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Figuras retóricas para registrar história(s): discursos sobre as mortes por Covid-19 no Brasil

Using rhetoric images to record story(ies): discourses on Covid-19-related deaths in Brazil

RESUMO

Este artigo busca refletir sobre o funcionamento de uma das técnicas retóricas usadas em discursos: as figuras. A abordagem será feita com base em mortes provocadas por Covid-19 no Brasil. Para isso, consideram-se como corpus de estudo duas capas de jornais brasileiros, o carioca O Globo e o paulistano Folha de S. Paulo, mais especificamente as edições que registram quando o país ultrapassou as 100 mil e as 200 mil mortes pelo coronavírus. O objetivo é mostrar o papel argumentativo que a metonímia e a repetição imprimem aos textos em questão. Essas figuras foram relevantes para a composição das duas capas. A de O Globo utiliza fotos de várias pessoas que morreram por causa da doença. A da Folha de S. Paulo reproduziu calçados usados por algumas das vítimas. A análise se fundamenta em pressupostos teóricos de estudiosos da Retórica e da Nova Retórica, especialmente no que diz respeito às figuras retóricas.

Palavras-chave:
figuras retóricas; metonímia; repetição; imprensa; Covid-19

ABSTRACT

This article reflects on the role of images in rhetorical techniques. The theme will be Covid-19-related deaths in Brazil. To this end, two covers from Brazilian newspapers namely, O Globo, from Rio de Janeiro, and Folha de S. Paulo, from São Paulo, compose the corpus. More specifically, the covers were published in the editions issued after the country registered over 100,000 and 200,000 Covid-19-related deaths. The objective is to show the argumentative role of metonymy and repetition in the corpus texts. The images presented in the study were relevant to the two cover compositions. O Globo used photos of several people who died from the disease. Folha de S. Paulo reproduced shoes that had been worn by some of the victims. The analysis is based on theoretical assumptions about rhetorical images by rhetoric and new rhetoric scholars.

Keywords:
rhetorical images; metonymy; repetition; press; Covid-19

1. Considerações iniciais

É a partir do presente que o historiador entende o passado. Nesse processo de observação histórica, diz Bloch (2002Bloch, M. (2002). Apologia da História ou o ofício do historiador. Zahar.), procuram-se vestígios e relatos de testemunhas que ajudem no processo de compreensão de algo. “Tudo o que o homem diz ou escreve, tudo que fabrica, tudo que toca pode e deve informar sobre ele”, detalha o autor (Bloch, 2002Bloch, M. (2002). Apologia da História ou o ofício do historiador. Zahar., p. 51). Embora seja do campo da História, e não da Linguística, o pesquisador e sua obra trazem algumas reflexões que ajudam a iniciar a contextualização sobre o tema que pautou este artigo: a pandemia do coronavírus.

Os pesquisadores da área de História, quando forem tentar entender o que ocorreu no mundo nos anos de 2020 e 2021, possivelmente terão nas reportagens noticiadas pela imprensa naquele biênio uma das fontes a serem consultadas. Nas páginas impressas e nos sites informativos, eles lerão que todos os países enfrentaram uma pandemia. Com recursos e realidades econômicas, sociais e políticas distintas, cada nação procurou dar a sua resposta à novidade que surgia em escala mundial.

A Covid-19, também chamada de coronavírus, surgiu na China nos meses finais de 2019. Mas sua expansão em nível pandêmico só ocorreria no ano seguinte. O vírus se transmite pelo ar e se fixa em superfícies. Nas duas situações, o ser humano fica sujeito a ele. Aos poucos, o planeta foi aprendendo a incorporar ao dia a dia medidas de proteção, como o uso de máscaras e o distanciamento social.

O Brasil não foi exceção. Tendo registrado os primeiros casos em fevereiro de 2020 e, principalmente, março, o país precisou se assimilar à nova realidade às pressas. Muitos não seguiram as recomendações, por motivos que vão da pura impossibilidade (por necessidade de trabalhar, como profissionais da área médica e pessoas de baixa renda, mais sujeitas ao impacto econômico) à discordância sobre a extensão da pandemia.

Seja qual for o motivo, o roteiro da infecção é o mesmo. As consequências, não. Houve casos de pessoas assintomáticas, ou seja, que contraíram a doença, mas não apresentaram sintomas. Houve casos em que as reações se assemelharam às de uma gripe, com febre, dores musculares, respiração alterada. E houve casos em que o aparelho respiratório foi seriamente comprometido. Foram essas as principais vítimas fatais da doença.

Quem for estudar esse período também irá ler nos registros históricos produzidos pela imprensa que o Brasil foi o “pior país do mundo na gestão da epidemia de Covid-19”, segundo noticiou o site informativo G13 3 G1 (2021). https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-19-aponta-estudo-australiano.ghtml (acesso em 10 fevereiro, 2021). , bem como outros veículos de imprensa, em 28 de janeiro de 2021. A matéria reproduzia estudo feito por pesquisadores australianos com quase cem nações, observando diferentes critérios. O Brasil ficou na última posição.

Um dos indicadores levados em conta foi o número de mortes. No dia 7 de janeiro de 2021, o país atingia a marca de 220 mil mortes causadas pela doença. Era o segundo maior do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos. O número de infectados, no final daquele mês, passava dos 9 milhões de pessoas.

Essas marcas, dada a importância do tema, ocuparam destaque nas capas dos jornais impressos (e de suas respectivas páginas digitais) nas datas em que a quantidade de mortos atingia números redondos. 10 mil, 50 mil, 100 mil, 200 mil. São dessas duas últimas marcas os exemplos selecionados para serem analisados neste artigo. Publicadas respectivamente em 21 de agosto de 2020 e em 8 de janeiro de 2021 pelos jornais O Globo e Folha de S.Paulo, dois dos principais diários do país, elas procuraram não apenas destacar o volume de mortos, mas também humanizar o tratamento dado ao tema.

Ao invés de mostrar estatísticas, os jornalistas de ambas as publicações procuraram individualizar as pessoas que morreram por conta da Covid-19. Uma das edições se valeu dos rostos de quem perdeu a vida para a doença. Outra, nos calçados usados por elas. Nas duas situações, várias das vítimas ocuparam as capas, dispostas repetidamente. Em termos persuasivos, valeram-se das figuras da metonímia e da repetição. É mostrar como isso se deu, aos olhos da Retórica, o objetivo desta exposição.

