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Ocupações de áreas ambientalmente frágeis em Almirante Tamandaré/PR: o direito à moradia em face da preservação do meio ambiente

Resumo

Este artigo analisa estigmas ligados à ocupação para moradia, quando esse direito se depara com restrições ambientais, e questiona o paradigma que associa a degradação ambiental à ocupação informal do solo e à pobreza urbana. O estudo que deu origem ao artigo foi conduzido em uma área ambientalmente frágil, disputada e pressionada por ocupação antrópica no município de Almirante Tamandaré, pertencente à Região Metropolitana de Curitiba/PR. Nesse estudo, foi possível identificar situações em que o estigma da informalidade urbana oculta e legitima estruturas de poder, mais inclinadas a atender a demandas de mercado, apropriadas de um discurso ambientalista, do que a garantir o direito igualitário à cidade.

ocupação informal; estigma; direito à moradia; direito ao meio ambiente; planejamento urbano e regional

Abstract

This article analyzes the stigma related to informal settlements when the right to housing faces environmental restrictions, and questions the paradigm that associates environmental degradation with informal land occupation and urban poverty. The study that originated the article was carried out in an environmentally fragile area, disputed and pressured by anthropic occupation in the municipality of Almirante Tamandaré, in the Metropolitan Region of Curitiba, State of Paraná. In this study, it was possible to identify situations where the stigma related to informal living conditions hides and legitimizes power structures, more inclined to meet market demands that display an environmentalist discourse than to guarantee the egalitarian right to the city.

informal settlements; stigma; right to adequate housing; right to a balanced environment; urban and regional planning

Introdução

A extensão urbana das metrópoles brasileiras é marcada pela segregação espacial ou ambiental que produz assentamentos populacionais precários quanto a saneamento, habitação, equipamentos e serviços urbanos, com grande demanda social, ambiental e urbana, e nos quais a pobreza é disseminada. Uma das suas principais características tem sido a ocupação de áreas de preservação permanente (APP), áreas de mananciais, áreas non aedificandi e outras áreas que contêm valores ambientais. Essa característica se reflete em problemas quando deriva de uma frágil relação entre Estado, sociedade e mercado, associada a práticas de planejamento e ao descumprimento da garantia aos direitos à cidade e à moradia previstos em legislações e na Constituição Federal (Maricato, 2003MARICATO, E. (2003). Metrópole, legislação e desigualdade. Estudos Avançados. São Paulo, v. 17, n. 48, pp. 151-166.; Fernandes, 2010FERNANDES, E. (2010). Preservação ambiental ou moradia? Um falso conflito. Caderno de Textos da I Conferência Nacional de Saúde Ambiental. Brasília, pp. 57-58.).

A ausência de políticas públicas eficazes que atuem sobre essa dinâmica motiva a negação do direito à moradia – um direito básico fundamental, reconhecido pela Constituição Federal de 1988 e pelo Estatuto da Cidade de 2001. Isso ocorre, pois o não atendimento desse direito lança os segmentos mais vulneráveis da população para áreas de menor valor econômico, que geralmente possuem fragilidade ambiental e inexistência de infraestrutura urbana adequada à moradia.

Partindo desse panorama, o presente trabalho analisa como se dá a concretização do direito à moradia quando contraposto à preservação ambiental e ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Assim, discutir-se-á sobre o direito à moradia, previsto no artigo 6° da Constituição Federal, tendo em vista a questão habitacional enfrentada pelo Brasil. Ademais, abordar-se-á sobre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, disposto no artigo 225 da nossa Carta Magna, e a forma como ele tem sido utilizado para deslegitimar o direito à moradia pelo processo de planejamento urbano adotado no Brasil.

Questiona-se a construção social dominante que associa a degradação do meio ambiente ao processo de ocupação informal do solo e à pobreza urbana a partir da suposição de que o Estado se utiliza de discursos ambientalistas como um recurso para a unificação do pensamento para deslegitimar o direito fundamental à moradia das ocupações informais em áreas ambientalmente frágeis (Acselrad, 2004ACSELRAD, H. (2004). Desregulamentação, Contradições Espaciais e Sustentabilidade Urbana. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 107, pp. 25-38. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/107/henri.pdf. Acesso em: jan 2020.
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; Fernandes, 2011FERNANDES, E. (2011). Regularização de assentamentos informais na América Latina. Cambridge, Lincoln Institute of Land Policy. Disponível em: http://www.iabrj.org.br/morarcarioca/wp-content/uploads/2012/12/3-Regularization-of-Informal-Settlements-Portuguese.pdf. Acesso em: jul 2019.
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). Mais especificamente, pretende-se investigar se o Estado diferencia a regulamentação de ocupações urbanas formais e informais, sobre áreas de fragilidade ambiental e apontar consequências dessa diferenciação na política urbana.

Para permitir que tal questão seja analisada em um caso concreto, foi selecionada, como objeto de pesquisa, a ocupação de uma área ambientalmente frágil na área urbana do município de Almirante Tamandaré, no Paraná, que, segundo a Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec, 2006COMEC (2006). Plano de Desenvolvimento Integrado da RMC. Curitiba, Comec.), é um dos eixos de expansão demográfica da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) que sofre pressão por ocupação sobre áreas de mananciais. O recorte espacial da análise abrange as áreas de influência direta e indireta do Aquífero Karst. Foram analisadas as ocupações que existiam em 2010, devido à compatibilidade com dados do último levantamento censitário nacional, e as ações e legislações municipal e estadual vigentes na época para regulamentação das ocupações nessas áreas.

Direito à moradia e informalidade urbana no cenário brasileiro

De acordo com a Constituição Federal, em seu artigo 6º, são considerados direitos sociais1 1 Direitos sociais, prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade. Tais direitos surgem no contexto do constitucionalismo social, modelo de Estado surgido das revoluções liberais do século XVIII que se preocupava basicamente com as liberdades públicas e, por isso, tinha como preocupação básica garantir a liberdade individual, mantendo a atuação do Poder Público equidistante da esfera privada e garantir a igualdade formal, no sentido de que o Poder Público trate todos como iguais (Saule Júnior e Cardoso, 2005). a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. O Direito à Moradia é, então, considerado direito social fundamental, sendo sua efetivação uma obrigação do Estado por meio da implementação de políticas públicas.

Vale ressaltar que a inclusão do direito à moradia na Carta Constitucional brasileira como um direito fundamental social se deu através da Emenda Constitucional n. 26, de 14 de fevereiro de 2000, doze anos após a publicação da Constituição, haja vista a adesão do Brasil a inúmeros documentos internacionais, tais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Saule Júnior e Cardoso, 2005SAULE JÚNIOR, N. e CARDOSO, P. M. (2005). O direito à moradia no Brasil. São Paulo, Instituto Pólis.).

Além da Constituição Federal, o Estatuto da Cidade e outras normas infraconstitucionais, tais como a Lei do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e a lei n. 11.977/2009, que regulamenta o Programa Minha Casa Minha Vida, também tratam desse direito e estabelecem diretrizes e mecanismos para sua efetivação.

