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Multissignificações do verbo pegar: transformações de esquemas imagéticos

Multiple senses of the verb pegar in Brazilian Portuguese: transformation of image schemas

RESUMO

Visando identificar se os sentidos do verbo pegar formam uma categoria radial face aos mecanismos sociocognitivos que os motivam, o presente artigo analisa suas ocorrências no corpus D&G do Rio de Janeiro. Primeiro verifica qual é a forma mais recorrente, suas possíveis variações e/ou regularidades por meio do software AntConc 3.5.8. Em seguida, as interpreta qualitativamente no contexto de uso e à luz dos conceitos de categoria radial (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), esquemas imagéticos, suas transformações e mapeamentos metafóricos e metonímicos (Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.; Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ). Foram encontrados seis grupos de sentido estruturados pelos esquemas MOVIMENTO-TRAJETÓRIA. As extensões derivam da metaforização do esquema OBJETO, das transformações de esquema e consequentes alterações de foco, assim como das metáforas e metonímias que os licenciam, engatilhadas por pistas linguístico-discursivas e contextuais. No centro prototípico encontra-se o pegar objetos em que TRAJETOR É CONTÊINER. Nas radiais mais periféricas, encontram-se o pegar ideias e o pegar orientacional em que IDEIAS SÃO OBJETOS e LOCAL DE CHEGADA É OBJETO, respectivamente. Dentre os sentidos, encadearam-se segurar, agredir, buscar, mover-se no discurso, conjecturar e seguir uma direção.

Palavras-chave:
polissemia; categoria radial; esquema imagético e transformações; verbo pegar

ABSTRACT

To verify if the senses of the verb pegar (‘to grasp’) in Brazilian Portuguese form a radial category motivated by sociocognitive mechanisms, this article analyzes its occurrences in the Discourse & Grammar corpus collected in Rio de Janeiro. First, it verifies which is the most recurrent form, variations and/or regularities of the verb with AntConc 3.5.8. Then, it qualitatively interprets each case in the light of context and concepts such as radial category (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), image-schema transformations, and metonymic and metaphorical mappings (Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.; Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ). Six groups of meanings were found, all of them structured by the MOVEMENT-PATH schemas. The extensions derive from the OBJECT schema metaphorization, schema transformations, and related changes in focus, as well as from metaphors and metonyms triggered by linguistic, discursive and contextual cues. The prototypical sense is ‘to hold objects’ (the TRAJECTOR IS A CONTAINER). The most peripheral senses are to have an idea and to move in a direction (IDEAS ARE OBJECTS and GOALS ARE LOCATIONS, respectively). The senses include ‘to hold’, ‘attack’, ‘pick up’, ‘move along discourse’, ‘speculate’, and ‘follow in a direction’.

Keywords:
polysemy; radial categories; image-schemas and transformations; verb to grasp

1.Introdução

Dentre os temas centrais da Linguística Cognitiva figura a polissemia, fenômeno que não só nos força a refletir sobre a âncora motivadora de dois ou mais sentidos de um mesmo item lexical, mas que também ilumina questões discursivas e socioculturais presentes nos processos de categorização. Inúmeros são os trabalhos que examinam a estrutura de categorias polissêmicas (e.g. Soares da Silva, 2003Soares da Silva, A. (2003). Image schemas and category coherence: The case of the Portuguese verb deixar. In H. Cuyckens, R. Dirven, & J.R. Taylor (Eds), Cognitive approaches to lexical semantics. Cognitive linguistics research vol. 23 (pp. 281-322). Mouton de Gruyter.; Bartóreo, 2010; Jansegers et al., 2015Jansegers, M., Vanderschueren, C., & Engels, R. (2015). The polysemy of the Spanish verb sentir: a behavioral profile analysis. Cognitive Linguistics, 26(3), 381- 421. https://doi.org/10.1515/COG-2014-0055.
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; Coelho, 2013Coelho, C. M. (2013). Construções com o verbo agarrar em português brasileiro e europeu. [Dissertação de mestrado]. Universidade Federal de Uberlândia. https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/15444/1/Carolina%20Medeiros.pdf.
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; Morotti, 2014Morotti, R. (2014). O emprego metafórico dos verbos de movimento: o ser humano pensando metaforicamente. Revista Linguagem Acadêmica, 4(1), 69-90.; Pinheiro, 2010Pinheiro, D. (2010). Homonímia, polissemia, vagueza: um estudo de caso em semântica lexical cognitiva. Revista Linguística , 6(2), 63-78. http://www.letras.ufrj.br/poslinguistica/revistalinguistica.
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). Este artigo tem propósito semelhante: examina as múltiplas significações do verbo pegar, como se relacionam e como se diferenciam dentro de uma abordagem sociocognitiva, que entende a cognição como fenômeno corporificado e socioculturalmente situado (Soares da Silva, 2018Soares da Silva, A. (2018). Polissemia na mente, na cultura e no discurso: para uma abordagem cognitiva mais dinâmica e contextualizada da individuação, relação e mudança de sentidos. In A. Almeida, & E. Santos (Eds.), Linguística cognitiva. Redes de conhecimento d’aquém e d’além mar (pp. 161-18). EDUFBA: Editora da Universidade Federal da Bahia.) “não apenas no contexto da mente, mas também no contexto da sociedade, da cultura ou da comunidade e no contexto da interação discursiva” (p. 175).

Com esse propósito, iniciamos discorrendo sobre os efeitos de prototipicidade nos processos de categorização (Geeraerts, 2006Geeraerts, D. (2006). Where does prototypicality come from? In D. Geeraerts (Ed.), Words and other wonders. Papers on lexical and semantic topics. Cognitive Linguistics Research vol. 33 (pp.27-47). Mouton de Gruyter. ; Soares da Silva, 2010Soares da Silva, A. (2010). Polissemia e contexto: o problema duro da diferenciação de sentidos. Estudos Linguísticos, 5, 353-367. http://fabricadesites.fcsh.unl.pt/clunl/wp-content/uploads/sites/12/2018/02/5z1-augusto-silva.pdf.
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; Lewandowka-Tomaszcyk, 2007Lewandowka-Tomaszczyk, B. (2007). Polysemy, prototypes, and radial categories. In D. Geeraerts, & H. Cuyckens (Eds.), The Oxford Handbook of Cognitive Linguistics (pp. 139-169). Oxford University Press.) e as relações da categoria central com suas subcategorias. “Sendo a polissemia um efeito da categorização com base em protótipos, os vários sentidos de uma forma estão organizados em rede” (Soares da Silva, p. 360), na qual um sentido tem maior peso do que o outro e alguns podem se sobrepor. Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. , p. 379) resume as características dessa rede do seguinte modo: (1) não possui uma única representação, já que as subcategorias (centrais e periféricas) têm constituição própria e não nos permitem antecipar seus atributos com base na categoria central, que tem maior peso; (2) todas as subcategorias são motivadas pelo membro central, o mais prototípico, e possuem atributos em comum, sem com isso serem variantes dele. Em outras palavras, as subcategorias funcionam como membros de uma família que se distinguem por atributos específicos (a cor dos olhos, tipo de cabelo, personalidade) herdados da subcategoria central. Mesmo que entre si não compartilhem nenhum atributo, compartilham semelhanças com a categoria central, o que os torna membros da categoria.

Para dar conta dos elos entre as subcategorias e a categoria central que as motiva, Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ) sinaliza a premência de uma teoria experiencialista, fundada em vivências físicas, sociais e culturais, e dos Modelos Cognitivos Idealizados (MCIs). Define tais modelos como estruturas cognitivas complexas, de caráter gestáltico, que organizam o conhecimento por meio de mapeamentos proposicionais, metafóricos, metonímicos e imagéticos. Dentre esses, o presente artigo dá destaque aos esquemas imagéticos e suas transformações.

2. Esquemas imagéticos

Conceitualmente, Johnson (2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press., p. 141)3 3 Image-schematic structure is the basis for our understanding of spatial terms and all aspects of our perception and motor activities (Johnson, 2007, p. 141). formaliza os aspectos relacionados à percepção e à atividade motora como uma série de esquemas imagéticos, que constituem a base de nosso entendimento: MOVIMENTO, TRAJETÓRIA, VERTICALIDADE, HORIZONTALIDADE, CIMA-BAIXO, DENTRO-FORA etc. Ao fazê-lo, o autor defende a organicidade do pensamento e do corpo assim como o papel da experiência na constituição do significado. Para ele, a origem do significado reside primeiro em nossas experiências sensório-motoras, nossos sentimentos e relações com o mundo; segundo, na nossa capacidade imaginativa, pois é por meio de processos sensório-motores que entendemos conceitos abstratos e espaciais. Novos sentidos são construídos a partir de experiências já vividas, permitindo que, como diz o autor, o velho dê lugar ao novo, sem necessariamente replicar o que já foi, mas sendo por ele motivado. Em outras palavras, um esquema imagético é “um padrão recorrente que emerge das interações do organismo com o seu meio”4 4 An image schema is a dynamic, recurring pattern of organism-environment interactions. As such, it will reveal itself in the contours of our basic sensorimotor experience (Johnson, 2007, p. 136). (p. 136). Deriva de relações de causalidade, temporalidade, padrões de parte-todo, localização ou relações espaciais e de orientação, estruturas agente-paciente, e relações instrumentais/funcionais entre suas partes constituintes, que podem incluir pessoas, eventos, estados, origens, destinos dentre outras.

Em termos de caracterização, o autor destaca duas propriedades dos esquemas: o número definido de partes relacionadas que os constituem e a flexibilidade, pois são esquemas que recorrem indefinidamente em eventos, percepções do mundo e manipulação de objetos. O resultado é que se tornam instrumentos chave na ordenação da experiência de modo a permitir que a compreendamos e raciocinemos sobre ela.