O discurso retórico se configura pela intenção de persuadir, algo que compreende um orador (ethos) que, diante de uma questão estruturada em seu discurso (logos), tenta convencer um auditório (pathos). Para isso, é necessário seguir algumas etapas, estruturas conhecidas como as partes do sistema retórico proposto pelos gregos, quais sejam: invenção (consiste na busca de meios/provas de persuasão), disposição (operação de colocar em ordem as provas), elocução (refere-se à forma de se expressar) e ação (concerne à proferição efetiva do discurso).

Enquadradas na elocução, as figuras são percebidas a partir de duas características: uma forma, que seria uma estrutura discernível, e um emprego, que chama a atenção por se distanciar de um modo comum de se expressar. Aristóteles (1964Aristóteles (1964). Arte retórica e arte poética. Tradução Antonio Pinto de Carvalho. Difusão Européia do Livro.), ao abordar as formas expressivas segundo o poder de persuasão delas, descreve a figura como processo produtor de surpresa.

Assim, para concretizar o ato retórico, buscavam-se nas figuras os recursos necessários tanto para construir um bom e belo discurso, quanto para seduzir o auditório. Por trás de gestos retóricos simples, porém, essa prática da sedução era obtida por artifícios ligados à articulação entre delectare (agradar), movere (comover) e docere (ensinar), os três níveis de persuasão a que Cicerón (2002Cicerón, M. T. (2002). Sobre el orador. Gredos.) chama de Tria Officia (três modos de persuadir), que se encontram entre os objetivos da retórica de qualquer tempo e assumem a palavra como um recurso de formação e de conformação do homem no mundo.

Considerando-se que a meta a ser alcançada pela figura retórica é a produção do efeito persuasivo, cabe questionar como os discursos fazem isso. Desse modo, a proposta aqui é mostrar o funcionamento de duas dessas figuras, a metonímia e a repetição, buscando destacar os efeitos produzidos por elas. Entende-se que, quando os oradores exploram discursivamente esses artifícios, procurando singularizar os mortos, suscitam - pela mobilização do pathos - tanto reflexão do auditório-leitor quanto respeito à identidade das vítimas.

É importante destacar que essas premissas serão aplicadas não somente em exemplos ancorados na linguagem verbal, que serviu de base para a construção dessa corrente teórica ao longo dos séculos. A aplicação será feita também em produções visuais, que refletem, com suas peculiaridades, estratégias argumentativas e persuasivas para abordar um tema ao mesmo tão sério e tão delicado: a pandemia e os milhares de mortes causados por ela.

2. Figuras retóricas: sobre argumentação e sensibilidade

Tratar das figuras é tratar de uma das questões fundamentais da Retórica. Como salientam Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes., p. 189), é provável que, “desde que o homem meditou sobre a linguagem, reconheceu-se a existência de certos modos de expressão que não se enquadram no comum”. Esse fenômeno, “cujo estudo foi em geral incluído nos tratados de retórica”, recebeu o nome de “figuras de retórica”. Aparentemente recursiva, esta exposição introdutória é condição sine qua non para que se compreenda a trajetória desse expediente (cuja função varia entre o caráter persuasivo e o valor estilístico), bem como para que se estabeleçam as bases do arcabouço teórico a ser trabalhado.

Em um breve percurso pela história das figuras, observa-se que o fenômeno foi objeto de vários estudos. É o que registra Mosca (2004Mosca, L. L. S. (2004). Velhas e novas retóricas: convergências de desdobramentos. In L. L. S. Mosca (Ed.), Retóricas de ontem e de hoje (pp. 17-54). Humanitas.), em uma pontual menção ao tema. Sabe-se que a Retórica Antiga priorizava a arte de falar bem e a eloquência, desse modo a figura

[...] foi alvo de estudos primorosos, tendo-se chegado a um inventário exaustivo e a classificações bastante detalhadas. Cultivadas nos trabalhos da Idade Média, bastante valorizadas no Renascimento, no século XVIII as figuras foram tema de estudo de Dummarsais em seu Traité des Tropes (1730) e no século XIX com P. Fontanier (1821-1827) em Les Figures du Discours, reeditado em 1968, com introdução de G. Genette. (Mosca, 2004Mosca, L. L. S. (2004). Velhas e novas retóricas: convergências de desdobramentos. In L. L. S. Mosca (Ed.), Retóricas de ontem e de hoje (pp. 17-54). Humanitas., p. 34)

Tringali (1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.) torna mais claras as etapas históricas por que passaram os estudos das figuras. O autor faz uma distinção cronológica entre Retóricas Antiga, Clássica e Geral. Na leitura do autor, houve, ao longo do tempo, um processo de afunilamento no foco de interesse da área. De estratégias persuasivas e argumentativas, que teriam nas figuras um dos recursos a serem utilizados (Retórica Antiga), o interesse se restringiu posteriormente à elocução, com amplo espaço para as figuras (Retórica Clássica), até, por fim, torná-las o próprio e único interesse de abordagem.

Essa última fase é dividida em dois momentos, segundo Tringali (1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.). O primeiro iria de 1730 a 1830. O nome utilizado pelo autor para se referir a esse intervalo de cem anos é Retórica das Figuras, posto que eram elas o objetivo nuclear de estudo. Uma medida da relevância e do impacto desse período pôde ser vista no ensino, que estimulou a caracterização e a identificação das variadas formas delas entre os alunos. A didatização foi também o que levou ao declínio. Autores românticos teceram críticas ao método. Para eles, “a linguagem é naturalmente figurada e primeiro a linguagem é figurada e depois, só depois, se faz natural, própria” (Tringali, 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades., p. 120).

Na segunda fase, que se refere à Retórica Geral, o estudo das figuras renasce ao definir “a função poética da linguagem pelo uso das figuras” (Tringali, 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades., p. 120). No caso, a linguagem figurada se generaliza como função poética, propondo-se como “função retórica da linguagem”. Desse modo, como a Retórica se ocupava com os problemas de estilo e de expressão, as figuras contribuíam para deixar o estilo ornamentado.