Ao se considerar a totalidade dessas legislações e documentos internacionais, é importante perceber que o direito à moradia não se limita à existência de um teto para morar, mas é qualificado por uma série de elementos, tais como a qualidade da habitação, a localização, a disponibilidade de serviços e infraestrutura, a segurança jurídica da posse, o custo de moradia acessível, a adequação cultural, dentre outros. Desse modo, o direito à moradia pode ser considerado um componente do direito mais amplo à cidade e à vida (Fernandes e Alfonsin, 2014FERNANDES, E. e ALFONSIN, B. (2014). Direito à moradia adequada: o que é, para quem serve, como defender e efetivar. Belo Horizonte, Fórum.).

Apesar de todo o processo histórico-conjuntural de consolidação do direito à moradia na legislação brasileira, é preciso cuidado para que não se vincule, aos direitos à cidade e à moradia, uma visão positivada. Em que pesem os avanços no campo institucional, o direito à moradia ainda está longe de ser efetivado na realidade brasileira. De fato, ao longo do processo de urbanização brasileiro, a moradia vem sendo tratada mais como uma mercadoria do que como um direito (Cardoso, Jaenisch e Aragão, 2017). Seu acesso tem se condicionado por “falsos problemas” (Bolaffi, 1975BOLAFFI, G. (1975). Habitação e urbanismo: o problema e o falso problema. In: SIMPÓSIO DE HABITAÇÃO DA 27ª REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA, 1975, Salvador. Anais..., pp. 1-34. Salvador, UFBA.), formulados sem consideração a características intrínsecas aos problemas que envolvem a moradia no Brasil – a exemplo de problemas decorrentes da atuação de agentes que produzem espaços excludentes e excessiva valorização imobiliária –, mas a partir de necessidades de poder e de ideologias (Bertol, 2013BERTOL, L. E. (2013). Terra e habitação: o problema e o falso problema. As políticas de obscurecimento do preço da terra na política habitacional de Curitiba. Dissertação de Mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo.).2 2 Para entender a interferência do modelo capitalista de produção do espaço urbano com o problema de pesquisa, faz-se necessária a explicação do “falso problema” da habitação que perpetua (in)soluções habitacionais. Para tanto, trouxemos a discussão para o contexto local: Bertol (2013) analisou que em Curitiba, município sede da região metropolitana onde se localiza Almirante Tamandaré, “o problema habitacional não é intrínseco ao processo de crescimento populacional [...] como simples fruto de uma grande demanda populacional diante de uma pequena oferta habitacional ou de um rápido crescimento desordenado” (p. 147). Nessa formulação de problema, as contradições do espaço e do capital na urbanização e na relação capital-trabalho desaparecem. Diferentemente do que o falso problema leva a entender, o setor imobiliário curitibano está plenamente estruturado e tem sido capaz de produzir unidades habitacionais e de usar o espaço para valorizar o capital. A partir do momento em que o órgão público responsável pela política habitacional não questiona os processos que travam a produção de moradia popular, decorrentes da urbanização voltada a interesses de mercado, ele está comprometido com a produção desigual do espaço e com a perpetuação de falsos problemas e de (in)soluções. Bertol (ibid.) chama de (in)soluções as propostas de moradia popular que não objetivam “atuar ativamente ante agentes presentes na produção do espaço e na valorização imobiliária” (p. 149).

De acordo com Domingues (2013)DOMINGUES, E. G. R. L. (2013). Moradia não é mercadoria. Revista de Direito da Cidade, v. 5, n. 1, pp. 197-233., para que o Estado implemente políticas públicas que garantam o direito à moradia, vislumbram-se, basicamente, dois modos: o primeiro ocorre a partir do incentivo ao mercado de habitação em vias de ampliar a produção e a circulação da “mercadoria” habitação, entendendo a construção de habitação e o ato de morar como inerentes à política econômica. O segundo modo parte da regulação das etapas de produção da habitação, da qualidade da moradia com todos os serviços a ela inerentes e o preço da terra urbanizada. Via de regra, o Estado brasileiro tem optado pelo primeiro modo, submetendo a política urbana, a propriedade urbana e, consequentemente, a moradia aos princípios das atividades econômicas estabelecidos na Constituição.

A partir da opção do Estado por tal estratégia em detrimento de uma postura regulatória, as áreas centrais e bem infraestruturadas das cidades, que geralmente possuem melhor tratamento urbanístico e menores restrições à ocupação urbana, passam por um processo de excessiva valorização. Como consequência, a grande maioria da população brasileira com remuneração abaixo das condições de solvência para acesso a bens urbanos, à moradia e, portanto, impossibilitada de adquirir imóveis nessas áreas por meio do mercado formal, passa a habitar áreas informais.

Os dados estatísticos do Banco Mundial informam que de 1 milhão de moradias produzidas no Brasil, cerca de 700 mil são ilegais, o que comprova que a maior parte da produção habitacional no país é informal. Tais dados demonstram a tolerância do setor público com essa ilegalidade, porquanto na legislação brasileira o registro do imóvel é constitutivo de propriedade, valendo a máxima – quem não registra não é dono. (Jansen, 2012JANSEN, R. D. (2012). Política urbana e o direito fundamental à moradia. Revista da Faculdade de Direito da UFG. Goiânia, v. 36, n. 1, pp. 161-178. Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/ revfd/article/download/17382/12662. Acesso em: jan 2020.
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, p. 165; grifos nossos)

O problema não diz respeito à falta de imóveis para se morar, mas principalmente à ausência de segurança da posse, que, por sua vez, favorece a baixa qualidade com que são construídos os imóveis existentes, em especial nas áreas ilegais. A partir desse panorama é possível concluir que “a informalidade é subproduto da regulação tradicional e das violações contra os direitos à terra e à moradia” (Holz e Monteiro, 2008HOLZ, S. e MONTEIRO, T. V. (2008). Política de habitação social e o direito à moradia no Brasil. Diez años de câmbios em el Mundo, en la Geografia y en las Ciências Sociales, 1999-2008. In: X COLÓQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA. Anais... Barcelona, Universidad de Barcelona, pp. 26-30. Disponível em: http:www.ub.es/geocrit/-xcol/158.thm. Acesso em: jan 2020.
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).

