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NOTAS SOBRE LIVROS/ BOOKNOTES

BASÍLIO, MARGARIDA (org.) 1999. Palavra. Departamento de Letras da PUC – Rio

O livro é composto por uma Introdução e mais quatro partes. Na Introdução, Basílio trata da questão da definição e estatuto da palavra desde a definição distribucionalista de Bloomfield (1962), passando pelas abordagens gerativistas, tocando na sua definição como átomo sintático (Di Sciullo & Williams (1987) até a Hipótese Forte (Chomsky 1995, 1998), que estabelece que a sintaxe é cega para a estrutura interna das palavras. Mostra que a dificuldade de uma definição universal de palavra se coloca em dois níveis.

Na Parte I, Everett sumariza um levantamento dos processos morfológicos em Wari', língua da família Txapacura/Chapacura, examinando um processo de verbalização, em que frases inteiras são transformadas em verbos. No segundo artigo desta parte, Lobato examina os processos de formação dos referidos particípios, apontando diferenças e semelhanças, questões que uma teoria lingüística explicativa deve responder e sugere que sejam abordadas numa perspectiva que incorpore o conceito de traços formais.

Alves inicia a Parte II focalizando as formações sintagmáticas, que constituem o processo mais produtivo para a formação de novas unidades, em corpus de divulgação da área de economia, tratando dos limites entre sintagma livre e sintagma lexicalizado. Biderman mostra que a definição de palavra deve ser feita de língua a língua. É discutida a problemática da segmentação do discurso em unidades léxicas e a terminologia adequada a uma ciência lexicológica. O artigo de Neves trata do estatuto das construções com verbo-suporte, o qual é contrastado com o de certas construções de formação análoga, com vista especial para a lexicografia.

A Parte III conta com a contribuição de Gonçalves et al, que examina o potencial de produtividade do sufixo –eiro, propondo regras de formação de palavras e regras de análise de estrutura que dêem conta do processo de formação de agentivos e locativos. A seguir, Perini discute a questão homonímia/polissemia na delimitação dos itens léxicos, confrontando-a com as posições de Katz (1963) e Weinreich (1966), e analisa diferentes problemas envolvidos na tensão unidade/diversidade na determinação de itens léxicos.

A última parte apresenta quatro trabalhos: Duarte identifica dois macrocritérios no estudo do prefixóide: de natureza extralingüística e de natureza lingüística, e apresenta a proposta de que o traço mais evidente para o seu reconhecimento seja o do emprego braquissêmico; Cunha apresenta as principais propostas de modelos lançadas ela teoria psicolingüística referentes ao acesso lexical a formas derivadas e às representações dessas formas no léxico mental, seguida de uma avaliação com relação à eficiência do falante no acesso ao léxico mental; Figueira focaliza a aquisição dos verbos de ação, mostrando que muitos dos "erros" na fala da criança são resultado de processo de construção de subsistemas; encerrando o livro, Rosa parte da hipótese de Spencer (1991) de que a morfologização não está completa em português, funcionando a marca de futuro como um clítico.

Por/By: Sumiko Nishitani Ikeda

(Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. E-mail: sumiko@uol.com.br)

BECHARA, E. 2001. Gramática Escolar da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Lucerna ISBN: 85-86930-16- 4. xi + 715 p. Acompanhada do Encarte Resposta aos exercícios (27p.)

Qual tem sido a influência da Lingüística nas criações pedagógicas brasileiras destinadas a usuários/aprendizes de português como língua materna? Esta pergunta-chave pode ser respondida de várias maneiras, segundo a perspectiva adotada. Assim, preferimos dizer que há uma dupla influência: 1. descritiva e 2. conceitual-terminológica. Mais especificamente, o quê, da Lingüística, pode ser encontrado nesta contribuição do mais erudito gramático brasileiro contemporâneo? As limitações de espaço só permitem dar poucos exemplos; pós-graduandos em Lingüística Aplicada poderiam complementar a exemplificação, analisando-a em profundidade, com um espírito conciliador ( uma gramática escolar tem um objetivo bem distinto do de uma gramática científica; a rigor, cada qual só pode ser avaliada à luz das respectivas tradições. (Cf. o apelo sensato do lingüista britânico David Crystal, pelo reconhecimento da importância dos enfoques descritivo e prescritivo, em sua magistral The Cambridge Encyclopedia of Language, 1997, 2nd. ed., p.3). Para exemplos de Check-lists avaliativas sistemáticas, veja-se, de nossa autoria e de Nelly Carvalho, Como avaliar um livro didático – Língua Portuguesa. São Paulo: Pioneira, 1984).

