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Influência da Genética no Desenvolvimento da Hipertensão

Palavras-chave
Hipertensão; Genética; Brasil

A hipertensão arterial sistêmica primária é uma das doenças mais comuns em todo o mundo, estimando-se que afete 20% das mulheres e 25% dos homens.11 Mills KT, Bundy JD, Kelly TN, Reed JE, Kearney PM, Reynolds K, et al. Global Disparities of Hypertension Prevalence and Control: A Systematic Analysis of Population-Based Studies from 90 Countries. Circulation. 2016;134(6):441-50. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.115.018912.
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É um fator de risco para metade das dez principais causas de morte, incluindo a líder do ranking, doença cardiovascular, seguida de doença cerebrovascular e renal.22 World Health Organization. The Top 10 Causes of Death [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2020 [cited 223 Dez 1]. Available from: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/the-top-10-causes-of-death.
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Há muitos anos, grandes esforços vêm sendo feitos para desvendar os mecanismos que contribuem para esta condição que - apesar de silenciosa - pode ser devastadora. Alguns advogam que a hipertensão não é uma doença, e sim uma síndrome, que apresenta etiologia individual variada e tem como sinal comum a elevação da pressão arterial.33 Manosroi W, Williams GH. Genetics of Human Primary Hypertension: Focus on Hormonal Mechanisms. Endocr Rev. 2019;40(3):825-56. doi: 10.1210/er.2018-00071.
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Alguns fatores previamente associados à hipertensão primária já são bem estabelecidos, por exemplo obesidade, tabagismo, desequilíbrio do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), estresse mental, entre outros.44 Elliott WJ. Systemic Hypertension. Curr Probl Cardiol. 2007;32(4):201-59. doi: 10.1016/j.cpcardiol.2007.01.002.
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Os fatores genéticos, no entanto, têm influência vaga e complexa no desenvolvimento da hipertensão. Apesar de vários estudos dedicados ao esclarecimento do o assunto, seu caráter poligênico torna cada caso único no que diz respeito ao impacto de cada fator predisponente. Vários polimorfismos em diferentes genes foram apontados como correlacionados com hipertensão,55 Natekar A, Olds RL, Lau MW, Min K, Imoto K, Slavin TP. Elevated Blood Pressure: Our Family‘s Fault? The Genetics of Essential Hypertension. World J Cardiol. 2014;6(5):327-37. doi: 10.4330/wjc.v6.i5.327.
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incluindo o polimorfismo C825T da subunidade β3 da proteína G (GNB3) (rs5443:C>T). As proteínas de ligação a nucleotídeos guanina (proteínas G) são expressas na maioria dos tecidos humanos e funcionam como transdutores em vias de sinalização intracelular, regulando uma ampla variedade de processos fisiológicos. O alelo 825T foi previamente associado à hipertensão e à obesidade; no entanto, alguns estudos foram controversos e as frequências do alelo T diferiram entre diferentes etnias (fT≈0,8 em africanos negros, fT≈0,45 em asiáticos e fT≈0,3 em brancos).66 Rosskopf D, Busch S, Manthey I, Siffert W. G Protein Beta 3 Gene: Structure, Promoter, and Additional Polymorphisms. Hypertension. 2000;36(1):33-41. doi: 10.1161/01.hyp.36.1.33.
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O estudo de Agostini et al.77 Agostini LC, Silva NNT, Lopes ACF, Melo AS, Bicalho LSM, Almeida TC, et al. G Protein Subunit Beta 3 (GNB3) Variant Is Associated with Biochemical Changes in Brazilian Patients with Hypertension. Arq Bras Cardiol. 2023; 120(12):e20230396. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20230396.
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teve como objetivo caracterizar uma amostra de 155 hipertensos brasileiros para avaliar a prevalência do polimorfismo C825T e correlacioná-lo com características clínicas.77 Agostini LC, Silva NNT, Lopes ACF, Melo AS, Bicalho LSM, Almeida TC, et al. G Protein Subunit Beta 3 (GNB3) Variant Is Associated with Biochemical Changes in Brazilian Patients with Hypertension. Arq Bras Cardiol. 2023; 120(12):e20230396. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20230396.
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Diferente da maioria dos estudos,88 Siffert W. G-Protein Beta3 Subunit 825T Allele and Hypertension. Curr Hypertens Rep. 2003;5(1):47-53. doi: 10.1007/s11906-003-0010-4.
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o grupo não encontrou associação entre a genética variante e hipertensão. A identificação e seleção dos hipertensos basearam-se exclusivamente em dados de entrevistas em prontuários (uso ou não de medicamento anti-hipertensivo e registro ou não registro de diagnóstico prévio), o que pode ter interferido em seus achados. Além disso, foi demonstrado anteriormente que a frequência do alelo T pode variar entre as etnias, assim como a prevalência de hipertensão. Dessa forma, embora a ideia de caracterizar geneticamente a população brasileira como uma unidade seja interessante, a população brasileira é uma das mais heterogêneas do globo. Portanto, olhar paralelamente para os grupos étnicos de forma separada, poderia enriquecer a análise. O perfil metabólico também foi comparado entre os grupos e encontrou associações positivas de hipertensos apresentando o polimorfismo com níveis mais elevados de triglicerídeos, glicose, ácido úrico e obesidade, semelhantes a relatos anteriores. A elucidação das vias da hipertensão é um assunto muito complexo, especialmente no que diz respeito à genética, pelo que cada esforço para identificar fatores predisponentes acrescenta uma nova peça valiosa a este quebra-cabeças.

