de vexame, insultos e agressão. Por fim, a subescala objetiva D, referente ao impacto que o cuidador sofre em sua rotina, mostra que a sobrecarga também foi maior para o GCUID A (p=0,004), porque, em função da maior responsabilidade para com o idoso, os cuidadores desse grupo, mais do que os do GCUID B, comumente faltavam ou chegavam atrasados a compromissos, não realizavam atividades de lazer, mudavam as rotinas de casa e diminuíam a atenção dispensada aos outros familiares.

Em relação à sobrecarga global subjetiva não foram observadas (Tabela 1) diferenças estatisticamente significativas entre os grupos de cuidadores (p=0,357), inclusive em nenhuma das subescalas A, B e E (p=0,607, 0,152 e 0,8, respectivamente).

A Tabela 2 mostra que as dimensões das subescalas provocam diferentes níveis de sobrecarga nos dois grupos de cuidadores (p=0,002 e p=0,007, respectivamente para GCUID A e GCUID B). Ao proceder à comparação múltipla de Kruskal-Wallis, identificou-se diferença significativa (p=0,002) somente entre as subescalas de sobrecarga objetiva A e B no GCUID A, com maior sobrecarga relacionada à assistência ao paciente na vida cotidiana do que na supervisão de comportamentos problemáticos. Da mesma forma, no GCUID B também foi observada diferença significativa apenas entre as subescalas objetivas A e B (p=0,008), o que indica que, independente de ser cuidador primário ou secundário, a maior sobrecarga do cuidado está na assistência ao paciente na vida cotidiana.

Tabela 2
Análise das diferenças entre as medianas das subescalas objetivas A, B e D e entre as medianas das subescalas subjetivas A, B e E da FBIS-BR

Em relação à sobrecarga subjetiva, observou-se diferença significativa para os dois grupos de cuidadores (p=0,00 para ambos). Nas comparações múltiplas observou-se que tanto no GCUID A quanto no GCUID B a preocupação com o idoso (subescala E) foi estatisticamente maior do que o grau de incômodo sentido ao assisti-lo na vida cotidiana (subescala A), ou ao supervisionar seus comportamentos problemáticos (subescala B), com valor de p=0,00 para todos os casos. Porém, não foi observada diferença significativa entre as subescalas A e B (p=0,74). Esses resultados indicam que a preocupação com o idoso é o principal fator relacionado à sobrecarga subjetiva dos dois tipos de cuidadores.

Embora o tempo como cuidador seja significativamente maior no GCUID A (p=0,0002), apenas a dimensão objetiva - impacto na rotina diária (subescala D) - no GCUID B -mostrou correlação positiva entre tempo como cuidador e sobrecarga (r=0,589; p=0,0006).

Por fim, dos 40 entrevistados apenas dezenove responderam às questões referentes aos gastos financeiros (subescala C), sendo doze cuidadores principais e sete cuidadores secundários. Entre os cuidadores do GCUID A, a média de gastos mensais com o idoso foi de 1,4 salários-mínimos, destinados, principalmente, à compra de medicamento e fraldas, além de gastos com tratamentos médicos, alimentação, moradia e roupas. É importante ressaltar que sete dos 12 cuidadores principais consideram que as despesas com o idoso não sobrecarregam o orçamento da família, sendo que quatro deles relataram que a aposentadoria do idoso (média de um salário-mínimo) cobria parte desses gastos.

Quanto aos cuidadores secundários, a média de gastos mensais com o idoso foi inferior a um salário-mínimo e era utilizado com a mesma finalidade. Entretanto, destaca-se que cinco dos sete cuidadores secundários relataram que as despesas mensais com o idoso raramente ou às vezes sobrecarregava o orçamento familiar, diferente do que foi relatado pelos cuidadores do GCUID A que, apesar de relatarem média de gastos maior, os mesmos não têm grande impacto no orçamento da família.

