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Cordialidade à brasileira: O animal cordial como metáfora do Brasil contemporâneo

Brazilian cordiality: The Friendly beast as a metaphor for contemporary Brazil

Resumo

O artigo busca como objetivo principal aprofundar uma possibilidade de leitura simbólica, por meio da análise de personagens e cenas, do thriller de horror O animal cordial (2017), dirigido por Gabriela Amaral Almeida. A leitura propõe o filme como uma metáfora do Brasil contemporâneo: um país rachado por tensões sociais de diferentes matrizes ? raça, gênero, cor, classe social, rivalidades regionais ? que vêm se esgarçando em uma trama de medo e ódio. No filme, graças ao evento inusitado que liga as engrenagens da trama, essas tensões terminam por explodir em uma série de atos de violência, que aludem de múltiplas e diferentes maneiras ao conceito de “homem cordial”, elaborado em 1936 pelo historiador Sergio Buarque de Holanda.

Palavras–chave
homem cordial; horror social; gênero fílmico; Jair Bolsonaro; slasher

Abstract

This paper aims to deepen a culturalist possibility of symbolic reading, through the analysis of characters and scenes, from the horror thriller Friendly beast (2017), by Gabriela Amaral Almeida. This symbolic reading works as a metaphor for contemporary Brazil: a country split by social tensions of different matrices ? race, gender, color, social class, regional rivalries ? that have been gradually breaking apart in a plot of fear and hate. In the feature film, due to the unusual event that links the gears of the plot, these tensions end up exploding in a series of acts of violence, which allude in multiple and different ways to the concept of “cordial man”, elaborated in 1936 by historian Sergio Buarque de Holanda.

Keywords
cordial man; social horror; film genre; Jair Bolsonaro; slasher

Introdução

A trama de O animal cordial (Friendly beast), de Gabriela Amaral Almeida, 2017, se passa em uma só noite, dentro de um mesmo local: um restaurante de classe média, localizado numa região tranquila da cidade de São Paulo. O protagonista, Inácio (Murilo Benício), põe a engrenagem da trama em movimento quando reage violentamente a uma tentativa de assalto cometida por dois ladrões encapuzados (Humberto Carrão e Ariclenes Barroso). O incidente obriga sete pessoas a ficarem trancadas no estabelecimento ― além do dono e dos assaltantes, dois funcionários e três clientes ― pelo resto da noite. A convivência forçada entre aqueles estranhos, e o clima de desconfiança e paranoia que cresce pouco a pouco entre eles, acaba por trazer à superfície um choque de forças sociais até então latente, escondido sob máscaras sorridentes de falsa cordialidade. Esse embate explode em uma espiral de sangue e violência.

Organizado com base em estrutura e convenções estilísticas de um slasher1 1 Subgênero do horror cinematográfico no qual os personagens de um filme são mortos, um a um. , O animal cordial pode ser lido dessa maneira mais literal, e também oferece leituras alegóricas, de matriz sociológica. Este artigo tem como objetivo aprofundar uma dessas possibilidades, por meio da análise de personagens e cenas. Quando posta em operação, essa leitura do longa-metragem de estreia de Gabriela Amaral Almeida funciona como uma potente metáfora do Brasil contemporâneo: um país rachado por tensões sociais de diferentes matrizes ― raça, gênero, cor, classe social, rivalidades regionais ― que vêm se esgarçando aos poucos, fenômeno comprovado por registros diários de atos de ódio. No filme, graças ao evento que liga as engrenagens da trama, essas tensões terminam por explodir em uma série de atos de medo, raiva e violência.

Assim, a leitura alegórica, como veremos a seguir, sugere que o restaurante onde ocorre a ação dramática pode ser compreendido como uma espécie de microcosmo metafórico do Brasil, enquanto os personagens simbolizam múltiplas forças sociais, políticas e ideológicas em choque. A fatídica noite, e a sucessão trágica de eventos que escancaram essas fricções sociais em múltiplos níveis transversais, pode ser lida como a alegoria de turbulento período político e social, que começou a ser percebido com mais clareza a partir da série de manifestações populares ocorridas entre abril e julho de 2013 ― que alguns jornalistas chamaram de Jornadas de Junho2 2 Série de manifestações populares que levaram milhares de pessoas às ruas de 438 cidades brasileiras, com confrontos violentos entre manifestantes e policiais. Essas manifestações pediam inicialmente a revogação de um aumento de passagens de ônibus na cidade de São Paulo, mas à medida que os protestos cresciam e se expandiam, seguindo o mesmo padrão visto em movimentos como a Primavera Árabe e o Ocuppy Wall Street, as causas se tornaram mais difusas, reunindo representantes de diversos espectros políticos que lutavam por objetivos diversos. (Al Hanati, 2013AL HANATI, Yuri. O que restou das jornadas de junho? In: A Gazeta do Povo, 24/11/2013. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/o-que-restou-das-jornadas-de-junho-3taxtogmq212tube76k7o7wb2/. Acesso em: 10 nov. 2023.
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; Toledo, 2013TOLEDO, Luiz Fernando. Passeata dos cem mil, caras pintadas e movimento passe livre debatem Jornadas de Junho. In: O Estado de São Paulo, 13/12/2013. Disponível em: https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,passeata-dos-cem-mil-caras-pintadas-e-movimento-passe-livre-debatem-jornadas-de-junho,1107798. Acesso em: 09 nov. 2023.
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) ― e culminou com a eleição de Jair Bolsonaro, ex-militar conservador de extrema direita, à Presidência da República, alguns meses após o lançamento do filme.

Desde então, o cenário social e político do Brasil permanece sombrio, mesmo após a saída de Bolsonaro da chefia do Poder Executivo. A ascensão do autoritarismo, as práticas fascistas e reacionárias de parte significativa da população e o crescimento da representatividade política de membros de igrejas neopentecostais fundamentalistas têm provocado uma reação agressiva de membros de minorias identitárias relacionadas a gênero, raça e credo, bem como o fortalecimento de culturas sociais de espectro mais à esquerda. O enredo de O animal cordial, como veremos adiante, permite uma interpretação do enredo como um microcosmo desse racha social.