Para Fernandes (2011)FERNANDES, E. (2011). Regularização de assentamentos informais na América Latina. Cambridge, Lincoln Institute of Land Policy. Disponível em: http://www.iabrj.org.br/morarcarioca/wp-content/uploads/2012/12/3-Regularization-of-Informal-Settlements-Portuguese.pdf. Acesso em: jul 2019.
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, a informalidade urbana, consequência do descumprimento do direito à moradia, acarreta implicações graves que se manifestam por diversos fardos:

  1. o fardo jurídico, expresso pela falta de segurança total da posse, que expõe os residentes de assentamentos informais ao risco permanente de despejo pelas autoridades públicas ou por proprietários de terrenos, e dificulta o acesso a serviços, tais como a obtenção de crédito em lojas e bancos, o recebimento do correio, a comprovação de que são moradores da cidade, etc.;

  2. o fardo social, expresso pela marginalização da população residente nos assentamentos informais e sua exclusão do acesso normal aos benefícios do desenvolvimento urbano, incluindo o acesso a serviços públicos, infraestruturas, espaços públicos e instalações coletivas;

  3. o fardo urbano ambiental, expresso por fragmentação e precarização das cidades, em que os assentamentos precários são marcados profundamente por diferentes riscos de saúde, segurança, degradação ambiental, poluição e condições sanitárias inadequadas;

  4. o fardo político, expresso pelo clientelismo político, no qual políticos fazem promessas eleitorais para resolver os problemas que afetam os assentamentos informais e tendem a perpetuar a informalidade; e

  5. o fardo econômico, expresso pela criação de cidades intrinsecamente ineficientes e de gestão urbana cara, segundo o qual a exclusão dos assentamentos informais dos sistemas oficiais de imposto sobre a propriedade resulta em uma perda potencial de receitas angariadas pelas administrações públicas, e os custos de programas de regularização e o acesso improvisado aos serviços públicos são expressivamente maiores que os de incorporações urbanas novas e legalizadas.

Para Acselrad (2004)ACSELRAD, H. (2004). Desregulamentação, Contradições Espaciais e Sustentabilidade Urbana. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 107, pp. 25-38. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/107/henri.pdf. Acesso em: jan 2020.
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, dentre estes, o estigma ambiental coloca-se como elemento de destaque, pois, quando evocado, conta com o apoio de grande parcela da população que replica o pensamento hegemônico, passando a defender a preservação ambiental como prioridade, sem um estudo mais aprofundado do cenário real ou de um cenário possível. É exatamente essa visão que tem subsidiado o conflito em torno das noções de direito à moradia e direito ao meio ambiente, conforme veremos a seguir.

O direito ao meio ambiente equilibrado e a estigmatização dos assentamentos informais

A tentativa de conciliar desenvolvimento e meio ambiente tem sido enfatizada desde o início da década de 1970, pela realização de diversas conferências, cúpulas e pactos internacionais, tais como o Clube de Roma em 1968, a 1ª Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente em 1972, a Eco92, a Rio+5, a Rio+10, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), dentre outras. A cidade apareceu tardiamente nesse processo político de discussões, sendo abordada apenas no Relatório Brundtland, em 1987. Nesse relatório foram discutidas questões como a falta de recursos para a estruturação do espaço urbano que ocorre nas cidades dos países pobres; a questão da distribuição da população no território; e a concentração de atividades industriais e da pobreza como a origem dos problemas ambientais urbanos. Tais debates propiciaram a redação da Agenda 21, um programa de ação que visa promover um novo padrão de desenvolvimento, conciliando métodos de proteção ambiental, de justiça social e de eficiência econômica (Acselrad, 2004ACSELRAD, H. (2004). Desregulamentação, Contradições Espaciais e Sustentabilidade Urbana. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 107, pp. 25-38. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/107/henri.pdf. Acesso em: jan 2020.
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; Polli, 2010POLLI, S. (2010). Moradia e meio ambiente, os conflitos pela apropriação do território nas áreas de mananciais em São Paulo. Tese de doutorado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.; Rickli Neto, 2012RICKLI NETO, J. (2012). A peia política urbana perspectiva da ecologia planejamento metropolitano de Curitiba: protegendo as águas e criando desigualdades. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.).

No Brasil, o direito ao meio ambiente equilibrado está respaldo em diversas legislações, dentre as quais cabe ressaltar o artigo. 225 da Constituição Federal. Em seu caput, esse artigo estabelece que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Assim, tal qual o direito à moradia, o direito ao meio ambiente é considerado pela doutrina e pela jurisprudência como uma extensão do direito à vida. O equilíbrio ecológico é entendido como um direito fundamental, tendo em vista que representa, em sua relação com o ser humano, elementos necessários a maior qualidade de vida, tais como saúde, cultura, lazer, etc. Sob esse ponto de vista, o direito ao ambiente sadio é entendido, também, como um direito fundamental no ordenamento jurídico brasileiro (Gaio, 2015GAIO, D. (2015). A interpretação do direito de propriedade em face da proteção constitucional do meio ambiente urbano. Rio de Janeiro, Renovar.).

Fernandes (2010)FERNANDES, E. (2010). Preservação ambiental ou moradia? Um falso conflito. Caderno de Textos da I Conferência Nacional de Saúde Ambiental. Brasília, pp. 57-58. ressalta que o desafio é compatibilizar esses dois valores e direitos. Para tanto, é preciso que se adote um conceito antropocêntrico de natureza, bem como que se tomem todas as medidas necessárias para a reversão do atual modelo de crescimento urbano segregador e poluidor, de tal forma que as cidades brasileiras possam se tornar cidades ecológicas e sustentáveis do ponto de vista socioambiental.

No entanto, não é essa a realidade encontrada quando se analisam as diversas políticas com caráter e objetivos voltados à preservação ambiental. O planejamento urbano tem seguido historicamente modelos modernistas de organização territorial, particularmente no que diz respeito à utilização de ferramentas que organizam as funções urbanas em zonas específicas. Nesse modelo de ordenamento, para a preservação ambiental, são delimitadas áreas que restringem a ocupação ou determinados tipos de uso sobre áreas de interesse de preservação ambiental ou de fragilidade ambiental. Tais áreas, como dito anteriormente, acabam por ser ocupadas informalmente em razão da realidade socioeconômica brasileira e da atuação do Estado que, ao não garantir a efetivação da função social da propriedade e da cidade, é conivente com essa situação.

Para Polli (2010)POLLI, S. (2010). Moradia e meio ambiente, os conflitos pela apropriação do território nas áreas de mananciais em São Paulo. Tese de doutorado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro., o senso comum sugere que os pobres das cidades e as cidades pobres são, em geral, considerados os maiores causadores das problemáticas ambientais, devido, dentre outros fatores, ao modo supostamente desordenado como ocupam o território. Sob essa interpretação, os assentamentos informais são estigmatizados como responsáveis por boa parte do que se entende por degradação ambiental, ao invés da degradação ambiental ser entendida como produto de escolhas políticas e econômicas para a estruturação do espaço urbano.

A aceitação desse estigma tem levado a processos de planejamento urbano que utilizam como recurso a restrição de áreas ambientalmente frágeis para tipologias de ocupação urbana sobre as quais se tem maior controle. Exemplo é a permissão de condomínios residenciais, normalmente voltados para classes média e alta, dotados de soluções de infraestrutura e saneamento básico. Ocorre que o planejamento que propõe tais práticas atua seguindo a lógica de mercado, mesmo que esta seja contrária aos interesses da cidade, sem propor reflexão crítica ou alternativas (Ascelrad, 2004; Rolnik, 2015ROLNIK, R. (2015). Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças. São Paulo, Boitempo.).