Discussão

Os participantes dos dois grupos de cuidadores apresentaram perfil semelhante ao descrito na literatura nacional e internacional, que são, em sua maioria, mulheres, ocupam posição de filhas ou esposas( 66. Inouye K, Pedrazzani ES, Pavarini SCI, Toyoda CY. Life quality perception for the elderly with dementia and his/her caregiver: evaluation and correlation. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(2):187-93. , 1313. Pavarini SCI, Melo LC, Silva VM, Orlandi FS, Mendiondo MSZ, Filizola CLA, et al. Cuidando de idosos com Alzheimer: a vivência de cuidadores familiares. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet] . 2008 [acesso 27 ago 2012]; 10(3): 580-90. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v10/n3/v10n3a04.htm.
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- 1414. Llibre Guerra JC, Guerra Hernández MA, Perera Miniet E. Impacto psicosocial del síndrome demencial en cuidadores cruciales. Rev Cubana Med Gen Integr. 2008;24(1):1-15. ) e se dedicam exclusivamente ao cuidado do familiar doente( 1313. Pavarini SCI, Melo LC, Silva VM, Orlandi FS, Mendiondo MSZ, Filizola CLA, et al. Cuidando de idosos com Alzheimer: a vivência de cuidadores familiares. Rev Eletr Enferm. [periódico da Internet] . 2008 [acesso 27 ago 2012]; 10(3): 580-90. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v10/n3/v10n3a04.htm.
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). Esse fato que pode estar ligado ao papel social e cultural da mulher na sociedade, pois a responsabilidade pelo cuidado dispensado aos filhos as tornam mais preparadas para desempenharem esse papel, enquanto o homem mantém-se, majoritariamente, na condição de provedor financeiro da família( 1515. Perdomo MP, Rodríguez JJL. Características sociodemográficas y nivel de sobrecarga de cuidadores de ancianos con Enfermedad de Alzheimer. Rev Cubana Enferm. 2010;26(3):104-16. - 1616. Cachioni C, Lima-Silva TB, Ordonez TN, Galo-Tiago J, Alves AR, Suzuki MY, et al. Elderly patients withAlzheimer's disease and their family relationships. Dement Neuropsychol. 2011;5(2):114-22. ). No entanto, a inserção cada vez maior da mulher no mercado de trabalho tem-lhes reduzido o tempo disponível para essas atividades( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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), o que, de certa forma, coloca os homens mais próximos do cuidado ao familiar com DA( 1515. Perdomo MP, Rodríguez JJL. Características sociodemográficas y nivel de sobrecarga de cuidadores de ancianos con Enfermedad de Alzheimer. Rev Cubana Enferm. 2010;26(3):104-16. ) e, ao mesmo tempo, faz com que mulheres também desempenhem o papel de cuidador secundário. Há que se destacar, ainda, que as mulheres cuidadoras geralmente sofrem maior impacto do que os homens por assumirem, mais frequentemente, tarefas desgastantes - a higiene do paciente, além de terem que gerenciar as tarefas domésticas( 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. , 1717. Pinto MP, Barbosa DC, Ferreti CEL, Souza LF, Fram DS, Belasco AGS. Qualidade de vida de cuidadores de idosos com doença de Alzheimer. Acta Paul Enferm. 2009;22(5):652-7. ).

A correlação positiva entre o tempo como cuidador do GCUID B e a sobrecarga referente à dimensão impacto nas rotinas diárias (subescala D) pode estar relacionada ao fato de os cuidadores secundários manterem seus empregos e, por essa razão, sentirem mais os efeitos de alterações, por menores que sejam; já, os cuidadores primários, justamente por estarem mais acostumados aos cuidados e, também, por centralizam suas atividades em torno deles, não sentem com tanto impacto a sobrecarga advinda daquelas atividades que consideram seu trabalho/obrigação. Em outros estudos( 1010. Morais HCC, Soares AMG, Oliveira ARS, Carvalho CML, Silva MJ, Araujo TL. Sobrecarga e modificações de vida na perspectiva dos cuidadores de pacientes com acidente vascular cerebral. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(5):944-53. , 1818. Visser-Meily A, Post M, van de Port I, Maas C, Forstberg-Wärleby G, Lindeman E. Psychosocial functioning of spouses of patients with stroke from initial inpatient rehabilitation to 3 years poststroke. Stroke. 2009;40:1399-404. ) também não foi identificada correlação entre idade e sobrecarga, corroborando os achados deste estudo.

