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A abordagem decolonial da crítica em Meu país é um corpo que dói

Resenha de: DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói.Belo Horizonte: Relicário, 2022
A voz
costura-se com as linhas de sangue
da sua fala. [...]
Herberto Helder, Poemas Completos

À certa altura de Meu país é um corpo que dói, Claudete Daflon sugere: “melhor não estar só” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 40). Ela poderia certamente afirmar que não está sozinha. A presente obra dá a impressão de organizar a sua argumentação como operação de uma leitora afetada criativamente por outros corpos de pensamento. Com imaginação e uma renovada mitologia política, a autora percorre o curso de uma reflexão detalhada e rigorosamente crítica sobre a condição residual e inacabada que o colonialismo, a escravização e os regimes militares encontram no contexto brasileiro e latino-americano.

As poéticas de arte visual, literatura, filme e ensaio, com as quais Claudete Daflon dialoga nesse volume, dão testemunho de lugares, ambientes e contextos ativados, onde a colonialidade coincidiu com a modernidade e o neocolonialismo com a contemporaneidade. As características distintivas dessas poéticas estão em seu envolvimento com o que foi sempre considerado a parte primitiva, animal, natural, irracional, supersticiosa dos fenômenos culturais. E o desafio posto provém de uma conjugação que elas instauram do presente com o passado, e por meio da qual se pode experimentar simbólica e materialmente o quão brutal é a manobra dos esquecimentos em nosso país e na América Latina.

Na mesma linha, a abordagem de Claudete Daflon constrói outros nexos com o passado, “pontes” de passados “submersos” com a diáspora negra e a escravização no Brasil, a ditadura chilena e a latino-americana e o extermínio de povos originários, sendo capaz de encontrar, na correlação de diversos experimentos criativos, fundamento para uma arqueologia de práticas epistemológicas, estéticas e políticas (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p.). É uma arqueologia que nos faz perceber e reconhecer como os usos e abusos da história e da arte hegemônicas estavam atrelados a uma geopolítica dos espaços coloniais e como eles, coordenados, semearam a barbárie, a destruição e o apagamento de tantos corpos da comunidade.

Meu país é um corpo que dói reflete a autoria crítica de Claudete Daflon, sendo elaborada além de um estabelecimento enrijecido de sistemas e metodologias. As “leituras-escutas”, talvez consequências de um gesto insubmisso, impelem a autora a uma posição clara no debate contemporâneo sobre a modernidade e a violência de uma conformação geosituada da experiência, do conhecimento e da consciência. Apostando no protagonismo da América Latina e no aprofundamento e reconhecimento de identidades comunitárias culturais, estéticas, linguísticas e étnicas, Daflon questiona a convicção do sistema-mundo na universalidade da humanidade. Justamente o sistema que, segundo pensa, fez e ainda faz da América Latina o palco das “seletividades perversas”. Registra-se, em seu discurso, um campo de visão associado ao “giro decolonial” que confere centralidade à contribuição latino-americana”, sem, contudo, desconsiderar autores e obras voltados à identificação do caráter complexo e controverso da hegemonia do Ocidente. Trata-se, afinal, de revelar a indissociabilidade substancial entre a constituição da modernidade epistêmica do pensamento ocidental e a condição latino-americana da colonialidade.

A seção intitulada “Humanidades seletivas”, iniciando o movimento geral do livro, busca delimitar um território político para o pensamento: “Considero absolutamente relevante que nós, latino-americanos, em nossa absoluta heterogeneidade, nos posicionemos como produtores de conhecimento e não só como receptores, sem pretensões substitutivas, e sim cooperativas” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 61). O que se aborda aí não são apenas os fundamentos teóricos de sua perspectiva decolonial, com as formulações e referências de Aníbal Quijano, Walter Mignolo, entre outros, passando pela ecologia dos saberes de Boaventura de Sousa Santos e pela banalidade do mal de Hannah Arendt. Há também uma discussão sobre a função do poder epistêmico de discernir os mais humanos (imperiais, civilizados, brancos) e os menos humanos (coloniais, primitivos, negros e indígenas) como se fosse o desenvolvimento obrigatório de uma seleção natural.

