Efeito de extratos aquosos de meliáceas sobre Bemisia tabaci biótipo B em tomateiro

Effect of aqueous extracts of meliaceous plants on Bemisia tabaci B biotype on tomato plants

FITOSSANIDADE

EFEITO DE EXTRATOS AQUOSOS DE MELIÁCEAS SOBRE BEMISIA TABACI BIÓTIPO B EM TOMATEIRO(¹)

ANTONIO PANCRÁCIO DE SOUZA(²); JOSÉ DJAIR VENDRAMIM(²)

RESUMO

Comparou-se a bioatividade de extratos aquosos a 3% (p/v) de três meliáceas, Melia azedarach L. (frutos verdes), Trichilia pallida Swartz (ramos) e Azadirachta indica A. Juss (sementes), em relação à mosca branca Bemisia tabaci (Gennadius) biótipo B, criada em tomateiro. No primeiro experimento os extratos foram aplicados sobre ovos e sobre ninfas com três dias de idade, avaliando-se a mortalidade e a duração das fases de ovo e de ninfa. No segundo experimento os extratos foram aplicados apenas sobre as ninfas, avaliando-se a mortalidade nessa fase e a longevidade e fecundidade dos adultos. Em relação à fase de ovo, o extrato de T. pallida foi o que provocou maior mortalidade, seguindo-se os de A. indica e M. azedarach. A maior mortalidade ninfal foi constatada com o extrato de A. indica, seguindo-se os de T. pallida e M. azedarach. Nenhum dos extratos afetou a duração das fases de ovo e de ninfa, assim como a longevidade e fecundidade.

Palavras-chave: Insecta, Aleyrodidae, mosca branca, Bemisia argentifolii, Melia azedarach, Trichilia pallida, Azadirachta indica, planta inseticida.

ABSTRACT

EFFECT OF AQUEOUS EXTRACTS OF MELIACEOUS PLANTS ON BEMISIA TABACI B BIOTYPE ON TOMATO PLANTS(¹)

The objective of this research was to compare the effect of aqueous extracts of fresh fruits of Melia azedarach L., twigs of Trichilia pallida Swartz and seeds of zadirachta indica A. Juss, on eggs and nymphs of silverleaf whitefly Bemisia tabaci (Gennadius) B biotype reared on tomato plants. The extracts were tested at a concentration of 3%. In the first experiment, the extracts were applied on eggs and 3-day-old nymphs. Records were taken on mortality, duration of egg and nymphal stages. In the second experiment the extracts were applied on 3-day-old nymphs and records were taken on nymphal mortality, adult longevity and fecundity. The extracts of T. pallida were the most effective on eggs, followed by A. indica and M. azedarach. The extracts of A. indica were the most effective on nymphs followed by T. pallida and M. azedarach. In both experiments, the duration of egg and nymph stages, longevity and fecundity were not affected by the extracts.

Key words: Insecta, Aleyrodidae, silverleaf whitefly, Bemisia argentifolii, Melia azedarach, Trichilia pallida, Azadirachta indica, insecticidal plant.

1. INTRODUÇÃO

A mosca branca Bemisia tabaci (Gennadius) biótipo B é, atualmente, uma das principais pragas do tomateiro e seu controle é dificultado pelo seu hábito de permanecer na face abaxial das folhas (VILLAS BÔAS et al., 1997). Esse biótipo é bastante agressivo e desenvolve resistência aos inseticidas convencionais com maior facilidade que o biótipo A (BETHKE et al., 1991; PRABHAKER et al., 1998). No Brasil essa praga encontra-se disseminada desde o Paraná até o Rio Grande do Norte, atacando grande número de plantas cultivadas (VILLAS BÔAS et al., 1997).

Em virtude do rápido desenvolvimento de resistência dessa praga a inseticidas (PRABHAKER et al., 1998) e dos problemas resultantes do uso de tais produtos para o ambiente, métodos alternativos de controle têm sido pesquisados e, entre eles, incluem-se os extratos de sementes da meliácea Azadirachta indica A. Juss (COUDRIET et al., 1985; PRABHAKER et al., 1989, 1999; ASIÁTICO e ZOEBISCH, 1992; CUBILLO et al., 1994; PURI et al., 1994; LIU e STANSLY, 1995a; SABILLON e BUSTAMANTE, 1995; LESKOVAR e BOALES, 1996).