Convém destacar, no entanto, que é a Retórica Geral que revê as figuras, trazendo uma contribuição no que diz respeito à sua classificação, a qual passa a ser mais abrangente4 4 Essa contribuição pode ser conferida na obra Retórica Geral proposta pelo Grupo µ, de Liége. . Consideradas como “modificações da linguagem seja da palavra, seja da frase”, modificações essas que podem ser observadas “tanto no nível da expressão, como no nível do conteúdo” (Tringali, 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades., p. 121), as figuras são classificadas sob quatro operações gerais: acréscimo, subtração, permuta e repetição. O entrecruzamento dos dados permite a identificação de quatro grupos de figuras:

  1. metaplasmos: figuras fonológicas (compreendem os casos que modificam o aspecto gráfico ou sonoro de palavras ou unidades menores)

  2. metataxes: figuras de sintaxe (compreendem os casos que modificam a estrutura da frase)

  3. metassememas: figuras de natureza semântica (compreendem os casos que modificam o conteúdo do vocábulo)

  4. metalogismos: figuras de pensamento (compreendem os casos que modificam o valor lógico da frase)

Os avanços acarretados pelas Ciências da Linguagem e disciplinas afins, como bem lembra Mosca (2004Mosca, L. L. S. (2004). Velhas e novas retóricas: convergências de desdobramentos. In L. L. S. Mosca (Ed.), Retóricas de ontem e de hoje (pp. 17-54). Humanitas.), permitiram não apenas reexaminar, mas também adaptar a questão das figuras sob novas perspectivas. Desse modo, quanto à classificação, pode-se dizer que, dependendo do olhar teórico e dos propósitos/pressupostos adotados, ela pode variar.

Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), a exemplo, que contribuem com instauração da Nova Retórica na segunda metade do século XX a partir do Tratado da argumentação, consideram as figuras conforme o fim a que se prestam na argumentação. Segundo esses autores, à luz dessa teoria, a linguagem não é tida mais como um meio de comunicação, mas como um instrumento de interação, de ação sobre os indivíduos, capaz de levar os falantes a partilharem seus juízos.

Assim, na busca de estudar as figuras em seu conjunto e “mostrar em que e como o emprego de algumas figuras determinadas se explica pelas necessidades da argumentação” (Perelman & Olbrechts-Tyteca, 2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes., p. 190 - grifos dos autores), os teóricos revelam interesse mais pelas técnicas do discurso persuasivo do que pela legitimação do modo literário de expressão. Nesse sentido, as figuras não são vistas como algo que atua apenas sobre a sensibilidade.

Conforme Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), uma figura é percebida como argumentativa quando acarreta a adesão do ouvinte, quando leva, portanto, a uma mudança de perspectiva. Quando isso não ocorre, a figura é percebida apenas como ornamento, figura de estilo. Isso não significa que ela não possa suscitar a admiração (no plano estético) ou o testemunho da originalidade do orador.

Ainda sobre o papel argumentativo da figura, os autores acrescentam que ela “não deve necessariamente acarretar a adesão às conclusões do discurso, bastando que o argumento seja percebido em seu pleno valor; pouco importa se outras considerações se oponham à aceitação da tese em questão” (Perelman & Olbrechts-Tyteca, 2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes., p. 193). De acordo com eles, é importante destacar que certa figura, reconhecida por sua estrutura, nem sempre produz o mesmo efeito argumentativo.

Os pressupostos de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.) não reduzem as figuras ao pathos, porque não facilitam o argumento, elas constituem o próprio argumento. Levando-se em conta o efeito produzido por certas figuras (que seria, na apresentação dos dados, impor ou sugerir uma escolha, aumentar a presença ou realizar a comunhão), esses autores as classificam em três grupos: figuras da escolha, da presença e da comunhão.

Nessa proposta, as figuras da escolha referem-se à forma como os fatos são apresentados, caracterizados, interpretados. As figuras da presença buscam despertar o sentimento (a consciência) para o objeto do discurso, fazem, portanto, sentir o argumento. Já as figuras de comunhão são aquelas em que o orador se empenha em criar ou confirmar a união com o auditório.

Reboul (2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes.) também destaca o papel persuasivo das figuras retóricas, ressaltando que, sob esse prisma, elas são funcionais, buscam convencer. No entanto, diferentemente do que propõem Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), para ele a figura advém sempre do pathos, tendo em vista que não se pode esquecer o prazer que ela proporciona. Daí sua consideração: “Se o argumento é o prego, a figura é o modo de pregá-lo” (Reboul, 2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes., p. 114).

Nos enfoques contemporâneos, as figuras deixam de ser vistas como meras fórmulas de bem falar e escrever, passando a ser examinadas como figuras de discurso, constituindo, portanto, um procedimento de construção de sentido. Nas palavras de Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto., p. 10), “as figuras são operações enunciativas para intensificar o sentido de algum elemento do discurso. São, assim, mecanismos de construção do discurso”.

Além disso, convém salientar que as figuras retóricas, com vistas à persuasão e seus efeitos, extrapolam o verbal. Ainda que a Retórica tenha priorizado esse tipo de linguagem, é preciso considerar a linguagem geral, com todas as suas modalidades. Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto., p. 15) defende que “em todas as outras linguagens (a pintura, a publicidade, etc.) usam-se metáforas e metonímias”.

A linguagem visual muito se utiliza dos sentidos desse recurso, seja para compartilhar informações, seja para evocar sensações no auditório-leitor, seja para propagar intenções estéticas no processo de persuasão. É o que se verá nos discursos sobre as mortes por Covid-19 constantes das capas de jornais brasileiros, objeto desta análise.

Do exposto, para os propósitos deste texto, será considerado que as figuras retóricas têm sempre uma dimensão argumentativa, por isso, de certo modo, estão a serviço da persuasão. Esse recurso muitas vezes desperta emoções, por isso movimenta o pathos. Desse modo, são expedientes ideais não só para a construção do sentido dos textos, mas também para a edificação de um discurso sedutor, seja em qual linguagem for (verbal, visual).

No que concerne às classificações das figuras retóricas, serão consideradas as palavras de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes., p. 194): “as classificações das figuras geralmente utilizadas em nada nos podem ajudar, o que importa é o que elas trazem à argumentação”. Nesse sentido, a partir de agora, serão abordadas duas figuras que, entende-se, têm um papel relevante no processo argumentativo dos discursos eleitos para nossa análise: a metonímia e a repetição.