A questão a ser considerada diante de uma seletividade do humano constitutiva da colonialidade é o “acionamento da condição de natureza”, diz Daflon (2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 59). A próxima seção, “Em estado de natureza”, expõe o paradigma genético da cultura, da raça e do gênero entrando em choque com as corporalidades femininas, a partir do trabalho da artista negra Rosana Paulino e da literatura de Diamela Eltit. A íntima vizinhança da mulher com o mundo das formas orgânicas compromete o ecologismo de seu corpo à lógica do recurso cobiçado pelo capital colonial e pelo patriarcado. Para comprovar a validade desta hipótese, em especial sobre as composições de Rosana Paulino, a autora discorre criticamente sobre as estratégias de nomear, classificar e objetificar as espécies tropicais de plantas e animais por naturalistas do século XVII ao século XIX, em viagens à América.

A ilustração botânica, como bem demonstra Claudete Daflon, aplica o saber taxonômico na fabricação e representação das imagens de naturezas típicas, sejam elas humanas, zoológicas ou vegetais. A força maior, no entanto, de suas visualidades esteve em evidenciar como o esquema conceitual (científico e estético, ao mesmo tempo) operou a apropriação e a destruição de múltiplas existências e de viventes. O conjunto de Paraíso Tropical, ¿Historia Natural? e Atlântico Vermelho, de Rosana Paulino, intervém nas figuras botânicas pintadas por uma imaginação extrativista justamente ao dispor sobre elas a forma civilizacional do retrato de tipos humanos, que, com efeito, dá a ver homens negros e mulheres negras como se eles/elas fossem plantas tropicais ou objetos que são obrigados a alinhar-se à estética e ao conhecimento científico dos agentes europeus do projeto colonialista. A analogia entre planta e mulher negra sinaliza, de resto, o controle político da taxonomia das plantas sobre a domesticação e a racialização da corporalidade negra.

Comparecem, ainda, “Em estado da natureza”, a ficção anarcobarroca de Diamela Eltit, em “Os selvagens a serem abatidos”, a cinematografia do chileno Patricio Guzmán e a poesia de Edimilson de Almeida Pereira. Sob olhar aplicado e minucioso da autora, são descritos os modos distintos como essas pesquisas poéticas reconfiguram a narratividade em proveito de existências encarnadas, de cosmologias e práticas de linguagem e pensamento sobre a concretude de fatos esquecidos, e de perspectivas expandidas das letras e artes na contemporaneidade. Daí a crítica ao afirmar ser “um desafio tecer redes que pesquem peixes”, querendo, com isso, falar de uma outra situação do conhecimento diante das práticas artísticas, por meio da qual seja possível “tornar os discursos, em sua pluralidade, comunicantes entre si”, para “imaginar que nós, mulheres latino-americanas que atuamos como romancistas, artistas visuais, pesquisadoras, críticas, professoras, ativistas etc. nos encontramos todas num campo cultural compartilhado” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p.. p. 134-135).

Meu país é um corpo que dói confere à escrita e à leitura, como exercícios criativos, um aspecto de visceralidade: “Sou uma leitora. Escrevo fiel a essa condição” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 33). A leitura anima a escrita, e a escrita é um aceno criativo à leitura, que, por sua vez, está atravessada pela escuta afetuosa, entendida tanto como leitura colaborativa de poeticidades e modos heterogêneos de especular mundos, quanto modo de se vincular a existências de conformações culturais subalternizadas. Assim ocorre a ação de escrever um corpo que dói. Ação essa que está longe de lhe ser entregue por um “ato secreto de escrever” ou uma “guerra sem testemunhas”, como considerava Osman Lins, quando escrevia sobre o escritor, sua condição e a realidade social (LINS, 1969LINS, Osman. Guerra sem testemunhas: o escritor, sua condição e a realidade social. São Paulo: Livraria Martins, 1969. 285 p.). Ação que vem, antes, da urgência dos tempos obscuros, do “sentimento íntimo” que ela provoca, e de quando “a realidade” passa a ser uma “teia para o pensamento”, sob os termos recentes de Edimilson de Almeida Pereira (2022PEREIRA, Edimilson de Almeida. A realidade - teia para o pensamento. Gragoatá, v, 27, n. 57, p. 187-213, 2022. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.uff.br/gragoata/article/view/51482 . Acesso em: 17 maio 2022.
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). Perante a realidade imediata e assombrosa, há o “chamado à participação pública, a ação sem demora à maneira do que ocorreu em outros momentos dramáticos da história do Ocidente” (PEREIRA, 2022PEREIRA, Edimilson de Almeida. A realidade - teia para o pensamento. Gragoatá, v, 27, n. 57, p. 187-213, 2022. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.uff.br/gragoata/article/view/51482 . Acesso em: 17 maio 2022.
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, p. 191).