Dentro dessa lógica, o mesmo Estado que lança mão da ideia de degradação ambiental para criminalizar os moradores de áreas de proteção/fragilidade ambiental através do planejamento urbano, por vezes disponibiliza ferramentas que viabilizam ocupações formais sobre áreas de interesse ambiental. Tais ações são justificadas por um suposto consenso em relação à forma de garantir a preservação dos recursos naturais, pretensamente orientando as políticas ambientais e territoriais.

Acselrad (2004)ACSELRAD, H. (2004). Desregulamentação, Contradições Espaciais e Sustentabilidade Urbana. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 107, pp. 25-38. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/107/henri.pdf. Acesso em: jan 2020.
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defende que o meio ambiente, vestido dessa roupagem universalista, convém, por certo, aos propósitos de pré-construção de um consenso social destinado a reconstituir o sentido de comunidade, solidariedade e interesse comum em um mundo socialmente fragmentado, buscando acomodar as diferenças em uma nova totalidade interdependente. A partir desse viés, é possível questionar se a questão ambiental tem sido utilizada para disfarçar a incapacidade de as políticas urbanas adequarem a oferta de serviços urbanos à quantidade e qualidade das demandas sociais.

O processo de urbanização de áreas de mananciais em Almirante Tamandaré

A Região Metropolitana de Curitiba (RMC), atualmente composta por 29 municípios, vem desenvolvendo processo de urbanização acentuado desde a década de 1970, sendo a região metropolitana brasileira que apresentou as maiores taxas de crescimento quando considerada a média dos últimos 40 anos, segundo dados do IBGE (2010)IBGE (2010). Censo demográfico 2010. Município Almirante Tamandaré. Rio de Janeiro, IBGE.. Sua taxa anual de crescimento populacional alcançou ápices em torno de 3,5%, com alguns municípios ultrapassando os 10%. Associado a isso, aproximadamente 70% do território da RMC é classificado como contendo áreas de mananciais ou de preservação ambiental, o que significa que, formal ou informalmente, parte dessas áreas é ocupada.

Situado ao norte da RMC, o município de Almirante Tamandaré possui cerca de 80% do território sobre o Aquífero Karst, um reservatório subterrâneo de águas em terrenos metacalcários, compostos por solos dolomíticos que correspondem à Formação Capiru (Figura 1). O município de Almirante Tamandaré foi alvo de um intenso processo de parcelamento do solo a partir da década de 1960 e abriga ocupações em áreas com fragilidade geotécnica, declividade acentuada e fundos de vale. Para Silva (2012)SILVA, M. N. (2012). A dinâmica de produção dos espaços informais de moradia e o processo de metropolização em Curitiba. Tese de Doutorado. Curitiba, Universidade Federal do Paraná., o problema da moradia ilegal em Almirante Tamandaré é, antes de tudo, um problema metropolitano – portanto de responsabilidade estadual –, pois sua origem vincula-se à intensificação da produção dos espaços informais de moradia, nos anos 1990, numa fase de urbanização metropolitana.

Figura 1
– Localização da área de estudo na RMC e no Aquífero Karst

Um estudo da Comec realizado em 2002 definiu para as rochas dessa formação duas zonas de influência, direta (ZID) e indireta (ZII), e as caracterizou quanto à fragilidade geotécnica e à vulnerabilidade à ocupação da superfície do Aquífero.

A ocupação urbana em áreas cársticas normalmente ocorre sobre as áreas de influência direta, devido às suas características de topografia favorável, como as planícies cársticas. Essas áreas encobrem a complexidade da dinâmica do Karst, suas estruturas subterrâneas (cavidades, cavernas) e zonas de extrema sensibilidade, e que não devem ser ocupadas pelos riscos de afundamento dos terrenos. (Araújo, 2006ARAÚJO, M. L. M. (2006). A influência do Carste em Almirante Tamandaré. Comec, CHD-007/2006. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/geografar/article/view/6838/4856. Acesso em: jan 2020.
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, p. 14)

A área de estudo (Figura 1) foi selecionada por se situar sobre a Bacia do Alto Iguaçu, responsável por grande parte do abastecimento de água da RMC e por caracterizar uma região de alta pressão por ocupação urbana sobre o Aquífero Karst. Também constitui uma região sujeita a acidentes geológicos, tais como colapsos de solo e subsidências. Esses acidentes geológicos são agravados em função do adensamento urbano sobre essa área, acarretando altos índices de vulnerabilidade socioambiental.

De acordo com Oliveira (2010)OLIVEIRA, L. M. (2010). Acidentes geológicos urbanos. Curitiba, Mineropar., a ocorrência de acidentes geológicos urbanos está relacionada à ocupação indevida de áreas de risco. Acidentes relacionados à ocupação resultam da “evolução de processos de alteração do meio físico, induzidos, potencializados ou acelerados pelo uso e ocupação do solo e que trazem como consequências prejuízos sociais, econômicos ou ambientais e até mesmo a perda de vida humana” (ibid., p. 11). Em áreas cársticas nas quais o solo é composto por materiais inconsolidados, os afundamentos cársticos correspondem ao efeito em superfície da tendência natural dos materiais de cobertura de preencherem e se depositarem sobre essas cavidades do solo (processos de dissolução das rochas carbonáticas, conhecidos como carstificação). Esses processos podem ser acelerados ou deflagrados por ações de mineração, ocupação urbana, exploração de água subterrânea, agricultura intensiva ou exploração turística das formações cársticas. No caso da urbanização, os afundamentos podem decorrer da ocupação de terrenos que apresentem comportamentos geotécnicos indesejáveis ou estruturas subterrâneas (cavernas e cavidades) inadequadas à ocupação ou ao adensamento construtivo. Além disso, quando realizada de maneira inadequada aos níveis de aptidão à ocupação sobre solos cársticos, a urbanização pode potencializar a contaminação do aquífero subterrâneo, a partir do lançamento de esgotos (ibid.).

Para a realização deste estudo, em vias de questionar o paradigma que associa a degradação ambiental ao processo de ocupação informal do solo e à pobreza urbana, foram identificadas ocupações formais e informais em áreas ambientalmente frágeis e avaliadas as ações do Estado no regramento desses tipos de ocupação. Nesse sentido, optou-se por avaliar as ocupações sobre áreas de influência de terrenos cársticos.

De acordo com os dados do Censo, em 2010 o Município possuía 98.954 habitantes e 32.594 domicílios. Desse total, 6.238 domicílios (cerca de 20%) estavam localizados em espaços informais de moradia. Em sua tese de doutorado, Silva (2012)SILVA, M. N. (2012). A dinâmica de produção dos espaços informais de moradia e o processo de metropolização em Curitiba. Tese de Doutorado. Curitiba, Universidade Federal do Paraná. contabilizou 117 assentamentos informais divididos entre favelas, loteamentos clandestinos e loteamentos irregulares.3 3 Segundo categorização proposta por Silva (2012), favelas são os espaços autoproduzidos pela população sem acesso à moradia formal, nos quais ela se torna um “agente modelador do espaço” (p. 121). Já os loteamentos irregulares ou clandestinos são parcelamentos do solo que apresentam diferentes graus de irregularidade, sendo o loteamento clandestino aquele executado sem autorização ou conhecimento do poder público; e o loteamento irregular o parcelamento que, embora aprovado pelo poder público, foi executado em desacordo com a legislação existente ou que não foi registrado em cartório após sua implantação.