3. A metonímia e a repetição

A metonímia, do grego metonymía, designa uma coisa pelo nome de outra a partir de uma relação de contiguidade, isto porque, entre as coisas, há uma relação de compatibilidade, interdependência, vizinhança, proximidade, associação (cf. Tringali, 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.; Reboul, 2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes.; Fiorin, 2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto.). Incluída entre os metassememas, ou seja, o grupo de figuras de natureza semântica, a metonímia é vista, portanto, como um processo semântico. Para Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto., p. 38), a metonímia “estabelece uma compatibilidade predicativa por contiguidade”, que pode ser vista sob dois ângulos: “no eixo da expansão, um valor semântico transfere-se a outro, num espalhamento sêmico” e, “no eixo da intensidade, ela dá uma velocidade maior ao sentido, acelerando-o [...] suprimindo etapas enunciativas”.

Sobre o valor argumentativo da metonímia, Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto., p. 38) observa que está exatamente no fato de essa figura “dar ao sentido aceleração”. Reboul (2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes.), observando outros aspectos recursivos, destaca que o poder de argumentação da metonímia está tanto na “denominação”, capaz de ressaltar tanto o aspecto da coisa que interessa ao orador, quanto na “familiaridade”, tendo em vista que se baseia no “nexo habitual”.

Dentre as espécies de metonímia ou compatibilidades metonímicas, as mais comuns são as de causa e efeito, matéria e objeto, instrumento e autor, continente e conteúdo, lugar e objeto que o caracteriza, símbolo e aquilo que o simboliza, coisa e ser que ela caracteriza, autor e obra, marca e produto, abstrato e concreto (cf. Tringali 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.; Fiorin, 2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto.).

É importante considerar, juntamente com Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto.), que a metonímia não se restringe à dimensão de uma palavra ou de um sintagma, já que, por meio dela, é possível construir textos inteiros. É também necessário salientar que essa figura não se limita ao verbal, visto que se apresenta por meio de outras linguagens, como a visual. A exemplos, considerem-se indicações de lugares em placas ou talheres que significam “restaurante”.

Uma das preocupações de quem aborda a metonímia é distingui-la da sinédoque. Aqui, entende-se que elas estão ligadas ao mesmo processo semântico, já que a sinédoque é considerada um tipo de metonímia. A diferença, conforme Fiorin (2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto., p. 38), é “que a relação de contiguidade é do tipo parte pelo todo, o que significa que a transferência sêmica se faz entre dois sentidos que constituem um todo”, havendo um englobamento. Dentre os tipos de sinédoque mais comuns, estão a coexistência de parte e todo, matéria e objeto, singular e plural, gênero e espécie.

Da classificação das figuras proposta por Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), tanto a metonímia quanto a sinédoque poderiam ser consideradas figuras de escolha. Os autores ressaltam que, embora as funções delas não sejam essencialmente as da escolha, esta poderia servir-lhes, porque está relacionada ao modo como os fatos são apresentados ou caracterizados.

Outra figura retórica que se destaca nos discursos que aqui serão analisados é a repetição. Embora não se tenha muito o que falar sobre ela, tendo em vista que a denominação condiz com o papel exercido por ela, qual seja, a ênfase, há diferentes tipos de repetição, os quais estão relacionados, de certo modo, com a disposição em que se dá a reprodução: no início, no meio, no final, numa sequência contínua. Assim, ela se efetiva em níveis diversos e sob variadas formas.

Nesse sentido, nas propostas de classificação das figuras retóricas, considerando-se a Retórica Geral, a repetição se enquadra nas metataxes, que compreendem os casos que modificam a estrutura da frase/do texto, isto é, ligam-se ao modo, à disposição do que se reproduz. Para Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), a repetição se inclui entre o que eles chamam de figuras de presença, por despertar o sentimento de consciência do objeto do discurso, fazendo com que se perceba o argumento.

Assim como ocorre com a metonímia, a repetição não se limita à linguagem verbal (considerando-se palavras, grupos de palavras, sons, estruturas sintáticas). O elemento da repetição pode ocorrer também na linguagem visual, como é o caso dos signos icônicos (imagens) e dos plásticos (cor e textura). Além disso, segundo Carrere e Saborit (2000Carrere, A., & Saborit, J. (2000). Retórica de la pintura. Cátedra.), o objeto da repetição pode ser com elementos iguais ou diferentes, por alteração de algum dos níveis de expressão.

Em termos de força argumentativa, os estudiosos defendem que ela pode ressaltar “o caráter chocante” de um fato, “acentuar o fracionamento de um acontecimento complexo em episódios detalhados”, “sugerir distinções” (Perelman & Olbrechts-Tyteca, 2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes., p. 198-199); “emocionar o auditório e ferir a parte contrária” (Reboul, 2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes., p. 114). Na verdade, pode-se considerar que a repetição persuade pelo uso contínuo de algo. Trata de um recurso a partir do qual o orador tende a estabelecer com seu auditório uma fixação e uma relação de contato mais prolongada, engendrando a informação de modo intenso e eficaz. Com base no exposto, passa-se agora à análise dos discursos sobre as mortes pelo novo coronavírus, que constam das capas de dois jornais brasileiros, objetos desta análise.

4. Figuras retóricas em discursos sobre as mortes por Covid-19 no Brasil

Foi dito que as figuras são recursos expressivos utilizados a serviço da persuasão. Os discursos a serem analisados, como já exposto, foram publicados nas capas de dois jornais brasileiros, o carioca O Globo, em 21 de agosto de 2020, e o paulistano Folha de S.Paulo, em 8 de janeiro de 2021. Os discursos das capas colocam em destaque as vidas perdidas pelo novo coronavírus no país, referindo-se respectivamente às 100 mil e às 200 mil mortes. Para isso, valem-se retoricamente de duas figuras para informar e sensibilizar: a metonímia e a repetição.

Sabe-se que faz parte do processo de persuasão organizar estrategicamente o discurso. Reboul (2004Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. Tradução Ivoni Castilho Benedetti. Martins Fontes., p. 54) destaca essa questão quando afirma que a “retórica apresenta-se como um código a serviço da criatividade”. Nesse sentido, além de o orador buscar as provas que sustentam o discurso, é preciso organizá-lo da maneira mais favorável às suas intenções persuasivas.