E talvez, mais radicalmente, seja justo isso que torne a ficção de Diamela Eltit tão sugestiva para Daflon. Como proposição de um feminino, maternal e monstruoso ao mesmo tempo, de Impuesto a la carne, a filha não encontra no corpo da mãe apenas abrigo, mas a dor biopolítica dos corpos torturados e destruídos durante a ditadura chilena. Em Eltit, não existirá a escrita sem a “realidade concreta” dessa dor (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p.). No curso sensível de sua escrita, emerge um corpo que sente e se ressente do castigo interminável do país. Insurge-se a autora desde uma condição psicossomática do corpo, assumindo o encargo de erigir uma criação capaz de trabalhar através do trauma a memória da ditadura chilena. Repiso passagens de Eltit reproduzidas por Claudete Daflon:

Entrarei em meu corpo como em um livro para transformá-lo em memória. Quero meu corpo para convertê-lo em uma crônica urgente e desesperada (ELTIT, 2001, p. 129 apudDAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p.160, tradução de Claudete Daflon).

Daflon escreve calorosamente sobre essas narratividades, sondando categorias e divisas teóricas que, não só lhe facultam a legibilidade de um presente de “práticas e políticas de destruição” da vida e das narrativas, como lhe abrem algumas portas fechadas da personalidade crítica e da contranarratividade. A autora afirma sua “reflexão como sentimento” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 48). Para ela, é estimulante experimentar no sentimento doloroso seu paradigma crítico, esquivar-se da dor do mundo lhe parece um modo de restringir a sensibilidade ética no escrito crítico. Há, é certo, preferência por um tipo de arte e teoria que nos dê algo sobre esse nosso mundo. Marca o livro uma orientação enunciativa de quem o enuncia. Marca-o igualmente um corpo doloroso que, por existir nesse contexto, se põe no que escreve e, logo, é capaz de partilhar “perspectivas que podem ou não ser as suas”.1 1 Estou me valendo de termos utilizados por Judith Butler (2019) em Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Por estar aplicada numa maneira de conceituar o corpo no campo da política, concorre para firmar a ideia, a ser acrescida aqui, de que não podemos ignorar o “fato crucial de que o corpo é, de algum modo, e mesmo inevitavelmente, não limitado - em sua atuação, em sua receptividade, em seu discurso, seu desejo e sua mobilidade. O corpo está fora de si mesmo, no mundo dos outros, em um tempo e um espaço que não controla, e ele não apenas existe no vetor dessas relações, mas também é esse próprio vetor. Nesse sentido, o corpo não pertence a si mesmo” (BUTLER, 2019, p. 84, tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha). Esta conceituação é ainda justificada por ela: o “corpo, na minha opinião, é onde encontramos uma variedade de perspectivas que podem ou não ser as nossas” (BUTLER, 2019, p. 85-84, tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha) A história pessoal e a ressonância emocional de seu agenciamento social e político fazem parte do discurso da crítica. É nesse sentido que a sua voz do presente, que é a voz do coração, se recusa a todo e qualquer empenho abstracionista, por entender que o pensamento “já não pode ser encarado como exercício abstrato de uma mente separada do mundo” e que o “direito de escrever” com essa voz constitui um aprofundamento no rumo de uma crítica de responsabilização ética pelas vidas e coisas que nomeia e com-o-como as nomeia (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 44).