Influência descritiva:

Manifestada através da adoção de comentários descritivos de autoria de J. Mattoso Câmara Jr. (80, 209. 210, 497 ) e de J. Gonçalo Herculano de Carvalho (81, 136). Seria instrutivo, ao verificar-se o grau de influência descritiva da Lingüística, examinar-se os questionamentos de Bechara sobre interpretações prescritivas de outros gramáticos (Cf. 116, 451). Como o gramático pernambucano-carioca (radicou-se no Rio ainda jovem) exerce seu senso crítico face a julgamentos de uso lingüísticos? Tal indagação poderia ser objeto de pesquisa mais ampla, na qual fossem incluídas outras gramáticas escolares.

Influência conceitual-terminológica:

Denominações propostas por Coseriu: língua exemplar(14) e lexemática ( 542). Aqui, caberia enumerar os conceitos-termos-chave de Lingüística incluídos na GELP, dentre os quais: estruturas paradigmáticas (543), sintagmáticas (546), fonema (555), morfema( 494), discurso (542), coesão textual (696). Registre-se a ocorrência de vários itens lexicais muito freqüentes em obras de Lingüística: lingüista (12, 542), competência lingüística (14), sistema lingüístico (14), comunidade lingüística (506), Lingüística do (sic) texto ( 353)/ Lingüística Textual ( 696-697), variedade regional/social/de estilo (14).

Terminólogos encontrarão muito a pesquisar no volume que, fiel à Tradição Gramatical, opta por "nomenclatura" (296, 506), em vez de "terminologia" e por "emprego" (cf. seção Emprego dos Pronomes, 142, 171), em vez de "uso". Sociolingüistas poderão analisar o uso de "culto" (cf. p.604 "... pronúncias cultas da língua"), a diversidade de rótulos de uso (língua exemplar, p.13; linguagem coloquial, p.170; norma exemplar, p. 280; linguagem informal, p.282; língua padrão, p.150) e o conceito de "erro gramatical" (668). Que a mini-amostra acima desperte o interesse de colegas atuais, emergentes e futuros, interessados em identificar quem (dentre os lingüistas) e o quê (da Lingüística) podem ter influenciado – como, onde, quando, e até que ponto – obras como esta, fruto de uma expressiva Tradição de Estudos Gramaticais que nem sempre é percebida e tratada com dignidade. Lembraríamos que o conceito-termo Gramática apareceu, em língua escrita, entre 1325 e 1375, enquanto Lingüística só começa a ser registrada a partir de 1850.

Em suma, louvamos o esforço de Bechara em ajudar usuários que buscam a exemplaridade lingüística adequada e eficaz nos usos de Português. Que lingüistas descritivos brasileiros também aceitem o desafio de produzirem gramáticas pedagógicas, para usuários nativos e não-nativos (um exemplo recente desta segunda alternativa: a publicação de uma gramática de Português – em língua inglesa – por Mário Perini: Modern Portuguese. A Reference Grammar. Yale University Press, 2002.).

Por/By: Francisco Gomes de Matos

(Universidade Federal de Pernambuco, Recife. E-mail: fcgm@cashnet.com.br)

CRYSTAL, David. 2001. Language and the Internet. Cambridge University Press, ix + 272 p.

Como estudar as relações entre a linguagem e a Internet? Que tipo de influência a Internet pode estar exercendo nos usuários de línguas? Qual o impacto causado pela gigantesca rede mundial de computadores na comunicação eletrônica interpessoal e intergrupal? Que tipo de recurso/meio lingüístico é a Internet? O que a lingüística pode esclarecer sobre a linguagem da Internet, ou Internetês? Quais algumas das características distintivas do e-mail, do bate-papo eletrônico? Que se pode antever, no desenvolvimento da Internet, sob o ponto de vista lingüístico? Essas e outras indagações subjazem ao livro muito oportuno, bem redigido (seria redundante caracterizar o estilo do autor como "cristalino"), bastante ponderado e acima de tudo inspirador, do mais prolífico e versátil lingüista contemporâneo: David Crystal.

Este volume, de formato gráfico semelhante ao de seu livro Language Death (CUP, 2000), contém um Prefácio (3 p.), 8 capítulos (com extensão de 19 a 42 páginas), Referências (10 p.), Índice de Autores (3 p.) e Índice de Assuntos (16 p.).