A chave interpretativa que incentiva a leitura alegórica está no título do filme. A contradição aparente entre as duas palavras que o compõem ― constituindo uma referência lógica à jornada de Inácio, o dono de restaurante cuja reação violenta ao assalto dá partida a um processo de brutalização individual, encaminha aquela noite rumo a um final trágico ―, traz, também, no português, um elemento ainda mais significativo. Essa chave de interpretação carrega uma referência ambiciosa e ambivalente, pois faz alusão direta a um dos mais importantes conceitos da sociologia brasileira: a noção de “homem cordial” (Holanda, 2014HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014.), elaborada em 1936 pelo historiador Sergio Buarque de Holanda (1902-1982). Esse conceito, muito reconhecido e citado — muitas vezes equivocadamente, como veremos —, consiste em uma das mais consistentes tentativas de explicar e sintetizar a identidade nacional brasileira, como apontam historiadores, antropólogos e sociólogos (Bresser-Pereira, 1987BRESSER-PEREIRA, Luiz Ccarlos. Relendo Raízes do Brasil. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (1936-69). Raízes do Brasil. 5. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1987.; Faoro, 2002FAORO, Raymundo. Mestre Sérgio. In: Folha de São Paulo, 23/06/2002. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2306200204.htm. Acesso em: 10 nov. 2023.
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; Schwarcz, 2008SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sérgio Buarque de Holanda e essa tal de “cordialidade”. In: Revista IDE, Psicanálise e cultura, São Paulo, v. 86, n. 31, p. 83-89, 2008.; Nicodemo, 2013NICODEMO, Thiago Lima. Os planos de historicidade na interpretação do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda. In: História da historiografia, Programa de Pós-Graduação em História – UNIRIO e UFOP. Rio de Janeiro, v. 7, n. 14, p. 44-61, 2013.; Costa, 2015COSTA, Emília Viotti da. Brasil: história, textos e contextos. São Paulo: Unesp, 2015.).

O conceito de “homem cordial”, portanto, será o eixo de nossa análise. Para tanto, procuraremos apresentar o conceito em todas as suas nuances de complexidade, explicando o contexto do seu surgimento no Brasil dos anos 1930. É necessário recorrer ao contexto histórico para enfatizar como parte dos leitores de Holanda interpretam a ideia de “homem cordial” de maneira errônea. O próprio autor percebeu isso, tendo feito sucessivas revisões do texto original em reedições do livro Raízes do Brasil (1936), no qual apareceu pela primeira vez. Em nossa análise do filme, procuraremos demonstrar como o conceito continua atual e, em particular, parece ter sido cristalizado simbolicamente de maneira precisa pela sucessão de peripécias que constroem a trama do longa-metragem.

Além disso, é importante enfatizar que a possibilidade de uma análise interpretativa de O animal cordial segue uma tradição da análise fílmica de matriz culturalista, que combina antropologia, estudos culturais e psicanálise, para buscar na interpretação simbólica das narrativas ficcionais e da estilística audiovisual medos e desejos da sociedade na qual esses filmes são gestados (Kellner, 2016KELLNER, Douglas. O apocalipse social no cinema contemporâneo de Hollywood. In: Matrizes, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 13-18, 2016., p. 13). Essa tradição é particularmente forte dentro do gênero horror, algo exemplificado por pesquisadores como Mark Jancovich (2002)JANCOVICH, Mark. Horror, the film reader. London: Routledge, 2002., Paul Wells (2000)WELLS, Paul. The horror genre: from Beelzebub to Blair Witch. New York: Wallflower Press, 2000., Andrew Tudor (1997)TUDOR, Andrew. Why horror? The peculiar pleasures of a popular genre. In: Cultural Studies, v. 11, n. 3, p. 443-463, 1997., Peter Hutchings (2008)HUTCHINGS, Peter. Historical dictionary of horror cinema. New Jersey: Scarecrow Press, 2008., Kim Newman (2011)NEWMAN, Kim. Nightmare movies. 4. ed. London: Bloomsbury Press, 2011. e Robin Wood (2018)WOOD, Robin. Robin Wood on the horror film: collected essays and reviews. Detroit: Wayne State University Press, 2018.. Tudor, por exemplo, aponta essa tradição como um dos motivos para que o horror atraia a atenção de um público massivo, embora pareça contraditório ― condição que Noël Carroll chama de “paradoxo do coração” (1990)CARROLL, Noel. A filosofia do horror ou paradoxos do coração. Campinas: Papirus, 1990. ― que as pessoas se disponham a acompanhar enredos ficcionais que lhes causem medo:

As interpretações mais simples e frequentes (embora de modo algum menos importantes) são aquelas que se concentram em características temáticas claramente aparentes dos filmes de terror de períodos específicos, tratando-os como articulações das preocupações sociais sentidas da época. Assim, por exemplo, é comum examinar o horror sci-fi dos anos 1950 em termos de um conjunto de temas interligados, incluindo a ameaça de invasão alienígena, os riscos da energia nuclear e os papéis da ciência e dos cientistas

(Tudor, 1997TUDOR, Andrew. Why horror? The peculiar pleasures of a popular genre. In: Cultural Studies, v. 11, n. 3, p. 443-463, 1997., p. 458, tradução nossa).

Dito isso, não se pode esquecer o caráter polissêmico da relação entre história e cinema, já que qualquer filme oferece leituras diversas de dado momento histórico, o que faz “desta tensão um dado intrínseco à sua própria estrutura interna” (Morettin, 2003MORETTIN, Eduardo. O cinema como fonte histórica na obra de Marc Ferro. In: História: Questões & Debates, Curitiba, n. 38, p. 11-42, 2003., p. 15). O historiador francês Marc Ferro, referência obrigatória nos estudos das relações entre cinema e história, as compreende como dialéticas e multifacetadas, já que a contra-análise da sociedade pode surgir mesmo sem intenção dos realizadores.

O documento tem uma riqueza de significação que não é percebida no momento em que ele é feito. [...] Esses lapsos de um criador, de uma ideologia, de uma sociedade, constituem reveladores privilegiados. Eles podem se produzir em todos os níveis do filme, como também em sua relação com a sociedade

(Ferro, 1992FERRO, Marc. Cinema e História. São Paulo: Paz e Terra, 1992., p. 88).

Concordando com Ferro, Jean-Claude Bernardet (1979)BERNARDET, Jean-Claude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. São Paulo: Paz e Terra, 1979. enfatiza a relação dialética entre cinema e sociedade, sugerindo que os filmes não são mero reflexo passivo da realidade, mas têm o potencial de revelar, como também influenciar, comportamentos sociais por meio de representações e narrativas. Nesse sentido, Pierre Sorlin (1985)SORLIN, Pierre. Sociologia del cine. México: Fondo de Cultura Economica, 1985. sugere que a coleta de dados de produção e recepção de um filme, bem como a análise de temas, peripécias e iconografias podem auxiliar a demostrar como o discurso fílmico é capaz de moldar uma perspectiva crítica sobre o espaço contemporâneo dentro da narrativa cinematográfica. Este artigo propõe um exercício de leitura simbólica nesses moldes.

Horror e tensões sociais

Apesar de ser o primeiro longa-metragem assinado pela diretora e roteirista Gabriela Amaral Almeida, O animal cordial foi concebido de forma pouco usual. Com seis curtas-metragens no currículo como diretora, além de créditos como roteirista no horror dramático Quando eu era vivo (Marco Dutra e Juliana Rojas, 2014), Almeida burilava desde 2013 o roteiro de uma obra pessoal, que posteriormente se tornaria o longa-metragem A sombra do pai (2018). O filme, que retrata a complexa relação entre um pai viúvo e sua filha criança, participou de uma oficina de roteiro no Festival de Sundance, ainda em 2013, ocasião em que Almeida pôde trabalhar no texto com a supervisão de Quentin Tarantino.