Por exemplo, são facilmente identificáveis ao subirmos ou descermos de elevador; brincarmos de pique esconde; atravessarmos uma rua ou estabelecermos ligação com as coisas e pessoas no mundo. Nosso entendimento dessas experiências envolve as noções de MOVIMENTO, HORIZONTALIDADE, VERTICALIDADE (cima-baixo), EQUILÍBRIO, FORÇA, DENTRO-FORA e outras como TRAJETÓRIA (origem-percurso-meta) e LIGAÇÃO, esquema que, como aponta Johnson (2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press.), experienciamos ainda no útero materno por meio do cordão umbilical que nos une a nossa mãe. Do mesmo modo, aprendemos no dia a dia que, entre uma sequência de ações originadas em determinado ponto e uma meta a ser atingida, traçamos uma TRAJETÓRIA ao longo da qual há obstáculos passíveis ou não de serem superados. Tais obstáculos podem causar a interrupção do movimento (CAUSA-EFEITO), pois há forças que nos impelem para frente assim como outras que podem bloquear o movimento, permitindo que experienciemos FORÇAS DINÂMICAS (Talmy, 1988Talmy, L. (1988). Force dynamics in language and cognition. Cognitive Science, 12, 49-100. https://doi.org/10.1207/s15516709cog1201_2.
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) como COMPULSÃO, ATRAÇÃO e BLOQUEIO, dentre outras.

Destacamos em especial o esquema de CONTÊINER por se relacionar com a análise da categoria pegar, ora em tela. Desde muito cedo interagimos com mamadeiras, canecas e uma variedade de contêineres que nos permitem aprender a lógica das relações de continência. Um contêiner, por característica, é uma estrutura qualquer que delimita uma região no espaço e que funciona como fronteira entre o interior e o exterior. A caneca, por exemplo, impede que o líquido que está dentro se mova para o exterior. Se a deixarmos cair (esquemas de VERTICALIDADE, CIMA-BAIXO, FORÇA), o líquido se espalha e não mais poderemos dele desfrutar. Uma criança de 3 anos já se deu conta dessas relações, pois usa contêineres variados para se alimentar; brinca de encaixar formas maiores em formas menores; usa contêineres distintos para funções específicas. E por inferência, em seus primeiros anos, alterna entre CONTÊINERES e suas funções, em contínua experimentação com as partes e relações desse esquema. É na experiência cotidiana que a maioria dos esquemas imagéticos se consubstanciam, e que a lógica de suas partes é disponibilizada para ser recrutada em outras situações, materializando assim nossa capacidade imaginativa e organizando a conceptualização abstrata e o raciocínio. Ao resumir o conceito, Johnson (2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press., p. 144) elenca os seguintes atributos:

  1. são padrões recorrentes e estáveis que emergem da experiência sensório-motora;

  2. possuem natureza imagética, pois preservam a estrutura topológica do TODO percebido na experiência cotidiana;

  3. operam dinamicamente em um determinado momento e através do tempo;

  4. conjugam corpo e mente;

  5. são predicados na interação com o meio e materializados como padrões de ativação em mapas topológicos de redes neurais;

  6. unem experiências sensório-motoras à conceptualização e à linguagem;

  7. possuem uma estrutura interna definida e simples, que possibilita inferências constrangidas pela própria estrutura do esquema.

Ou seja, desempenham um papel fundamental na significação, pois encontram-se na base de todas as formas de interação simbólica, inclusive da linguagem, do raciocínio abstrato e dos processos inferenciais.

Transformações de esquema

Para Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. , p. 440), as transformações de esquemas imagéticos são as responsáveis pela formação de categorias radiais e, consequentemente, pela polissemia. Segundo ele, é comum palavras estruturadas conceptualmente pelo esquema TRAJETÓRIA também o serem por um esquema correspondente que é FOCO NO MARCO DA TRAJETÓRIA. Exemplifica com o caso da preposição OVER, em inglês5 5 Exemplos de Lakoff (1987), p. 440. . No enunciado “Sam walked over the hill ” [Sam caminhou pela colina] temos o esquema TRAJETÓRIA; já no enunciado “Sam lives over the hill ” [Sam mora na colina] temos o FOCO NO MARCO, a colina. Como essas transformações são operações não proposicionais, que acontecem em um nível superior de abstração, são motivadas principalmente por nossa experiência visual e cinética. Continuamente, no nosso cotidiano, nos vemos impelidos a realizá-las, transformando subsequentemente esquemas para dar conta da significação; por exemplo:

  1. FOCO NA TRAJETÓRIA-FOCO NO MARCO. Ao seguirmos a trajetória de um objeto em movimento e na sequência alterarmos o foco para o destino, ponto esse em que o objeto cessa por completo o movimento, o FOCO na TRAJETÓRIA transforma-se em foco no ponto de chegada, o MARCO.

  2. MOVIMENTO-TRAJETÓRIA: ao percebermos um objeto em movimento contínuo, podemos mentalmente traçar a trajetória que ele já atravessou ou que está por atravessar.

Nesses e em outros casos de transformações de esquemas, exercitamos a habilidade de mudar o foco ou manipularmos a assimetria figura-fundo na construção da cena de acordo com uma perspectiva particular (Evans & Green, 2006). São inúmeras as evidências nesse sentido (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. , cap. 5; Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press., p.21-40). Não é então sem razão que utilizamos as transformações de esquemas imagéticos recorrentemente como padrão de identificação e compreensão de um número interminável de experiências.

Johnson (1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press., p.32-37) exemplifica o processo com os usos da preposição OUT em inglês, dos quais destacamos:

  1. John went out of the room. [John saiu da sala]

  2. Pour out the beans. [Despeje o feijão]

  3. Write out your ideas. [Escreva suas ideias]

  4. He squeezed out some toothpaste. [Ele espremeu um pouco de pasta de dente]

Segundo o autor, há uma orientação espacial básica entre objetos, pessoas, substâncias, nos exemplos. O padrão MOVIMENTO para fora de uma região delimitada no espaço se repete, seja em John se movendo para fora da sala ou a pasta de dente se movendo para fora do tubo plástico. No entanto, a ação de SE MOVER é distinta em cada caso, mesmo que entre eles permaneça alguma semelhança. É o nosso corpo que funciona como ponto de referência, enquanto os outros participantes orientam-se no espaço em relação a ele. Tanto é que pode funcionar como TRAJETOR, fato que se dá em (a) ou como CONTÊINER, fato que se dá em (c) - as ideias saem da cabeça e vão para o papel no ato de escrever. Ou seja, o corpo pode ser ‘a coisa contida em’ ou o ‘contêiner.’

Ações que geram transformação de esquemas podem ser físicas ou metafóricas, posto que as projeções metafóricas potencialmente constituem elos entre diferentes sentidos de um mesmo termo. Por exemplo, em Tell me your story again, but leave out the minor details [conte-me sua história de novo, mas deixe de lado os detalhes]6 6 Johnson (1987), p. 34. , o EVENTO história é conceptualizado como CONTÊINER, já que os detalhes deveriam ficar FORA da história (DENTRO-FORA). Ou seja, o esquema prototípico da preposição OUT que se aplica à orientação espacial é metaforicamente projetado em um domínio cognitivo7 7 Radden & Dirven (2007, p. 11) definem domínio conceptual como “campos gerais da conceptualização nos quais uma categoria se encaixa em uma dada situação. Por exemplo, uma faca pertence ao domínio de ‘comer’ se for usada para cortar pão na hora do café, mas ao domínio de ‘agressão’ se for usada como arma.” Alguns exemplos incluem EMOÇÃO, ESPORTES, VIAJAR e até mesmo conceitos complexos como EVENTO (Langacker, 1987, p.147). em que há processos tais como escolher os detalhes que entram e os que ficam de fora, as partes a destacar, todos ações mentais contidas no domínio EVENTO. A ligação entre os conceitos e esquemas (EVENTO é CONTÊINER) é operada graças ao esquema imagético LIGAÇÃO, que motiva as analogias e a seleção dos detalhes que entram na história.

Padrões inferenciais

Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), Johnson (2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press.; 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.) e Brugman (1988Brugman, C. (1988). The story of over: polysemy, semantics and the structure of the lexicon. [Tese de doutorado]. Universidade da Califórnia, Berkeley. Outstanding dissertations in linguistics series. Garland. ) discutem extensivamente o papel dos padrões inferenciais na transformação de esquemas e na significação. Segundo eles, se todo esquema imagético tem partes constituintes definidas e relacionadas entre si, essa estrutura interna constrange as inferências possíveis e, consequentemente, constrange também o raciocínio de vários modos.

Metaforicamente, compreendemos o processo de raciocínio como uma forma de MOVIMENTO ao longo de uma TRAJETÓRIA (Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press., p.113). Isso é possível porque as partes constituintes do esquema TRAJETÓRIA permitem a inferência e o consequente mapeamento do domínio fonte (espacial) para o domínio alvo (mental). Essas partes incluem: origem ou fonte; um objetivo ou destino; e uma sequência de pontos no espaço (físico ou mental) que ligam a origem ao destino, o MARCO. A estrutura interna do esquema TRAJETÓRIA possibilita várias projeções metafóricas entre domínios mais concretos para domínios mais abstratos. Nessa linha de pensamento, as proposições em um argumento são locais ou pontos no espaço (ESTADOS SÃO LOCAIS) que se ligam em direção à conclusão, o local de destino. Sustentar uma proposição, então, é estar localizado em um ponto deste percurso, o que ancora cognitivamente proferimentos como “Você não tem elementos para chegar a essa conclusão”. Por inferência, sustentar um argumento é estar em um determinado local. Se negarmos o argumento, nos colocamos fora do espaço delimitado pelo argumento. Há aqui a transformação do esquema TRAJETÓRIA em CONTÊINER, pois se sustentar um argumento é estar em um determinado local, ou estamos dentro ou fora desse local ou espaço. Tal estrutura inferencial é preservada nas projeções metafóricas dos esquemas TRAJETÓRIA e CONTÊINER.

À luz dessas considerações, este artigo analisa os usos do verbo pegar no corpus D&G da cidade do Rio de Janeiro, gravado e transcrito pelo Grupo de Estudos Funcionalistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, visando entender os possíveis sentidos por ele instanciados e os mecanismos sociocognitivos que os licenciam.