O maior grau de sobrecarga objetiva no GCUID A corrobora os resultados de outros estudos( 1919. Albuquerque EPT, Cintra AMO, Bandeira M. Sobrecarga de familiares de pacientes psiquiátricos: comparação entre diferentes tipos de cuidadores. J Bras Psiquiatr. 2010;59(4):308-16. ), pois, mesmo com a participação significativa da família como um todo, que, de modo geral, modifica sua rotina para cuidar do idoso com DA, a responsabilidade pelo cuidado direto, na maioria das vezes, fica a cargo de um único familiar, para o qual essa atividade se torna extremamente cansativa e estressante.

De fato, o cuidador principal experimenta um rompimento em seu modo de vida, caracterizado, por exemplo, pela inexistência de limites entre sua vida e a do paciente, havendo, assim, menos tempo para lazer, vida social, familiar e afetiva - e, em alguns casos, dificuldades econômicas( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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). Tudo isso interfere no autocuidado, qualidade de vida e podem surgir sentimentos de depressão, angústia, raiva, tristeza, medo, culpa e frustração( 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. , 2020. Freitas ICC, Paula KCCP, Soares CJL, Parente ACM. Convivendo com o portador de Alzheimer: perspectivas do familiar cuidador. Rev Bras Enferm. 2008; 61(4):508-13. ). Estudo aponta que esses cuidadores possuem mais chances de apresentarem sintomas psiquiátricos e problemas de saúde, entre os quais hipertensão arterial, desordens digestivas e respiratórias, depressão, além de vivenciarem conflitos familiares e problemas no trabalho com maior frequência, em comparação com pessoas da mesma idade que não exercem tal função( 1717. Pinto MP, Barbosa DC, Ferreti CEL, Souza LF, Fram DS, Belasco AGS. Qualidade de vida de cuidadores de idosos com doença de Alzheimer. Acta Paul Enferm. 2009;22(5):652-7. ).

Essa condição estressante tende a aumentar à medida que os idosos com DA tornam-se progressivamente dependentes. Nesse sentido, a inclusão da família no planejamento das ações de cuidado, desde o diagnóstico da DA, pode reduzir a vulnerabilidade dos idosos e dos seus familiares cuidadores, pois, quando informados sobre a doença, sua evolução e conscientizados acerca da sobrecarga de papéis e suas consequências, há a possibilidade de se prepararem, se reorganizarem para enfrentar as mudanças que, certamente, virão e isso terá reflexos positivos na convivência entre os membros familiares( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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, 2020. Freitas ICC, Paula KCCP, Soares CJL, Parente ACM. Convivendo com o portador de Alzheimer: perspectivas do familiar cuidador. Rev Bras Enferm. 2008; 61(4):508-13. ). Contudo, apoiar os cuidadores não significa apenas transmitir informações e orientações sobre a doença e os cuidados( 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. ). Há necessidade de promover e manter uma rede de suporte social para essas famílias, a fim de que a responsabilidade pelo cuidado seja dividida, diminuindo as sobrecargas que lhes são inerentes. Os grupos de ajuda mútua, ligados à Abraz constituem um bom exemplo de atuação dessa rede( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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).