Pesquisas desenvolvidas no Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola da ESALQ/USP evidenciaram a atividade inseticida de diversos extratos de meliáceas sobre B. tabaci biótipo B, destacando-se os obtidos de frutos verdes de Melia azedarach L. e de ramos de Trichilia pallida Swartz (SOUZA, 1999). Assim, realizou-se a presente pesquisa com o objetivo de comparar a atividade desses dois extratos em relação à do extrato de sementes de A. indica.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Frutos verdes de M. azedarach e ramos de T. pallida, coletados em uma área de mata da ESALQ, e sementes de A. indica, provenientes de estoque existente no Setor de Entomologia dessa Instituição, foram secos em estufa (a 40 °C por 48 h) e triturados em moinho, separadamente, até a obtenção de pó. Para o preparo dos extratos os pós foram misturados à água destilada na proporção de 3 g por 100 mL de água. As suspensões foram mantidas em frascos por 24 h e, a seguir, filtradas através de um tecido fino (voil), obtendo-se os extratos aquosos a 3% (massa/volume).

Para obtenção dos ovos da mosca branca, pequenas gaiolas de voil que podiam ser abertas e fechadas por uma tira de Velcro foram dispostas de modo a envolver uma folha de tomateiro. Em cada gaiola foram colocados cerca de 30 adultos do inseto não sexados e, após 24 h, as gaiolas foram retiradas e as folhas examinadas, selecionando-se um folíolo com 50 ovos no mínimo. Os folíolos foram então pulverizados com os extratos, usando-se um pulverizador manual, de modo que as folhas fossem cobertas até o ponto de escorrimento. Folíolos com, no mínimo, 50 ovos, pulverizados com água destilada foram utilizados como testemunha. Quando as ninfas atingiram a fase final de desenvolvimento (caracterizada pelo seu tamanho), os folíolos foram novamente envolvidos pelas gaiolas para evitar a fuga dos adultos.

Foram realizados dois experimentos em casa de vegetação, em fotoperíodo natural a 25,5 ± 4,6 °C e 65,3 ± 13,7% de UR (primeiro experimento) e a 26,5 ± 2,2 °C e 62,7 ± 4,4% de UR (segundo experimento). No primeiro, os extratos foram aplicados sobre ovos com um dia de idade e sobre ninfas com três dias e, no segundo, apenas sobre ninfas com três dias. O delineamento experimental em ambos foi inteiramente casualizado, com quatro tratamentos (extrato de cada meliácea e testemunha) e cinco repetições (folíolos com ovos) para cada tratamento.

No primeiro experimento foram utilizados folíolos contendo, em média, 103, 147, 98 e 65 ovos nos tratamentos com M. azedarach, T. pallida, A. indica e testemunha, respectivamente. As variáveis avaliadas foram mortalidade e duração das fases ovo e ninfa.

No segundo experimento o número de ovos por folíolo foi, em média, 104, 145, 234 e 65, nos tratamentos com M. azedarach, T. pallida, A. indica e testemunha respectivamente. A utilização de maior número de ovos nesse experimento visou garantir uma quantidade suficiente de insetos para avaliação da fase adulta. O número de adultos emergidos era anotado diariamente. Na data em que a emergência de adultos ultrapassou 75 por tratamento (cinco folíolos), os mesmos foram coletados e levados para freezer, onde permaneceram por três minutos para diminuir sua atividade. A seguir, os insetos foram reunidos em cinco grupos (repetições) com cerca de 15 indivíduos em cada grupo e transferidos para outros folíolos, mantidos em laboratório a 25,0 ± 2,0 °C, 70,0 ± 10,0% de UR e fotofase de 12 h. Cada grupo foi isolado em uma pequena gaiola de acrílico, com a parte superior coberta com voil para permitir a aeração. Diariamente foi anotada a morte dos adultos, ocasião em que eram retirados e sexados. A sexagem foi feita considerando o tamanho dos adultos e o formato do abdome (Figura 1) A contagem dos ovos e ninfas em cada folíolo era feita a partir da morte de todos os adultos de uma gaiola. Os parâmetros avaliados nesse experimento foram: mortalidade ninfal, longevidade dos adultos (machos e fêmeas) e fecundidade (número de ovos/fêmea).

Os resultados de ambos os experimentos foram analisados pelo teste F, sendo as comparações entre as médias feitas através do teste de Tukey (P £ 0,05).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Primeiro experimento

Os três extratos apresentaram efeito ovicida, destacando-se como mais eficiente o extrato de ramos de T. pallida, que provocou mortalidade superior às observadas com os extratos de frutos verdes de M. azedarach e de sementes de A. indica (nim), os quais foram igualmente eficientes (Quadro 1).