3. Histórias do verbo pegar

Poucos foram os estudos que investigaram a rede polissêmica do verbo pegar à luz da Linguística Cognitiva (Sigiliano, 2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.; Leite, 2011Leite, A. (2011). Um estudo sincrônico do verbo pegar. Cadernos de Estudos Linguísticos da Universidade Federal do Ceará, 3(1), 33-46. https://issuu.com/funcionalismo.em.perspectiva/docs/funcionalismo_em_perspectiva_3.
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; Silva, 2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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). Que motivação atravessa os usos cotidianos desse verbo? Que tipo de relações pegar pode evocar em contextos de uso? Tanto os estudos de Sigiliano e de Silva quanto o nosso olhar para o corpus D&G do Rio de Janeiro parecem sinalizar que há uma rede de sentidos motivada por um esquema imagético básico e a partir dele, subsequentes transformações que resultam em mudança de FOCO.

Sigiliano (2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.) foi uma das primeiras a pontuar a presença da noção de MOVIMENTO em todas as funções do verbo pegar: verbo pleno, introdutor de discurso reportado ou de verbos de ação, marcador de aspecto inceptivo e/ou interativo. A autora investigou os usos do verbo pegar na fala mineira, na cidade de Ibitipoca e em audiências do PROCON, em Juiz de Fora. Demonstrou que MOVIMENTO se transforma em CONTÊINER (Tabela 1), pois o esquema CONTÊINER perpassa os usos em seu corpus. Ou seja, os usos de pegar são também motivados pela “relação tátil do falante, própria de sua constituição corpórea, com os objetos e com os eventos do mundo” (Silva, 2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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, p.309). Tal relação tátil pode ser explicada pela base experiencial que constitui nossa organização conceptual, unindo linguagem, corpo e cognição.

Tabela 1
O esquema CONTÊINER em usos de pegar

Sigiliano (2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.) defende ainda que no caso do pegar discursivo as noções de MOVIMENTO e MUDANÇA encontram-se presentes. Silva (2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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) chega à conclusão semelhante, em estudo qualiquantitativo sobre construções idiomáticas com o verbo. Salienta que pegar “pressupõe, em seus sentidos mais básicos, o corpo” e que “esses sentidos, funcionalmente integrados com outros domínios, vão se abstraindo, apesar de sempre manterem a noção de movimento, que é própria do corpo humano” (p. 322). Apesar de as construções idiomáticas (“...e a gente tem que se pegar com Deus...cada vez mais”; “acho que eles não deveriam assim pegar muito no pé dos alunos sem saber da vida deles...”) do D&G fugirem do escopo do presente artigo, interessa-nos particularmente a construção pegar + meio de transporte (“pegô o trem de ferro”).

Segundo Silva (2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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), trata-se de uma construção metafórica: o MOVIMENTO do agente envolve o corpo todo, e é impossível segurar o trem com as mãos. Apesar disso, a construção ainda possui composicionalidade, pois as partes conservam os significados originais, conferindo à expressão baixo grau de opacidade. Ou seja, há idiomaticidade no uso da expressão, comprovada pela possível substituição de trem, por ônibus, metrô, etc. Há ainda uma metáfora a partir do esquema CONTÊINER, posto que A (nós) se movimenta até B (o trem de ferro) e nele se insere. Silva (2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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) explica ainda o uso de “pegar com Deus” como consequência da relação de proximidade entre (A) e (B) na esperança de que (B), Deus, possa transformar o estado de A.

Para verificar a idiomaticidade da expressão, o autor substitui a expressão por um elemento semelhante. Assim, dizemos “pegando com Jesus”, “pegando com a Virgem Maria” etc. - a construção é produtiva. Ao contrário, “segurando com Deus”, “agarrando com Deus”, “apalpando com Deus” não apresenta igual produtividade. Como o verbo pegar não demonstra flexibilidade, só o elemento (B) à direita do sintagma construcional, há a metaforização do verbo. “A variabilidade de significados do verbo pegar, associado a outros elementos linguísticos, é prova de que o verbo foi submetido a ‘mutações’ de significado, ao ser amplamente utilizado no meio sociocultural” (Silva, 2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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, p.322).

Consequentemente, conjecturamos que o verbo pegar no corpus D&G possa igualmente evocar múltiplos sentidos, com diferentes graus de representatividade e variadas interpretações, formando uma categoria complexa ou rede de radiais. Nessa categoria, antecipamos haver domínios convergentes e extensões periféricas motivadas pelos esquemas MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, sua transformação em CONTÊINER, mapeamentos metafóricos e metonímicos. Da mesma forma, esperamos encontrar sentidos específicos de contextos particulares, consoante à proposta de Soares da Silva (2003Soares da Silva, A. (2003). Image schemas and category coherence: The case of the Portuguese verb deixar. In H. Cuyckens, R. Dirven, & J.R. Taylor (Eds), Cognitive approaches to lexical semantics. Cognitive linguistics research vol. 23 (pp. 281-322). Mouton de Gruyter.) e de Silva (2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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), assim como de outros autores que defendem o papel do contexto na significação (Kövesces, 2020Kövesces, Z. (2020). Extended conceptual metaphor theory. Cambridge University Press. ). Por fim, conjecturamos serem os sentidos do verbo encadeados dos mais concretos para os mais abstratos (Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.; Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ; Silva, 2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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).

4. O estudo

Resultado da releitura da dissertação de mestrado de Secundino (2018Secundino, T.G. (2018). Delírios do verbo pegar: transformações de esquemas em corpora de língua falada e escrita. [Dissertação de mestrado em linguística]. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. https://www.bdtd.uerj.br:8443/handle/1/6214.
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)8 8 Os dados foram reanalisados e os resultados reelaborados. , este estudo analisa os dados da língua falada e escrita encontrados no corpus D&G do Rio de Janeiro (http://www.discursoegramatica.letras.ufrj.br/), gravado e transcrito pelo Grupo de Estudos Funcionalistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na década de 90. Dentre os objetivos do Grupo figuram a análise da iconicidade em situações reais de uso da língua e a comparação entre as modalidades escrita e falada em diferentes gêneros/tipos textuais em cinco cidades do Brasil: Natal, Juiz de Fora, Rio Grande, Niterói e Rio de Janeiro.

O corpus do Rio de Janeiro é o aqui analisado. Combina relatos de procedimentos, relatos de opinião, narrativas pessoais e narrativas recontadas de 93 alunos do ensino superior, médio, fundamental e alfabetização (antigo CA), nas modalidades escrita e oral. Soma um total de 147.802 palavras, caracterizando-se como um corpus de pequeno-médio porte (Sardinha, 2004Sardinha, T.B. (2004). Linguística de corpus. Manole.).

Visa-se nele investigar os sentidos do verbo pegar, verificar se formam uma categoria radial e que mecanismos sociocognitivos os motivam. Para esse fim, a sequência de procedimentos metodológicos incluiu a análise quantitativa das ocorrências de pegar (incluindo flexões e derivações) por meio do AntConc 3.5.8 (http://www.laurenceanthony.net/software.html), seguida de análise qualitativa. Enquanto a análise quantitativa permitiu a contabilização da frequência com que a construção ocorre no corpus e as suas formas mais recorrentes, a análise qualitativa agregou considerações sobre o cotexto e o contexto de ocorrência do verbo, por meio do estudo dos colocados gerados pelo AntConc 3.5.8 (5 colocados anteriores e 5 colocados posteriores), da situação discursiva e de aspectos contextuais. Essas ações possibilitaram o agrupamento das ocorrências em grupos de sentido e a consequente reflexão sobre as possíveis relações de semelhança e diferença entre eles, assim como sobre as motivações sociocognitivas responsáveis pela possível formação de uma rede de sentidos. Para tal, os conceitos de categoria radial, esquema imagético, suas transformações e padrões inferenciais, assim como aspectos socioculturais e discursivos foram considerados.

5. Análise e discussão

A Tabela 2 ilustra as formas mais recorrentes do verbo pegar no corpus. Setenta por cento de suas 413 ocorrências se deu na modalidade oral, o que evidencia uma probabilidade maior de ocorrência do verbo nessa modalidade. Dentre as 413 ocorrências, ‘pega’ (presente do indicativo; 3p.sg.) e ‘pegou’ (pretérito imperfeito do indicativo; 3p.sg.) foram as mais frequentes, seguidas imediatamente por ‘pegar’ (infinitivo), ‘pego’ (presente do indicativo, 1psg.) e ‘peguei’ (pretérito imperfeito do indicativo, 1p.sg.).

Tabela 2
Formas mais recorrentes de pegar no corpus D&G Rio de Janeiro

Se tomarmos o aspecto verbal9 9 Aspecto é uma categoria verbal de TEMPO, não dêitica, através da qual se marca a duração da situação e/ou suas fases, sendo que estas podem ser consideradas sob diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o do completamento e o da realização da situação (Travaglia, 1985, p. 53). como fator, a forma mais recorrente (‘pega’) sinaliza repetição de processo (iteração). Em geral, os entrevistados usaram a forma para se referirem às sequências de um procedimento (uma receita, por exemplo). Então, a representatividade de ‘pega’ no corpus relaciona-se ao gênero textual ‘relato de procedimentos’. O mesmo acontece com a forma ‘pegou’, a segunda mais recorrente. Houve alta frequência da forma em relatos de experiência e narrativas recontadas. No primeiro gênero, os participantes narravam fatos que julgassem interessantes sobre outra pessoa e, no segundo, organizavam suas próprias vivências discursivamente, o que explica a forma ‘peguei’ também ter aparecido múltiplas vezes. Já nos relatos de opinião, gênero no qual o informante expunha sua opinião sobre assuntos livres (política, saúde, educação), a forma mais utilizada foi “pegar”, visando referendar situações hipotéticas (“se pegar um prédio velho e reformar...”; “poderia pegar...”).

Cabe ainda observar a relativa frequência (n=31) do pegar discursivo (“pegou + e + V2) tanto em relatos orais quanto nos escritos (“...ele pegou e saiu com ela...ficou com ela...” e “então meu pai pegou e foi embora com o carro”, respectivamente). Ocorrências como “pegou e disse”, “pegou e levou”, “pegou e morreu” são usos que realçam a ideia de movimento dentro da própria narrativa, perfilando o desfecho da história ou aquilo que o participante julga importante permanecer no foco de atenção do interlocutor. Dados como esses sugerem que a escrita não está imune à mudança. Usos surgidos na oralidade podem entrar para a modalidade escrita, se manifestados com frequência continuada nas práticas sociais. Em outras palavras, podem se tornar regulares na escrita.