Para demonstrar como o trabalho com a organização dos dados que compõem os discursos das capas selecionadas para esta análise apresentam-se de modo singular, é necessário, antes, explicar como são, tradicionalmente, as páginas de abertura dos jornais, entre as quais as que serão aqui analisadas. De modo geral, pode-se dizer que a composição final é resultado de um gerenciamento entre a relevância do assunto e o modo como ele será exposto ao auditório.

A relevância se confunde com a própria função exercida pela capa de um jornal impresso. Ela tem por objetivo apresentar ao leitor o que de mais importante aquela edição contém. Numa disposição visual prototípica, o assunto mais importante é o que recebe a manchete principal, no alto da página (logo abaixo do nome do jornal), com letras maiores, acompanhada ou não de foto. Por consequência, seria a que deveria ter maior destaque, construindo junto ao auditório-leitor (e para ele) uma função retórica pedagógica. As demais notícias ficariam distribuídas no restante do espaço.

Quando se diz que a relevância é equacionada ao modo de exposição, é porque, em determinadas situações - como coberturas especiais, datas marcantes ou mesmo a produção de um conteúdo mais amplo e aprofundado -, o assunto a ser destacado pode fugir do padrão prototípico e compor uma capa diferenciada, pensada especificamente para o tema ou o assunto. Por demandar um planejamento gráfico mais trabalhado, tende a ser um recurso menos usual. Nesta segunda situação, fica bem mais evidente a função persuasiva exercida pela capa.

Os dois exemplos que irão compor esta análise são casos de capas elaboradas para marcar um fato especial, o de o número de mortes causadas pelo coronavírus no Brasil ter alcançado as marcas de 100 mil, em O Globo, e de 200 mil, na Folha de S.Paulo. Na sequência, as páginas de abertura dos dois periódicos serão contextualizadas e descritas para, então, serem feitas as respectivas análises.

A primeira capa a ser abordada é a do jornal O Globo, edição de 21 de agosto de 2020, uma terça-feira, data em que o Brasil registrou 100 mil mortes pela Covid-19. O jornal considerou aquele o assunto mais relevante a ser exposto a seu auditório-leitor. Foi o único a figurar na capa daquele dia, mostrado, portanto, como raro, preferível, insubstituível. A forma de abordar a notícia também foi singular: ressaltar os rostos das vítimas, uma forma de privilegiar a pessoa, a sua identidade. É o que se pode observar na Figura 1.

Figura 1
Capa d’ O Globo de 21 de agosto de 2020

A página de abertura de O Globo, como visto na Figura 1, destoa das capas prototípicas impressas diariamente pelo jornal. Isso, por si só, já exerce uma função retórica de chamar a atenção do auditório-leitor por meio do inusitado, do diferente, do singular, e, por que não, único também. O recurso que o veículo procurou utilizar foi o de humanização das vítimas da Covid-19. Em vez de expor a notícia em si, a marca de 100 mil mortos no país por conta da doença, procurou-se dar rosto a algumas das vítimas.

Expondo em palavras o que se vê. Identificam-se fotos de várias pessoas, mostradas em tamanho padronizado, quadrado, compondo quase toda a página. Sabe-se quem são ao se ler a manchete daquela edição, grafada no alto da página, em letras grandes e maiúsculas, nas cores cinza e azul: “100 MIL HISTÓRIAS”. Fica esclarecido, então, que cada uma daquelas pessoas mostradas ali guarda um relato, uma história de luta contra a doença. Em comum, o fato de terem perdido a batalha.

Uma das imagens se destaca. Composta pelas fotos de outras vítimas, vê-se o rosto de uma mulher de cabelos pretos, mostrada olhando de frente para o auditório-leitor. A primeira linha-fina - nome dado no jargão jornalístico às frases que aparecem abaixo das manchetes e que complementam o título dado à notícia - explica quem é. Trata-se de Rosana Aparecida, a primeira a perder a vida para a doença no Brasil. As demais linhas-finas terminam por dar um fecho à capa especial: “Em cinco meses, pandemia marcou para sempre milhares de famílias, expôs o despreparo do governo e acelerou o passo da ciência”.

No que diz respeito às estratégias retóricas usadas no discurso dessa capa, vê-se que a metonímia assume um papel preponderante, isso considerando que há várias espécies de compatibilidades metonímicas e que as relações predicativas por contiguidade podem ser estabelecidas por meio de diferentes linguagens. Aqui, é possível notar que o orador explora essa figura em dois níveis.

O primeiro deles é o verbal, que pode ser visto na manchete, especificamente a partir do enunciado “100 MIL HISTÓRIAS”, em que “HISTÓRIAS”, numa espécie de associação, designa “VÍTIMAS DE COVID”. Trata-se de uma compatibilidade de causa e efeito, tendo em vista que as histórias de vida têm como resultado a morte. Nota-se uma extensão sêmica, com a transferência de valores semânticos de um para outro dos elementos coexistentes. A força argumentativa reside exatamente nessa extensão, que ressalta o aspecto da situação que interessa ao orador: evidenciar as histórias (de vida), e não as vítimas.

O segundo nível em que se explora a metonímia é o visual, uma vez que as vítimas do coronavírus são retratadas a partir da imagem de seus rostos. Nesse caso, a compatibilidade metonímica é do tipo parte pelo todo. Os rostos são, portanto, a parte intencionalmente escolhida como responsável pela transferência sêmica feita entre os sentidos. Cada pessoa em si, em sua plenitude, é representada pela parte que a identifica: a face. Uma vez mais o valor argumentativo da metonímia se mostra no elemento ressaltado, que é capaz não apenas de identificar as pessoas, mas de torná-las familiares, reconhecíveis, lembradas.

Ainda é preciso considerar que o rosto de Rosana Aparecida, o que se sobrepõe aos das demais vítimas retratadas, também reflete um caso de metonímia visual, cuja relação de contiguidade é do tipo parte pelo todo, o que significa que a transferência sêmica se faz entre dois sentidos que constituem um todo, havendo um englobamento. No entanto, o rosto de Rosana não reflete apenas parte da identidade da mulher, reflete também uma parcela de todos os que morreram em virtude da Covid-19. Ela foi apenas a primeira das 100 mil vítimas. Desse modo, levando-se em conta o texto visual, pode-se dizer que ele constitui uma totalidade metonímica.