De acordo com o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS, 2010), 81% do déficit habitacional do Município era composto por população com renda média mensal de até três salários mínimos. De acordo com Arretche (2012)ARRETCHE, M. (coord.) (2012). Capacidades administrativas dos municípios brasileiros para a política habitacional. São Paulo, Centro de Estudos da Metrópole., essa faixa de renda enquadra pessoas que não possuem capacidade econômica para endividamento ou adesão a um sistema de crédito habitacional. Portanto, caracteriza-as como a parcela da população que está à margem das políticas habitacionais comumente praticadas, concentradas no financiamento habitacional como única possibilidade de acesso à moradia no mercado formal. Essa população tende a encontrar soluções em áreas que não são utilizadas pelo mercado formal, como as áreas de proteção ambiental, ou em outros arranjos para a moradia, como a coabitação ou o ônus excessivo com aluguel.

O PLHIS (2010) identificou, ainda, que 37% dos assentamentos informais situavam-se em áreas sujeitas a risco de inundações e deslizamentos. O PLHIS indicou que, dos 6.240 domicílios localizados em ocupações irregulares no Município, 1.591 deveriam ser reassentados. Do total de domicílios informais com necessidade de reassentamento, 50% estavam localizados em áreas de risco ambiental ou em áreas de preservação ambiental. A tipologia de ocupações irregulares em áreas de fragilidade ambiental possuía a maior expressividade dentre os tipos de risco aos quais as ocupações irregulares a serem reassentadas estavam sujeitas no Município.4 4 A lei do plano diretor de Almirante Tamandaré foi revista e publicada em 2018 (lei complementar n. 77/2018). No entanto, até o momento finalização deste artigo, a revisão da lei de zoneamento de uso e ocupação do solo não havia sido publicada. Sendo assim, a lei municipal n. 9 002/2006 permanece em vigência nas análises.

Resultados

Em vias de analisar como se dá a concretização do direito à moradia em áreas de fragilidade ambiental e investigar se o Estado diferencia a regulamentação de ocupações urbanas formais e informais sobre essas áreas no município de Almirante Tamandaré, foi identificada a adequabilidade dos solos para o uso e a ocupação do ponto de vista de recomendações geotécnicas (Mineropar, 1994MINEROPAR (1994). Projeto de mapeamento geológico geotécnico para planejamento na Região Metropolitana de Curitiba. Curitiba, Mineropar.) e do zoneamento do Aquífero Karst (Comec, 2002COMEC (2002). Plano de Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo da Região do Karst na RMC. Curitiba, Comec.). Na sequência, foi avaliada a forma como o município regulamenta as ocupações sobre essas áreas através da versão vigente do zoneamento urbano vigente à época5 5 O recorte da Figura 2 em relação aos limites do Município e do Aquífero está indicado na Figura 1. (lei municipal n. 002/2006 – Almirante Tamandaré, 2006ALMIRANTE TAMANDARÉ (2006). Lei complementar n. 001/2006 – Institui o Plano Diretor, e estabelece Objetivos, Instrumentos e Diretrizes para as Ações de Planejamento no Município de Almirante Tamandaré. Almirante Tamandaré. Disponível em: http://tamandare.pr.gov.br/planoDiretor/. Acesso em: jan 2020.
http://tamandare.pr.gov.br/planoDiretor/...
).

Para identificar as áreas formais e informais, foram utilizados: 1) registro dos loteamentos aprovados disponível no Plano de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Curitiba (Comec, 2006COMEC (2006). Plano de Desenvolvimento Integrado da RMC. Curitiba, Comec.); 2) setores censitários que concentram maior renda em relação aos demais (IBGE, 2010IBGE (2010). Censo demográfico 2010. Município Almirante Tamandaré. Rio de Janeiro, IBGE.); e 3) levantamento de espaços informais de moradia realizado por ocasião do desenvolvimento do PLHIS (Silva, 2012SILVA, M. N. (2012). A dinâmica de produção dos espaços informais de moradia e o processo de metropolização em Curitiba. Tese de Doutorado. Curitiba, Universidade Federal do Paraná.).

Análise da regulamentação estadual sobre a situação existente

Segundo o Projeto de Mapeamento Geológico Geotécnico – Planejamento na RMC realizado pela Mineropar (1994)MINEROPAR (1994). Projeto de mapeamento geológico geotécnico para planejamento na Região Metropolitana de Curitiba. Curitiba, Mineropar. –, a área efetivamente ocupada em Almirante Tamandaré é caracterizada por: solos impróprios para loteamentos, com alta suscetibilidade a enchentes e inundações, afundamentos cársticos e descarga de efluentes; e solos adequados com restrições, conforme demonstrado pelas Figuras 2 e 3. Para a ocupação de solos inadequados a loteamentos, o estudo destaca a necessidade de realização de estudos que considerem critérios técnicos adequados, em consonância com planos de mineração e aproveitamento de recursos hídricos.

Figura 2-A
– Legenda de avaliação de aptidão dos solos à ocupação, adaptada ao estudo

Figura 3
– Loteamentos aprovados, ocupações de alta renda e ocupações informais sobre o Zoneamento do Karst – 2006

Na Figura 2, é possível observar que os loteamentos foram aprovados em toda a área urbana analisada6 e que não há concentrações de loteamentos sobre determinados tipos de solo classificados pela Mineropar (ibid.) como mais aptos para implantação de loteamentos. Constatou-se que a maioria dos loteamentos data de um período anterior à realização do estudo da Mineropar (ibid.) e que, portanto, não teria sido influenciada pelas diretrizes de adequabilidade geotécnica. Nesse caso, a implantação dos loteamentos precede a regulamentação de aptidão do uso do solo cárstico pelo órgão estadual. A partir de 1994, é de responsabilidade do Município regulamentar as diretrizes de uso e ocupação do solo para projetos realizados nesses loteamentos e coibir a ocupação em solos considerados inadequados para esse fim.

Para a confecção da Figura 2, foram agrupadas as classificações da Mineropar (ibid.) em três grandes classes, conforme aptidão a loteamentos. A Figura 2-A contém a legenda original das cartas do órgão. Foram agrupados, na classe “adequada a loteamento”, os solos CR com declividade de até 5% e DB com declividade de até 20%. Na classe “inadequado ou com severas restrições”, todos os solos A, DT e solos de outras classes com declividade superior a 30%. Os demais solos foram agrupados como “adequados com restrições”.

Figura 2
– Loteamentos aprovados, ocupação de alta renda e ocupações informais sobre as indicações de adequabilidade a loteamentos – até 2010

O tipo de solo inadequado ou com severas restrições a loteamentos está presente na área de influência direta do Karst, delimitada pelo plano de zoneamento de uso e ocupação do solo da região do Karst na Região Metropolitana de Curitiba (Comec, 2002COMEC (2002). Plano de Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo da Região do Karst na RMC. Curitiba, Comec.), conforme detalhado na Figura 3. A zona de influência direta é definida como situada diretamente sobre os metacalcários dolomíticos, caracterizada, por um lado, por maior vulnerabilidade ambiental e geotécnica e, por outro, por estar diretamente relacionada às características de recarga e produção do Aquífero (ibid.).