Conceptualmente, as ocorrências do verbo são estruturadas pelo esquema imagético OBJETO, que funciona como um esquema básico, ponto de referência para outras experiências físicas no espaço - MOVIMENTO-TRAJETÓRIA - que por sua vez se transformam nos esquemas CONTATO-FORÇA, CONTÊINER (Szwedeck, 2002Szwedeck, A. (2002). Objectification: From object perception to metaphor creation. In K. Lewandowska-Tomaszczyk, & K. Turewicz (Eds.), Cognitive linguistics today (pp. 159-175). Peter Lang.; Szwedeck, 2011Szwedeck, A. (2011). The ultimate source domain. Review of Cognitive Linguistics , 9(2), 341-366. https://doi.org/10.1075/rcl.9.2.01szw.
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), em domínios não espaciais. É o nosso conhecimento esquemático associado ao OBJETO que guia os padrões inferenciais (sua estrutura interna associada a valores contextualmente determinados). As diferentes facetas do esquema arquétipo (OBJETO) são iluminadas pelos esquemas MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, cujas transformações motivam os variados sentidos do verbo ao perfilar diferentes pontos na TRAJETÓRIA. São essas facetas que agora passamos a ilustrar, na ordem em que foram mais comumente encontradas no corpus.

Grupo 1: pegar OBJETOS

No primeiro exemplo das cenas do grupo 1, um relato de experiência em sala de aula, as mãos do TRAJETOR (ele) se movem na direção da caneta, traçando uma TRAJETÓRIA cujo MARCO é a caneta. Ao estabelecer CONTATO com o alvo, transforma-se em CONTÊINER e exerce ligeira FORÇA para contê-lo. Ou seja, as mãos do TRAJETOR metonimicamente o representam (PARTE-TODO), assim como representam o poder de controle que ele exerce sobre o objeto (CONTROLADOR-CONTROLADO). O foco recai sobre o ato de conter o OBJETO, alvo do interesse do deslocamento. Dentre os atributos desse OBJETO encontram-se ser percebido via visão e/ou tato, ser inanimado, manipulável pelas mãos, passível de ser deslocado e ocupar um lugar no espaço. Em outras palavras, é uma entidade física, que pende para a concretude. Relações semelhantes acontecem nos outros casos do grupo, inclusive em narrativas escritas. Por exemplo, em um domínio de assalto, a mão do assaltante exerce a função de se apropriar de bens alheios. O contexto discursivo e social nos permite deduzir que há FORÇA mais intensa no CONTATO do TRAJETOR com o alvo, e que há CONTRAFORÇA, já que a reação contrária é explicitada no discurso.

Como o deslocamento do TRAJETOR sobre uma TRAJETÓRIA implica em mobilização e dispêndio de energia no seu CONTATO com o OBJETO, o esquema FORÇA será instanciado (em maior ou menor grau), sempre que houver interação entre TRAJETOR e OBJETO. Seu grau é que variará dependendo da finalidade da ação e das relações de CAUSA-EFEITO explícitas ou implícitas no discurso e/ou contexto. No caso dos OBJETOS do grupo 1, alguma FORÇA é necessária para que se dê a relação de continência (as mãos conterem os utensílios, por exemplo). Usos físicos/espaciais relacionados à manipulação de líquidos ou objetos funcionais (‘aí a gente pega essa nata... coloca pra ferver’ ou ‘você pega lama, molha com água’) requerem menor força do que a apropriação de bens alheios no domínio de assalto e não envolvem CONTRAFORÇA.

Em todos os casos classificados neste grupo, a mente e o corpo-em-ação dos alunos-narradores interagem com o ambiente físico e social e têm papel constitutivo na categorização do verbo pegar (Johnson, 2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press.). Esse uso é motivado pela transformação do esquema TRAJETÓRIA em CONTATO-FORÇA, CONTÊINER e pelos aspectos contextuais acima referidos.

Cenas do Grupo 1: pegar objetos

Ele pegou a caneta e deu uma espetada no braço do garoto que estava sentado na minha frente, e jogou a caneta no meu colo. (narrativa escrita de experiência pessoal)

Pega a cebola...pica bem...pega a salsinha...que eu adoro...lava...pica bem a salisanha...pega um pouco daquele::chamado alho com::um pouco do sal...que virou o chamado salho...não esses comprados feitos...eu falo salho porque eu estou dando uma referência ...(relato oral de procedimento)

Eles atacaram pegando tudo de valor mas uma das três garota reagiu e não entregou nada nessa confusão duas conseguiram fugir e outra foi linchada... (narrativa escrita de experiência pessoal)

Embora a presença cotidiana de objetos por toda a parte nos leve a ignorar sua participação em interações que envolvem outros esquemas (Johnson, 1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.), as colocações lexicais (‘peguei o cheque’, ‘pego todo o material’, ‘pegou o bife’, ‘pegamos o ovo’ dentre várias outras) e a situação discursiva corroboram não só a transformação dos esquemas MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO-FORÇA, CONTÊINER, mas também o papel precursor do OBJETO (Szwedeck, 2011Szwedeck, A. (2011). The ultimate source domain. Review of Cognitive Linguistics , 9(2), 341-366. https://doi.org/10.1075/rcl.9.2.01szw.
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; 2002Szwedeck, A. (2002). Objectification: From object perception to metaphor creation. In K. Lewandowska-Tomaszczyk, & K. Turewicz (Eds.), Cognitive linguistics today (pp. 159-175). Peter Lang.). O TRAJETOR só se desloca porque tem interesse no alvo, o OBJETO. O interesse decorre de questões contextuais (Kövesces, 2020Kövesces, Z. (2020). Extended conceptual metaphor theory. Cambridge University Press. ), iluminadas pelo discurso (divertir-se ao culpar outro colega por um ato escuso, por exemplo).

Johnson (1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.), Lakoff e Turner (1989Lakoff, G., & Turner, M. (1989). More than cool reason: A field guide to poetic metaphor. The University of Chicago Press.) e Lakoff (1993Lakoff, G. (1993). The contemporary theory of metaphor. In A. Ortony (Ed.), Metaphor and thought (pp. 202-251). 2nd ed. Cambridge University Press.) já haviam sublinhado o papel do esquema OBJETO como o precursor de outros. Segundo Lakoff, temos detectores de movimento e localização de objetos no espaço, visando sua manipulação e subsequente conceptualização da estrutura interna de eventos em termos de MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO-CONTÊINER. Os casos de pegar nas cenas do grupo 1 recrutam essa lógica. É o sentido mais frequente (n=274), constituindo-se naquele que emerge como o mais central e que servirá de âncora para inferências e generalizações sobre a categoria, a cada nova situação discursiva - o pegar prototípico.

Grupo 2: pegar seres animados

As cenas do grupo 2 têm sua origem nas cenas espaciais do Grupo 1, com as quais estabelecemos conexões à luz de nossa experiência socioculturalmente situada. Dado que o alvo do deslocamento no espaço envolve seres humanos e animais, denominamos o grupo de pegar seres animados. Com frequência intermediária-baixa (n=65), casos nesse grupo são licenciados pela metáfora conceptual SERES ANIMADOS SÃO OBJETOS (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), em que o esquema OBJETO é a fonte da metaforização. Compartilha semelhanças parciais com o Grupo 1, pois o TRAJETOR se move até o MARCO e com ele estabelece CONTATO. No entanto, o MARCO é um ser animado, a transformação CONTATO-FORÇA, CONTÊINER envolve parâmetros situacionais, e o modo como o MARCO é contido encapsula os efeitos do grau da FORÇA, em contextos de briga, acidente e prisão de bandidos. Ou seja, há efeitos de prototipicidade dentro do próprio grupo, o que nos levou a subdividi-lo em quatro (2a, 2b, 2c e 2d), de acordo com a frequência, os contextos e os parâmetros envolvidos.

Grupo 2a. As cenas do Grupo 2a em contextos de acidente, captura de bandidos pela polícia, briga e ferimento a tiro, ativam todo o nosso conhecimento culturalmente compartilhado sobre as situações narradas. Nos casos aqui classificados (n=30), há um TRAJETOR (o carro, a patrulha, o tiro, os oponentes em briga) que se desloca até um alvo (o melhor colega, uma pessoa do sexo feminino, os dois bandidos, a perna do amigo, uma pessoa do sexo masculino, as entidades localizadas) e estabelece CONTATO violento contra o alvo, em sequências causais de FORÇA intensa. É a subcategoria mais representativa do grupo 2.

O MARCO é objetificado ao ser conceptualizado como uma região delimitada do espaço (LOCAL), atingida pelo TRAJETOR com FORÇA violenta, e sofrer as consequências do impacto. A estrutura inclui a direção da FORÇA e o encadeamento de efeitos (CAUSAS SÃO FORÇAS). O foco de atenção recai sobre o resultado da ação que compõe a estrutura de causalidade, implícita ou explícita no contexto. Desse modo, ‘atravessar a rua’, ‘avançar o sinal’ são ações que funcionam como causas (pano de fundo) do atropelamento, no primeiro exemplo abaixo. Um dos agentes é o ‘carro’, o TRAJETOR, que atinge o melhor amigo do narrador. A lógica nos permite inferir igualmente que o corpo humano enquanto MARCO É CONTÊINER, pois absorve o impacto. Já no segundo exemplo, o efeito da FORÇA dos policiais fica implícito no contexto (captura de bandidos). No entanto, nosso conhecimento compartilhado nos permite inferir ser a prisão dos bandidos o resultado.

Cenas do Grupo 2a: pegar seres animados com força violenta

Uma vez um colega meu da 1ª série me contou que quando um colega meu um grande amigo meu e ele e o meu outro colega estavam indo atravessar a rua e um carro que avançou o sinal e pegou em cheio no meu melhor colega e ai levaram ele ao hospital... (escrita, narrativa recontada)

Nessa altura alguém chamou a patrulha que chegou rapidamente e conseguiu pegar os dois bandidos... (escrita, narrativa recontada)

Daqui a pouco veio um/dois caras lá...que...e começou a dar tiro... e um tiro...pegou na perna do amigo dela...e ela achou isso muito triste... (fala, narrativa recontada).