Para a escrita ensaística de Daflon ainda tecer outras relações e desmontar a cosmologia moderna e seu cálculo colonialista de outrificar comunidades étnicas, de gênero e classe, há um dispositivo metafórico e teórico no livro, que nada tem de rígido. Ele está ligado ao fazer da sutura e à sua potência de afetar, gerar pensamento e sentimento. Não me dispenso de indicar a proximidade disso com “as transformações metamórficas em nossa capacidade de sentir, pensar e imaginar” que Isabelle Stengers manifesta em Reativar o animismo. Stengers diz: "Algumas pessoas adoram dividir e classificar, enquanto outras fazem pontes - tecem relações que transformam uma divisão em um contraste ativo” (STENGERS, 2017STENGERS, Isabelle. Reativar o animismo. Tradução de Jamille Pinheiro Dias. Caderno de Leituras n. 62. Belo Horizonte: Chão de Feira, 2017. 15 p., p. 2). E Daflon declara: “Vim até aqui costurando, buscando talvez produzir suturas à maneira de Rosana Paulino” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 134). Suturar parece ser a ação "contrapedagógica" para as tantas feridas nos corpos da história. “Suturar é um ato de amor”, define Daflon, “[f]ere para juntar aquilo que foi esgarçado, mas não finge harmonias nem apaga as pegadas da violência. A sutura tem memória” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 135). Como se vê, na impressão digital sobre tecido, recorte e costura de Atlântico Vermelho (2017), de Rosana Paulino, há uma determinada compreensão do fazer artístico. A costura, com o rastro-ritual de mãos femininas e artesãs, de ossos, azulejos, fotografias de pessoas negras e caravelas - instrumentos reais do projeto colonial europeu - consiste num “fazimento cuja imperfeição é uma conquista importante para o desfazimento de modelos e ocultamentos.” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 84).

Nos processos criativos que examina, adivinha sempre muitas relações. Atenta aos mínimos arcabouços que sustentam os trabalhos, vai em busca das “redes de materiais e significados”, das mediações com outras/outros artistas, dos indícios e das epígrafes. Alarga, assim, os contornos da alteridade na experiência artística, num ultrapasse permanente do que pudesse sugerir a “solidão criativa” de um/uma ou outro/outra artista ou da própria crítica.

Chegamos com isso a uma virtude do trabalho de Daflon, sem a qual dificilmente a autora viria aprofundar seu processo crítico. Saber como costurar a materialidade de mundos e sujeitos ocultados à linguagem do pensamento, além de conectar a potência das suas costuras às costuras de corpos feridos por um modelo ocidental de epistemologia. O seu livro não é desligado da realidade, começa no Brasil de 2018, que, de algum modo, o requisitou, com “Não sou um corpo sem órgãos”, sobre a dor viva pelo retrocesso que, desde então, vivemos. E termina “Sem rendição”, numa luta que prossegue contra a violência em múltiplos sentidos dos silenciamentos. Significa, desse modo, um exercício singular nesses tristes tempos, atravessando as expectativas de uma combinação ousada entre epistemologia e estética em um gesto corporal da escrita crítica.

O procedimento característico dos processos criativos que investiga é experimentado em algumas de suas muitas possibilidades. Ante a “narrativa relacional” do documentarista chileno Patricio Guzmán, assevera: “[p]ara um trabalho de criação relacional, uma perspectiva crítica igualmente relacional” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 214) ou o “desafio de leitura exige que eu volte à pedagogia das suturas de Rosana Paulino, aos corpos anarcobarrocos de Diamela Eltit e que eu me aproxime da narratividade de diferentes fios que o cinema de Guzmán me ensina” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 204), ou ainda: “Sinto minhas mãos atadas às de Diamela, quando escrevia seu texto cujo título me assoma: Escuchar el dolor, oír el goce” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p. p. 204 e 229). Interessada pela relação de seu texto com as vozes que, de certo modo, engendram o arranjo escritural de seu trabalho e dele participam, o que pôde obter de aprofundamento teórico no convívio com as distintas expressões torna-se contíguo à sua obra. Sucede, a cada abordagem, uma veste de energia crítica. E é nesse sentido que propõe desestabilizar as fronteiras entre ficção e teoria, pensamento e suas corporificações. Considerações suas a respeito de certo modo de fazer crítica podem ser lidas a seguir:

Para um trabalho de criação relacional, uma perspectiva crítica igualmente relacional. Como fazê-lo? Peço ajuda [...] Quero pensar em conjunto a poética das relações de Édouard Glissant e a proposta de documental de criação como poesia. Incorporar o desafio do como dizer que a conjunção epistemológica-estética supõe - me fez aprender sobre suturas e constituições imprecisas - corpos, plantas, organomadres fora dos catálogos, insubmissos a uma abordagem crítica que isola e cala. Também esse cinema das relações múltiplas que bebe do ensaístico me ensina a dor dos estados fixos. Se sigo indiferente a esses modos de dizer, me mantenho na triste tradição dos sujeitos e materiais violentos, corro o sério risco de reduzir a contribuição artística, cinematográfica e literária sobre a qual me debruço à condição de espécimes excisados, congelados e descontextualizados exatamente como os que enriquecem as coleções dos naturalistas. Nessa conversa que inventei, estão juntos à mesa meus interlocutores muito distintos, o arranjo que posso dar a esse concerto de vozes depende da minha capacidade de escuta (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 214).

Ganham especial interesse em Meu país é um corpo que dói a exploração e os desdobramentos que um episódio tem no ensaio. O episódio que a autora vivenciou com uma professora e um aluno em sua escola na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, ilustra e testemunha as marcas de “uma dor infligida” em seu corpo, o que em certa medida sinaliza um falar da ferida, do mal-estar da civilização, dando-se a ouvir desde um rasgo na alma. A menina estava responsável pelo diário da professora do sétimo ano, e um garoto enxergou nisso a oportunidade de pegar o diário para procurar anotações a seu respeito. Essa atitude do garoto fez crescer na menina um sentimento de indignação. Ela conta o caso para a professora e toda a turma. Logo depois, vem a ameaça: “vou te pegar lá fora”.

Daflon, que utiliza esse relato pessoal, assume sem reservas a dor, “os croques lhe custaram algumas lágrimas e o sentimento doloroso do abandono pelos colegas” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 36). Foi duplamente ferida em consequência da decisão destemida de responsabilizar-se intimamente por algo que também dizia respeito a seu grupo. Ela teve a cota de dor e castigo. Isolada, sem chance de ser acolhida; isso lhe tocou fundo. No entanto, como “de cada ferida nasce uma asa”,2 2 São palavras de Nietzsche a Paul Rée, na carta em que o filósofo promete uma “lição prática de moral” ao ex-amigo que, segundo lhe parecia, impedia a sua aproximação intelectual e íntima desejada com a jovem Lou Salomé. A passagem é esta: “A cada calúnia, a cada ressentimento, sinto-me mais e mais desanimado: confio cada vez menos na humanidade, e sacrifico-me por ela cada vez mais. Custa-me bastante suportar cada um desses rompimentos individuais. Mas de cada ferida nasce uma asa”. MARTINS, Maria. Deuses Malditos: I. Nietzsche. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1965. p. 52. foi essa a sua lição sobre “o sentido ético dos limites nas relações” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 36), que não se restringiu evidentemente à etapa colegial de sua vida, para aprender algo correto. A “menina sobreviveu como sujeito-obediente a si mesma” que “soube desobedecer” (“a menina não aceita o silenciamento que o menino tenta lhe impor”), soube sair do isolamento, se impor como pessoa que afirma sua diferença e ocupar um lugar crítico e sensível dentro do grupo. Apesar disso, a má conduta de um comprometeu o sentido do comum, “todos, enquanto grupo”, pagaram preço alto. A indiferença dos colegas, expressão, segundo anota a autora, de um “individualismo radicalizado” que se acercou de estratégias de “invisibilização” de outros sujeitos, amplificou-se, em escalada brasileira e mundial, nas eleições de 2018 e no “fortalecimento de tendências autoritárias, racistas, misóginas e predatórias” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 36).