Por se tratar de um roteiro ambicioso, que abordava questões pessoais, Gabriela Almeida não acreditava estar madura o suficiente para dirigi-lo. Em 2016, durante um almoço na cidade de São Paulo com a amiga Luana Demange (que, depois, receberia o crédito de coautora do argumento), descobriu que o restaurante onde estava tinha sofrido um assalto violento alguns dias antes. À descoberta, seguiu-se uma conversa com a amiga sobre a falta de segurança e a violência latente que divide classes sociais, no Brasil contemporâneo (Moura, 2018MOURA, Julia. 2018. Elogiado O animal cordial chega aos cinemas com direção da estreante Gabriela Amaral Almeida: “Gostaria de não ser exceção”. In: Glamurama, 10/08/2018. Disponível em: https://bit.ly/3OjcVd2. Acesso em: 12 nov. 2023.
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).

A conversa acabou por gerar a ideia de escrever o roteiro de um longa-metragem, que poderia ser rodado rapidamente, como uma espécie de ensaio para a produção mais ambiciosa. O produtor Rodrigo Teixeira, parceiro de longa data da diretora, viabilizou a ideia com um orçamento de R$ 1,5 milhão, modesto para os padrões brasileiros. O roteiro foi escrito em poucas semanas e, após um breve período de quatro meses de produção, a diretora estava pronta para comandar um mês de ensaios com o elenco, formado por atores experientes, alguns deles muito conhecido por trabalhos em filmes e telenovelas brasileiros: Murilo Benício, Irandhir Santos, Luciana Paes (parceira da diretora em outros trabalhos) e Humberto Carrão (Sorc, 2018SORC, Bruno. Entrevista com Gabriela Amaral Almeida, diretora do longa O animal cordial. In: CinemAção, 23/07/2018. Disponível em: https://cinemacao.com/2018/07/23/entrevista-gabriela-amaral-almeida-diretora-do-longa-animal-cordial/. Acesso em: 09 nov. 2023.
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).

O animal cordial estreou em julho de 2017, no International Fantasy Film Festival (Canadá), e passou um ano percorrendo o circuito de festivais, antes da estreia comercial, ocorrida em agosto de 2018. Nesse período, o filme acumulou alguns prêmios: melhor ator para Murílio Benício no Festival de Cinema do Rio de Janeiro (2017); melhor atriz (Luciana Paes) e melhor direção (Gabriela Amaral Almeida) no Festival Internacional de Cinema Fantástico (Fantaspoa), em Porto Alegre (RS), no ano seguinte.

A crítica cinematográfica brasileira adotou, em geral, um tom elogioso, muitas vezes dirigido à reflexão sobre as tensões sociais que permeiam as relações entre os personagens. Luiz Carlos Merten (2018)MERTEN, Luiz Carlos. Estreia do filme O animal cordial afirma a força do cinema de terror brasileiro. In: Estadão, 09/08/2018. Disponível em: https://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,estreia-do-filme-o-animal-cordial-afirma-a-forca-do-cinema-de-terror-brasileiro,70002438715. Acesso em: 12 nov. 2023.
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escreveu que “a sangrenta ficção da diretora é feita sob medida para desmentir a tese da cordialidade brasileira (e humana, em geral)”, reafirmando por uma compreensão errônea do conceito de Sérgio Buarque de Holanda, que esclareceremos na próxima seção deste artigo. Já Carlos Alberto Mattos (2018)MERTEN, Luiz Carlos. Estreia do filme O animal cordial afirma a força do cinema de terror brasileiro. In: Estadão, 09/08/2018. Disponível em: https://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,estreia-do-filme-o-animal-cordial-afirma-a-forca-do-cinema-de-terror-brasileiro,70002438715. Acesso em: 12 nov. 2023.
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sublinhou o paralelo entre tensões cotidianas e política:

Gabriela Amaral Almeida põe em cena alegorias de um Brasil que se dilacera e se autodevora no altar do consumo, da exploração e de um machismo transformado em política. Ela escreveu O animal cordial em tempos de impeachment de Dilma Rousseff. A indignação está na base dessa criação e chega a nos tocar como a ponta de uma faca

(Mattos, 2018MATTOS, Carlos Aalberto. O arroto do leão. In: Carmattos, 21/22/1997. Disponível em: https://carmattos.com/2017/11/21/o-arroto-do-leao/. Acesso em: 12 nov. 2023.
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).

O crítico Rodrigo Fonseca (2018)FONSECA, Rodrigo. O animal cordial é o retrato preciso deste Brasil medieval. In: Estadão, 11/10/2018. Disponível em: https://cultura.estadao.com.br/blogs/p-de-pop/o-animal-cordial-e-o-retrato-preciso-deste-brasil-medieval/. Acesso em 12/11/2023.
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, ciente de que a gênese do roteiro havia ocorrido dois anos antes, foi mais longe ao sugerir que a obra era premonitória, chamando-a de “retrato preciso desse Brasil medieval”, fazendo referência à agressiva campanha da eleição presidencial vencida pelo ex-militar autoritário Jair Bolsonaro, ponto de inflexão no turbulento momento político-social vivido pelo país.

Em entrevistas (Sorc, 2018SORC, Bruno. Entrevista com Gabriela Amaral Almeida, diretora do longa O animal cordial. In: CinemAção, 23/07/2018. Disponível em: https://cinemacao.com/2018/07/23/entrevista-gabriela-amaral-almeida-diretora-do-longa-animal-cordial/. Acesso em: 09 nov. 2023.
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; Gazeta, 2018GAZETA Zero Hora. A ascensão do horror é inevitável na época de ansiedade em que vivemos”, diz diretora de O animal cordial. In: Gazeta Zero Hora, 07/08/2018. Disponível em: https://bit.ly/3xnmosU. Acesso em: 12 nov. 2023.
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), Gabriela Amaral Almeida destacou o uso intencional de recursos do cinema de horror na construção estilística e narrativa do filme, destacou que historicamente o subtexto político sempre esteve muito presente no gênero fílmico (Jancovich, 2002JANCOVICH, Mark. Horror, the film reader. London: Routledge, 2002.; Hutchings, 2008HUTCHINGS, Peter. Historical dictionary of horror cinema. New Jersey: Scarecrow Press, 2008.), e comentou sobre uma nova geração de realizadores brasileiros que tem, como ela, utilizado ferramentas narrativas e estilísticas do horror à atenção midiática recebida:

A ascensão do horror é inevitável na época de ansiedade em que vivemos, o gênero tende a refletir isso. É talvez o gênero que melhor capta e que torna alegórico o medo que a gente tem, a angústia que a gente sente

(Almeida in Gazeta, 2018GAZETA Zero Hora. A ascensão do horror é inevitável na época de ansiedade em que vivemos”, diz diretora de O animal cordial. In: Gazeta Zero Hora, 07/08/2018. Disponível em: https://bit.ly/3xnmosU. Acesso em: 12 nov. 2023.
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).