As ocorrências de pegar em cenas de briga são expressivas (n=20) e constituem a maioria do grupo 2a. Incluem cotextos tais como ‘um monte de moleque para pegar ele... pegaram e o machucaram’, ‘aí os garotos mandaram ele nunca mais subir lá...porque senão eles iam pegar ele...na porrada...’ etc. São cenas aparentemente recorrentes no cotidiano dos envolvidos, que regularizam o uso de ‘pegar’ na acepção de ‘bater’ ou ‘agredir’. Nem sempre é explícito o modo de o TRAJETOR (um indivíduo) exercer a FORÇA ou o poder para controlar o MARCO (com socos, pauladas etc.); muitas vezes fica implícito no contexto (‘pegar ele... pegaram e o machucaram’) assim como a própria existência de CONTRAFORÇA, comum em contextos de briga. Em decorrência, muitas vezes há BLOQUEIO, minimizando ou evitando a transformação do CONTATO-FORÇA em CONTÊINER. Conceptualiza-se apenas a aproximação bidirecional ao corpo do outro e ataque, em uma associação metonímica entre contato corporal e agressão física. Como ambos os oponentes se deslocam na direção do outro, ambos podem funcionar como TRAJETOR e CONTÊINER.

No corpus, há também algumas cenas de histórias imaginadas: ‘o saci apareceu e pegou ela’ ou ‘o lobo pegou ele...e comeu toda a comida’. Padrões inferenciais semelhantes são ativados pelo conhecimento compartilhado sobre ataques de animais a seres humanos, sendo que o TRAJETOR é um animal que impinge FORÇA ao morder/atacar o MARCO (um indivíduo). Outras vezes, é o TRAJETOR que se transforma em CONTÊINER ao controlar o alvo (‘o lobo comeu toda a comida’). Ou seja, no Grupo 2a, o sentido de pegar é estruturado pelos esquemas imagéticos OBJETO, MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO-FORÇA, podendo ou não haver LIGAÇÃO com o esquema CONTÊINER.

Grupo 2b. Neste grupo, partes do corpo humano fazem CONTATO com o MARCO (seres animados) e se transformam em CONTÊINER (‘eu peguei um passarinho...cuidei dele’) exercendo FORÇA mínima para conter o alvo. Nas duas cenas de socorro que se seguem, as mãos do narrador contêm o passarinho, e os braços do pai o corpo da mãe do narrador (os MARCOS), respectivamente. Mãos e braços funcionam como CONTÊINERES e são perspectivados como PARTES em uma relação de contiguidade que evidencia o poder de ajudar um outro ser humano (PARTE-TODO; CONTROLADOR-CONTROLADO). O foco de atenção recai sobre ação de conter o MARCO. São casos (n=24) em que, mais uma vez, evidencia-se a hipótese da corporificação da mente (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ).

Cenas do Grupo 2b: pegar seres animados visando ajudar

...e teve um dia lá que eu peguei um passarinho... um filhotinho...né? Ele estava com ferida no bico...né? Acho que acertaram algum pedra... aí a gente eu peguei ele...cuidei dele...(fala, narrativa recontada)

‘quando chegou perto de casa...ela caiu no chão...e aí...meu pai pegou ela ... levou ela até em casa no colo’ (fala, narrativa recontada)

Já em ‘aí veio uma onda...ela me pegou...começou a me levar pro fundo...’, o TRAJETOR é uma onda. A ela é atribuída a capacidade humana de se deslocar no espaço e de possuir membros que possam conter um ser humano, por meio da projeção de partes do domínio fonte (seres humanos) sobre o domínio alvo (onda). Essa personificação é licenciada pela metáfora ONDAS SÃO SERES HUMANOS.

...aí veio uma onda...ela me pegou...começou a me levar pro fundo...aí minha mãe viu e começou a ...a me/ a tentar ir pra lá que ela não sabe nadar direito...engoli muita água...(fala, narrativa recontada)

Grupo 2c. Nas cenas do Grupo 2c (n=7), o CONTATO entre o TRAJETOR e o MARCO é causado por outros eventos (CAUSAS SÃO FORÇAS) e gera efeitos pragmáticos como cumprir uma missão profissional, social ou moral. Nele incluímos usos de pegar em colocações lexicais tais como ‘...a empresa mandou que...me pegassem...levassem pra uma delegacia’, ‘...aí ela pegou ele e levou pra terra...’. O MARCO ou entidade localizada (OBJETO) é retirado de um CONTÊINER (a casa, o orfanato, o mar) para ser deslocado até outro CONTÊINER (a delegacia, a casa do narrador, a areia da praia) visando outra ação ou objetivo. Ou seja, aqui a objetificação do MARCO motiva dois cursos de MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO-CONTÊINER, que se sobrepõem, dando proeminência ao propósito da ação de pegar e não à ação de pegar em si, que compõe a estrutura de causalidade.

Essa especificidade de sentido emerge de contextos específicos, como os exemplificados abaixo. Nós temos acesso a ela pela experiência e cultura, que alimentam a significação. Em ‘pegou no orfanato’, o TRAJETOR (o narrador) se desloca e faz CONTATO com o MARCO (crianças pobres) visando provocar mudança no seu status de pobreza. ‘Pobreza’ atua como FORÇA causal da ação de pegar e do consequente efeito social e moral de prover melhor qualidade de vida. As ações-propósito expandem, elaboram a ação de pegar (‘para quirar’). Por isso, assumem o foco da atenção.

Cenas do Grupo 2c: pegar seres animados com foco no propósito

o pai dela acha que ela pegou no ofanato para quirar (escrita, narrativa recontada)

Certo dia uma amiga minha pegou sua irmã e foi fazer umas compras na Tijuca... (escrita, narrativa recontada)

Ainda nesse subgrupo, encontram-se dois casos de pegar na acepção de ‘surpreender’ em cenas que evocam domínios de ações escusas ou moralmente indesejadas, na perspectiva dos narradores. Nesses casos, o deslocamento no espaço é empreendido pelo olhar, e o CONTATO com o alvo é visual, gerando o efeito de repreensão. Por exemplo, um dos narradores rememora ter surpreendido um amigo beijando outra mulher que não a noiva, pouco antes do casamento.

...quando foi a hora da cerimônia ( ) antes...isso um pouquinho antes...eu peguei beijando a...tal da menina...tá?... (fala, narrativa recontada)

Beijar outra menina que não a noiva pouco antes do casamento aparentemente cinde com representações de fidelidade que possam estar ligadas aos laços matrimoniais ou instituições socialmente estabelecidas, como o casamento, na perspectiva do conceptualizador. A proeminência do efeito da ação (reprimenda) é implicitada pelo ‘tá?’ e distingue esse uso dos anteriores.

Grupo 2d. Neste grupo, a situação discursiva evoca o domínio de relação amorosa contra o qual interpretamos o sentido do CONTATO físico. Em nossa sociedade, se ele existe, é para demonstrar afeto ou agredir ou porque há alto grau de intimidade corpórea entre os indivíduos. Pegar, nesses casos, sinaliza manter relações sexuais, ação sobre a qual recai o foco. Quatro foram as ocorrências no corpus. No exemplo, a narradora reconta um caso em que uma garota e o pai de uma outra mantinham um relacionamento amoroso. Só acessamos o sentido porque entrecruzamos os atores à luz do domínio de relação amorosa. O sentido de ‘manter relações sexuais’ emerge por força inferencial, à luz de como os padrões sociais e culturais contemporâneos organizam as atitudes sexuais e amorosas. Se por outro lado o domínio ativado fosse o de conversa entre pai e mãe, ‘peguei a Lúcia na festa’, o sentido seria de deslocamento até a festa para acompanhar a filha de volta para casa (2c).

Cenas do Grupo 2d: pegar relação amorosa

aí uma garota falou que vai bater ne::la por causa do mari/ porque ela quer pegar o pai dela...está pegando o pai...quase que mata a garota ((riso)) foi a maior confusão... (fala, narrativa recontada)

No domínio físico-espacial, os corpos dos atores discursivos se deslocam um em direção ao outro, sendo que suas partes representam a TRAJETÓRIA e o MARCO, um contendo o outro, em CONTATO físico/sexual que envolve a FORÇA da ATRAÇÃO de um pelo outro. O MOVIMENTO é bidirecional, pois ambos se deslocam, havendo duas TRAJETÓRIAS e algum grau de FORÇA sobrepostos. Uma possível explicação para a baixa ocorrência desse sentido no corpus talvez seja o período de geração do corpus, década de 90, tempo em que a liberação sexual da mulher e dos jovens de modo geral ainda se iniciavam.

Os usos do pegar no domínio de relacionamento amoroso, como acontecia com o verbo ficar, têm forte ligação com a duração do relacionamento amoroso (ver Ribeiro, 2004Ribeiro, R. P. (2004). A expansão de sentidos do verbo ficar e os mecanismos responsáveis pela organização cognitiva de suas significações. Revista Eletrônica do Instituto de Humanidades, 2(8). http://publicacoes.unigranrio.edu.br/index.php/reihm/article/view/437/429.
http://publicacoes.unigranrio.edu.br/ind...
, sobre o ficar). Atribuímos a diferença entre os usos de pegar e ficar ao modo como a pessoa se relaciona com o outro. O pegar coisifica a pessoa, ou seja, a trata como objeto (SERES ANIMADOS SÃO OBJETOS), diferentemente do ficar, que estabelecia uma relação mais humanizada e mais próxima ao que em décadas anteriores denominávamos de namoro.

Em resumo, as acepções no grupo 2 incluem o CONTATO com uso de FORÇA intensa para exercer controle e poder sobre o alvo (‘bater’, ‘agredir’, ‘ferir’); o CONTATO com relação de continência para acudir o alvo (‘cuidar’, ‘socorrer’); o deslocamento até o alvo para cumprir um propósito (ajudar) e o contato físico (sexual). Consubstanciam-se na experiência cotidiana, a partir da lógica que permeia os esquemas primários OBJETO, TRAJETÓRIA-CONTATO-FORÇA-CONTÊINER recrutados a cada situação discursiva e licenciados por mapeamentos metafóricos e metonímicos.