Os traços essenciais do episódio referido, a responsabilidade da menina diante do compromisso estabelecido com a professora e a dor diante da indiferença dos colegas, não são destituídos de um tensionamento então reelaborado nas últimas páginas do volume. O que mais manifestamente parecerá problemático, e que retorna do episódio da escola, é a indiferença e a consequente “monstrificação” que a desumanidade do humano foi capaz de produzir das vidas que não importam ao Estado. A questão da responsabilidade alcança, assim, estatuto de experiência vivida e ensaio crítico e liga-se a suas formulações sobre “o direito de escrever”, ocorrendo entre a leitura para compreender a realidade, a angústia diante do mundo e o lugar de um texto da existência, em que o saber abriga o corpo e a dor sobe à cabeça. A reflexão com sentimento, no livro, prestigia a hipótese de uma ética do pensamento e da vida, sobre a qual prevalece, tão calorosa quanto objetiva, a leitura e a escuta de Daflon ecoando a epígrafe de O Botão de Pérola (2015O BOTÃO de pérola. Direção: Patricio Guzmán. França, 2015. DVD (92 min), son., color. ), de Patricio Guzmán, com as palavras, finalmente colaborativas e comunicantes, do poeta Raúl Zurita, Todos somos arroyo de una sola agua (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p.).

É inevitável, nesse ponto, se perguntar sobre os limites ou não de um movimento de moralização da dor ou da escrita da dor no livro de Claudete Daflon. Até que ponto a fala, a enunciação e a formulação da dor são contrapedagógicas ou contraposições propositivas? Em que medida a dor constituiria um eu poético-político num corpo que não consegue mais modificar o mundo? Nessas indagações, procuro intensificar os sentidos com que Daflon se manifesta a respeito da contrapedagogia, de Rita Segato, tendo como referência sua própria atitude de assinar um texto e uma textualidade que pretende ser de insubordinação intelectual do corpo. Ao atribuir a Meu país é um corpo que dói uma contribuição significativa dessa insubordinação enquanto “ato de intervenção”, Vera Lúcia Follain de Figueiredo, em sua apresentação ao volume, alude aos desvios de “protocolos acadêmicos”, ao “manifesto contra a indiferença” e à “consciência da responsabilidade de quem escreve” (DAFLON, 2022DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói. Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p., p. 15). Cabe acrescentar, ainda, uma crítica que busca nas poéticas e práticas de desnudamento e autodesnudamento tanto questionar verdades estabelecidas por consensos cognitivos quanto suturar contrapedagogicamente o que foi dividido pelos saberes.

A título de conclusão, convém repercutir aqui a argumentação de Peter Sloterdijk sobre as teorias críticas da modernidade, com a qual inicia o seu Crítica da Razão Cínica. Deixo algumas considerações do filósofo sobre a relação entre crítica e dor a fim de descerrar um horizonte com os devidos contrastes e vizinhanças aproximativas dos esforços de sensibilização prática de cada crítica, mantendo a perspectiva sobre o incitamento favorável das múltiplas suturas de Daflon, com as quais, aliás, dissipa a aniquilação do ciclo hegemônico e universalista do pensamento. Sloterdijk identifica, no aparato crítico moderno, o “a priori da dor” como o valor judicativo fundamental da expressão sensível de um arder, "[s]e as coisas nos acossam de maneira ardente, precisa surgir uma crítica que dê expressão ao arder (SLOTERDIJK, 2012SLOTERDIJK, Peter. Prefácio. In: SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica. Tradução de Marco Casanova, Paolo Soethe, Maurício Mendonça Cardoso, Pedro Costa Rego e Ricardo Hiendlmayer. São Paulo: Estação Liberdade, 2012. p. 11-27., p. 20). A seu ver, a teoria crítica de Adorno não esteve livre de basear-se no aspecto sensível da dor para poder esclarecidamente definir o verdadeiro e o falso.3 3 Sloterdijk aponta a estagnação e o arrefecimento das faculdades criativas no projeto crítico de Adorno, apesar de seu pioneirismo em uma “crítica renovada do conhecimento”; cito duas passagens do “Prefácio” de Crítica da Razão Cínica: “Adorno está entre os pioneiros de uma crítica renovada do conhecimento, que conta com um a priori emocional [...]. A certeza de o real estar efetivamente escrito com a pena da dor, da frieza e da rigidez marcou o acesso dessa filosofia ao mundo. Em verdade, ela não acreditava senão muito pouco na mudança para melhor, mas não cedia à tentação de se embotar e de se habituar com o dado. Permanecer sensível era uma postura por assim dizer utópica: manter aguçados os sentidos para uma felicidade que não virá, mas à qual nos mantemos de prontidão, nos protege dos recrudescimentos mais malévolos” (SLOTERDIJK, 2012, p. 22, tradução de Marco Casanova) e “Adorno, em primeira linha, tinh[a] um conceito exclusivamente restrito do sensível: a pressuposição nunca racionalizável de uma irritabilidade psíquica extrema e de uma instrução estética; sua estética caminhava no limiar da náusea em relação a tudo e a cada coisas. Quase nada do que ocorria no mundo ‘prático’ ficava sem lhe causar dor e quase nada era poupado da suspeita de brutalidade. Para ela, tudo estava de algum modo encadeado à ‘vida falsa’, por uma relação de cumplicidade, na qual ‘não havia nada certo’ (SLOTERDIJK, 2012, p. 21, tradução de Marco Casanova et al.) Essa teoria crítica, uma “teoria sensível”, foi, segundo pensa, autoridade na cura da dor, e com o poder da “cura exemplar”, porque a ideia de “expressão da fratura” desenvolvida pelo poeta Heine, na visão de A Ferida Heine por Adorno, é sobre um escritor desterrado que modifica a linguagem poética alemã a partir de sua insuficiência e carência de ter uma relação com aquela mesma linguagem. A ferida de Heine, assim, faculta à voz de uma humanidade mutilada sua condição de exílio no mundo tal como a própria enunciação do poeta significa o “vestígio” desse sofrer (ADORNO, 2003ADORNO, Theodor. A ferida Heine. In: Notas de Literatura I. Tradução de Jorge de Almeida. São Paulo: Duas Cidades: Ed. 34, 2003. p. 127-134. , p. 131, tradução de Jorge de Almeida). Sloterdijk vai um pouco mais além e afirma:

Sob as grandes realizações críticas modernas há feridas abertas por toda parte a ferida Rousseau, a ferida Schelling, a ferida Heine, a ferida Marx, a ferida Kierkegaard, a ferida Nietzsche, a ferida Spengler, a ferida Heidegger, a ferida Theodor Lessing, a ferida Freud, a ferida Adorno. Da cura de si, levada a cabo por parte de grandes feridas, surgem críticas. Estas servem às épocas como pontos de unificação da experiência de si. Cada crítica é um trabalho pioneiro na dor do tempo e um pedaço de uma cura exemplar (SLOTERDIJK, 2012SLOTERDIJK, Peter. Prefácio. In: SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica. Tradução de Marco Casanova, Paolo Soethe, Maurício Mendonça Cardoso, Pedro Costa Rego e Ricardo Hiendlmayer. São Paulo: Estação Liberdade, 2012. p. 11-27., p. 25, tradução de Marco Casanova et al.).

Referências

  • ADORNO, Theodor. A ferida Heine. In: Notas de Literatura I Tradução de Jorge de Almeida. São Paulo: Duas Cidades: Ed. 34, 2003. p. 127-134.
  • BUTLER, Judith. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. 288 p.
  • DAFLON, Claudete. Meu país é um corpo que dói Belo Horizonte: Relicário, 2022. 292 p.
  • LINS, Osman. Guerra sem testemunhas: o escritor, sua condição e a realidade social. São Paulo: Livraria Martins, 1969. 285 p.
  • MARTINS, Maria. Deuses Malditos I: Nietzsche. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. 102 p.
  • O BOTÃO de pérola. Direção: Patricio Guzmán. França, 2015. DVD (92 min), son., color.
  • PEREIRA, Edimilson de Almeida. A realidade - teia para o pensamento. Gragoatá, v, 27, n. 57, p. 187-213, 2022. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.uff.br/gragoata/article/view/51482 Acesso em: 17 maio 2022.
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  • STENGERS, Isabelle. Reativar o animismo. Tradução de Jamille Pinheiro Dias. Caderno de Leituras n. 62 Belo Horizonte: Chão de Feira, 2017. 15 p.
  • SLOTERDIJK, Peter. Prefácio. In: SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica Tradução de Marco Casanova, Paolo Soethe, Maurício Mendonça Cardoso, Pedro Costa Rego e Ricardo Hiendlmayer. São Paulo: Estação Liberdade, 2012. p. 11-27.