O cinema de horror, de fato, não era novidade na carreira da realizadora. Mestre em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia, ela fez parte de um grupo de estudos de narrativas cinematográficas e escreveu uma dissertação sobre a obra do escritor estadunidense de horror Stephen King. Depois de fazer uma especialização em roteiro cinematográfico na Escuela Internacional de Cine y TV (Cuba), a realizadora passou a morar em São Paulo e a colaborar em roteiros para cineastas da mesma geração. Também tem dirigido para a televisão, tendo feito três episódios da minissérie Verdades secretas (2021).

Sua associação profissional mais conhecida é com os diretores Marco Dutra e Juliana Rojas, com quem trabalhou no roteiro de curtas e longas-metragens antes de passar à direção. Dutra e Rojas, por sinal, são conhecidos pela realização dos longas-metragens Trabalhar cansa (2011), Quando eu era vivo (2014) e As boas maneiras (2018), títulos que têm um aspecto em comum com os longas-metragens assinados por Gabriela: enredos que tratam de choques e tensões sociais no Brasil da atualidade, sempre recorrendo a convenções do cinema de horror para gerar uma atmosfera (Gumbrecht, 2014GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência, stimmung: sobre um potencial oculto da literatura. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.) de medo e insegurança perceptual (Elsaesser, 2009ELSAESSER, Thomas. World cinema: realism, evidence, presence. In: NAGIB, Lúcia; MELLO, Cecília (orgs.). Realism and the audiovisual media. London: Palgrave Macmillan, 2009. p. 3-19.).

Nas entrevistas citadas anteriormente (Sorc, 2018SORC, Bruno. Entrevista com Gabriela Amaral Almeida, diretora do longa O animal cordial. In: CinemAção, 23/07/2018. Disponível em: https://cinemacao.com/2018/07/23/entrevista-gabriela-amaral-almeida-diretora-do-longa-animal-cordial/. Acesso em: 09 nov. 2023.
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; Gazeta, 2018GAZETA Zero Hora. A ascensão do horror é inevitável na época de ansiedade em que vivemos”, diz diretora de O animal cordial. In: Gazeta Zero Hora, 07/08/2018. Disponível em: https://bit.ly/3xnmosU. Acesso em: 12 nov. 2023.
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), Almeida ressaltou o fato de que muitos realizadores da geração dela ― na faixa dos 40 anos de idade ― têm apostado no horror com conteúdo social, seja por meio de dramas sociais que incorporam elementos fantásticos, insólitos ou sobrenaturais, seja com enredos que evocam atmosferas horroríficas em estruturas narrativas diretamente ligadas ao horror. Nesse ponto, é preciso destacar que muitos pesquisadores (Elsaesser, 2009ELSAESSER, Thomas. World cinema: realism, evidence, presence. In: NAGIB, Lúcia; MELLO, Cecília (orgs.). Realism and the audiovisual media. London: Palgrave Macmillan, 2009. p. 3-19.; Cherry, 2009CHERRY, Brigid. Horror. London: Routledge, 2009.; Ndalianis, 2012NDALIANIS, Angela. The horror sensorium: media and the senses. Jefferson: McFarland, 2012.; Santos, 2018SANTOS, Fernanda. Atmosferas do medo: filmes brasileiros e argentinos do início do século XXI. 2018. Tese (Doutorado em Comunicação). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) têm apontado como global, e não apenas local, essa tendência da realização cinematográfica.

Thomas Elsaesser (2009)ELSAESSER, Thomas. World cinema: realism, evidence, presence. In: NAGIB, Lúcia; MELLO, Cecília (orgs.). Realism and the audiovisual media. London: Palgrave Macmillan, 2009. p. 3-19., estudioso pioneiro a escrever sobre a tendência, identificou um elemento articulador crucial nos filmes, que chamou de insegurança perceptual. O teórico alemão afirma que a prática de assistir a filmes nos dias atuais está permeada por uma constante desconfiança não apenas em relação à narrativa, mas também no desdobramento da trama e nas ações dos personagens. Ele relaciona essa insegurança perceptual com o discurso do realismo sensorial, em que a percepção humana do real se torna vaga e imprecisa. Segundo a visão de Elsaesser, isso resulta em uma incerteza no modo como vemos (e ouvimos) o mundo. Essa incerteza, por sua vez, induz sentimentos de alerta, tensão e medo no espectador, refletindo a insegurança que surge ao observar um mundo turbulento e incerto.

Distorção conceitual

O conceito de “homem cordial” apareceu pela primeira vez em um momento histórico no qual uma parcela significativa dos intelectuais do Brasil estava se voltando, pela primeira vez, para uma questão que dominaria a sociologia, a antropologia e a história do país no restante do século XX: um esforço interpretativo para identificar quais seriam as características fundamentais que comporiam a identidade nacional do povo brasileiro. Desde a Semana de Arte Moderna (1922), o tema circulava entre críticos literários e historiadores. Até aquele momento, a figura do branco europeu predominava na historiografia brasileira, embora abolicionistas e intelectuais como Joaquim Nabuco, Luiz Gama e José do Patrocínio, desde o século XIX, procurassem, no contexto da luta pela abolição da escravatura, compreender a contribuição do afrodescendente na formação da sociedade brasileira. A abordagem historiográfica predominante, contudo, tentava dissimular e relativizar o passado sangrento da tomada de posse do território do país pelos portugueses.

Nessa época, três jovens intelectuais deram contribuições fundamentais para o debate sobre identidade nacional: Gilberto Freyre (com o livro Casa grande & senzala, de 1933), Caio Prado (com Formação do Brasil contemporâneo, de 1942) e Sergio Buarque de Holanda. A contribuição do último se deu sob a forma do livro de ensaios Raízes do Brasil, publicado pela primeira vez em 1936. O conceito de “homem cordial”, que se tornou central para a obra de Holanda ― e, de modo geral, para a sociologia brasileira ― foi desenvolvido no quinto capítulo. Trata-se de um ensaio curto, de apenas 13 páginas, no qual Holanda (2014)HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014. esboça os princípios gerais do que ele considerava ser um importante traço de comportamento e caráter dos brasileiros.