Grupo 3: pegar meios de transportes

As cenas do pegar meios de transporte (n=33) são ocorrências igualmente estruturadas pelos esquemas imagéticos MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO-FORÇA. No entanto, neste caso, os usos são licenciados pela metáfora primária MEIOS DE TRANSPORTE SÃO CONTÊINERES, pois o TRAJETOR (o sujeito discursivo) se move em direção a um meio de transporte (barca, trem, ônibus, carro), objeto que foge da escala das mãos ou dos braços, e é contido por ele, como em ele pegou um ônibus cheio’. Relação semelhante já fora reportada por Sigiliano (2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.).

Cenas do Grupo 3: pegar meios de transporte

...ele pegou um ônibus cheio...né? aí no momento que ele ia soltar do ônibus... tinha uma se/ uma senhora não...uma...mulher que devia...que devia ter uns trinta e poucos anos assim...ele disse...né? (fala, narrativa recontada)

Depois de muitas voltas eles acharam o caminho de volta, ainda a tempo de pegar a barca das 4:00H (escrita, narrativa recontada).

...aconteceu foi...onde é que eu trabalhava...eu trabalhava no centro da cidade...né? Então eu pegava trem...e eu peguei esse trem...era o Deodoro... (fala, narrativa recontada)

Ao estabelecer CONTATO com o meio de transporte (o MARCO), o agente exerce FORÇA de IMPULSO para completar a ação de entrar (DENTRO-FORA), e o MARCO se transforma em CONTÊINER. O corpo do sujeito discursivo (TRAJETOR) passa a ser a coisa contida. A proeminência recai sobre o CONTÊINER.

Dentre os colocados, encontramos ‘pegaram o meia vinte e dois’, ‘o carro pegou a gente e levou pro clube’, ‘ela pegou um taquis e foi para casa’, sendo que o meio de transporte mais recorrente foi ônibus (n=17), e os menos recorrentes foram o táxi e a barca. A menção ao número do ônibus (‘pegaram o meia vinte e dois’) em lugar do termo ônibus, instancia o papel da experiência na organização categorial, pois há aqui uma relação metonímica entre o número da linha e a categoria ônibus (PARTE-TODO).

Grupo 4: pegar discursivo

Já o pegar discursivo (n=31), presente em relatos escritos e orais de experiências pessoais, evoca uma estrutura de EVENTO, como explicaremos na sequência. No primeiro exemplo do grupo, o pai da narradora é um taxista. Portanto, a primeira menção de pegar ativa a acepção de ‘oferecer serviços de locomoção’ a um passageiro. Há o MOVIMENTO do táxi até o passageiro, com consequente CONTATO e transformação do taxi, o TRAJETOR, em CONTÊINER (grupo 3).

Cenas do Grupo 4: pegar discursivo

Meu pai num dia pegou um passageiro no aterro e o moço contou a ele que tinha sido assaltado no ônibus e que os assaltantes levaram o salário dele todo, pois ele tinha acabado de receber e obrigaram a ele a saltar do ônibus, ele então pediu meu pai que ultrapassa-se o ônibus, quando o meu pai conseguiu ultrapassar o ônibus ele queria que meu pai solta-se do carro e o ajuda-se a pegar os ladrões, meu pai disse que não ia e ele começou a receber santo dentro do carro, com isso meu pai deu-lhe um tapa e ele caiu para fora do carro, então meu pai pegou e foi embora com o carro. (escrita, relato de experiência)

...foi quando num dia ele...falou assim “ah...vamos dar um tempo...” eu “tudo bem...” uma semana depois...ele começou a dar em cima dessa minha amiga...ela chegou pra mim...falou pra/ falou o que estava acontecendo...nisso nós demos um tempo...não chegamos nem a terminar...eu falei assim “não...tudo bem...você faz o que der na sua cabeça...” foi quando depois de um tempo...ele pegou e saiu com ela...ficou com ela...aquilo pra mim foi um choque...foi uma desilusão... (fala, relato de experiência)

A segunda menção de pegar nesse mesmo primeiro excerto instancia o sentido de ‘ir atrás e capturar’ ou MOVIMENTO até um MARCO com o qual o TRAJETOR estabelece CONTATO e o contém a FORÇA (pegar seres animados com força violenta). Por outro lado, a terceira menção, a construção ‘pegou e foi’, poderia ser substituída apenas por ‘foi’, sem afetar o sentido. No entanto, a narradora transportou esse uso comum da oralidade para o texto escrito. Ao fazê-lo, destaca para o interlocutor o assunto a ser introduzido.

A Gramática de Construções defende que construção é um pareamento de forma e sentido com significado próprio, esquemático, parcialmente independente das palavras que a compõem (Goldberg, 1995Goldberg, A. E. (1995). A construction grammar approach to argument structure. University of Chicago Press.). Se assim o é, ‘pegou e foi’ é uma construção que enfatiza a situação desagradável enfrentada pelo pai da narradora e deixa em foco o fechamento da narrativa. A narradora ao usá-la parece fazer um MOVIMENTO dentro do próprio discurso, conforme já apontado por Sigiliano (2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.), na direção do desfecho da história. Na perspectiva da narradora, é o desfecho que ela julga importante perfilar.

A construção ‘pegou e saiu’ no segundo exemplo corrobora o argumento. A narradora move-se pelo discurso e traça a TRAJETÓRIA da ação descendente da narrativa em direção ao desfecho, imediatamente anterior à coda10 10 Segundo Labov e Waletsky (1967), a narrativa conjuga os seguintes movimentos discursivos: sumário, orientação, ação complicadora, avaliação externa e/ou encaixada, desfecho e coda. que, nesse caso traz uma avaliação encaixada (‘ele pegou e saiu com ela...ficou com ela...aquilo pra mim foi um choque...foi uma desilusão...’). Ao fazê-lo, a narradora perspectiva o EVENTO como um CONTÊINER das ações que entram na narrativa, objetificando-o. Ao mesmo tempo, destaca a sua desilusão. A ligação entre EVENTO, CONTÊINER e OBJETO se dá pelo esquema LIGAÇÃO, que motiva as analogias entre eles e a seleção dos detalhes pela narradora, consoante à proposta de Johnson (1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.). Construções como ‘pegou...falou assim’, ‘pegou...continuo olhando’, ‘pegou saiu correndo’, ‘pegou e botou ele’ relacionam-se à intenção de perspectivar a resolução ou coda narrativa como o ponto de chegada e foco de atenção.

Grupo 5: pegar ideias

O pegar ideias é licenciado pela metáfora conceptual IDEIAS SÃO OBJETOS (n=7). Nesse grupo, o CONTATO do TRAJETOR com o MARCO, ao contrário dos casos anteriores, se dá no plano nocional. De acordo com Talmy (1988Talmy, L. (1988). Force dynamics in language and cognition. Cognitive Science, 12, 49-100. https://doi.org/10.1207/s15516709cog1201_2.
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; 2000Talmy, L. (1988). Force dynamics in language and cognition. Cognitive Science, 12, 49-100. https://doi.org/10.1207/s15516709cog1201_2.
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), o MOVIMENTO pode ser físico, quando há deslocamento em um ESPAÇO real, e fictício quando isso acontece no plano das ideias. Os narradores conceptualizam as ideias como coisas materiais, passíveis de serem ‘pegadas’. Mentalmente, os sujeitos discursivos deslocam-se até as ideias (‘reformar e manter instalações decadentes do sistema educacional brasileiro’, ‘comparar comandos da linguagem computacional às letras do alfabeto’, ‘adicionar um bom volume de ingredientes’), estabelecem CONTATO com elas, para conjecturar sobre as ações mais indicadas em situações que retratam a educação no Brasil, a montagem de um programa de computador e o preparo de um caldo, no domínio da culinária.

Cenas do Grupo 5: pegar ideias

...querem dar projetos revolucionários para educação num país que eu acho que podia pegar um prédio velho...reformar e manter... (relato de experiência, fala)

Um programa de computador é semelhante ao alfabeto no qual pegamos várias letras e formamos uma palavra. (relato de procedimento, escrita)

Eu gosto de botar bastante quantidade...eu gosto de ver aquilo encorpado...de você pegar não é aquele caldo ralo não... (relato de procedimento, fala)

A relação corpórea (CONTATO) do sujeito com a meta (a ideia) é mediada por sua mente (o CONTÊINER), que se apossa da ideia, contendo-a fisicamente (CONTATO transforma-se em CONTÊINER com a FORÇA mental). A ação não só parte do sujeito discursivo em direção à ideia, mas volta para ele, que passa então a usufruir de seus efeitos junto aos interlocutores. São usos que evocam o domínio da percepção subjetiva, e que no discurso deixam em proeminência a perspectiva oferecida por quem fala. Parece que se relacionam com o gênero (relato de opinião sobre temas livres), pois emitir uma opinião coaduna-se com perspectivar de forma autoral ou agir no mundo das ideias.

Grupo 6: pegar orientacional

Por fim, há três ocorrências (n=3) estruturadas pela metáfora conceptual DESTINOS SÃO OBJETOS, na qual o destino é conceptualizado como uma região delimitada no espaço físico, qual seja, uma passagem na estrada ou um túnel. O conceptualizador os reifica, tendo como pano de fundo o MCI de caminho, que implica seguir em uma determinada direção ou na direção de um lugar, perspectivada pelo informante como o foco de atenção. Infere-se que, se o perspectivador permanecer na direção escolhida, chegará ao destino (MOVIMENTO-TRAJETÓRIA).