Ao se comparar a sobrecarga dos grupos de cuidadores por subescala, as diferenças encontradas também diziam respeito somente à sobrecarga objetiva. Em todas as subescalas (A, B e D), os cuidadores do GCUID A apresentaram maior grau de sobrecarga do que o GCUID B, o que pode ser justificado pelo maior tempo de permanência do cuidador do GCUID A junto ao idoso doente. É o cuidador principal que assume maior responsabilidade tanto na prestação de cuidados cotidianos quanto na supervisão de comportamentos problemáticos e, por conseguinte, sofre maior impacto do encargo de cuidador no dia a dia. Cabe destacar, no entanto, que, apesar da sobrecarga objetiva ser maior para os cuidadores do GCUID A em todas as subescalas, os componentes da subescala A apresentaram maior influência na determinação da sobrecarga do cuidado quando comparada aos da subescala B. Isso pode ser entendido a partir da compreensão de que as tarefas que envolvem os cuidados essenciais - realizar a higiene pessoal e prover a alimentação (componentes da subescalas A) -, possuem características mais desgastantes e tendem a se tornar mais complexas à medida que a doença progride e o nível de dependência aumenta( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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- 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. ).

No âmbito subjetivo não foi observada diferença estatisticamente significativa na sobrecarga dos cuidadores dos dois grupos, o que decorre, de um lado, do fato de os cuidadores do GCUID B permanecerem por curto período de tempo junto ao idoso com DA, assim não se sentem sobrecarregados; e, por outro, do fato de os cuidadores do GCUID A, apesar de maior dedicação ao familiar doente, relataram pouco incômodo ao lidar com as situações estressantes impostas pelo papel assumido. A literatura mostra que isso pode estar relacionado à dupla sensação gerada pela convivência com o familiar doente, isto é, ao mesmo tempo em que o cuidador se vê imbuído de raiva, pela teimosia do doente, sente pena por ter um familiar acometido por uma doença progressiva( 2020. Freitas ICC, Paula KCCP, Soares CJL, Parente ACM. Convivendo com o portador de Alzheimer: perspectivas do familiar cuidador. Rev Bras Enferm. 2008; 61(4):508-13. ).

Ademais, a baixa percepção da sobrecarga subjetiva pelos cuidadores do GCUID A também pode estar relacionada ao sentimento de gratidão e ao desejo de manifestar o seu amor ao familiar doente por meio do cuidado, preocupação, respeito e solicitude, o que o leva a realizar as atividades de cuidado de forma carinhosa e paciente( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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). Esse fato induz a que se questione a premissa de que o estresse de cuidadores constitui evento natural e inevitável, pois a avaliação subjetiva de cuidado é heterogênea, sendo reducionista, portanto, a associação direta das demandas atreladas ao cuidado e aos prejuízos à saúde dos cuidadores( 77. Falcão SVD, Bucher-Maluschke FNSJ. Cuidar de familiares idosos com a doença de alzheimer: uma reflexão sobre aspectos psicossociais. Psicol Estud. 2009;14(4):777-86. ).

No que tange ao aspecto financeiro, encontrou-se que os gastos com os idosos com DA não representam peso no orçamento para os cuidadores principais, mas o é para os cuidadores secundários. Embora a DA seja, de fato, onerosa para a família que passa a ter gastos com medicamentos, utensílios para os cuidados diários de higiene, conforto, alimentação e os relativos ao suporte para o tratamento( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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), para os cuidadores principais esses gastos são compensados, de certa forma, com os recursos da aposentadoria do idoso. Já, para os secundários os gastos são mais representativos porque eles ajudam quase que exclusivamente no quesito financeiro.