Nessa zona, o estudo aponta que, embora em diversos casos seja tecnicamente aconselhada a “desurbanização” de áreas urbanizadas, como, por exemplo, em áreas de influência direta do Karst, essa medida deve ser tomada apenas em casos extremos de fragilidade de base natural e/ou quando a ocupação põe em risco a segurança das próprias populações lá estabelecidas. Ainda, indica que a expansão e o adensamento urbano do Município deveriam se concentrar na faixa limítrofe com o município de Curitiba e conclui que, mesmo que existam conflitos ambientais entre a ocupação e o Aquífero, seria viável o desenvolvimento de ações de proteção sobre ele (ibid.). Ou seja, assume uma postura de relativização das ações tomadas sobre áreas frágeis ocupadas, indicando a necessidade de realização de estudos específicos que apontem a real necessidade de remoção das famílias ali assentadas. Segundo Araújo (2006)ARAÚJO, M. L. M. (2006). A influência do Carste em Almirante Tamandaré. Comec, CHD-007/2006. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/geografar/article/view/6838/4856. Acesso em: jan 2020.
https://revistas.ufpr.br/geografar/artic...
,

A ocupação urbana em áreas cársticas normalmente ocorre sobre as áreas de influência direta, devido às suas características de topografia favorável, como as planícies cársticas. Essas áreas encobrem a complexidade da dinâmica do carste [sic], suas estruturas subterrâneas (cavidades, cavernas) e zonas de extrema sensibilidade, e que não devem ser ocupadas pelos riscos de afundamento dos terrenos. (p. 31)

Isso independe da regularidade da ocupação, como pode ser observado acima; as Figuras 2 e 3 3 Segundo categorização proposta por Silva (2012), favelas são os espaços autoproduzidos pela população sem acesso à moradia formal, nos quais ela se torna um “agente modelador do espaço” (p. 121). Já os loteamentos irregulares ou clandestinos são parcelamentos do solo que apresentam diferentes graus de irregularidade, sendo o loteamento clandestino aquele executado sem autorização ou conhecimento do poder público; e o loteamento irregular o parcelamento que, embora aprovado pelo poder público, foi executado em desacordo com a legislação existente ou que não foi registrado em cartório após sua implantação. demonstram que existem ocupações formais e informais sobre a zona de influência direta do Aquífero Karst. Inclusive, a concentração de loteamentos com domicílios de renda média superior ao restante da área analisada está inteiramente sobre essa zona, imprópria para loteamento.

Percebe-se, na Figura 2, que a única área de concentração de população com maior faixa de renda do Município (em Almirante Tamandaré, equivale a mais de 6 salários mínimos mensais, conforme os dados do censo do IBGE de 2010IBGE (2010). Censo demográfico 2010. Município Almirante Tamandaré. Rio de Janeiro, IBGE.) estava localizada sobre solo inadequado a loteamento ou com severas restrições.

A partir das Figuras 2 e 3 3 Segundo categorização proposta por Silva (2012), favelas são os espaços autoproduzidos pela população sem acesso à moradia formal, nos quais ela se torna um “agente modelador do espaço” (p. 121). Já os loteamentos irregulares ou clandestinos são parcelamentos do solo que apresentam diferentes graus de irregularidade, sendo o loteamento clandestino aquele executado sem autorização ou conhecimento do poder público; e o loteamento irregular o parcelamento que, embora aprovado pelo poder público, foi executado em desacordo com a legislação existente ou que não foi registrado em cartório após sua implantação. , também é possível analisar que as ocupações informais (incluem clandestinas e irregulares) encontravam-se predominantemente sobre solos apropriados para loteamento, ainda que se recomende, para essas áreas, restrições de controle de drenagem superficial e esgotamento sanitário.

Análise da regulamentação municipal sobre a situação existente

A Figura 4 mostra que o zoneamento municipal, realizado no ano 2006 e posterior às diretrizes estaduais, buscou regulamentar a ocupação do solo através da definição de zonas residenciais com maiores ou menores restrições à ocupação, segundo o grau de influência do Aquífero Karst.

Figura 4
– Loteamentos aprovados, ocupações de alta renda e ocupações informais sobre o Zoneamento Municipal – 2006

Como é possível verificar na Figura 4, a região de maior renda encontra-se sob regulamentação da Zona Residencial Karst (ZRK). Tal zona foi criada para regrar o uso e ocupação do solo nas áreas de influência direta do Karst e tem um grau de restrição maior à ocupação, se comparada a áreas de mesma tipologia que não se encontram em solos sob influência do Aquífero. Na ZRK, a dimensão do lote mínimo é de 600 m2, enquanto, nas demais zonas residenciais, as dimensões mínimas dos lotes são de 360 m2 e de 450 m2. O aumento da dimensão do lote mínimo na ZRK foi um dispositivo utilizado para diminuir a densidade construtiva na zona, sob o pretexto de aumentar a preservação da área.

Quanto aos assentamentos informais, a maioria está situada fora de áreas ambientalmente frágeis do Karst, em áreas nas quais o uso residencial é permitido pelo zoneamento, em Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) ou Zonas Residenciais (ZR).

De modo geral, portanto, a análise desse caso mostra que as ocupações de maior renda são as que estão ocupando o tipo de solo mais frágil, e que as ocupações informais, com raras exceções, estão ocupando solos apropriados ou apropriados com restrições ao parcelamento. Essa prática se contrapõe ao estigma comumente relacionado a ocupações informais sobre áreas de interesse de preservação, contribuindo para atestar que o estigma ambiental da informalidade é uma construção social.

Esse estigma guarda a concepção hegemônica de que o ordenamento dos territórios municipais segue parâmetros urbanísticos considerados ideais e adequados para a preservação ambiental e a qualidade urbana das cidades. Nessa concepção, a desordem urbana estaria fortemente associada ao processo de ocupação urbana irregular e à degradação do meio ambiente, o que justifica a sua remoção ou reordenamento (Compans, 2009COMPANS, R. (2009). “Cidades sustentáveis, cidades globais: antagonismo ou complementaridade?”. In. ACSELRAD, H. A duração das cidades: sustentabilidade e risco nas políticas urbanas. Rio de Janeiro, Lamparina.).

A ênfase na questão do risco ambiental que culpabiliza as ocupações informais pela degradação ambiental faz parte do modus operandi dos atores estatais, ao tratar do ordenamento territorial em Almirante Tamandaré em vias de justificar remoções. Dentre os casos mais emblemáticos, está o da Ocupação Vila União, localizada no bairro Bonfim em área de fragilidade cárstica, em que residiam mais de 500 famílias. A ocupação, iniciada em 1995, foi alvo de uma ordem de despejo em 2006, justificada por fragilidade ambiental e inadequação da área para a ocupação urbana (Terra de Direitos, 2006TERRA DE DIREITOS (2006). Almirante Tamandaré: Moradores protestam contra ação de despejo. Disponível em: https://terradedireitos.org.br/noticias/noticias/almirante-tamandare-moradores-protestam-contra-acao-de-despejo/564. Acesso em: jan 2020.
https://terradedireitos.org.br/noticias/...
).