Cenas do grupo 6: pegar orientacional

A gente saiu correndo, pegamos a passagem errada e tivemos que descer por um matagal até conseguir voltar para o túnel. Ao chegar de novo ao carro, o reboque já tinha chegado e rapidamente o carro foi rebocado (relato de experiência, escrita)

...em vez de pegar pra dentro do túnel a gente pegou como se estivesse indo pro outro lado... (relato de experiência, fala)

No segundo excerto, é a nossa experiência social com cenas semelhantes que nos permite interpretar a situação, pois o MCI de caminho é implicado na situação discursiva. Essas ocorrências assemelham-se a usos como ‘pegar a estrada’, bastante comuns, e que muitas vezes são usados em estruturas metonímicas como ‘pegar a Presidente Dutra’, em que Presidente Dutra refere-se a uma Rodovia. É o conhecimento do contexto situacional que permite a inferência.

Em tempo, cabe mencionar que há um caso único de pegar na acepção de ‘grudar’, no domínio culinário, que não contabilizamos em nenhum dos grupos. Posto que o gênero relato de procedimentos inclui processos culinários na maioria, esperávamos que essa acepção tivesse maior frequência:

... aí boto dentro... aí mexo... boto sal... aí deixo pegar um pouquinho... sabe? ...depois boto água... aí ali... fica no fogo.

A cena já traz em si o esquema básico OBJETO, licenciado pela metáfora LOCAIS SÃO OBJETOS, que, como visto anteriormente, instancia os esquemas de MOVIMENTO-TRAJETÓRIA e sua transformação em CONTATO. Os elementos conceptualizados como TRAJETORES são os ingredientes que a narradora intenciona LIGAR ao MARCO (a panela) de modo a ‘grudar’. Ou seja, há sobreposição com o MARCO. Se não houver conhecimento e experiência em culinária, o refogado pegará a ponto de queimar, intenção essa não perspectivada pela narradora. O foco de atenção, portanto, é a sobreposição do CONTATO com o MARCO no tempo certo. Esse só a experiência permite conhecer.

Panorama geral

Com base nos esquemas imagéticos, suas transformações e padrões inferenciais que emergem da lógica deles recrutada, os usos de pegar encontrados no corpus D&G Rio de Janeiro foram sumarizados na Tabela 3. Em um total de 147.802 palavras, 413 casos foram encontrados e analisados qualitativamente. O uso prototípico que motiva as subcategorias é o pegar objetos, que estrutura sentidos distintos ao metaforizar o esquema básico OBJETO. O esquema age como domínio fonte para a conceptualização de entidades tangíveis e manipuláveis pelas partes do corpo humano; entidades animadas (humanas e animais); e entidades nocionais (o discurso, ideias e orientação no espaço).

Tabela 3
Sentidos do verbo pegar no corpus D&G Rio de Janeiro: mecanismos cognitivos

Motivados pelo esquema OBJETO, subjazem aos sentidos de pegar, neste corpus, outros esquemas dele dependentes, que se transformam e se sobrepõem - os esquemas de MOVIMENTO-TRAJETÓRIA presentes em todas as ocorrências. Em sua maioria (grupos 1, 2b-d, 3, 5) há também transformação de TRAJETÓRIA em CONTATO-FORÇA, CONTÊINER, como é o caso do sentido prototípico (pegar objetos) e do pegar ideias, em que o TRAJETOR se transforma em CONTÊINER (a cabeça do sujeito discursivo).

No caso do pegar meios de transporte, a lógica dos esquemas envolvidos é invertida, pois é o MARCO que se transforma em CONTÊINER. No que tange à essa lógica, cabe-nos sublinhar que tanto no pegar com força violenta quanto no pegar relações amorosas ambos o TRAJETOR e o MARCO são CONTÊINERES, já que ambos os corpos se movem e se aproximam um do outro. Já o pegar discursivo implica deslocamento no discurso e relações de CAUSA-EFEITO na narrativa, fazendo do desfecho o ponto de chegada (OBJETO por LOCAL de chegada). Tais transformações são responsáveis por mudanças no foco de atenção e, consequentemente, na significação do verbo.

Para além da metaforização de OBJETO, há mapeamentos metafóricos e metonímicos motivados pelo contexto social e discursivo. O grupo (2), por exemplo, é estruturado pela metáfora conceptual SERES ANIMADOS SÃO OBJETOS e desdobra-se em quatro outros subgrupos. Em (2a), o TRAJETOR e o MARCO SÃO CONTÊINERES, como acontece também em (2d) nas acepções de ‘agressão’ ou ‘bater com força intensa causando danos à entidade atingida’ e ‘manter relações sexuais’, respectivamente, pois há relação de CONTATO-FORÇA nas duas direções. Esse detalhe é evocado pela situação e contexto discursivo.

Metonimicamente, as partes do corpo humano (mãos, braços, mente) funcionam com TRAJETORES, CONTÊINERES e MARCOS em uma relação que reafirma a corporificação da mente (Johnson, 2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press.) na significação. Outras como CONTROLADOR por CONTROLADO, OBJETO por LOCAL de chegada, CONTATO CORPORAL por AGRESSÃO, CONTATO CORPORAL por RELAÇÕES SEXUAIS, iluminam o papel do contexto (Quadro 1). Conforme conjecturado, esses processos cognitivos atuam em conjunto com pistas discursivas e contextuais que evocam domínios específicos, por exemplo, o de agressão e de relações amorosas, acessíveis pelo nosso conhecimento de mundo via gatilhos linguístico-discursivos presentes no contexto e situação discursiva.

Quadro 1
Sentidos do verbo pegar no corpus D&G Rio de Janeiro: aspectos discursivos e contextuais

6. Considerações Finais

Diante do exposto, teoriza-se haver um encadeamento sucessivo de sentidos a partir de um significado mais central, estruturado pelo esquema imagético OBJETO. Trata-se de um esquema básico, precursor de outros como MOVIMENTO-TRAJETÓRIA, CONTATO. Essa interpretação já fora defendida por Szwedeck (2002Szwedeck, A. (2002). Objectification: From object perception to metaphor creation. In K. Lewandowska-Tomaszczyk, & K. Turewicz (Eds.), Cognitive linguistics today (pp. 159-175). Peter Lang.; 2011Szwedeck, A. (2011). The ultimate source domain. Review of Cognitive Linguistics , 9(2), 341-366. https://doi.org/10.1075/rcl.9.2.01szw.
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) e anteriormente apontada como possível por Lakoff e Turner (1989Lakoff, G., & Turner, M. (1989). More than cool reason: A field guide to poetic metaphor. The University of Chicago Press.) quando os autores defendem ser a “nossa cognição uma cognição de objetos físicos”. Os dados analisados na seção anterior corroboram essa interpretação.

Sua frequência elevada e a proeminência de atributos (ser uma entidade física; ser manipulável e passível de ser contida/controlada por um TRAJETOR animado ou inanimado e ocupar um lugar no espaço), somadas ao fato de vários desses atributos serem mapeados para domínios mais abstratos (eventos discursivos, nocionais e direcionais), nos autorizam a fazer tal inferência. Ao conceptualizarem seres humanos e entidades abstratas como concretas, os participantes assinalam aos primeiros atributos como ‘poder ser possuído’, ‘controlado’ ou ‘localizado’ e recrutam a lógica dos esquemas envolvidos para estrutar as cenas discursivas em que o verbo ocorre. As subcategorias mais periféricas, portanto, herdam da mais central os esquemas imagéticos OBJETO, MOVIMENTO-TRAJETÓRIA (no mínimo) com as especificidades sumarizadas na Tabela 3.

Se assim o é, o verbo pegar emerge do corpus como uma categoria radial (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ). Existem relações motivadas entre os grupos de sentido, confirmando não só a polissemia da construção já reportada por Sigiliano (2008Sigiliano, N. S. (2008). Eu peguei e falei: eu vou!: as noções de movimento e mudança nas construções com o verbo pegar. Estudos Linguísticos 37(1), 243-251.), Leite (2011Leite, A. (2011). Um estudo sincrônico do verbo pegar. Cadernos de Estudos Linguísticos da Universidade Federal do Ceará, 3(1), 33-46. https://issuu.com/funcionalismo.em.perspectiva/docs/funcionalismo_em_perspectiva_3.
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) e Silva (2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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), mas também a hipótese da corporificação da mente (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ) e o experiencialismo Lakoffiano, pois são as experiências sensório-motoras que se projetam em outros domínios de experiência, gerando as extensões subcategoriais. Em várias das subcategorias, o CONTÊINER é uma parte do corpo humano ou o próprio corpo humano em relações metonímicas de PARTE-TODO ou de POSSUIDOR-POSSE / CONTROLADOR-CONTROLADO. A noção de proximidade (CONTATO) implicita tais relações como já antecipara Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ) e mostrado na análise.

No centro categorial encontra-se o pegar objetos em que TRAJETOR É CONTÊINER. Na radial mais periférica encontra-se o pegar orientacional em que TRAJETÓRIA É ORIENTAÇÃO e o MARCO o LOCAL para onde se desloca o TRAJETOR. As subcategorias da rede originam-se (1) de elaborações advindas da transformação dos esquemas envolvidos, responsáveis por diferentes focos de atenção, e (2) de projeções metafóricas e/ou metonímicas, que se relacionam com o modus vivendi dos participantes em sociedade. É o contexto social e discursivo que baliza a conceptualização e a perspectiva do conceptualizador (Croft & Cruise, 2004Croft, W., & Cruise, D.A. (2004). Cognitive linguistics. Cambridge University Press. http://dx.doi.org/10.1017/CBO9780511803864.
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, p.87). Há sempre uma dada intenção implicada. Os aspectos pragmáticos (a intencionalidade, as implicaturas, as pressuposições) e os domínios iluminados na análise envolvem conhecimento geral do mundo e do contexto social e discursivo, confirmando nossas conjecturas. Essa estrutura radial encontra-se na Figura 1.