A outra figura retórica que se destaca no discurso da capa, como já mencionado, é a repetição. Considerada por Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.) como um caso de figura de presença, a repetição procura suscitar a consciência sobre o objeto do discurso, fazendo conhecer o argumento. Esse expediente pode ser observado nessa capa a partir de diferentes elementos da linguagem visual, caso dos signos icônicos e plásticos, forma como o Grupo µ (1993Grupo µ (1993). Tratado del signo visual: para una retórica de la imagen. Cátedra.) divide o que chama de signo visual.

Para os autores do grupo, o signo icônico representa uma construção de algo correlato do mundo real. No caso em tela, trata-se de uma reprodução, por meio de fotografias, de rostos de vítimas do coronavírus. Embora as faces sejam diferentes umas das outras, há o recurso de repetição de fotografias e do molde geométrico onde elas foram expostas. Essa replicação tende não apenas a aumentar a consciência da situação, amplificando os mortos pela Covid-19, mas, também, a sugerir que eles devam ser lembrados como pessoas que tiveram suas “histórias” interrompidas.

O valor argumentativo, nesse caso, está no caráter chocante do fato em si e no modo tocante como ele é exposto ao auditório-leitor: realça-se a proporção de um acontecimento complexo em episódios particularizados. Não seriam apenas 100 mil mortos. Seria a repetição de 100 mil fotografias de rostos, impressos nas páginas do jornal. Desse modo, não há como ignorar a maneira intensa e eficaz como informação é engendrada.

Ainda que os diferentes tipos de repetição estejam atrelados à linguagem verbal e se efetivem em níveis diversos e sob variadas formas, pode-se considerar que o tipo de repetição trabalhado é a epizeuxe, ou seja, o encadeamento, no qual se nota a repetição seguida de mesmo elemento (cf. Tringali, 1988Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.; Fiorin, 2014Fiorin, J. L. (2014). Figuras de retórica. Contexto.), qual seja, fotos.

Para o Grupo µ (1993Grupo µ (1993). Tratado del signo visual: para una retórica de la imagen. Cátedra.), o signo plástico abarca a cor e a textura. Articuladas, levam a um terceiro aspecto, a forma. Haveria, portanto, uma integração dos três. Esse raciocínio é particularmente presente na capa de O Globo aqui analisada. Percebe-se que a composição das fotografias simula uma textura diferente ao rosto da mulher exposta em destaque. É como se olhos, sobrancelhas, boca, cabelo, colo, a pele como um todo fosse composta por aquelas imagens. O resultado é que constroem um recurso gráfico que simula a rugosidade. Outro possível efeito proporcionado é o de um quebra-cabeças completo, composto por suas diferentes peças (que seria cada uma das várias fotografias ali reproduzidas).

Nota-se que, para se obterem esses efeitos, apela-se obrigatoriamente para a repetição. Esta, segundo o Grupo µ (1993Grupo µ (1993). Tratado del signo visual: para una retórica de la imagen. Cátedra.), é elemento integrante da textura. E, para que se moldem a ponto de levar à percepção da forma, a cor exerce papel essencial. A coloração permitiria, segundo os autores, sete possíveis contrastes: 1) de uma mesma cor, obtida por maior ou menor luminosidade; 2) claro e escuro (branco e preto ou saturado e não saturado); 3) quente e frio; 4) complementar, cujo efeito resultaria no cinza; 5) simultâneo, ancorado no efeito de olhar; 6) de qualidade, com cores fragmentadas por preto ou branco; 7) de quantidade, pela percepção do tamanho.

Na capa de O Globo, parece haver, para a composição do rosto da mulher apresentada em tamanho maior, uma mistura de dois dos recursos elencados. Há tanto alternância de claro e escuro, entre preto e branco, quanto uma complementariedade dos dois, levando à obtenção do cinza, necessário principalmente para simular a sombra do rosto oposta à luminosidade dele. Uma vez mais, a repetição das cores próximas foi necessária para que se obtivesse a forma (resultado global do signo plástico), que levaria à percepção do signo icônico.

Ainda sobre a capa, é preciso considerar que a notícia sobre os 100 mil mortos que aparece em destaque é detalhada também em outras três reportagens sobre a pandemia, destacadas no pé da página. Lidas da esquerda para a direita, a primeira (“Dor na periferia”) explica onde Rosana morava (bairro pobre de São Paulo) e que havia morrido sem diagnóstico definido. A segunda (“Sem rumo”) versa sobre os problemas enfrentados no Ministério da Saúde (rotulado como “caos na saúde”) no combate à pandemia (nomeada como “tragédia”)5 5 A título de contextualização, o “caos na saúde” a que se refere à reportagem pode ser sintetizado por dois fatores: a) indicação de uso da “cloroquina” (medicamento variante da hidroxicloroquina, destinado a pacientes com lúpus e malária, entre outras patologias, que o governo federal passou a defender o uso para o combate ao coronavírus, mesmo não havendo comprovação científica sua eficácia) e b) as trocas de ministros de saúde (naquele momento havia ocorrido duas delas: o médico Luiz Henrique Mandetta e o oncologista Nelson Teich deixaram o cargo por discordarem do uso da cloroquina e por defenderem o isolamento social, ao contrário do que apregoava o presidente Jair Bolsonaro. Interinamente à época, foi colocado à frente da pasta um militar da ativa, Eduardo Pazuello). . Já a terceira (“Salto científico”) trata da velocidade dos estudos na busca por uma vacina contra a doença.

Em cinco meses, o número de óbitos provocados pela pandemia havia dobrado no Brasil. Do mesmo modo como O Globo fez, a Folha de S. Paulo procurou registrar a marca dos 200 mil mortos com uma capa especial, planejada especificamente para noticiar esse fato. A Figura 2 mostra como ela foi feita:

Figura 2
Capa da Folha de São Paulo de 8 de janeiro de 2021

Publicada em 8 de janeiro de 2021, uma sexta-feira, a capa tinha um diferencial em relação ao exemplo anterior, de O Globo: não se tratava de uma página de abertura monotemática. Do modo como foi composta, ela procurava dar destaque a dois assuntos. O primeiro aparecia no espaço próprio às manchetes diárias, ou seja, no topo da página, com letras maiores, mostradas abaixo do nome do jornal. Lia-se que a “Coronavac tem eficácia de 78% em estudos no Brasil”. A referência era à divulgação parcial sobre a eficiência da vacina chinesa Coronavac, produzida no país em uma parceria firmada com o Instituto Butantã, de São Paulo.