A maior mortalidade ninfal ocorreu com o uso do extrato de sementes de nim, diferindo dos valores encontrados nos demais tratamentos. Os tratamentos à base de frutos verdes de M. azedarach e de ramos de T. pallida também foram eficientes, provocando mortalidade superior àquela verificada na testemunha (Quadro 1).

Embora a mortalidade de ovos e a de ninfas não tenham sido comparadas estatisticamente entre si, aparentemente foi maior na fase de ninfa que na fase de ovo, com os três extratos testados (Quadro 1).

Nenhum dos extratos afetou a duração das fases de ovo e de ninfa (Quadro 1). Os dados de duração dessas fases estão próximos aos obtidos por TSAI e WANG (1996), em condições similares de ambiente e na mesma planta hospedeira.

3.2. Segundo experimento

Quando aplicados apenas sobre ninfas com três dias de idade, os três extratos foram também eficientes em comparação à testemunha. De modo similar ao observado no primeiro experimento, também nesse a maior mortalidade ninfal (cerca de 90%) foi registrada com o extrato de sementes de nim, de valores superiores aos constatados com os extratos de M. azedarach e T. pallida, os quais não diferiram entre si (Quadro 2).

A longevidade dos adultos (Quadro 2) foi afetada de modo diferenciado, em função do sexo. Para os machos os valores de longevidade não diferiram significativamente nos vários tratamentos, incluindo a testemunha. Diversamente para as fêmeas, os adultos provenientes de ninfas tratadas com nim apresentaram maior longevidade que os oriundos dos tratamentos com T. pallida e M. azedarach, verificando-se um valor intermediário na testemunha.

Tendência semelhante foi constatada com a fecundidade, que foi maior no tratamento com nim, diferindo, nesse caso, apenas dos oriundos do tratamento com M. azedarach; no tratamento com T. pallida e na testemunha foram obtidos valores intermediários. Entretanto, considerando-se o número diário de ovos por fêmea, não houve diferença entre os tratamentos (Quadro 3), indicando que o maior número de ovos depositados por fêmea no tratamento com nim está associado ao maior período de oviposição.

Na presente pesquisa os valores de longevidade das fêmeas e de fecundidade, obtidos nas plantas não tratadas, foram baixos se comparados aos registrados por TSAI e WANG (1996), que também trabalharam com tomateiro e em condições de temperatura próximas da constatada no presente estudo. Essa variação possivelmente se deve à diferença entre as cultivares utilizadas nos dois trabalhos.

No experimento para a determinação da atividade ovicida observou-se que alguns insetos completaram o desenvolvimento embrionário, porém morreram sem conseguir romper completamente o córion do ovo, sugerindo que, em tais casos, os extratos não afetaram a embriogênese. Esse tipo de efeito foi observado também por LIU e STANSLY (1995b) e por PRABHAKER et al. (1999), ao aplicarem um óleo comercial e o inseticida amitraz sobre ovos de B. tabaci biótipo B. Os autores mencionaram que a morte tenha ocorrido, possivelmente, devido aos resíduos depositados sobre o córion. A hipótese, no entanto, não explicaria o que ocorreu na presente pesquisa, visto que as ninfas recém-formadas, mortas, não chegaram a sair do ovo e, portanto, não tiveram contato com os resíduos dos extratos. Informações acerca do efeito ovicida de extratos botânicos aplicados diretamente sobre ovos de Bemisia spp. são escassas na literatura, restringindo-se aos trabalhos de COUDRIET et al. (1985), PRABHAKER et al. (1989, 1999) e SOUZA e VENDRAMIM (2000).

A mortalidade ninfal causada pelo uso de sementes de nim, por outro lado, confirma dados de literatura obtidos, tanto com extratos aquosos (COUDRIET et al., 1985), como com formulações comerciais à base de sementes, em diversas concentrações (PRABHAKER et al., 1989, 1999; NATARAJAN e SUNDARAMURTHY, 1990; PURI et al., 1994; LIU e STANSLY, 1995a; LESKOVAR e BOALES, 1996). Nos experimentos de PRABHAKER et al. (1999) foi constatada mortalidade de ovos e de ninfas com o uso de uma formulação comercial de sementes, independentemente do tipo de aplicação (no solo, nas sementes e nas folhas de algodoeiro), indicando a ocorrência de ação sistêmica. A atividade sobre as ninfas, na aplicação foliar, pode ser atribuída ao efeito residual, uma vez que a pulverização do extrato foi feita anteriormente à oviposição. Segundo OSMAN e PORT (1990), a liberação gradual dos compostos químicos do nim incorporados ao solo e sua gradual absorção e translocação, pela planta, aumenta sua persistência, dado que, no solo, o composto fica protegido da luz solar que degrada o produto. Não existem informações a respeito da ação sistêmica de extratos de outras meliáceas, e, em vista da boa atividade inseticida de M. azedarach e T. pallida contra a mosca branca, seria interessante a avaliação desse tipo de ação nos extratos de tais plantas.