Figura 1
Categoria radial do verbo pegar no corpus D&G Rio de Janeiro

Os sentidos de pegar não são previsíveis a partir do protótipo, mas sim a partir da metaforização do esquema OBJETO e das transformações dos esquemas por ele instanciados em um determinado contexto social e discursivo. Como verbo de AÇÃO, pegar implicita haver OBJETOS dos quais o TRAJETOR intenciona se aproximar para controlá-los, mesmo que o modo de controle varie. As acepções encontradas ilustram o processo de objetificação (Szwedeck, 2002Szwedeck, A. (2002). Objectification: From object perception to metaphor creation. In K. Lewandowska-Tomaszczyk, & K. Turewicz (Eds.), Cognitive linguistics today (pp. 159-175). Peter Lang.; 2011Szwedeck, A. (2011). The ultimate source domain. Review of Cognitive Linguistics , 9(2), 341-366. https://doi.org/10.1075/rcl.9.2.01szw.
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) assim como as transformações de esquemas imagéticos, mudanças no foco de atenção e sentido, consoantes às propostas de Johnson (1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.), Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), Gibbs & Colston (1995Gibbs, R. W., & Colston, H. (1995). The cognitive psychological reality of image schemas and their transformations. Cognitive Linguistics, 6, 347-78. https://doi.org/10.1515/cogl.1995.6.4.347.
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) e Turner (1996Turner, M. (1996). The literary mind. Oxford University Press.). Esses sentidos não representam homonímias, pois interrelacionam-se e encadeiam-se de domínios mais concretos para outros mais abstratos (Silva, 2016Silva, L. A. (2016). Construções idiomáticas com o verbo pegar: uma abordagem sociocognitiva. Scripta, 20(40), 286-306. https://doi.org/10.5752/P.2358-3428.2016v20n40p307
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; Sweetser, 1990Sweetser, E. E. (1990). From etymology to pragmatics. Metaphorical and cultural aspects of semantic structure. Cambridge University Press. https://www.researchgate.net/publication/300834111_11_Cross-linguistic_polysemy_in_tactile_verbs.
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), confirmando nossas expectativas.

Algumas das acepções instanciadas no corpus fogem às 16 descritas no Aurélio (2021Aurélio, B.H. (2021) Pegar. In Dicio: dicionário online da língua portuguesa. http://www.dicionariodoaurelio.com/Pegar.html.
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)11 11 Disponível em: https://www.dicio.com.br/pegar/ (Aurélio online). . Dentre elas encontram-se alguns dos sentidos estruturados por metáforas e metonímias. Respectivamente, são elas: ‘ir buscar ou apanhar alguém’; ‘capturar alguém’; ‘agredir ou bater em alguém’; ‘cumprir um objetivo social ou moral’; ‘surpreender’; ‘manter relação sexual’; ‘conjecturar’; ‘deslocar o pensamento até o desfecho narrativo’; ‘escolher um caminho’. Essas diferenças iluminam a relação entre questões discursivas e socioculturais e os processos de categorização. Como o corpus é constituído por relatos de procedimentos, relatos de opinião e narrativas de experiência, os sentidos encontrados “são interpretações que surgem de um contexto particular” (Soares, 2003, p. 150-51), conforme as vivências dos entrevistados do D&G. Ou seja, “não são dadas, mas construídas” (Soares, p.151) por eles.

Isso se dá de tal modo que o pegar discursivo adentra a escrita com representação expressiva. O pegar manter relações sexuais começa a surgir, ocorrendo com frequência muito baixa. Fosse o corpus gerado nos tempos atuais, provavelmente a incidência de ambos seria bem maior. Uma busca rápida em notícias de jornal de um único dia indicou 102.000 ocorrências de ‘pegar + V2 e 11.500 de ‘pegar mulher’. Reforçando o mesmo ponto, o sentido de ‘bater’ no domínio de agressão é pressuposto em várias cenas. O narrador não julga ser necessário explicitá-lo, já que entende ser ele parte do conhecimento compartilhado. Aparentemente, o uso de pegar na acepção de ‘bater’ se tornou normal ou o único jeito de falar daquela experiência (Croft & Cruise, 2004Croft, W., & Cruise, D.A. (2004). Cognitive linguistics. Cambridge University Press. http://dx.doi.org/10.1017/CBO9780511803864.
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). Ou seja, as categorias geradas pelo ser humano são cognitivas, mas são também socioculturais (Lakoff, 1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. , p. 280-81; Soares, 2018; Kövesces, 2020Kövesces, Z. (2020). Extended conceptual metaphor theory. Cambridge University Press. ). Os esquemas imagéticos e suas transformações operam como princípios estruturantes e, dependendo do contexto, alguns serão mais proeminentes que outros. É exatamente a perspectivação de uns como foco de atenção em contraposição a outros que gera os diferentes significados contexto a contexto.

Pelas mesmas razões, algumas acepções que constam do Aurélio on-line não apareceram no corpus (e.g. comunicar por contágio ou contato; transmitir doença; criar raízes; generalizar/espalhar) ou aparecem com frequência mínima. A acepção de ‘grudar’ (a segunda a aparecer nos dicionários), aquela que mais se aproxima da origem etimológica do verbo (do latim picare, ‘sujar com pixe’, ‘ter em si, trazer para si’, conforme o Houaiss & Villar, 2001Houaiss, A., & Villar, M. (2001). Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Objetiva.), só foi instanciada uma única vez, nos relatos orais de procedimento. Como anteriormente mencionado, quem nunca cozinhou, dificilmente entenderá o que é pegar no fundo, já que as ações e atitudes que vêm da prática de cozinhar não são dadas, mas sim construídas na prática. Enquanto MOVIMENTO-TRAJETÓRIA são noções espaciais, INTENÇÃO, ATITUDE são noções pragmáticas, que emergem do contexto. A comparação entre o que encontramos no corpus, as entradas de pegar no Aurélio on-line e a origem etimológica de pegar só iluminam e reforçam a relação entre questões pragmáticas e socioculturais e os processos de categorização.

Com base no acima exposto, teorizamos (1) irem as extensões de pegar no corpus D&G Rio de Janeiro de objetos concretos para seres animados e eventos discursivos, nocionais e direcionais, remetendo à GRANDE CADEIA DO SER (Lakoff & Turner, 1989Lakoff, G., & Turner, M. (1989). More than cool reason: A field guide to poetic metaphor. The University of Chicago Press.), uma estrutura hierárquica da matéria que orienta a conceptualização de objetos concretos para seres animados e outros domínios abstratos. Ressalva seja feita à subcategorização do grupo 2. No grupo 2, o encadeamento é diferenciado, pois a ação de pegar também é performada por TRAJETORES inanimados (tiros, veículos), aos quais são atribuídos o valor de AGENTES, em cenas de agressão e atropelamento. Do mesmo modo, teorizamos (2) irem as radiais de domínios mais concretos para mais abstratos, espelhando os mapeamentos metonímicos e metafóricos entre o domínio OBJETO e os domínios FÍSICOS/ESPACIAIS, da FORÇA, da PRAGMÁTICA e do CONTROLE ou o poder do TRAJETOR sobre a entidade objetificada. Apesar de as extensões serem sentidos que nos parecem convencionalizados na e pela experiência sociocultural, são motivadas e derivam de uma cena física e espacial com as quais os falantes estabelecem conexões.

Em síntese, o uso e a compreensão das acepções de pegar aqui ilustradas passam pela percepção dos esquemas OBJETO, MOVIMENTO-TRAJETÓRIA e da experiência que temos com suas transformações em outros esquemas como CONTATO-FORÇA, CONTATO-FORÇA-(CONTÊINER), CONTATO-(CAUSA-EFEITO), engatilhadas por pistas linguístico-discursivas e contextuais. Esses princípios de organização categorial são apreendidos indiretamente no uso e ordenam as cenas discursivas no presente corpus (Soares, 2003; Soares, 2018; Kövecses, 2020). Cumpre salientar, entretanto, que os possíveis sentidos de pegar podem ainda ser alargados por pesquisas com outros corpora, em outros contextos e com outros participantes. Do mesmo modo, a análise aqui proposta não esgota possíveis outras que futuros estudos venham a explorar.

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  • 3
    Image-schematic structure is the basis for our understanding of spatial terms and all aspects of our perception and motor activities (Johnson, 2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press., p. 141).
  • 4
    An image schema is a dynamic, recurring pattern of organism-environment interactions. As such, it will reveal itself in the contours of our basic sensorimotor experience (Johnson, 2007Johnson, M. (2007). The meaning of the body: Aesthetics of human understanding. The University of Chicago Press., p. 136).
  • 5
    Exemplos de Lakoff (1987Lakoff, G. (1987). Women, fire and dangerous things. Chicago University Press. ), p. 440.
  • 6
    Johnson (1987Johnson, M. (1987). The body in the mind: The bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago University Press.), p. 34.
  • 7
    Radden & Dirven (2007Radden, G., & Dirven, R. (2007). Cognitive English grammar. John Benjamins Publishing., p. 11) definem domínio conceptual como “campos gerais da conceptualização nos quais uma categoria se encaixa em uma dada situação. Por exemplo, uma faca pertence ao domínio de ‘comer’ se for usada para cortar pão na hora do café, mas ao domínio de ‘agressão’ se for usada como arma.” Alguns exemplos incluem EMOÇÃO, ESPORTES, VIAJAR e até mesmo conceitos complexos como EVENTO (Langacker, 1987Langacker, R. (1987). Foundations of cognitive grammar: Theoretical perspectives. Stanford University Press. , p.147).
  • 8
    Os dados foram reanalisados e os resultados reelaborados.
  • 9
    Aspecto é uma categoria verbal de TEMPO, não dêitica, através da qual se marca a duração da situação e/ou suas fases, sendo que estas podem ser consideradas sob diferentes pontos de vista, a saber: o do desenvolvimento, o do completamento e o da realização da situação (Travaglia, 1985Travaglia, Luiz Carlos. (1985). O aspecto verbal no português: a categoria e sua expressão. 5ª. Edição (pp.49-54). EdUF. , p. 53).
  • 10
    Segundo Labov e Waletsky (1967Labov, W., & Walesky, J. (1967). Narrative analysis: oral versions of personal experience. In J. Helm (Ed.), Essays on the verbal and visual arts (pp. 12-44). University of Washington Press.), a narrativa conjuga os seguintes movimentos discursivos: sumário, orientação, ação complicadora, avaliação externa e/ou encaixada, desfecho e coda.
  • 11
    Disponível em: https://www.dicio.com.br/pegar/ (Aurélio online).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2021
  • Aceito
    03 Dez 2021
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