A conscientização sobre o valor da avaliação genética na assistência médica no Brasil ainda está longe do ideal em diversas áreas, inclusive na cardiologia. Além da barreira do seu alto custo, existe a ideia comum de que o perfil genético não gera impacto significativo no manejo clínico. Ainda que a pesquisa caminhe frequentemente com pequenos passos, toda contribuição é de extrema importância e deve ser incentivada. O grupo de Agostini abordou uma das condições mais impactantes do mundo e trouxe grande conhecimento do ponto de vista genético – um campo no qual pesquisadores e profissionais de saúde brasileiros estão em fase de desenvolvimento e necessitam incentivo para explorar. Nesse contexto, independente dos possíveis achados finais, seu estudo significa contribuição valiosa e inovadora para a comunidade científica brasileira.

  • Minieditorial referente ao artigo: Variante da Subunidade Beta 3 da Proteína G (GNB3) Está Associada a Alterações Bioquímicas em Pacientes Brasileiros com Hipertensão

Referências

  • 1
    Mills KT, Bundy JD, Kelly TN, Reed JE, Kearney PM, Reynolds K, et al. Global Disparities of Hypertension Prevalence and Control: A Systematic Analysis of Population-Based Studies from 90 Countries. Circulation. 2016;134(6):441-50. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.115.018912.
    » https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.115.018912
  • 2
    World Health Organization. The Top 10 Causes of Death [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2020 [cited 223 Dez 1]. Available from: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/the-top-10-causes-of-death
    » https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/the-top-10-causes-of-death
  • 3
    Manosroi W, Williams GH. Genetics of Human Primary Hypertension: Focus on Hormonal Mechanisms. Endocr Rev. 2019;40(3):825-56. doi: 10.1210/er.2018-00071.
    » https://doi.org/10.1210/er.2018-00071
  • 4
    Elliott WJ. Systemic Hypertension. Curr Probl Cardiol. 2007;32(4):201-59. doi: 10.1016/j.cpcardiol.2007.01.002.
    » https://doi.org/10.1016/j.cpcardiol.2007.01.002
  • 5
    Natekar A, Olds RL, Lau MW, Min K, Imoto K, Slavin TP. Elevated Blood Pressure: Our Family‘s Fault? The Genetics of Essential Hypertension. World J Cardiol. 2014;6(5):327-37. doi: 10.4330/wjc.v6.i5.327.
    » https://doi.org/10.4330/wjc.v6.i5.327
  • 6
    Rosskopf D, Busch S, Manthey I, Siffert W. G Protein Beta 3 Gene: Structure, Promoter, and Additional Polymorphisms. Hypertension. 2000;36(1):33-41. doi: 10.1161/01.hyp.36.1.33.
    » https://doi.org/10.1161/01.hyp.36.1.33
  • 7
    Agostini LC, Silva NNT, Lopes ACF, Melo AS, Bicalho LSM, Almeida TC, et al. G Protein Subunit Beta 3 (GNB3) Variant Is Associated with Biochemical Changes in Brazilian Patients with Hypertension. Arq Bras Cardiol. 2023; 120(12):e20230396. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20230396
    » https://doi.org/10.36660/abc.20230396
  • 8
    Siffert W. G-Protein Beta3 Subunit 825T Allele and Hypertension. Curr Hypertens Rep. 2003;5(1):47-53. doi: 10.1007/s11906-003-0010-4.
    » https://doi.org/10.1007/s11906-003-0010-4

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    31 Out 2023
  • Revisado
    08 Nov 2023
  • Aceito
    08 Nov 2023
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