No Prefácio, Crystal destaca o lugar primacial da linguagem na Internet e conjectura que, se esta é uma revolução, é bem possível tratar-se de uma revolução lingüística (p.viii). Os títulos dos capítulos dão uma idéia da caminhada a ser feita pelo leitor: A linguistic perspective; The médium of Netspeak; Finding an identity; The language of e-mail; The language of chat groups; The language of virtual worlds; The language of the Web; The linguistic future of the Internet.

As Referências bibliográficas estão em inglês, exceto uma, em francês.

Várias obras recentes, relevantes para uma iniciação interdisciplinar à problemática focalizada, estão incluídas, por exemplo: Patrícia Wallace, The Psychology of the Internet (CUP, 1999). Os sites fornecidos foram atualizados até a data da impressão do volume: fevereiro de 2001; Global Literacies and the World-Wide Web, organizado por Gail E. Hawisher e Cynthia l. Selfe (London: Routledge, 2000). Ali, encontramos um magistral capítulo sobre práticas de letramento (ou "literacia", para usar a variante adotada em Portugal) no e-mail, por japoneses e americanos e a coletânia Network-Based Language Teaching: Concepts and Practice, organizada por M. Warschauer e R. Kern (CUP, 2000).

Aos que atuam em Lingüística Aplicada, o livro oferece uma agradável surpresa conceitual-terminológica: uma seção dedicada à Applied Internet Linguistics (231-237). Registre-se que a expressão Internet Linguistics ocorre também no primeiro capítulo (páginas 6 e 9) e louve-se o "recado estratégico" dado pelo notável lingüista britânico a pesquisadores atuais/emergentes/ futuros de que este volume é exploratório, programático, transicional ..., podendo inspirar muitíssimas dissertações/teses, por exemplo, sobre a aquisição da Linguagem da Internet por adultos e crianças (p. 241).

Em suma, uma significativa contribuição pioneira sobre alguns dos aspectos da fascinante, multifacetada linguagem da Internet, por um de seus mais notáveis usuários-pesquisadores.

Por/By: Francisco Gomes de Matos

(Departamento de Letras, CAC,UFPE, Recife. E-mail: fcgm@cashnet.com.b)

PAGANO, Adriana (org.) 2001. Metodologias de Pesquisa em Tradução. Belo Horizonte: FALE – UFMG. 172p.

Adriana Pagano reúne em Metodologias de Pesquisa em Tradução, algumas das metodologias de pesquisa em pauta nos Estudos da Tradução no momento atual. Como bem salientado pela própria organizadora na apresentação, o livro reflete o caráter pluralista de abordagens teóricas e metodológicas que os autores nele reunidos apresentam. "Seus objetos, perspectivas e estilos diversos apontam para a multiplicidade de formas de se falar sobre a tradução tendo-se em vista que todo objeto de estudo propõe métodos para sua análise, assim como toda metodologia revela novos aspectos sobre o objeto enfocado".

Os três primeiros artigos do livro apresentam algumas das opções metodológicas que têm aberto novos horizontes para o estudo do processo tradutório: Protocolos verbais são o foco da pesquisa de José Luiz Vila Real Gonçalves, "uma antiga técnica de introspecção aprimorada a partir de sua aplicação no registro do processo tradutório e em interação com outros recursos tecnológicos como o vídeo e o monitor de TV".

Medidas em tempo real para estudos experimentais em tradução: explorando o programa Translog, trabalho de Rui Rothe-Neves, enfoca uma técnica nova da computação, o software Translog, verdadeiro "carbono" da produção textual à medida que se vai processando o texto de partida e dando gestação à tradução.

No terceiro artigo, A triangulação como opção metodológica em pesquisas empírico-experimentais em tradução, Fábio Alves apresenta e analisa seis tópicos principais enquanto instrumentos de coleta e análise de dados, utilizados pelo meio acadêmico em vários países: "os protocolos verbais, a retrospecção, os questionários e entrevistas dirigidas, o uso de câmaras de vídeo, o julgamento e avaliação feitos por especialistas e a utilização de softwares que colocam à disposição do pesquisador dados on line sobre o trabalho de tradutores que utilizam computadores para realizar sua traduções". Alves propõe a opção metodológica de triangulação: o uso conjunto de métodos quantitativos e qualitativos para a investigação de fenômenos tradutórios. Ele afirma que dados coletados e interpretados através de cruzamentos de resultados obtidos por métodos diferentes aumentam as chances de sucesso do pesquisador em sua tentativa de observação, compreensão e explicação de um determinado fenômeno.

Célia M. Magalhães abre novos caminhos de reflexão sobre a tradução, com o trabalho sobre As pesquisas textuais/discursivas: o uso de Corpora, dado seu caráter bivalente de metodologia de pesquisa e abordagem teórica.