Apesar de os instrumentos utilizados não identificarem a renda dos cuidadores como um aspecto inerente à análise da sobrecarga, é possível inferir que a heterogeneidade subjetiva com que os cuidadores percebem a situação que vivenciam, por exemplo, o fato de cuidarem de um familiar doente como obrigação ou em retribuição ao carinho e à paciência que um dia receberam, também pode justificar a percepção distinta desses dois grupos de cuidadores quanto à influência na contabilização dos gastos com a DA, dentro do orçamento familiar. Contudo, diferentemente dos resultados deste estudo, a sobrecarga financeira foi evidenciada em outro estudo como um dos fatores que mais contribuiu para a sobrecarga dos cuidadores(19,21), principalmente dos cuidadores principais( 1919. Albuquerque EPT, Cintra AMO, Bandeira M. Sobrecarga de familiares de pacientes psiquiátricos: comparação entre diferentes tipos de cuidadores. J Bras Psiquiatr. 2010;59(4):308-16. ).

No Brasil, os familiares ainda assumem a função de cuidadores de forma desassistida e sem apoio de programas governamentais efetivos, os quais deveriam fornecer subsídios e orientações para a prática desse cuidado( 44. Seima MD, Lenardt MH. A sobrecarga do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Texto Contexto Enferm. 2011;10(2):388-98. ). Sabe-se que o modelo biomédico hegemônico centra-se na dimensão patológica da situação, em detrimento da visão holística que inclui a família como unidade a ser cuidada( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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). Nesse contexto, considerando-se que a enfermagem possui atribuições e competências para atuar junto aos cuidadores, torna-se imprescindível a avaliação do nível de sobrecarga dessas pessoas e sua influência na dinâmica do núcleo familiar, o que possibilitará ao profissional identificar estratégias mais apropriadas de cuidado( 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. ). Cabe às equipes de saúde dirigirem especial atenção aos cuidadores de idosos com DA, fazendo com que se sintam acolhidos, esclarecidos e orientados quanto ao seu encargo e aos seus direitos( 22. Valim MD, Damasceno DD, Abi-acl LC, Garcia F, Fava SMCL. A doença de Alzheimer na visão do cuidador: um estudo de caso. Rev. Eletr. Enf. [periódico da internet]. 2010 [acesso 25 ago 2012]; 12(3): 528-34. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a16.htm.
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), facilitando-lhes a adaptação ao novo cotidiano sem anular suas próprias necessidades de vida e saúde( 33. Lenardt MH, Willig MH, Seima MD, Pereira LF. A condição de saúde e satisfação com a vida do cuidador familiar de idoso com Alzheimer. Colomb Med. 2011;42 Suppl:17-25. ).

Conclusão

Os resultados da presente pesquisa mostram que os cuidadores principais de idosos com DA apresentaram maior sobrecarga do que os cuidadores secundários, principalmente ao se considerar as atividades relacionadas à assistência do cotidiano. Isso porque os cuidadores principais assumem total ou maior responsabilidade nos cuidados, dedicando maior parte do seu tempo em prol da assistência ao familiar doente, enquanto o cuidador secundário limita-se às atividades complementares e a prover recursos financeiros. Constatadas tais diferenças na sobrecarga entre os grupos de cuidadores, atenta-se para a necessidade de planejar ações de saúde específicas para cada tipo de cuidador, visando a redução da sobrecarga familiar.

Em relação às limitações deste estudo, cita-se, sobretudo, o reduzido número de sujeitos da amostra, do ponto de vista estatístico; além da heterogeneidade na composição dos grupos, pois determinados pares de indivíduos dedicavam-se ao cuidado de um mesmo idoso, e, ainda, não houve identificação prévia do estágio da DA em que se encontravam os doentes, fatores que, se controlados, poderiam proporcionar resultados mais fidedignos.

Dessa forma, sugerem-se novas investigações abordando os diferentes tipos de cuidadores familiares, com maior quantidade de participantes e utilização de outros instrumentos para avaliar a sobrecarga e, inclusive, estudos qualitativos que possibilitem complementar as discussões acerca do tema e nortear novas abordagens na área da saúde.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2013

Histórico

  • Recebido
    18 Set 2012
  • Aceito
    06 Jun 2013
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