A autoria original do termo, curiosamente, não é do pesquisador, que se deparou com ele, pela primeira vez, ao ler em uma correspondência diplomática escrita em 1931 pelo escritor Ribeiro Couto, e endereçada ao colega mexicano Alfonso Reyes. Na época, Holanda trabalhava como correspondente da imprensa brasileira na Alemanha, expressava abertamente simpatia pelo ideário comunista, e demonstrava grande influência do método de pesquisa de Max Weber (Schwarcz, 2008SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sérgio Buarque de Holanda e essa tal de “cordialidade”. In: Revista IDE, Psicanálise e cultura, São Paulo, v. 86, n. 31, p. 83-89, 2008.). Holanda considerou o termo “uma expressão feliz” (Holanda, 2014HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014., p. 176), mas procurou invertê-lo em direção oposta, em um sentido primordialmente negativo.

Ao contrário de Gilberto Freyre, que lançava ao processo de miscigenação racial desenvolvido no Brasil um olhar condescendente, dócil e patriarcal, sugerindo que a integração entre brancos portugueses, negros e índios havia sido um processo mais pacífico do que ocorrera na realidade, Holanda compreendia a essência do “homem cordial” como a ausência de separação clara entre os domínios das esferas pública e privada. No texto de 1936, Holanda defendeu que a identidade brasileira havia nascido da família patriarcal de origem agrária, na qual os processos de impessoalidade e valorização da capacidade técnica e intelectual, fundamentais para o sistema capitalista moderno, não se haviam desenvolvido. O cidadão brasileiro, graças ao apego ao citado modelo familiar, teria uma necessidade atávica de criar um tipo superficial de intimidade com o outro, para poder se relacionar com ele. Esse verniz de cordialidade, contudo, não seria um traço de caráter positivo. Sergio Buarque de Holanda o enxerga mais como um disfarce, um tipo de máscara social:

A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam com efeito um traço definitivo do caráter brasileiro, na medida, ao menos, que permanece ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal. Seria engano supor que essas virtudes poderiam significar “boas maneiras”, civilidade. [...] Nossa forma de convívio social é, no fundo, justamente o contrário da polidez. Ela pode iludir na aparência. [...] Equivale a um disfarce que permitirá a cada qual preservar intatas sua sensibilidade e suas emoções

(Holanda, 2014HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014., p. 176-177).

Uma das características do “homem cordial” seria o patrimonialismo ― um termo que Buarque tomou emprestado de Max Weber (Costa, 2015COSTA, Emília Viotti da. Brasil: história, textos e contextos. São Paulo: Unesp, 2015.), principal influência sobre o historiador brasileiro naquela época — no qual cargos públicos, por exemplo, são preenchidos menos por critérios técnicos e impessoais, e mais pela proximidade e por afetos familiares (vêm dessa característica, por exemplo, as intermináveis denúncias de nepotismo que até hoje aparecem diariamente no noticiário político brasileiro). Holanda (2015, p. 178)HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014. cita outros exemplos, como a tradição coloquial de usar apelidos no diminutivo para se referir a parentes, amigos e até mesmo a santos e figuras importantes da religião católica ― na iconografia das festas de Natal, que celebram o nascimento de Jesus Cristo, os brasileiros se referem normalmente à figura bíblica como “menino Jesus” (Milaré, 2020MILARÉ, Gabriel. O conceito de “Homem cordial” na sociologia brasileira. In: Blog do QG, 20/04/2020. Disponível em: https://blog.enem.com.br/o-conceito-de-homem-cordial-na-sociologia-brasileira/. Acesso em: 10 nov. 2023.
https://blog.enem.com.br/o-conceito-de-h...
).

No contexto histórico da década de 1930 ― é importante observar que, na época, ao mesmo tempo que intelectuais brasileiros buscavam compreender e identificar os traços formadores da identidade nacional, acontecia o governo nacionalista do presidente Getúlio Vargas, que daria um golpe de Estado um ano mais tarde, governando o país até 1945 ―, o conceito de “homem cordial” terminou por manter, aos olhos de boa parte dos leitores do livro do Sergio Buarque de Holanda, a conotação positiva do termo, conforme originalmente cunhado. Essa conotação positiva, de fato, reverbera até os dias atuais entre parcela significativa dos brasileiros. Boa parte do marketing turístico do Brasil, por exemplo, alimenta a hipótese da existência de uma suposta hospitalidade inata que existiria na população (Sampaio, 2020SAMPAIO, Alexandre. Dia da Hospitalidade: a forma como o Brasil é visto pelos estrangeiros. In: Portal Brasileiro do Turismo, 20/02/2020. Disponível em: https://www.mercadoeeventos.com.br/blogs/dia-da-hospitalidade-a-forma-como-o-brasil-e-visto-pelos-estrangeiros/. Acesso em: 09 nov. 2023.
https://www.mercadoeeventos.com.br/blogs...
).

Esse desvirtuamento do conceito de “homem cordial” desagradava a Sergio Buarque de Holanda. Emília Viotti da Costa (2015)COSTA, Emília Viotti da. Brasil: história, textos e contextos. São Paulo: Unesp, 2015., professora na Universidade de Yale (Estados Unidos) e especialista em Holanda, lembra que ele alterou sucessivamente o texto original a partir de 1948, incluindo notas explicativas, quando percebeu que a popularidade do livro começava a crescer. Atualmente, Raízes do Brasil se encontra na 27ª edição, e sua popularidade entre antropólogos, historiadores e sociólogos continua alta. Em entrevista datada de 1976, Buarque de Holanda chegou a criticar o próprio conceito, considerando-o menor por ter sido gestado em um ensaio, gênero que ele passara a considerar menos importante, por supostamente conter apenas “elucubrações, às vezes brilhantes, mas desvinculadas da realidade” (Holanda in Costa, 2015COSTA, Emília Viotti da. Brasil: história, textos e contextos. São Paulo: Unesp, 2015., p. 204).

Seja por modéstia ou desilusão, nos últimos anos de vida Sergio Buarque de Holanda diminuiu voluntariamente a importância do conceito. Contudo, se examinada atentamente, em toda a sua ambivalência, a “elucubração brilhante” do historiador sintetiza com bastante precisão o comportamento do brasileiro contemporâneo. A cordialidade de Holanda, afinal, está mais próxima de sua raiz etimológica ― a palavra vem do latim cordialis, que significa coração. Uma pessoa cordial não é necessariamente bondosa, gentil ou hospitaleira. Esse traço se manifesta na superfície, mas também é responsável por atitudes agressivas, violentas e antiéticas, quando posto em prática para proteger os objetos de seu afeto. Ao defender seus interesses individuais, o brasileiro é capaz de se tornar hostil, rude e grosseiro. Não por coincidência, a jornada experimentada por Inácio e outros personagens de O animal cordial expressam os dois lados da cordialidade à brasileira, como veremos a seguir.