No capítulo 5, em As pesquisas historiográficas em tradução, a organizadora do livro situa o estudo da tradução no Brasil sob uma perspectiva comparada com a tradução num outro país latino-americano, a Argentina, correlacionando a tarefa tradutória ao contexto político e social, observando ainda seu caráter interdisciplinar.

O livro é concluído com o trabalho de Carlos A. Gohn, Pesquisas em torno de textos sensíveis: os livros sagrados, em que são tratadas questões ligadas à funcionalidade, intencionalidade e conceitualização na tradução de textos sagrados e considerados "sensíveis": sensibilidade esta que não está no texto, mas na forma como o texto é visto.

Regado com inúmeros exemplos ilustrativos, e organizado em blocos distintos relacionados entre si numa busca única, é um livro que revela a indissociabilidade entre objeto e metodologia e aponta para novas evidências que aos pesquisadores em tradução compete a investigação.

Por/By: Miriam Bacha Miranda Barbosa

(GR- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)

MICHELETTI, Guaraciaba (org.) 1999. Leitura e Construção do Real – O Lugar da Poesia e da Ficção. São Paulo - Cortez Editora. ISBN 85-249-727-4. 128 p.

A existência deste livro é justificada, pela constatação, a partir de diagnóstico em escolas, de que o ensino da língua e da literatura se apresenta de forma inteiramente desconectada, reduzindo-se a decorar regras gramaticais e a traçar panoramas de tendências e de escolas literárias, de modo esquemático e separado do trabalho analítico e interpretativo.

Assim sendo, pretende-se aparelhar os professores na exploração didática de diferentes tipos de textos, fornecendo-lhes conceitos e práticas para sua abordagem, segundo uma concepção de leitura como construção do texto e do real, porém, ao mesmo tempo, respeitando a especificidade de seu gênero e de suas características próprias.

Desta forma, a parte prática da obra estabelece critérios gerais para a leitura em sala de aula, segundo os quais, devem-se buscar em cada texto, e não fora deles, as estratégias lingüísticas com que devemos abordá-los. No entanto, este é apenas o ponto de partida para o trabalho, já que ler é muito mais do que decodificar sinais, letras, palavras e estruturas, consistindo no "fazer a leitura do mundo", fazer a reconstrução do texto e colocar em ação as experiências que se possui. Enfim, é um ato de interação e um vôo do cotidiano da sala de aula para fora dela.

Partindo-se desse entendimento, houve a divisão do livro em dois títulos maiores, destinados, respectivamente, a abarcar o estudo de textos poéticos e textos narrativos.

Na primeira dessas duas partes, faz-se a desconstrução e reconstrução de dois poemas: "Eu, etiqueta", de Carlos Drummond de Andrade, e "Ritmo", de Mário Quintana. Neles, ao se trabalhar a materialidade dos textos, a partir dos diversos aspectos que os compõem: lingüísticos, fonológicos ou sonoros, morfossintáticos e semânticos, busca-se a interpretação viva dos sentidos, num diálogo contínuo com os alunos, daí resultando a possibilidade de várias leituras e o pensar sobre a língua, em sua carga expressiva.

Já a segunda parte focaliza a leitura da narração em sala de aula e, como na leitura do texto poético, não há receitas. Cada texto nos dá a sua chave para a interpretação, porém a meta é sempre formar leitores críticos, o que se constrói através de caminhos diferentes dos clássicos roteiros de leituras e questionários estereotipados que, via de regra, acompanham os livros didáticos.

Para a análise, foram selecionados os contos: "Apólogo brasileiro sem véu de alegoria", de Antônio Alcântara Machado, e "As borboletas copulam no vôo", de Jorge Miguel Marinho, estudados num diálogo, respectivamente, com uma notícia de jornal e um poema ("Quadrilha", de Carlos Drummnond de Andrade), que tratam, de formas diferentes, dos assuntos neles abordados. O ponto de partida é sempre uma leitura baseada no texto, para em seguida, com os alunos, se fazer uma observação dos elementos estruturais próprios do gênero e, num momento posterior, o enfoque intertextual.

Desta forma, o livro cumpre seu papel de exemplificar um trabalho analítico e uma leitura ativa, que, ancorada nos elementos lingüísticos dos textos, abre-se a uma variedade de enfoques e a uma multiplicidade de sentidos.

Por/By: Nanci Maria Stephano de Queiroz

(LAEL/Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2002
  • Data do Fascículo
    2002
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