Esse discurso ambientalista também está presente nos instrumentos de planejamento e gestão habitacional do Município. Ao analisarmos a síntese das ocupações irregulares indicadas para reassentamento pela versão atual do PLHIS de Almirante Tamandaré (2016), do total de 1.591 domicílios a serem reassentados, 798 reassentamentos (50% do total de domicílios a serem reassentados) são motivados pela localização em áreas de preservação ambiental ou de risco ambiental.

A investigação sobre se tais ocupações irregulares efetivamente se encontravam em áreas que impossibilitam a sua regularização deve ser objetivo de um estudo mais aprofundado sobre o PLHIS. No entanto, cabe aqui uma problematização acerca da visibilidade dada às ocupações informais em áreas ambientalmente frágeis por parte do discurso da administração municipal enquanto, em momento algum, coloca em questão as flexibilizações seletivas típicas do planejamento urbano (Acselrad, 2004ACSELRAD, H. (2004). Desregulamentação, Contradições Espaciais e Sustentabilidade Urbana. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 107, pp. 25-38. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/107/henri.pdf. Acesso em: jan 2020.
http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR...
; Polli, 2010POLLI, S. (2010). Moradia e meio ambiente, os conflitos pela apropriação do território nas áreas de mananciais em São Paulo. Tese de doutorado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.), que produzem danos ambientais consentidos pelo poder público. Ou seja, o discurso da política habitacional e de ordenamento territorial municipal oculta a existência de ocupações formais em áreas ambientalmente frágeis.

Apesar dos estigmas, os assentamentos informais são legalmente reconhecidos como parte do desenvolvimento normal da cidade pela demarcação como Zeis de regularização fundiária na lei de zoneamento municipal. Vale ressaltar, no entanto, que embora esses assentamentos tenham adquirido seu reconhecimento na medida em que foram demarcados como Zeis em 2006, até o presente momento muito pouco se fez para a efetiva regularização dessa população. Isso foi observado ao constatar que o número de domicílios em situação informal permanece inalterado nos estudos que deram origem à demarcação das Zeis em 2006, no levantamento que deu origem ao PLHIS em 2010 e na atualização desse estudo em 2016.

Considerações finais

As análises realizadas permitiram comprovar a hipótese de que o estigma da informalidade relacionado ao fardo ambiental é uma construção social ideológica, visto que, no recorte espacial analisado, são os assentamentos formais que se localizam em áreas de risco geológico, quando comparados aos informais, e que são os assentamentos informais objetos de remoções sob a prerrogativa de proteção ambiental.

Esse fato mostrou a primeira indicação de quebra do paradigma apontado no referencial teórico do presente estudo: de que as ocupações informais estariam ocupando áreas ambientalmente mais frágeis. Ao contrário do que prega o senso comum, no município de Almirante Tamandaré, as ocupações informais estão localizadas predominantemente em áreas onde a regulação municipal e estadual permite ocupação residencial e onde é possível sua regularização para o uso residencial – tanto que algumas foram demarcadas como Zeis de regularização fundiária.

Numa primeira análise, pode-se dizer que o estigma ambiental não se aplica aos assentamentos informais do Município. No entanto, a inexistência de assentamentos informais sobre solos inapropriados em área de influência direta ou indireta do Aquífero Karst, no recorte espacial e temporal analisado, pode apontar para a adoção de processos de planejamento urbano que utilizam como recurso a restrição destas áreas para tipologias de ocupação urbana sobre as quais se tem maior controle. Tal prática pode ser comprovada quando se analisa que a totalidade dos assentamentos informais localizados em áreas categorizadas como de preservação ambiental são demarcadas como áreas a serem removidas e/ou reassentadas pelo PLHIS (2010) enquanto, paralelamente, constatamos a existência de ocupações de alta renda nas áreas ambientalmente mais frágeis, que não foram enquadradas pela legislação municipal como áreas para regularização fundiária ou para remoção. Esse fato mostra o tratamento diferenciado de áreas de alta e de baixa renda na regulamentação municipal.

Nas figuras apresentadas, identificamos que as áreas mais planas e, portanto, mais procuradas para parcelamento no Município correspondem às áreas de influência direta do Karst, suscetíveis a afundamentos cársticos e nas quais a Mineropar (1994)MINEROPAR (1994). Projeto de mapeamento geológico geotécnico para planejamento na Região Metropolitana de Curitiba. Curitiba, Mineropar. não recomenda o loteamento. Identificamos, sobre essas áreas frágeis e cujo loteamento não é recomendado pela regulamentação estadual, a ocupação de mais alta renda, dentro do recorte espacial analisado pela pesquisa.

Além disso, foi identificada a ausência de ocupações irregulares sobre essas áreas. A partir do entendimento de que as áreas com maior fragilidade ambiental cárstica são também as mais planas e mais valorizadas pelo mercado (Araújo, 2016), compreende-se que a lógica de estruturação do espaço urbano segundo as diretrizes de valorização do capital contribuiu para que a população de baixa renda ocupasse áreas menos valorizadas, com topografia mais acidentada, sobre solos considerados aptos ou aptos com restrições à ocupação urbana. No caso de Almirante Tamandaré, portanto, o mercado formal apropriou-se de áreas ambientalmente frágeis, que apresentam restrições no zoneamento para loteamentos. A regulamentação municipal permite a ocupação de áreas inadequadas e com severas restrições a loteamentos para setores de mais alta renda da população, para os quais define lotes maiores sob o pretexto de ocupação com baixa densidade construtiva. Cabe ressaltar que não existiam, no recorte temporal analisado, dispositivos que garantissem a manutenção da baixa densidade construtiva dessas áreas para além daqueles estritamente necessários para a emissão do alvará de construção, do habite-se e da fiscalização preventiva realizada pela prefeitura de modo pontual mediante denúncias. Desse modo, não existia garantia de que as ocupações formais estivessem efetivamente cumprindo o estabelecido na legislação e respeitando a fragilidade ambiental da área.

Reconhece-se que as áreas ocupadas informalmente podem apresentar riscos que justifiquem seu reassentamento e não se questiona a legitimidade dessas ações. O questionamento realizado é sobre os pesos dos holofotes direcionados para as ocupações informais sobre áreas aptas à ocupação versus o obscurecimento para as ocupações formais sobre áreas inaptas à ocupação, que podem representar riscos tanto para o meio ambiente quanto para a vida da população assentada sobre ela.