Choques de forças sociais

À luz do conceito de Sergio Buarque de Holanda, o primeiro ato do filme assume um duplo objetivo narrativo, ambos apontando para aspectos que trazem para a esfera do concreto, do cotidiano, da vida social, alguns dos insights do historiador sobre o caráter do brasileiro. O trecho de abertura apresenta a dinâmica de funcionamento do restaurante de Inácio, ao mesmo tempo que revela aspectos da personalidade dele. Inácio é um homem tenso, e vive em um ambiente tenso. Seu rosto denuncia a tensão: a mandíbula rígida e contraída, a fala mastigada e sem sinais de espontaneidade, as rugas permanentes que lhe vincam a testa são marcas dessa tensão. Parafraseando Pedro Almodóvar, ele é um homem à beira de um ataque de nervos. São múltiplas as causas desse estado, e o filme desfia e entrelaça muitas dessas causas durante os 20 minutos de duração do primeiro ato.

Para começar, Inácio é um empresário em crise. Uma breve tomada do pátio externo do restaurante dá uma pista do motivo: o restaurante fica em uma rua deserta, sem tráfego, num bairro residencial. É por isso que, a 30 minutos de encerrar o expediente, a casa tem apenas um cliente ― um homem enigmático, de expressão carrancuda e modos grosseiros (Ernani Moraes), que trata agressivamente a garçonete Sara (Luciana Paes), insinua que tem um revólver escondido sob a calça e não hesitará em usá-lo, caso a refeição não esteja exatamente como ele deseja, sem nenhum resquício do gosto de alho.

Na cozinha, os funcionários reclamam de Inácio ao chef Djair (Irandhir Santos), que é visto decepando a cabeça de um coelho desfolado, uma imagem de violência e repulsa, uma convenção do cinema de horror, que antecipa a espiral de violência que cairá sobre os presentes. Eles querem levar o lixo para a área de descarga, para poderem tomar banho e se preparar para ir embora; argumentam que estão saindo atrasados todos os dias, e que esse atraso os faz perder a última condução do dia, fazendo com que percam horas para poder chegar em casa. Mas não podem agilizar a saída, tirando o lixo, porque o dono do restaurante centraliza as operações e detém a única chave da porta traseira. Como não podem cruzar o salão principal com sacos de lixo, os cozinheiros precisam esperar.

Enquanto isso, Sara circula entre o salão principal, o balcão de recepção (onde está Inácio) e a cozinha, e é tratada rispidamente ― ou simplesmente ignorada ― por todos (com exceção de um ajudante da cozinha, que flerta com ela). O olhar baixo, os ombros caídos, a maquiagem borrada, o cabelo amarrado num rabo-de-cavalo fora de moda enfatizam que é uma mulher sem autoestima. Ou, pelo menos, é isso que intuímos ao longo do primeiro ato. Enquanto ela caminha silenciosamente por entre as salas, Inácio recebe uma ligação da esposa, que o pressiona para chegar mais cedo em casa ―mais um foco de tensão para ele, uma bomba-relógio prestes a explodir. Diante do espelho, ele ensaia sorrisos falsos e frases fabricadas (Figura 1) para receber um jornalista na semana seguinte, em uma imagem que lembra bastante os trejeitos premiados do ator Joaquin Phoenix em Coringa (Joker, Todd Phillips, 2019), um filme que também admite uma leitura interpretativa sobre choque de forças sociais, embora não pertença ao gênero horror. Inácio quer dar a recepção mais intimista e cordial possível ao repórter, pois sabe que uma crítica positiva ao restaurante pode reduzir seus problemas. A tensão se acumula mais e mais.

Figura 1
Inácio diante do espelho.

A chegada inesperada de um casal de burgueses (Jiddu Pinheiro e Camila Morgado) exalta os ânimos dos funcionários. O expediente, que parecia prestes a terminar, agora promete se estender por mais uma ou duas horas. O casal é extravagante, fala alto sobre viagens de luxo, e se comporta de forma arrogante. Eles são recebidos por Sara, mas a cliente, chamada Verônica, não demora para humilhar a garçonete, fazendo com que Inácio se aproxime e se identifique como proprietário. O homem, que se anuncia advogado e enófilo, pede o vinho mais caro da casa ― depois, quando a namorada enche a taça e bebe num só gole, lança a ela um olhar assustado, denunciando que a conta alta vai lhe pesar no bolso, embora ele tente vender uma aparência despreocupada ― e discute com Inácio sobre a procedência da bebida.

O cenário piora ainda mais quando os ajudantes de cozinha, sem paciência, atravessam o salão com sacolas de lixo, e o chef Djair senta diante de Inácio para, como responsável pela cozinha, reclamar um tratamento mais digno e respeito (Figura 2). Ele retira a touca, revela uma longa cabeleira que lhe cai nas costas e sobrancelhas cuidadosamente delineadas. Inácio reclama desse ato, sob o pretexto de que os clientes não gostam ― uma clara demonstração de incômodo e preconceito de gênero.

Figura 2
Djair, o chef vítima de preconceitos.

O forte sotaque do chef revela, ainda, outra matriz de preconceito, mais sutil, que talvez passe despercebido a estrangeiros: Djair vem do Nordeste, o que ativa a hostilidade com que parte significativa dos cidadãos paulistanos tratam os brasileiros oriundos dessa região, muitas vezes tratados como preguiçosos e ignorantes. É uma relação que espelha aquela existente entre europeus de matriz racial branca e habitantes das antigas colônias. Nesse momento do filme, os dois assaltantes invadem o restaurante, dando início à explosão de violência e sangue que fará com que apenas duas das sete pessoas saiam vivas do local, ao amanhecer.

A essa altura, apenas 20 minutos se passaram, mas uma miríade de tensões sociais de múltiplas naturezas já está desenhada na tela, em um exemplo discreto e quase minimalista ― tudo acontece, afinal, em tempo real e numa única locação ― de economia narrativa. O cenário está pronto para a tragédia, sem criar um estudo de personagem. Afinal, Inácio é um homem de meia-idade que sente pressões vindas de todos os lados: a família o quer mais presente, os cozinheiros pedem compreensão, o restaurante está com dívidas, o chef reclama da hostilidade (que tem subtexto sexual), os clientes ordenam subserviência, a garçonete deseja atenção. A reação de Inácio ao anúncio do assalto é descarga de pressão, mas também manifestação do “homem cordial” (Figura 3).

Figura 3
O assalto ao restaurante vira banho de sangue.

As interações entre os personagens revelam outros choques de forças sociais. Para começar, a maneira humilhante como todos os presentes tratam Sara simboliza o papel submisso da mulher em uma sociedade patriarcal, como apontado por Holanda (2014)HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014.. Djair, por sua vez, precisa esconder os sinais de sua sexualidade para ser aceito em um ambiente de classe média. O casal de clientes espalhafatosos exige tratamento especial, como se cada um dentro do recinto ― até mesmo os outros clientes ― estivesse ali para servi-los sem questioná-los. O homem solitário que odeia alho revela, aos poucos, um motivo para tratar com ar de superioridade e desdém a mulher que está ali para atendê-lo: ele tenta esconder que manca de uma perna, por ter se ferido durante um confronto policial, ocorrido anos antes, o que abre brecha para uma discussão multitemática que vai do capacitismo à misoginia. É revelador que na breve conversa que tem com Inácio, no primeiro ato, ele não demonstre o mesmo desdém. Seria por causa do gênero de Inácio? Pela posição social superior que ele ocupa? Tudo isso junto?