Feito com pompa, o anúncio do governo estadual sugeria que a eficácia do medicamento era de 78%. O que não foi dito à imprensa, e só seria revelado na semana seguinte, estrategicamente sem o mesmo destaque dado anteriormente pelas autoridades estaduais, era que a eficácia total, referente ao conjunto todo de voluntários submetidos às doses na fase de testagem, havia sido de 50,38%. Ainda assim, estava acima do mínimo exigido pela OMS (Organização Mundial de Saúde) para situações de pandemia (pede-se mínimo de 50%).

O texto da chamada de capa da Folha de S. Paulo daquela data refletia as informações fornecidas até então pelo governo paulista. A notícia deixava claro que o índice “se aplica à prevenção de casos leves da doença”. Embora faltasse a outra parte dos dados, só anunciados dias depois, era a primeira esperança concreta no país de acesso a uma vacina contra a pandemia do coronavírus. No dia 17 de janeiro daquele ano, as primeiras doses passaram a ser aplicadas em profissionais da área de saúde.

Isso justifica a opção editorial do jornal de pôr em destaque o índice de eficácia da vacina. Paralelamente, havia outro fato relevante sobre a pandemia: ela já havia levado à morte de 200 mil brasileiros. Em termos verbais, esse segundo assunto teve destaque menor: “País chega a 200 mil mortos pela Covid ante série de erros”. Na disposição da capa, a frase aparece no pé da página, com uma manchete redigida com tipos gráficos em tamanhos menores que o da chamada principal.

Mas, como dito, isso em termos verbais. Se observadas a linguagem visual e a composição da capa como um todo, os milhares de mortes acabam tendo maior destaque junto ao auditório-leitor. Isso porque o tópico ocupa visualmente toda a área central da página. Somado à parte verbal, são praticamente dois terços do espaço disponibilizado para resumir os assuntos principais daquela edição. Na prática, a atenção obtida é, tendencialmente, maior.

O que se fez visualmente foi a exposição de fotos de dezenas de pares de calçados. Dispostos simetricamente uns ao lado (horizontalmente) e acima (verticalmente) dos outros, eles, em um primeiro momento, chamam a atenção (pelo inusitado, pelo singular, ainda mais em se tratando de uma capa de um jornal diário) ao mesmo tempo em que criam uma curiosidade, um mistério sobre do que se trata. Isso só é revelado na legenda das fotos, exposta logo abaixo da última linha de fotos.

Lia-se na legenda: “Em homenagem às vítimas do coronavírus, a Folha reuniu mais de cem fotos de pares de sapatos que pertenciam a elas e representam a ausência dessas pessoas para os familiares”. Essa composição demanda necessariamente um planejamento prévio para ser executada (dificilmente seria reunida mais de uma centena de calçados de vítimas em único dia). Ou seja, havia uma indicação clara de que a capa vinha sendo pensada com antecedência. A composição dela também.

Por que, então, não ocupou a manchete principal? Possivelmente, pela importância da notícia referente à proximidade da vacina contra a pandemia, algo aguardado havia dez meses, desde quando os primeiros casos haviam sido registrados no país. A solução encontrada seria a de mesclar o molde prototípico da capa diária, com a manchete principal no alto da página, e compor o restante dela com a marca dos 200 mil mortos.

Cabe reprisar que não se tratava de uma capa monotemática, ao contrário do exemplo anterior, de O Globo. Na página de abertura da Folha de S. Paulo mostrada, podiam-se ler outras manchetes, expostas com destaque menor, como as relacionadas ao noticiário econômico (“Bolsa vai a 112 mil pontos com Biden, vacinas e China”) e internacional (“Facebook e Instagram vão banir Trump até o fim de seu mandato”).

Mas o registro mais relevante é mesmo que parte das histórias resumidas metonimicamente nos calçados é detalhada nas páginas internas do jornal. A seguir, a título de ilustração, reproduz-se uma delas, do modo como foi publicada pelo diário (Figura 3). Trata-se da história de Maria José da S. Souza, de 58 anos. Moradora de São Paulo, era faxineira. “A sapatilha”, registra o texto, “era sua companheira na hora de ir à igreja”.

Figura 3
Folha de São Paulo de 7 de janeiro de 2021

Observando a capa em termos retóricos, identificam-se, uma vez mais, a metonímia e a repetição. Nesse caso, as duas figuras também assumem um papel de destaque e, em ambas as situações, são exploradas por meio da linguagem visual, via signos icônicos. As metonímias podem ser percebidas a partir das fotos dos sapatos dos falecidos pela Covid-19. As vítimas são, portanto, representadas por seus calçados.

Dentre as compatibilidades metonímicas, veem-se tanto a do tipo parte pelo todo, quanto a do tipo coisa e o ser que ela representa. Os calçados (parte/coisa) representam os donos deles (todo/ser), que não poderão mais usá-los por terem falecido. Em um segundo nível, cada sapato, sandália e tênis exposto representa um conjunto maior, o das 200 mil pessoas que também morreram. Dado que confere ao texto uma totalidade metonímica.

Como a metonímia se explica pelas necessidades da argumentação, verifica-se que sua força persuasiva está no elemento estrategicamente selecionado (os calçados) para estabelecer a difusão semântica pretendida: são eles que permitem recuperar as vítimas, tornando-as, presentes.

A repetição icônica pode ser vista na replicação das fotos dos sapatos, reprisadas horizontal e verticalmente na página. Essa repetição, se lida segundo os pressupostos de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.), teria a função de criar aquilo que, em Retórica, se chama de presença. Esta atua de modo direto sobre a nossa sensibilidade. No que diz respeito ao tipo, pode-se considerar um caso de epizeuxe, que concerne à reprodução seguida de mesmo elemento: os calçados.

Assim, o discurso da capa busca tornar presente, apenas pelos sapatos, sandálias e tênis, o que está efetivamente ausente e que deve ser evidenciado. Tal como ocorre em O Globo, a Folha de S. Paulo também reitera em sua capa o caráter chocante, mas extremamente tocante, do episódio, salientando o fracionamento da tragédia a partir de casos individualizados.