Notas

  • 1
    Estou me valendo de termos utilizados por Judith Butler (2019BUTLER, Judith. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. 288 p.) em Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Por estar aplicada numa maneira de conceituar o corpo no campo da política, concorre para firmar a ideia, a ser acrescida aqui, de que não podemos ignorar o “fato crucial de que o corpo é, de algum modo, e mesmo inevitavelmente, não limitado - em sua atuação, em sua receptividade, em seu discurso, seu desejo e sua mobilidade. O corpo está fora de si mesmo, no mundo dos outros, em um tempo e um espaço que não controla, e ele não apenas existe no vetor dessas relações, mas também é esse próprio vetor. Nesse sentido, o corpo não pertence a si mesmo” (BUTLER, 2019BUTLER, Judith. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. 288 p., p. 84, tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha). Esta conceituação é ainda justificada por ela: o “corpo, na minha opinião, é onde encontramos uma variedade de perspectivas que podem ou não ser as nossas” (BUTLER, 2019BUTLER, Judith. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. 288 p., p. 85-84, tradução de Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha)
  • 2
    São palavras de Nietzsche a Paul Rée, na carta em que o filósofo promete uma “lição prática de moral” ao ex-amigo que, segundo lhe parecia, impedia a sua aproximação intelectual e íntima desejada com a jovem Lou Salomé. A passagem é esta: “A cada calúnia, a cada ressentimento, sinto-me mais e mais desanimado: confio cada vez menos na humanidade, e sacrifico-me por ela cada vez mais. Custa-me bastante suportar cada um desses rompimentos individuais. Mas de cada ferida nasce uma asa”. MARTINS, MariaMARTINS, Maria. Deuses Malditos I: Nietzsche. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. 102 p.. Deuses Malditos: I. Nietzsche. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1965. p. 52.
  • 3
    Sloterdijk aponta a estagnação e o arrefecimento das faculdades criativas no projeto crítico de Adorno, apesar de seu pioneirismo em uma “crítica renovada do conhecimento”; cito duas passagens do “Prefácio” de Crítica da Razão Cínica: “Adorno está entre os pioneiros de uma crítica renovada do conhecimento, que conta com um a priori emocional [...]. A certeza de o real estar efetivamente escrito com a pena da dor, da frieza e da rigidez marcou o acesso dessa filosofia ao mundo. Em verdade, ela não acreditava senão muito pouco na mudança para melhor, mas não cedia à tentação de se embotar e de se habituar com o dado. Permanecer sensível era uma postura por assim dizer utópica: manter aguçados os sentidos para uma felicidade que não virá, mas à qual nos mantemos de prontidão, nos protege dos recrudescimentos mais malévolos” (SLOTERDIJK, 2012SLOTERDIJK, Peter. Prefácio. In: SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica. Tradução de Marco Casanova, Paolo Soethe, Maurício Mendonça Cardoso, Pedro Costa Rego e Ricardo Hiendlmayer. São Paulo: Estação Liberdade, 2012. p. 11-27., p. 22, tradução de Marco Casanova) e “Adorno, em primeira linha, tinh[a] um conceito exclusivamente restrito do sensível: a pressuposição nunca racionalizável de uma irritabilidade psíquica extrema e de uma instrução estética; sua estética caminhava no limiar da náusea em relação a tudo e a cada coisas. Quase nada do que ocorria no mundo ‘prático’ ficava sem lhe causar dor e quase nada era poupado da suspeita de brutalidade. Para ela, tudo estava de algum modo encadeado à ‘vida falsa’, por uma relação de cumplicidade, na qual ‘não havia nada certo’ (SLOTERDIJK, 2012SLOTERDIJK, Peter. Prefácio. In: SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica. Tradução de Marco Casanova, Paolo Soethe, Maurício Mendonça Cardoso, Pedro Costa Rego e Ricardo Hiendlmayer. São Paulo: Estação Liberdade, 2012. p. 11-27., p. 21, tradução de Marco Casanova et al.)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2022
  • Aceito
    13 Jul 2022
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