O painel humano que emerge do primeiro ato funciona como perfeito microcosmo do Brasil contemporâneo: um país assolado por um permanente choque de forças sociais antagônicas de múltiplas naturezas ― sexo, gênero, raça, classe social, diferenças regionais, entre outras ― em que as tensões se acumulam sem que haja qualquer válvula de escape possível. Cozinhado lentamente, esse caldeirão de tensões está pronto para explodir quando recebe o elemento catalisador, que é o assalto praticado por dois jovens encapuzados, que abusam sexualmente de Verônica antes que um deles seja baleado no peito por Inácio. Tendo percebido que as armas usadas pelos ladrões eram de brinquedo, o empresário dá vazão à tensão acumulada atirando num dos ladrões para matar; ou melhor, atirando conscientemente para provocar no agressor uma morte lenta e dolorosa.

A reação violenta de Inácio encapsula um exemplo cristalino de gesto cordial, segundo o conceito de Sergio Buarque de Holanda (2014)HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2014.. Pode parecer um paradoxo, mas é exatamente nesse ponto que reside a originalidade do conceito de “homem cordial”. A cordialidade do assassinato a sangue frio se expressa como um ato que vem do coração, um ato instintivo de proteção do status quo, do patrimônio familiar, dos privilégios de classe ― naquele momento urgente, Inácio não julga com imparcialidade e nem usa o intelecto; ele reage com o instinto de um animal... um animal cordial. Mas não demora muito para que ele perceba que se meteu numa enrascada da qual será difícil sair impune. É por isso que a ordem seguinte dele é surpreendente: todos estão proibidos de sair do restaurante até o amanhecer. As pessoas que ele protegeu se tornam, no instante seguinte, potenciais inimigos.

É a partir desse momento que as máscaras da cordialidade começam a cair, aos poucos ― mas não sem que os personagens iniciem um jogo de sobrevivência que tem a cordialidade à brasileira como elemento fundamental. A arrogância do cliente enófilo desaparece como que por encanto e é substituída pelo medo, a ponto de ele, trancado na cozinha, chorar e urinar nas próprias calças, enquanto a situação piora progressivamente no salão principal do restaurante. Verônica, a socialite, finge humildade para roubar de Sara uma navalha e tentar escapar ― e nesse ponto, nos perguntamos: será que o desleixo de Sara foi proposital? Ou ela cometeu um ato de mera desatenção?

Esse tipo de peripécia em camadas, que move o enredo com frequência, enriquece o filme ao tingi-lo com uma ambiguidade que nunca se dissipa. Como já dissemos, o assaltante sobrevivente insinua que a garçonete é cúmplice, algo que o filme não deixa claro se é fato ou suspeita. O cliente solitário, na verdade policial aposentado, pressente o destino trágico e usa os últimos momentos como uma espécie de confissão para tentar se livrar do trauma de ter ficado com um defeito físico, denotando sua misoginia ao descarregar essa frustração apenas nas personagens femininas, enquanto muda visivelmente o modo de agir diante dos homens.

Figura 4
Sara, a garçonete enigmática.

Por sua vez, Sara se mostra a mais enigmática e ambígua das personagens (Figura 4). Não é à toa que a personagem é interpretada pela atriz do elenco que mais tem parcerias com Gabriela Amaral Almeida, tendo participado anteriormente do curta A mão que afaga (2012) e, no ano seguinte, surgindo em papel de destaque no segundo longa da diretora, A sombra do pai. Sara é, de fato, um dos motores que impulsiona a progressão dramática para direções imprevisíveis. Ela está envolvida em todos os pequenos atritos que irrompem no restaurante. É ela quem se desentende com Ernani e com o casal de burgueses; ela discute com Djair na cozinha, ora se colocando do lado dos funcionários, ora defendendo o patrão. No segundo ato, descobrimos também que ela tem um namorico com um dos cozinheiros (Diego Avelino), fato que pode estar associado à própria ação criminosa, já que um dos assaltantes a acusa de ser o cérebro que organizou a operação. Isso é algo que a narrativa mantém em suspense, acentuando a ambiguidade da personagem, embora a ação dela ao final, matando Inácio e deixando o restaurante com calma, como se nada tivesse acontecido, reforce a suspeita.

Na perspectiva da leitura simbólica que propomos, Sara é sem dúvida a personagem mais difícil de compreender. É possível que ela represente, de fato, uma versão mais complexa do “homem cordial” de Sérgio Buarque de Holanda: alguém que age de maneira dúbia, sem jamais revelar suas intenções. Num contexto de múltiplas tensões transversais, como ocorre na noite fatídica, a personagem oscila entre os diversos pontos de tensão, aliando-se a um ou a outro, ao sabor dos acontecimentos, procurando sempre tirar vantagem de algum modo. Um comportamento bastante frequente na sociedade brasileira.

O único personagem que mantém a calma e tenta argumentar sem fingir uma falsa cordialidade é Djair. Enquanto está amarrado com os clientes na despensa, ele estuda possibilidades de fuga. Sara, por sua vez, se coloca ao lado do patrão, especialmente depois que é atacada por Verônica com uma navalha ― a socialite acaba morta por Inácio com um tiro no peito à queima-roupa. Um a um, como em um autêntico slasher, os personagens vão morrendo, às vezes de forma gráfica e sangrenta. Sem muita surpresa, a pulsão de morte embriaga Inácio e Sara em uma espécie de excitação hipnótica, que Gabriela Amaral Almeida encena por meio de uma estratégia narrativa interessante: a cada ato de violência, Inácio vai tirando peças de roupa sujas de sangue, até ficar nu e ensanguentado ― essa trajetória culmina com uma cena de sexo selvagem entre ele e Sara, os dois banhados de sangue e suor (Figura 5). A essa altura, o dono do restaurante já encarna de forma explícita o animal cordial a que o título alude. E fica cada vez mais claro quem é o alvo final da selvageria: o seu oposto, Djair.

Figura 5
Sara e Inácio fazem sexo no restaurante.

Nesse ponto, é muito importante perceber uma estratégia estilística importante, utilizada pela realizadora para justapor visualmente a rivalidade entre esses dois personagens: a atenção ao cabelo. Já vimos antes que o cabelo de Djair, longo e sedoso, incomoda Inácio ― um incômodo que parece ter relação com questões de gênero e sexualidade. Este último, em meio ao processo de animalização que vive ao longo da madrugada, fica sujo de sangue, anda nu pelo restaurante, mas o penteado ― cabelos negros, puxados para trás e banhados de brilhantina ― nunca muda. Inácio vira um animal, mas mantém o cabelo arrumado ― não é à toa que, quando vai ao banheiro e fica diante do espelho, sempre passa as mãos pelo cabelo. É um indício sutil, mas firme, de que há mais semelhanças entre Inácio e Djair do que os diálogos entre ambos deixam antever.