Considerando-se as duas capas, é preciso salientar, no entanto, que, ao mesmo tempo em que repetem as estratégias, tanto O Globo quanto a Folha de S. Paulo individualizam os dados: cada rosto, cada calçado é diferente, tem, portanto, uma identidade. Isso é dar destaque à personalidade humana. Em termos retóricos, é buscar ser expressivamente persuasivo. Exploradas discursivamente, a metonímia e a repetição funcionam também para comover, impressionar, ou seja, mover o pathos, incitando sobretudo a compaixão e o respeito às vítimas da Covid-19.

5. Considerações finais

Nas descrições que os historiadores farão sobre a Covid-19, um dos capítulos possivelmente irá registrar que o mundo precisou aprender, às pressas, que medidas de segurança eram itens necessários para enfrentar e superar a pandemia. Máscaras de proteção ajudaram a impedir o contágio aéreo. Lavagem das mãos com água e sabão ou com álcool (líquido ou gel, com índice de 70%) eliminaria o vírus. As menções às máscaras e ao álcool, feitas verbalmente ou mostradas por fotos ou desenhos, talvez configurem metonímias nessas análises críticas sobre a doença. Metonímias como as trabalhadas neste artigo.

A proposta foi observar o funcionamento das figuras retóricas - duas delas especificamente, a metonímia e a repetição - em discursos sobre as mortes pela pandemia do coronavírus no Brasil, levando-se em conta para isso as capas dos jornais O Globo e a Folha de S. Paulo que registraram quando o país superou as 100 mil e as 200 mil mortes.

Sem ressaltar números ou estatísticas ao exporem o avanço da doença, as capas apresentaram identidade visual própria (na disposição gráfica, na utilização da cor, no modo como foram redigidas as manchetes principais), ressaltando ainda mais a singularidade e, por consequência, a relevância do que era noticiado na primeira página daquelas edições. Isso foi feito a partir da metonímia e da repetição.

A metonímia (seja ela verbal, seja visual), em sendo uma figura de escolha, mostrou a sua força persuasiva ligada à seleção estratégica do elemento usado para a difusão semântica almejada. No caso, as metonímias “história”, “rostos” e “calçados” permitiram recuperar as vítimas, tornando-as, de certa maneira, presentes e individualizadas. Os elementos escolhidos caracterizam a figura como um processo produtor de surpresa.

Já a repetição, em sendo uma figura de presença, mostra seu caráter persuasivo exatamente na ênfase, que tanto é capaz de chocar quanto de sensibilizar pela proporção realçada: 100 mil fotos de rostos e 200 mil fotos de sapatos. Ao mesmo tempo em que se repetem os dados, eles também são individualizados: cada rosto e cada sapato é diferente porque representa uma identidade. Logo, a repetição não apenas aumenta a consciência da situação como também sugere distinções a partir da diversidade de rostos e sapatos mostrados, reafirmando o enunciado de que as vítimas devem ser lembradas por sua identidade.

Ambas as capas centraram o olhar numa abordagem humanizada, tendo em vista que os números expressivos deram vez aos rostos e aos calçados das vítimas, mesmo que reprisados muitas vezes. Não se tratava apenas de explorar os 100 mil e os 200 mil mortos, mas de um “conjunto de pessoas” infectadas pela Covid-19 e que perderam a luta contra a moléstia pandêmica. Assim, tanto O Globo quanto a Folha buscaram, a partir da metonímia e da repetição, singularizar e eternizar as vidas perdidas, destacando a identidade das pessoas. Ao fazerem isso, não só se mostraram sensíveis à situação, mas, também, buscaram sensibilizar o auditório-leitor, movimentando, desse modo, fortemente o pathos.

A partir da reflexão sobre o funcionamento das figuras retóricas em discursos sobre as mortes por Covid-19 no Brasil, pode-se dizer que esses expedientes desempenham um papel relevante no processo argumentativo, não só porque são recursos ideais para a construção do discurso sedutor, mas também porque participam da construção do sentido dos textos. Desse modo, fica evidente a função persuasiva que as figuras exercem sobre os elementos emotivos que constituem e fundamentam a estrutura dos discursos, ultrapassando o seu papel puramente informativo para cumprir uma finalidade: seduzir e levar à reflexão.

Pode-se ressaltar ainda que os efeitos produzidos pelas figuras retóricas nos discursos não passam despercebidos. No jogo das sugestões, observa-se que tanto a metonímia quanto a repetição buscam a tríplice estratégia para chamar a atenção do auditório-leitor: por uma emoção suscitada (movere), por uma informação transmitida (docere), por um prazer oferecido (delectare).

Referências

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    » https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-19-aponta-estudo-australiano.ghtml
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  • O Globo (2020). https://www.vercapas.com.br/edicao/capa/o-estado-de-sao-paulo/2020-06-21/ (acesso 10 de fevereiro, 2021).
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  • Perelman, C., & Olbrechts-Tyteca, L. (2005). Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina A. P. Galvão. Martins Fontes.
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  • Tringali, D. (1988). Introdução à retórica: a retórica como crítica literária. Duas Cidades.
  • 3
    G1 (2021G1 (2021). Brasil é pior país do mundo na gestão da epidemia de Covid-19, aponta estudo australiano. https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-19-aponta-estudo-australiano.ghtml (acesso em 10 fevereiro. 2021).
    https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/...
    ). https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-19-aponta-estudo-australiano.ghtml (acesso em 10 fevereiro, 2021).
  • 4
    Essa contribuição pode ser conferida na obra Retórica Geral proposta pelo Grupo µ, de Liége.
  • 5
    A título de contextualização, o “caos na saúde” a que se refere à reportagem pode ser sintetizado por dois fatores: a) indicação de uso da “cloroquina” (medicamento variante da hidroxicloroquina, destinado a pacientes com lúpus e malária, entre outras patologias, que o governo federal passou a defender o uso para o combate ao coronavírus, mesmo não havendo comprovação científica sua eficácia) e b) as trocas de ministros de saúde (naquele momento havia ocorrido duas delas: o médico Luiz Henrique Mandetta e o oncologista Nelson Teich deixaram o cargo por discordarem do uso da cloroquina e por defenderem o isolamento social, ao contrário do que apregoava o presidente Jair Bolsonaro. Interinamente à época, foi colocado à frente da pasta um militar da ativa, Eduardo Pazuello).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Fev 2021
  • Aceito
    11 Jul 2021
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