Levantam-se questões sobre o modus operandi dos atores estatais responsáveis pela elaboração de regulamentações urbanísticas apoiadas em discursos ambientalistas, mas que nem sempre possuem conexão com políticas que possam garantir a efetividade da preservação ambiental, uma vez que desconsideram as dinâmicas de produção social do espaço estabelecidas. É de se problematizar a omissão do Estado no sentido de garantir o direito de permanência dessas populações, com suas particularidades, ao mesmo tempo que permite a permanência de ocupações formais em áreas sobre comprovado risco geoambiental.

Embora se possa associar maiores condições de instalações (saneamento, infraestrutura) adequadas às ocupações formais, particularmente as de alta renda, vale ressaltar que o fornecimento de serviços públicos e de infraestrutura urbana é uma função do Estado, bem como a efetiva fiscalização acerca da correta utilização destes a favor da coletividade. A ocupação com lotes de maiores dimensões não é garantia de que eles não serão subdivididos em frações ideais menores, muitas vezes não regulamentadas pelo município, para formar condomínios de unidades habitacionais geminadas. Também, a ocupação de áreas ambientalmente frágeis por parte da população com mais alta renda não garante que não haja lançamentos irregulares de esgoto sobre solo cárstico, por exemplo, quando não há um sistema de fiscalização em operação.

A efetiva compatibilização entre o direito ao meio ambiente e a garantia de acesso ao direito à moradia exige que o poder público altere a sua postura com relação a essa realidade e intervenha, progressivamente, na ordem econômica e social, através de políticas reguladoras do uso e do desenvolvimento do espaço urbano.

Segundo Pírez (2016)PÍREZ, P. (2016). Las heterogêneas formas de producción y consumo de la urbanización latinoamericana. Quid 16, v. 16, n. 6, pp. 131-167., o pensar sobre o papel do Estado na urbanização latino-americana como garantidor de condições urbanas para a reprodução da formação social é uma proposta de abstração, já que, em diferentes momentos, o Estado atua para garantir interesses que não são necessariamente coincidentes (reprodução global e acumulação particular). Para o autor, o conhecimento sobre processos específicos de urbanização deve nos levar a questionar a dita orientação pública associada ao Estado de maneira simplista, dada a heterogeneidade do capitalismo dependente. Pelo contrário, aponta a necessidade de conhecer os processos políticos que, em momentos diferentes, são realidade concreta às intervenções estatais.

Pírez (ibid.) defende o papel da regulação estatal com orientação externa ao mercado como condição para que a produção de espaços urbanos deixe de ser desenvolvida exclusivamente no sentido comercial e, consequentemente, o solo urbano e a moradia possam ser consumidos como bens de uso, fora do circuito de (re)produção mercantil. Destaque seja feito para o fato de que o autor pressupõe que a regulação é uma atividade de responsabilidade estatal sem interferência do mercado, assumindo a separação entre os interesses públicos e privados. Desse modo, a observação sobre a omissão observada em Almirante Tamandaré dentro do recorte temporal da pesquisa não deve limitar o papel regulador do poder público local, mas seu conhecimento deve permitir a tomada de decisões para mudanças de rumo.

Para finalizar, cabe reiterar a ressalva de que não se pretende, aqui, desmobilizar esforços feitos no sentido de preservação do meio ambiente pela gestão municipal. No entanto, avalia-se que as práticas identificadas, embasadas principalmente na ideia de que a ordenação territorial promovida e/ou autorizada pelo Estado é a que garante a preservação ambiental ou a ausência de risco, apresentam categorias genéricas, muitas delas positivadas e sem uma definição clara que possa colaborar com uma efetiva transformação social e garantir um meio urbano ecologicamente equilibrado e socialmente justo.

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    » https://terradedireitos.org.br/noticias/noticias/almirante-tamandare-moradores-protestam-contra-acao-de-despejo/564

Notas

  • 1
    Direitos sociais, prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade. Tais direitos surgem no contexto do constitucionalismo social, modelo de Estado surgido das revoluções liberais do século XVIII que se preocupava basicamente com as liberdades públicas e, por isso, tinha como preocupação básica garantir a liberdade individual, mantendo a atuação do Poder Público equidistante da esfera privada e garantir a igualdade formal, no sentido de que o Poder Público trate todos como iguais (Saule Júnior e Cardoso, 2005SAULE JÚNIOR, N. e CARDOSO, P. M. (2005). O direito à moradia no Brasil. São Paulo, Instituto Pólis.).
  • 2
    Para entender a interferência do modelo capitalista de produção do espaço urbano com o problema de pesquisa, faz-se necessária a explicação do “falso problema” da habitação que perpetua (in)soluções habitacionais. Para tanto, trouxemos a discussão para o contexto local: Bertol (2013)BERTOL, L. E. (2013). Terra e habitação: o problema e o falso problema. As políticas de obscurecimento do preço da terra na política habitacional de Curitiba. Dissertação de Mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo. analisou que em Curitiba, município sede da região metropolitana onde se localiza Almirante Tamandaré, “o problema habitacional não é intrínseco ao processo de crescimento populacional [...] como simples fruto de uma grande demanda populacional diante de uma pequena oferta habitacional ou de um rápido crescimento desordenado” (p. 147). Nessa formulação de problema, as contradições do espaço e do capital na urbanização e na relação capital-trabalho desaparecem. Diferentemente do que o falso problema leva a entender, o setor imobiliário curitibano está plenamente estruturado e tem sido capaz de produzir unidades habitacionais e de usar o espaço para valorizar o capital. A partir do momento em que o órgão público responsável pela política habitacional não questiona os processos que travam a produção de moradia popular, decorrentes da urbanização voltada a interesses de mercado, ele está comprometido com a produção desigual do espaço e com a perpetuação de falsos problemas e de (in)soluções. Bertol (ibid.) chama de (in)soluções as propostas de moradia popular que não objetivam “atuar ativamente ante agentes presentes na produção do espaço e na valorização imobiliária” (p. 149).
  • 3
    Segundo categorização proposta por Silva (2012)SILVA, M. N. (2012). A dinâmica de produção dos espaços informais de moradia e o processo de metropolização em Curitiba. Tese de Doutorado. Curitiba, Universidade Federal do Paraná., favelas são os espaços autoproduzidos pela população sem acesso à moradia formal, nos quais ela se torna um “agente modelador do espaço” (p. 121). Já os loteamentos irregulares ou clandestinos são parcelamentos do solo que apresentam diferentes graus de irregularidade, sendo o loteamento clandestino aquele executado sem autorização ou conhecimento do poder público; e o loteamento irregular o parcelamento que, embora aprovado pelo poder público, foi executado em desacordo com a legislação existente ou que não foi registrado em cartório após sua implantação.
  • 4
    A lei do plano diretor de Almirante Tamandaré foi revista e publicada em 2018 (lei complementar n. 77/2018). No entanto, até o momento finalização deste artigo, a revisão da lei de zoneamento de uso e ocupação do solo não havia sido publicada. Sendo assim, a lei municipal n. 9 002/2006 permanece em vigência nas análises.
  • 5
    O recorte da Figura 2 em relação aos limites do Município e do Aquífero está indicado na Figura 1.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Out 2019
  • Aceito
    15 Jan 2020
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