Tudo isso fica mais claro quando o dono do restaurante ataca o chef, já perto do final. Empunhando uma faca, ele se coloca às costas de Djair e ergue seu pescoço. A mise-en-scéne remete a dezenas de assassinatos que já vimos antes, em filmes slasher, como Sexta-feira 13 (Friday the 13th, Sean Cunningham, 1980) e Pânico (Scream, Wes Craven, 1996) O espectador espera que o burguês corte a jugular do empregado, mas Inácio não faz isso; ele arranca o cabelo de Djair com a faca; de certo modo, trata-se de uma morte simbólica, talvez o ato mais violento de todo o filme. É o gesto que simboliza o choque de dois personagens que representam com mais ênfase a miríade de forças sociais em convulsão: o caldeirão inclui lutas de classes sociais, raças, rivalidades regionais, sexo e ― principalmente ― gênero. Não deixa de ser, também, um gesto cordial.

Considerações finais

O almoço entre Gabriela Amaral Almeida e Luana Demange, em cuja conversa O animal cordial foi gestado, girou em torno das possíveis reações dos frequentadores e funcionários a um assalto. As duas passaram a discutir o contexto mais amplo: o aumento dos índices de violência urbana, a campanha pela liberação do uso de armas de fogo, a disputa entre diferentes forças sociais no país se tornando mais agressiva e transversal. O argumento do filme, portanto, surgiu de reflexões sobre os rumos políticos e sociais que o Brasil parecia estar tomando, o que nos remete à tendência de alguns cineastas em inserir nos filmes o ambiente político-cultural de sua época (Wood, 2018WOOD, Robin. Robin Wood on the horror film: collected essays and reviews. Detroit: Wayne State University Press, 2018.). Ecoando a posição de Marc Ferro (1992)FERRO, Marc. Cinema e História. São Paulo: Paz e Terra, 1992., Douglas Kellner é enfático ao sublinhar a importância de tomar os filmes como documentos históricos:

[...] os filmes fornecem importantes insights dentro da composição psicológica, sociopolítica, e ideológica de uma sociedade e cultura em um determinado ponto da história. Ler filmes diagnosticamente permite-nos extrair insights sobre problemas e conflitos sociais, avaliar os problemas e as crises sociopolíticas dominantes, medos e esperanças, conflitos ideológicos e políticos do momento contemporâneo

(Kellner, 2016KELLNER, Douglas. O apocalipse social no cinema contemporâneo de Hollywood. In: Matrizes, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 13-18, 2016., p. 13).

Nos últimos dez anos, uma série de filmes brasileiros tem tematizado a polarização entre forças sociais. É o caso de Trabalhar cansa (Marco Dutra e Juliana Rojas, 2011), O som ao redor (Kleber Mendonça Filho, 2012), Azougue Nazaré (Tiago Melo, 2018), As boas maneiras (Juliana Rojas e Marco Dutra, 2018) e Morto não fala (Dennison Ramalho, 2019). Esses e outros títulos são exemplos de uma tendência que Laura Cánepa (2016)CÁNEPA, Laura. Configurações do horror cinematográfico brasileiro nos anos 2000: continuidades e inovações. In: CARDOSO, J. & SANTOS, R. (orgs.). Miradas sobre o cinema ibero latino-americano. São Caetano do Sul: USCS, 2016. p. 121-143. chamou de “horror social”.

Os longas-metragens citados expressam uma tendência de uso de recursos estilísticos e convenções do cinema de horror para tratar ― às vezes de forma alegórica, outras vezes de maneira mais explícita ― dessa polarização, que reflete a ascensão de políticos e partidos de extrema direita, com discursos e políticas sociais refratários a minorias (populações negras, índias e LGBT+, por exemplo) e aos direitos humanos. Os filmes citados, tendo O animal cordial como exemplo destacado, parecem transpor para os anos 2020 a tese de Paul Wells (2000, p. 3)WELLS, Paul. The horror genre: from Beelzebub to Blair Witch. New York: Wallflower Press, 2000.: “a história do gênero horror é a história das ansiedades do século XX”.

O comentário de Wells nos permite sublinhar também o motivo pelo qual a emergência e a força do horror social se espraiam para além das fronteiras brasileiras, incluindo títulos como o paraguaio Eami (Paz Encina, 2022), o argentino Zama (Lucrecia Martel, 2017), o dinamarquês Border (Ali Abbasi, 2018), o sueco Os Inocentes (De Uskyldige, Iskil Vogt, 2021), entre outros. As crises identitárias, políticas, econômicas, imigratórias, religiosas e ambientais, entre outras, permanecem se espalhando mundo afora, talvez porque “o cinema pode tornar-se ainda mais ativo como agente de uma tomada de consciência social” (Ferro, 1992FERRO, Marc. Cinema e História. São Paulo: Paz e Terra, 1992., p. 15).

Omar Calabrese cita a profusão de monstros ― num sentido etimológico literal, ou seja, como seres que representam um elemento espetacular (Calabrese, 1987CALABRESE, Omar. A idade neobarroca. São Paulo: Martins Fontes, 1987., p. 106) inserido dentro da realidade mundana, um ser extraordinário que quebra normas e rompe barreiras, inclusive aquelas que demarcam o que é socialmente aceitável ― nos filmes contemporâneos. Calabrese (1987)CALABRESE, Omar. A idade neobarroca. São Paulo: Martins Fontes, 1987. assegura que o espírito do tempo tem sido captado por produtos da cultura pop, sugerindo que os medos e desejos mais profundos da sociedade são tratados de forma indireta nessas obras, por meio de metáforas narrativas. É exatamente o caso do enredo e dos personagens de O animal cordial, um filme que oferece um retrato alegórico do momento sombrio por que passa o Brasil.

  • 1
    Subgênero do horror cinematográfico no qual os personagens de um filme são mortos, um a um.
  • 2
    Série de manifestações populares que levaram milhares de pessoas às ruas de 438 cidades brasileiras, com confrontos violentos entre manifestantes e policiais. Essas manifestações pediam inicialmente a revogação de um aumento de passagens de ônibus na cidade de São Paulo, mas à medida que os protestos cresciam e se expandiam, seguindo o mesmo padrão visto em movimentos como a Primavera Árabe e o Ocuppy Wall Street, as causas se tornaram mais difusas, reunindo representantes de diversos espectros políticos que lutavam por objetivos diversos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Out 2023
  • Aceito
    01 Dez 2023
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