COUDRIET et al. (1985) observaram, com produtos à base de nim aplicados sobre ninfas, que a mortalidade máxima ocorreu entre 2 e 5 dias após o tratamento ou durante a ecdise, fato que foi atribuído a alterações no sistema neuro-endócrino que produz ecdiesteróides. ABRAHAM e AMBIKA (1979) haviam também referido o efeito de extratos acetônicos de folhas e sementes de nim na ecdise do percevejo Dysdercus cingulatus.

No que concerne à ação tóxica de M. azedarach e T. pallida especificamente sobre ninfas de B. tabaci, SABILLON e BUSTAMANTE (1995) relataram que a aplicação de extratos aquosos de frutos de M. azedarach em plantas de tomateiro em condições de campo, causou redução na população dessa praga, o que, os autores supõem ter sido devido à mortalidade do inseto nessa fase. SOUZA e VENDRAMIM (2000), avaliando o efeito das duas espécies vegetais sobre o biótipo B, constatou que os extratos aquosos de frutos verdes, de folhas e de frutos maduros de M. azedarach provocam mortalidade ninfal, sendo os dois primeiros mais eficientes. Em relação a T. pallida, os ramos foram a única estrutura efetiva sobre as ninfas do inseto.

Observando-se os efeitos letais sobre ovos e ninfas, quando os extratos foram aplicados nas respectivas fases, verifica-se que, embora não tenha sido feita uma comparação estatística entre os dados, aparentemente ocorreu menor atividade inseticida sobre ovos que sobre ninfas, sugerindo que os ovos são mais resistentes à ação dos extratos dessas duas estruturas vegetais. Foi também constatado por COUDRIET et al. (1985) e PRABHAKER et al. (1989, 1999) maior efeito de produtos à base de nim sobre ninfas que sobre ovos de Bemisia spp.

Não se observou efeito dos extratos sobre a duração das fases imaturas da mosca branca. Informações acerca do prolongamento da fase ninfal de B. tabaci, em decorrência do uso de extratos de meliáceas, estão restritas aos dados de COUDRIET et al. (1985), que observaram tais efeitos com extrato de sementes de nim a 2%. Entretanto, o alongamento da fase larval de Lepidoptera, tem sido freqüentemente referido na literatura, tanto com extratos de M. azedarach (MCMILLIAN et al., 1969; MIKOLAJCZAK et al., 1989; ANWAR et al., 1992; CHEN et al., 1996; RODRIGUEZ e VENDRAMIM, 1996, 1997 e VENDRAMIM e SCAMPINI, 1997) como com extratos de T. pallida (RODRIGUEZ, 1995; TORRECILLAS, 1997; ROEL, 1998; THOMAZINI, 1999). O alongamento da fase imatura com o emprego de produtos derivados de nim já foi verificado em relação a diversas pragas, incluindo algumas de hábito sugador (DIMETRY e EL-HAWARY, 1995 e DORN et al., 1986).

A descoberta da atividade inseticida do extrato de T. pallida e a confirmação dessa atividade nos extratos de M. azedarach sobre B. tabaci devem propiciar novos estudos visando determinar as substâncias químicas responsáveis por tal efeito, bem como avaliar as concentrações efetivas em condições de campo, a persistência, os mecanismos de ação e os demais aspectos necessários para viabilizar o uso comercial dos referidos extratos, para controle dessa praga.

4. CONCLUSÕES

1. Extratos aquosos a 3% (p/v) de frutos verdes de M.azedarach, de sementes de A. indica e de ramos de T. pallida apresentam ação ovicida sobre B.tabaci, biótipo B, sendo o último o mais eficiente.

2. Esses extratos também causam mortalidade de ninfas dessa mosca branca, sendo o de sementes de A. indica o mais eficiente.

⁽²)Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo (ESALQ/USP) Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba (SP). E-mail: [e-mail]

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⁽¹)Recebido para publicação em 2 de dezembro de 1999 e aceito em 28 de abril de 2000.

)Recebido para publicação em 2 de dezembro de 1999 e aceito em 28 de abril de 2000.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  08 Mar 2001
• Data do Fascículo
  2000

Histórico

• Aceito
  28 Abr 2000
• Recebido
  02 Dez 1999